CARIBOU- ELTON JOHN ( O PRIMEIRO DISCO A GENTE NUNCA ESQUECE )

   Foi num Natal dos anos 70. Na loja Yaohan. Meu pai me deu dinheiro, e um dos meus presentes foi um vinil. Criança, eu adorava Wings, Harold Melvin e Elton John. Nas prateleiras da loja, lugar cheio de escadas rolantes e aço cromado, peguei o disco e mandei embrulhar. Na rua, atulhada de gente, pessoas com enormes pacotes, andei cantarolando "Beannie and The Jets". Era minha música favorita. Ela não está em Caribou.
   A banda de Elton John, a Elton John Band, entre 1972/1975 era do cacete!  Dee Murray, Ray Cooper, Davey Johnstone e o super baterista Nigel Olsson. Se voce ouvir as músicas gravadas nessa época, vai reparar que o instrumental é rock, é country, é soul, faz o diabo.
   Foi uma grande época para o pop. Tínhamos o pop negro arrepiando com o som da Filadélfia, o funk e o groove de New York. E um majestoso e adulto pop branco, que ia de Steely Dan à Rod Stewart, de Cat Stevens à Sweet. Mas quem reinava era Elton. Entre 71 e 76 ele colocou dez singles em primeiro lugar nos EUA e mais oito nos top ten. Na Inglaterra ele era chamado de rei do pop, o herdeiro dos Beatles. Não era. A praia de Elton era muito mais Elvis e Beach Boys que Beatles e Dylan. Em termos de música pra rádio, de melodia harmoniosa e arranjos sublimes, foi um mestre. Desde então, o único que obteve seu alcance, no pop branco, foi Madonna.  De U2 a REM, de George Michael a Coldplay, ninguém tem o número de hits de Elton. O único cara que pode fazer um show de duas horas só de sucessos como ele faz, se chama Paul MacCartney.
   Caribou é de 1974. Auge da Elton- mania mundial. A capa é das coisas mais ridículas já feitas. Uma enorme foto de Elton, camisa aberta, peito peludo, a camisa feita de pele de tigre e um cenário falso atrás. Na contra-capa, fotos da banda e de Elton com seu parceiro, Bernie Taupin. Abrindo essa capa, vemos uma foto imensa do rosto de Elton, autografada, e as letras das canções. Um detalhe: Elton não era levado a sério pela crítica. Era um tempo de letras políticas ou surreais. Bernie Taupin fazia letras simples. Era subestimado.
   Bitch is Back abre o disco. As guitarras rasgam o som, é um riff poderoso. O piano de Elton paga sua dívida a Jerry Lee e os metais negros da Tower of Power atacam. Mas é o ritmo, o baixo funky e a batera de Olsson que me aturdiam em 1974. Ainda me comovem. Bitch é uma festa. A cadela, após o imenso sucesso de Goodbye Yellow Brick Road, lançado meses antes ( Elton lançava um lp a cada nove meses e mais alguns singles cada seis meses. A concorrência era feroz), está de volta.
   Pinky vem em seguida. Uma doce e muito bela balada. Os vocais de fundo são de alguns dos Beach Boys. Harmonia pop de gosto muito refinado. Por favor me digam: alguém em 2011 faz música assim? Espero que sim.
   Grimsby volta a ter um riff de guitarra poderoso. É rock, é festeira. Tem baixo sacolejante, tem vocais de fundo harmônicos, tem bateria do cacete. E emenda com Dixie Lilly, uma canção do Mississipi, com apito de barcaça, banjo, violões e muita alegria. É deliciosa!
   Solar Prestige A Gammon é uma gozação com a nobreza inglesa. Cantada com sotaque de opereta, é estranhíssima. Não é rock, nem soul, nem folk. É anos 20. O antigo vinil terminava o lado A com You're So Static, onde os metais da Tower of Power dão um show. Vem o lado dois.
   I've Seem The Saucers é uma obra-prima. Começa solene, se torna sonhadora, e tem um arranjo sutil, com um milhão de vozes e de instrumentos. É linda, linda e sublime.
   Stinker é outra obra-prima. Um soul invocado das antigas. Elton canta de forma agressiva, forte, e a bateria de Olsson faz misérias. É um som áspero, negro, noturno.
   Don't Let The Sun vem agora e eu imagino a criança George Michael a escutando então. Todos a conhecem. É magnífica, ambiciosa, orquestral. E para fechar, Ticking, só voz e piano. Triste.
   Deste disco quatro canções viraram single e duas chegaram ao number one. Em 1974 ainda foi lançado o single de Lucy in The Sky With Diamonds e One Day. Em 1975 teríamos Pinball Wizzard, Philadelphia Freedom e o lp Captain Fantastic. Todos number one. Em 1973 o recorde: os singles de Goodbye Yellow, Beannie and the Jets, Candle in the Wind e Saturday Night, todos no topo, e mais os lps Goodbye Yellow e Don't Shoot Me. Mais os singles Sweet Painted Lady, Roy Rogers e Daniel. Tudo isso tocando no rádio do mundo todo. Trabalhava muito o cara...
   Mas em 1976, Elton cometeu dois erros: disse ser gay e comprou um time de futebol inglês. Ainda conseguiu enormes sucessos como Don't Go Breaking My Heart, mas a magia se desfez. Elton não era mais um "esquisito" e bem humorado ídolo pop. Ele agora parecia ser um debochado gay perigoso e muito grotesco. Se Bowie podia dizer ser gay e continuar no alto, isso se devia ao tipo de público que o adorava. Para eles, Bowie ser gay era mais uma qualidade do ídolo. O público de Elton não aceitou. Ele perdeu seus fãs infantis, seus fãs ingênuos, seus fãs conservadores. Sobraram os caras como eu, que amavam Bowie e Roxy e pouco se lixavam pra aquilo que eles faziam na cama.
   Quem começou a ouvir discos nos anos 80, percebe Elton como um tipo de Phil Collins. Quem começou a escutar música nos anos 90 o conhece como um tipo de George Michael velho. Entendam, ele deve ser comparado a Beatles, Beach Boys, Elvis, Stevie Wonder, Marvin Gaye ou Paul Simon, os grandes artífices do pop, do single, da harmonia. Phil, George, assim como Billy Joel e uma imensa constelação de cantores pop são sub-Eltons.
   Eu adoro Elton.
   PS: na internet Jack White diz que seu disco fundamental é um de Son House, um velho cara do blues. No video ele o coloca pra tocar e vemos que todo o som que Jack fez e faz é aquele. Eu devo ser um cara muuuuito pop. Apesar de adorar Son House, meu disco definidor é Rocket Man. Pra mim, o single perfeito.