Gore Vidal foi o último americano aristocrata. Ele tinha uma nostalgia crítica daquilo que a América um dia fora e daquilo que poderia ter sido. A América que ele amava não era aquela dos cowboys e nem a dos soldados heróis da segunda guerra. Era o país idealizado pelos fundadores. Ao ler Gore Vidal, indicado por Paulo Francis, em 1988, toda a minha ideia sobre o que fosse a História mudou.
Imagine. Um grupo de intelectuais é incumbido de pensar e idealizar um país recém fundado. Isso é a América em seu apogeu. Franklyn, Jefferson, Paine...todos iluministas bem formados, todos liberais modernos, recebem a missão de fazer um país. Pela primeira vez, e pela única até hoje, uma nação nasce por ato de inteligência e não pelo acaso da história. Os EUA surgem como proposta, como ato humano, como obra da mente. Contrário da Europa, feita ao acaso de escombros do imperio dos romanos, os EUA são construídos pela vontade. Planejados. A terra da liberdade e dos ideais. Mas Gore Vidal logo nos alerta. Essa nação é traída. Ela desvia sua direção e se faz nação do militarismo. Primeiro sinal: a guerra contra a Espanha em fins do século XIX. O país tinha entre seus compromissos o não envolvimento em questões internacionais. Mas os militares se fazem poderosos. Nasce o país que conhecemos, uma ideia iluminista maculada pela realidade.
Vidal escrevia bem. Tinha um estilo leve, direto, e desfiava uma corrente de informações enciclopédicas. Sua familia era daquelas que podemos chamar de aristocracia americana. Os filhos de Harvard, da politica liberal tradicional, da região de Boston e Philadelphia. Exemplo de elegãncia, tinha um caso de amor com a Itália. Para Gore, a terra de Dante era a única nação onde um homem com educação e senso de beleza poderia viver. Era apaixonado pela luz romana, pelos mármores envelhecidos, pela comida e o vinho. Gore Vidal era resenha constante nos jornais dos anos 80/90. Me mostrou que era possível cultivar a mente e ser feliz. Não foi pouca coisa. Eu pensava que todo intelectual era como Sartre. Um tipo de ratinho feio. Vidal era solar.
Claro que ele tinha defeitos. O pior era a vaidade. Se ele era chamado de "Montaigne americano" ( e ele adorava esse rótulo ), devemos lembrar que Montaigne era genuinamente modesto. Um Montaigne vaidoso nega o próprio Montaigne.
Seus livros históricos são excelentes. JULIANO deve ser lido por todos. E ele ainda frequentava Hollywood ( num tempo em que intelectuais sérios ainda acreditavam em cinema ). Assim como Aldous Huxley e Faulkner, ele se arriscou em alguns roteiros, o mais famoso sendo Ben Hur. Foi Vidal quem ressaltou a pulsão gay do herói. É hilária a história de como ele conseguiu enganar Charlton Heston, que não percebeu as pistas sobre a homossexualidade do filme.
Gore Vidal morre, e preciso dizer, mais uma vez, que em mundo de Miami onipresente, Vidal estava sem lugar. Mais que um autor, um questionador. Um chato charmoso. Um belo de um escritor.
Imagine. Um grupo de intelectuais é incumbido de pensar e idealizar um país recém fundado. Isso é a América em seu apogeu. Franklyn, Jefferson, Paine...todos iluministas bem formados, todos liberais modernos, recebem a missão de fazer um país. Pela primeira vez, e pela única até hoje, uma nação nasce por ato de inteligência e não pelo acaso da história. Os EUA surgem como proposta, como ato humano, como obra da mente. Contrário da Europa, feita ao acaso de escombros do imperio dos romanos, os EUA são construídos pela vontade. Planejados. A terra da liberdade e dos ideais. Mas Gore Vidal logo nos alerta. Essa nação é traída. Ela desvia sua direção e se faz nação do militarismo. Primeiro sinal: a guerra contra a Espanha em fins do século XIX. O país tinha entre seus compromissos o não envolvimento em questões internacionais. Mas os militares se fazem poderosos. Nasce o país que conhecemos, uma ideia iluminista maculada pela realidade.
Vidal escrevia bem. Tinha um estilo leve, direto, e desfiava uma corrente de informações enciclopédicas. Sua familia era daquelas que podemos chamar de aristocracia americana. Os filhos de Harvard, da politica liberal tradicional, da região de Boston e Philadelphia. Exemplo de elegãncia, tinha um caso de amor com a Itália. Para Gore, a terra de Dante era a única nação onde um homem com educação e senso de beleza poderia viver. Era apaixonado pela luz romana, pelos mármores envelhecidos, pela comida e o vinho. Gore Vidal era resenha constante nos jornais dos anos 80/90. Me mostrou que era possível cultivar a mente e ser feliz. Não foi pouca coisa. Eu pensava que todo intelectual era como Sartre. Um tipo de ratinho feio. Vidal era solar.
Claro que ele tinha defeitos. O pior era a vaidade. Se ele era chamado de "Montaigne americano" ( e ele adorava esse rótulo ), devemos lembrar que Montaigne era genuinamente modesto. Um Montaigne vaidoso nega o próprio Montaigne.
Seus livros históricos são excelentes. JULIANO deve ser lido por todos. E ele ainda frequentava Hollywood ( num tempo em que intelectuais sérios ainda acreditavam em cinema ). Assim como Aldous Huxley e Faulkner, ele se arriscou em alguns roteiros, o mais famoso sendo Ben Hur. Foi Vidal quem ressaltou a pulsão gay do herói. É hilária a história de como ele conseguiu enganar Charlton Heston, que não percebeu as pistas sobre a homossexualidade do filme.
Gore Vidal morre, e preciso dizer, mais uma vez, que em mundo de Miami onipresente, Vidal estava sem lugar. Mais que um autor, um questionador. Um chato charmoso. Um belo de um escritor.