O GÊNIO E A DEUSA- ALDOUS HUXLEY

   É tão bom tomar contato com a literatura inglesa! O bom-senso inglês, nunca tão Descartes-Racine como os franceses, nunca tão Kant-Schiller como os alemães. Há um momento neste livro em que Huxley fala disso. Da razão extremada dos franceses, razão que é uma abstração em si, pois a vida nada tem de racional; e a mania alemã de colocar a vida dentro de um romance, de a imaginar como fato com começo, meio e fim. Os ingleses se abstêm disso. Apenas escrevem aquilo que sentem e percebem. Jane Austen já era assim. E mesmo românticos como Wordsworth ou Keats mantinham a vida dentro dos limites de nossa percepção. Não é uma questão de realismo, pois o ingleses abominam o realismo crú, tampouco questão de materialismo, pois a Inglaterra é o país dos fantasmas e das bruxarias. É uma questão de não tentar falar "com certeza". Nada de correntes de "ismos". O único ismo inglês é o pragmatismo.
   Esta é uma novela de apenas 100 páginas e foi escrita no fim da vida de Huxley. Já quase cego ( como Joyce, como Borges ), Aldous viajava pelo mundo, vivia experiências psicodélicas e se preparava para morrer. A história começa com o encontro de dois velhos. Um deles conta uma experiência vivida na juventude. Ele foi trabalhar na casa de um velho gênio da física e lá se envolveu com a filha e a esposa desse gênio. Tudo termina em kaos.
   O livro basicamente fala da necessidade de "precisar se morrer para poder se viver plenamente". Seus temas são morte, sexo e razão. Tudo tratado de modo simples, objetivo, sem grandes vaidades. O velho gênio quase morre várias vezes, e continua sendo o duro e teimoso gênio de sempre. Sua esposa é a deusa que o faz renascer continuamente, mas como deusa, ela não sabe morrer. A filha é uma adolescente que descobre o sexo e é humilhada pelos adultos. E o narrador, um tateante novato na arte de viver.
   Novela que se lê numa tarde, longe das alturas dos textos mais ambiciosos de Huxley, serve para nos fazer lembrar do soberbo autor inglês, filho de uma familia cheia de intelectuais liberais, de suas ideias que admitem nada saber, mas que mesmo assim indagam e tentam apreender. Huxley abomina os "donos da verdade", os pregadores confiantes, os respondedores. Ele sabe que a vida é inapreensível pelo homem.
   As pessoas deveriam lê-lo muito mais.