ROBERT CAPA NA TV CULTURA

Cartier-Bresson e Robert Doisneau são mais conhecidos. Man Ray é mais artístico e Richard Avedon glamuroso, mas Robert Capa foi o maior. A tv Cultura, em seu atual renascimento, exibiu ontem um suscinto e belo documentário sobre esse herói da objetiva.
Capa cobriu guerras. A revolução da Espanha, a chinesa, a segunda grande guerra, a revolução do México. E sempre esteve contra o fascismo. Foi o único fotógrafo no desembarque do dia D. Ele estava lá, desceu em meio as balas, na areia e no frio. Entrou em Pequim e fotografou discursos e tiroteios. Seu ditado era : se a foto não saiu boa, foi porque não me arrisquei o bastante.
Amava a vida. Bebia e namorava muito. Bom conversador, sorridente, um tipo latino. Suas fotos têm a força de literatura completa. Cada foto é uma narrativa sobre aquele fato. Voce as olha e imediatamente ouve a história. Serão eternas.
O maior momento de Capa foi a libertação de Paris. Nossa geração, penso eu, jamais terá idéia do que foi aquilo. Imagine um dia em que todos saem à rua para celebrar a derrota de um inimigo comum. Mais que isso, o final de um terrível pesadelo. Penso que nunca mais comemoraremos a derrota de um inimigo. Pois nunca mais poderemos crer na vitória. Milhões de pessoas nas ruas, cantando, chorando, rindo, se beijando. Milhões de pessoas completamente felizes. Sem qualquer pudor. Me é, nos é, inimaginável. E aconteceu a tão pouco tempo.....
Após a segunda-guerra Capa foi para Hollywood. Para descobrir que o mundo falso do cinema lhe era insuportável ( o que não o impediu de ter um caso com Ingrid Bergman. Mas ela era uma estrela anti-Hollywood ). Mesmo assim, Capa tem belas fotos de Hitchcock, Ingrid, James Stewart, Cary Grant e George Cukor. Mas seu lugar era Paris.
Volta e cria a Magnum ( nome tirado de uma champagne ). Com Bresson e outros, é criada a primeira agência de fotógrafos. Eles vendem suas fotos aos veículos que desejarem. São donos de seus narizes. Sebastião Salgado é hoje membro dessa agência ( que sempre tem apenas dez ou doze participantes ).
E Capa vive. Festas, casos, jazz. Até que é chamado pela revista Life para fotografar o Vietnã. Os vietnamitas lutavam contra a França. Tentavam se libertar. Capa foi. Tirou fotos assombrosas. E morreu por lá, ao pisar numa mina. Tinha trintae oito anos.
Os vietnamitas queriam o enterrar em Hanoi. Mas foi levado para New York.
Não haverá mais espaço para novo Robert Capa porque hoje temos um bilhão de fotógrafos fotografando tudo. Isso é bom. Posso brincar de ser Capa. E sei que meu mundo estará para sempre vivo nessas imagens que não param de se reproduzir. Democracia.
Mas por outro lado, em meio a essa massa imensa, se existir um talento tão forte quanto o de Capa, ele será imediatamente subjugado pelo clamor dessas imagens que não cessam de brotar. E pior, nosso olhar, sempre instigado e confundido por cenas que não páram de chegar, não será mais educado por outro olhar, um olhar mais apurado, treinado e sábio. Na bilhanesca quantidade de imagens, todas terminam por ter o mesmo valor : a irrelevância.
Nisso a geração de Capa foi privilegiada. Como aconteceu com o cinema e a música da época, é uma geração que teve a sorte de ser a primeira e ao mesmo tempo a última. A primeira a conhecer a comunicação global, e a última a ter o tempo necessário para se desenvolver e ser apreciada.
Tenho em casa um livro de Robert Capa. Fotos da Espanha, da China e da grande guerra. E das festas em Paris. São como textos de Heminguay ou páginas de Proust. Tudo está lá. Tudo. Mas o que mais se percebe é a força de quem tirou essas fotos. Se em Bresson percebemos a ordem e a suprema maestria do francês, e se em Doisneau vemos a poesia e a fé do fotógrafo, em Capa não paramos de notar, em toda foto, a coragem, a virilidade, a confiança de quem as produziu.
Robert Capa foi um Homem.