SEM NOVIDADES NO FRONT- LEWIS MILESTONE ( O MELHOR FILME DE GUERRA JÁ FEITO? )

   Filmes de guerra, mesmo os melhores, e penso em PATTON  e APOCALYPSE NOW, sempre acabam tendo alguma cena em que a guerra é mostrada como algo "heróico". O bom GUERRA AO TERROR acaba, em meio a toda nóia, exibindo algum fascínio por toda aquela adrenalina. Isso não acontece com este filme. Aqui não há um segundo, uma fala, uma imagem que remeta a algum tipo de heroísmo, de glamour ou de transcendencia. A guerra como absurdo sem sentido. Radicalmente pacifista, eis o que este filme é.
   E mesmo assim, provando a falta de poder da arte, ele não pode evitar a segunda guerra. Sim, como voce sabe, este filme fala sobre a primeira guerra mundial, é um filme de 1930, vencedor dos Oscars de filme e direção. Baseado no livro de Erich Maria Remarque, conta a experiência de onze jovens alemães na guerra mais cruel já feita ( a segunda foi mais violenta e satãnica, mas a primeira foi a perda da virgindade humana. Soldados ainda saídos do mundo pré-guerra total, ainda crendo em honra e pátria, sendo jogados na carnificina industrial moderna ).
   O filme começa com uma sala de aula onde o professor instiga os alunos a se alistarem e marcharem rumo a Paris. Os alunos, sonhadores, se alistam com alegria. Para eles a guerra é ainda um jogo, mortal, eles sabem, mas um jogo de cavalheiros, com regras e com limpeza moral. Logo em seu primeiro contato com o quartel todos começam a perder a ilusão. O treinamento é baseado em crueldade e humilhação. Mas nada se compara a guerra em si.
   Milestone, que foi um grande diretor épico, cria cenas de batalha que ainda hoje impressionam por seu realismo. São cenas que se parecem com a vida real, um documentário. Cada explosão, e são muitas, dá a sensação de morte, de terror, de paranóia. Sentimos medo, muito medo. O campo de guerra se revela um inferno de lama, arame farpado, ratos, fome, e desespero. Não há heroísmo, não há honra nenhuma, medo apenas, medo constante. O filme exibe a podridão da vida na trincheira. Os soldados, sem comida, sem equipamento algum, chegavam a ficar semanas em buracos subterrâneos, cercados de explosões, pulgas, carrapatos, ratos e água de fossa. Fedor, coceiras, doença, lama, e muita escuridão. Desabamentos, soldados enlouquecendo, gritos de medo, tremedeiras, mortes e mais mortes. As tropas passam semanas para avançar cem metros e depois recuam duzentos. São encurraladas por chuvas de bombas e estão todo o tempo com frio e com fome. O filme mostra tudo isso, sem medo, com ira, com coragem, sem aliviar. O que pensamos todo o tempo é: Porque eles estão lá?
   Várias cenas se fixam na memória. Soldados correndo e morrendo, os hospitais com seus amputamentos e mortes às dúzias, os soldados com saudades de casa. Mas talvez a mais crua cena seja a da morte do inimigo. A crueldade da batalha com baionetas, a agonia do inimigo que demora horas para morrer, o cara-a-cara da dor. Não se engane, toda nossa arte moderna, toda nossa filosofia pessimista, nasce dessa loucura. A segunda guerra foi a consequencia daquilo que nascia aqui, o nosso tempo.
   Toda guerra sempre foi cruel. Mas havia uma diferença. Existiam regras. Se escolhia um campo de guerra, se esperava o inimigo e se ( creia, é fato ) tentava matar o mínimo possível. O objetivo era capturar as tropas adversárias, cercá-las, vencer o rival, fazê-lo se entregar. Nunca se pensava em aniquilar, esmagar, destruir.
   Com as bombas modernas, o gás quimico, os aviões, os super canhões, pela primeira vez matou-se às centenas. De forma anônima, sem captura e resgate, sem atos de heroísmo, sem regra alguma. A guerra se faz impessoal ( como já era o trabalho e se tornaria a vida ). O filme mostra jovens que ainda pensavam em Napoleão e Julio César perdidos em meio a explosões vindas não se sabe de que lado, aviões assassinos dos céus, distãncia de seus chefes, regras abolidas. Caos absoluto.
   A cena final é uma das mais famosas da história do cinema e após 81 anos ainda emociona e muito. Em meio a lama e aos mortos, um soldado vê uma borboleta tentando voar. Ela se debate presa na sujeira. O soldado estica seu braço para tentar a libertar. Ouve-se um tiro e o braço se torna rígido. A tela fica negra. O filme termina em silêncio....
   Uma certeza se faz: isso é cinema puro, sem literatice, sem teatro, sem enfeite. Imagem que narra, que conta, que diz. Ainda contundente, moderno, forte, eis um muito grande filme. Veja!!!!