GAINSBOURG, HERÓI, um filme de JOANN SFAR

Existem 3 modos de se ver o filme-homenagem de Joann Sfar. O primeiro é vê-lo como alguém que conhece e ama Gainsbourg. É meu caso e ver este filme tem algo de frustrante. O cinema é por natureza um simplificador e Sfar fez um filme que torna a vida turbulenta, rica, perigosa de Serge, uma vida quase linear. Pior, é um filme com o rosto de 2011, puritano. Sfar consegue o milagre de fazer um filme sobre Serge sem uma cena de sexo. Nada se fala sobre seu filme provocante de 1976, e se mostra o homem alcoólatra que ele se fez, sem jamais se exibir uma garrafa de bebida. Para o Gainsbourg fã, o filme é bastante não-gainsbourgiano.
O segundo modo de vê-lo é como alguém que nada sabe sobre Serge e que quer descobrir quem ele é através do filme. Esse é o típico personagem-alvo do cinema para inteligentinhos do cinema atual. Aquele cara que nunca leu Tolstoi e que tenta conhecer o gênio russo através da "Última Estação", ou o cara que não ouve Bob Dylan mas acha que conhece Dylan pelo filme genial de Todd Haynes. O inteligentinho irá agora conhecer Serge via Sfar. E que Serge é esse? Um cantor/compositor francês que fazia músicas bacaninhas ( e que antecipavam o som bacaninha de pessoas fashion de hoje ). Um feioso que namorou BB ( e chega a ser humilhante para Laetitia Casta o quanto ela é menos bonita que a diva BB ), um chato que teve a sorte de ser casado com Jane Birkin. Fica a imagem de um cara meio perdido, levado pelo destino, solto, e sempre com seu Gitanes aceso. Um cara simpático, e eis o erro: Serge nunca foi simpático! Voce o amava ou o odiava, simpático jamais! Mas estamos em 2011, a ditadura da simpatia...
O terceiro modo é vê-lo como cinema, sem se preocupar com Gainsbourg. Fazendo de conta que tudo aquilo é ficção. E é então que o filme cresce. Como cinema em si, é um filme encantador. Joann Sfar ama tanto a Serge Gainsbourg que lhe fez uma fábula. Jogou fora a pretensão de exibir sua caleidoscópica e labiríntica persona e se concentrou em dar de presente à Serge e a seus fãs um poema de amor. O filme exibe suas canções, ama seu rosto de rato, apaixona-se por seus cigarros e cresce muito na parte final, ao mostrar a relação com Jane Birkin. O ator, Eric Elmosnino é mais feio que Serge ( e menos viril ). Gainsbourg era muito mais rouco e bruto. Atraía pela virilidade explícita. Joann suaviza isso, mas homenageia seu herói mostrando seu lado mais suave, engraçado, "simpático" então.
É um belo filme, léguas à frente de biografias tolas como RAY. Quando o filme se encerra sentimos um imenso respeito pelo homem Gainsbourg e reside aí o segredo do filme.