A IDADE MÉDIA POR CARPEAUX ( DA HISTÓRIA DA LITERATURA MUNDIAL- OTTO MARIA CARPEAUX )

   Muitos consideram esta a melhor obra já escrita sobre a história da literatura. Em qualquer lingua. Lançada e relançada várias vezes, ela acaba de ser editada mais uma vez, agora em edição popular. Dividiram a obra em dez volumes, cada um deles falando de uma época. Escolho a idade média para começar. E escolho por vários motivos: é o tempo que menos conheço, em 2012 algumas das obras que mais me impactaram são desse período, idade média combina com Natal. O livro, delicioso, foi devorado como rabanada.
   Carpeaux era um gênio. Sabia tudo sobre a cultura humanista. É dele o melhor livro sobre música, e aqui, ao falar sobre poetas e prosadores, ele dá aulas de história, filosofia, arquitetura, religião, politica, música e até sobre armamentos. Dentro dessa erudição, ele jamais se faz dificil, é leitura simples, prazerosa, informal. Ao final da leitura acontece o mesmo que me ocorreu ao fim da História da Música Ocidental: uma enorme vontade de conhecer mais. Sua missão é plenamente alcançada.
   Não existe a idade média, esse é o primeiro mito que Otto derruba. Jamais houve uma época de paz e conformismo. A história do período é história de movimento. Conflitos entre camponeses e donos da terra, entre burgueses e nobres, entre bispos e monges, entre novas seitas e o papa. E em meio a esse turbilhão, uma produção literária que nunca cessou. Epopéias, liricas, prosas, história, lendas, aventuras, teatro, vidas de santos, pregações, panfletos, obras eróticas. Carpeaux analisa a produção de cada gênero, contextualiza no momento politico. Ele leu obras raras, manuscritos, e não teme falar de quais são obras mortas, ilegíveis, e quais são vivas, eternas.
   Não vou ficar aqui citando autores e repetindo frases de Otto. O livro é curto. E é barato. E qualquer leitor sério ficará encantado. O que direi é que ele lança nova luz sobre a época. Falando dos provençais ele não aceita apenas o culto a Virgem como explicação do nascimento do amor. A coisa, claro, passa também pelo culto, mas engloba bem mais. Carpeaux vai atrás das raízes célticas da literatura francesa ( que domina o período ), demonstra a presença bárbara nas letras alemãs, e fala do maior nome do período, Dante Alighieri, autor da Comédia, obra atemporal que se lê hoje como se fosse escrito agora. Dante era filho do único país que não conheceu um período bárbaro, a Itália, a sempre culta e refinada Itália.  E tem muito mais, a decadência da época a partir de 1400 e a vulgarização da guerra ( com a pólvora qualquer um pode lutar, não é preciso saber, ser nobre ), o nascimento da figura do intelectual, os monges pobres que criam a figura do viajante-poeta, a extrema internacionalização da cultura, estudantes em constante movimento entre Bologna, Paris, Cambridge, Toledo. O nascimento dos estilos: as literaturas e as linguas inglesa, espanhola, alemã.... E até dos best-sellers se fala, os livros que se tornaram febre.
   Carpeaux nasceu na Áustria e poderia ter sido famoso em qualquer país, escolheu o Rio. Sorte nossa. Mal posso esperar pelo próximo volume!