O que posso dizer sobre Maggie?
Ela mudou o mundo. Foi a última lider a mudar globalmente a história. Acabou com a Inglaterra trabalhista, do bem-estar social. Com ela nasce a politica como administração econômica. O que passa a importar é o saldo da balança e nunca a população em si. Mesmo governos aparentemente diferentes de Maggie ( posso citar o PT e Clinton ) se guiam por essa coisa "maggiieana": Politica é salvar a economia.
Ela pegou a Inglaterra quebrada. Era o tempo dos punks, dos hippies e do país aturdido pelo IRA. Tive um amigo que morou em Londres na época ( 1975/1977 ). Era uma cidade maravilhosa e decadente. Jovens imigrantes moravam de graça em casas abandonadas. Comunidades eram sustentadas pelo governo. O imposto dos mais ricos chegava a 50 por cento ( o que fez com que quase todos os astros do rock se mandassem e fossem chamados de traidores ). A Irlanda do Norte pegava fogo e a sensação era de fim do mundo. Por mais que fosse uma deliciosa cidade de glitters e pré-punks, Londres não tinha futuro nenhum. Às vezes lembrava a Berlin de 1920. Claro que um discurso baseado em força e coragem venceria. O que os conservadores não esperavam era que Maggie salvasse a economia e matasse a velha e risonha London Town.
A coisa pegou fogo e em todos os confrontos Maggie venceu.
Jovenzinhos de 2013 não sabem, mas a Inglaterra já foi país de gente viril. Os trabalhistas, nascidos nas minas de carvão de Newcastle eram a verdadeira imagem do povão. E os intelectuais seguiam o esquerdismo elegante de Shaw. No rock os Kinks eram seus representantes. Tudo se foi com Maggie. Ela esmagou a esquerda e as velharias e se tornou o modelo daquilo que Reagan faria nos EUA. O pau comeu. Ela fechou todas as estatais que não davam lucro. Os mineiros foram pra rua. Fizeram greve de fome e Maggie os deixou morrer sem ceder um centímetro. Surrou os argentinos, matou irlandeses, enfrentou passeatas com bombas e cães. Assustou tanto a esquerda que ela se desfez aos poucos. Principalmente porque a Inglaterra voltou a se sentir segura, imperial, dona do próprio nariz. Enriqueceu. Mas pagou um preço alto, se tornou um país frouxo.
O cinema acabou. Todo incentivo estatal a cinemas menos pop se foi. O cinema inglês passou a depender da TV e da publicidade. Derek Jarman e Stephen Frears tiveram de ceder. No rock houve uma guerra. As bandas "two-tone" ( Specials, Madness, Beat ) junto a Clash, Costello, Paul Weller, passaram a se radicalizar. Lutavam frontalmente contra Maggie. Ao mesmo tempo nascia o novo rock inglês, bandas que variavam entre um deslumbramento yuppie ( Duran Duran, Human League, Spandau Ballet ) ou uma melancolia derrotada e flácida ( Joy Division, Smiths, Ultravox ). Logo todos os rebeldes se calaram e o rock da ilha desde então varia entre os alegrinhos fofos e os tristes presos em seu quarto.
Vencendo todos e sendo reeleita sempre de barbada, Maggie acabou assustando até seus eleitores. Porque eles começaram a perceber que a velha England havia morrido. Não havia mais espaço para o bom teatro subvencionado, para os excêntricos revolucionários e para os "doces vagabundos". Tradições que faziam da Inglaterra um pais único foram esquecidas. E os futuros lideres sumiram. Tarde demais perceberam que a Inglaterra não voltara a ser a potência de Disraeli e de Asquith mas apenas uma Boston da Europa.
O legado de Maggie foi o de ter acabado com a politica como coisa abstrata. A realidade passou a ser o balanço econômico. Tudo se resumindo a inflação e desemprego. Não se pode negar, Maggie venceu. Todas e todos. Sempre..