LONGE DESTE INSENSATO MUNDO...

   Assisti ontem, mais uma vez, esse filme de John Schlesinger. Quantas vezes? A primeira foi na TV Manchete, em...1990? O visual do filme nos alucina. ( A foto é de Nicolas Roeg ). Planícies sem fim, o mar, o verde, a umidade, a gente vê o filme e sente o frio do lugar. Ao contrário de David Lean, este épico olha as beiradas. Deixe explicar.
  David Lean se tornou um clássico para sempre porque ele conseguia, em meio a filmes grandes e caros, aprofundar o caráter dos personagens. Ele fazia blockbusters com alma, filmes imensos e épicos que examinavam a personalidade dos tipos humanos como filmes pequenos podem fazer. Este filme não. Schlesinger não se aprofunda, o que ele busca é o ambiente. E nisso ele é bem sucedido. Claro que ele perde algo em troca. No livro de Thomas Hardy, Bethsabah, a personagem de Julie Christie, é muito mais forte. É uma mulher independente, destemida, dura, original. Aqui não. Ela quase é reduzida a uma simples mulher vaidosa. Mas algo fica do livro. O mesmo ocorre com o militar feito por Terence Stamp. No livro ele é um romântico. Aqui ele é quase um playboy. Dito isso vamos ao que se destaca nesta sinfonia cinematográfica de verdes, de vento e de rochas. O ambiente.
  Roger Ebbert dizia que há filmes em que o que queremos é ficar absorvendo, viver neles, morar dentro do filme. Roger cita Monsieur Hulot, de Tati, como exemplo. Concordo. E aqui acontece o mesmo. A câmera insiste em dar closes nos personagens menores. E em grupo, esses tipos pequenos invadem o filme e criam sua magia. Camponeses trabalhando, cantando, desempregados que dançam na praça, mulheres rindo, casamentos, ovelhas pastando, cães, galos, bois, crianças brincando...O vento, a montanha...Você se vê lá dentro, em 1870, no norte frio da Inglaterra, e você se encanta. O filme, cheio de drama e de dor, te seduz por isso, pela ambientação, pela gente que lá vive e respira. Não pense que são detalhes abstratos, frios, como em Terrence Malick. Não. São pequenas narrativas dentro do fio maior. Quentes.
   É preciso estilo para conseguir esse efeito. Num cinema hiper veloz e editado, como o de hoje,  isso é impossível. Voce mal consegue ver o cenário, não tem chance alguma de se acomodar dentro do filme, fica de fora do ambiente e dentro da eletricidade dos efeitos velozes. Sem chance.
   Que lindo filme!!!
   PS: Não pense que todo grande filme dá essa vontade de morar dentro dele. Eu não gostaria de viver no mundo de Rastros de Ódio.