AS NAUS- ANTÓNIO LOBO ANTUNES, Portugal, este pesadelo.

   Quando era um miúdo, lá por 1975, lembro de uma portuguesa ir fazer faxina em casa. E de minha mãe comentar com meu pai como era triste esse povo que fugia corrido de Moçambique para não ser estripado pelos negros. Faz tempo.
   Lobo Antunes toca nessa ferida. Num tempo que voa entre 1500 e 1977, Pedro Alvares Cabral, Diogo Cão, Vasco da Gama, Luis de Camões, entre outros, voltam da África e tentam sobreviver na Lixboa setentista e socialista. Tudo lhes parece sujo e louco e agora eles são anônimos. A narrativa, eliptica, tonta, é cheia de adjetivos, de imagens de pesadelo, de becos sem saída, imagens de sujeira, de sexo, doenças, fedor e uma melancolia quente e desesperada.
   Portugal é o lugar onde todos pensam e querem crer ter sangue de fidalgo. E seus heróis andam sem saber onde estão, onde ficar, o que fazer. Miragem. Sofrem de saudades africanas. Querem as mulatas e o verão sem fim. O mar cheio de pestes, a fome e a violência.
   Ler Lobo Antunes não é fácil. Ele exige muito do leitor. Quer atenção e quer cultura. Escrita espinhosa, complicada, exagerada, tortuosa. Quase barroca. Barroquismo ateu.