PEANUTS- CHARLES M. SCHULZ

   Minduim passava na TV quando eu era criança. Eu adorava. E tinha o jazz de Vince Guaraldi que me dava uma sensação boa, de bolo recém assado. Tinha um lado tristonho. Eu pressentia que seria um Charlie Brown da vida. Nunca um Snoopy. Com a idade fui me transformando em Linus.
   Tantos anos mais tarde ainda me emociono com Peanuts. E admiro o fato de Schulz ter desenhado todas as tiras, sózinho, por toda a vida. Ele era um poeta. Um poeta de verdade. Há tanto para falar de Charlie Brown. Ele antecipa o humor de Woody Allen em mais de dez anos. Um pequeno neurótico, com medo de tudo, sempre perdendo, sempre suspirando. O sorriso de Charlie Brown é profundamente comovedor. Não há sorriso mais triste que o dele. Mas Peanuts não é só Charlie Brown. Já foi dito que na galeria de personagens de Schulz estão presentes todos os tipos de neurose moderna. De Marcy até Schroeder, toda a gama de tristezas e de ilusões está representada. Mas em meio a eles há Snoopy.
   Snoopy representa a saúde mental plena ( não são palavras minhas, mas as assino embaixo ), ele é realista, apesar de seus sonhos com o Barão Vermelho e o Legionário. Snoopy percebe o ridiculo das vidas ao seu redor e é feliz com seu prato cheio e sua casinha de madeira ( onde há uma biblioteca e uma sala de jogos ). Snoopy não fica apavorado a toa, e quando resolve se mover, resolve as coisas. E sonha. Sonhos reais, sonhos dos quais ele não tem vergonha. Sinto que Schulz, como eu, adoraria ser Snoopy.
   O que me encanta na vida dos Peanuts é seu espaço. As ruas são imensas, as casas têm jardins, há lugar para as crianças viverem. Mas ao mesmo tempo tudo é desolado, vazio, melancólico. O fato de tiras tão tristonhas serem as mais populares do século XX diz muito sobre o que foi essa época. Charlie Brown arremessa a bola e sabe que vai errar. Mas continua arremessando. Snoopy vem e lhe mostra a lingua... o que mais Charlie Brown pode fazer? Suspira, diz "Que puxa...", e continua jogando. E erra.
   Snoopy dança, o que confirma a teoria de que todo filósofo verdadeiro deve saber dançar. Não que ele "saiba" dançar, mas ele dança como sabe... então ele sabe! Quando Snoopy vira o personagem Joe Cool o mundo faz sentido.
   Guardo os livros de Schulz ao lado dos livros de Rilke, Yeats e Whitman. Pra mim faz todo o sentido. É culminância de um tipo de arte. Schulz foi um gênio intuitivo.