GIORGIO, WILDER E HAWKS EM SP

   Alice Brill morreu. Ela tem uma série de fotos sobre uma feira na Oscar Freire que é uma coisa linda. Consegue captar a alma de uma cidade que não mais existe. Se voce puder ver suas fotos, mire o rosto das pessoas.
   No jornal se fala também de Giorgio Moroder. Lembro da primeira vez em que o escutei. Foi no rádio, em 1977. FIRST HAND, meu primeiro contato com techno. Acho Giorgio melhor que Kraftwerk. Depois desse LP de 1977, FROM HERE TO ETERNITY nada mais foi como era. O que mais me deixou besta na época foi a percussão. Eu demorei a sacar que aquela bateria não era uma bateria. Falo pra voces uma história: Vivendo em Berlin na época, Eno liga para Bowie, que acabara de chegar a capital alemã. Diz Eno, Bowie, liga na rádio X....voce vai ouvir o futuro....Bowie liga e escuta I FEEL LOVE. Era o futuro sim. Que dura até agora.
   Mostra de Billy Wilder. Cuidado! Wilder tem filmes ruins. Tem até um muito ruim ( FEDORA ). Dica minha para voce: PACTO DE SANGUE, CREPÚSCULO DOS DEUSES, SABRINA, TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO, QUANTO MAIS QUENTE MELHOR e IRMA LA DOUCE. Meu favorito hoje é Testemunha. Um suspense tão bom que parece Hitchcock. Dos gênios clássicos do cinema americano, Billy é o que menos gosto. Mas talvez seja aquele que o povo hoje mais gosta.
   Muito maior é Howard Hawks. Esse é prova de bom gosto em cinema. Se voce ama Hawks voce está no grau mais alto. Não lembro de um filme ruim dele. E são mais de 40. SCARFACE, SUPREMA CONQUISTA, LEVADA DA BRECA, PARAÍSO INFERNAL, JEJUM DE AMOR...esses só nos anos 30 e 40. Ele tem mais um monte nos anos 50 e 60. Escolher meu favorito é impossível. Ford tinha inveja de RIO BRAVO, Tarantino idolatra Jejum de Amor, Godard amava RED RIVER. O segredo de Hawks? Ninguém sabe dizer. Mas um de meus mais queridos filmes, HATARI, me mostrou algo. Hatari fala de um grupo de amigos que caça animais na África. Para um zoo. O filme tem belas cenas de ação e ótimos atores. Trilha sonora de sucesso e linda fotografia. Mas, após reve-lo pela quinta vez, notei que a coisa mais importante não era a captura do rinoceronte ou o namoro dos dois atores centrais. O principal era o café da manhã. O modo como o grupo se sentava à mesa e se servia. As conversas com café e cigarros. O papo furado. Alí estava o coração de Hawks. Ele é o diretor dos "tempos mortos", das cenas banais, da vida simples. E como é dificil fazer isso!!!! Não importa em Rio Bravo o duelo final. Importa a amizade de Wayne e Dean Martin.
   Indicar um filme? Nenhum. Para entender a grandeza desse gênio voce tem de ver ao menos dez filmes. E perceber que ele nada tem de artista, de poeta ou de intelectual. Ele é O Cinema.