Quem já disputou alguma coisa a sério sabe que sempre há uma hora em que voce quer estapear seu adversário. Não existe essa besteira de que o que vale é competir. Voce quer é ganhar sempre. E se puder, humilhar o adversário. Quem fala em "o que vale é saber perder", é aquele que já sabe ser a derrota certa.
O boxe é então o menos dissimulado dos esportes. Sim, ele tem sua máfia de resultados, doping etc. Todo esporte tem. Mas sua prática, ali, sobre o ringue, é um ato de verdade. Nada na troca de socos finge uma nobreza de delicadas atitudes. Sua nobreza é outra. É o sangue azul da coragem, do se deixar atingir, do saber se esquivar, conseguir se reerguer, e principalmente: derrubar o oponente. Eu respeito todo lutador.
Nenhum esporte é tão épico. De Ali a Sugar Ray, de Joe Louis a Marcel Cerdan, de Rocky Marciano a Carlos Monzon. Uma galeria de heróis, de martires, de loucos e de poetas do corpo. Mas principalmente: uma constelação de homens com atitude. Não é a toa ser o boxe o mais cinematográfico dos esportes, o mais jazzistico, o esporte existencialista. É um fio de navalha.
O volley jamais terá um herói. São bonzinhos. O tênis precisou de dois séculos para produzir um John McEnroe. O futebol, como disse Eric Cantona, está matando todos os seus cavalos selvagens. É uma época de Kakás e Christianos Ronaldos. George Best ou Garrincha seriam desempregados. No automobilismo não existe mais a atitude kamikase. Ela está extinta. Jim Clark ou Gilles Villeneuve jamais again. Mas mesmo na era de Jackie Stewart, Maradona, Borg ou Magic Johnson, era o boxe quem tinha Mano de Piedra Duran, Leonard ou o estúpido e fascinante Mike Tyson. Cavalos selvagens. Originais. Vira-latas únicos. Extintos.
Pessoas boazinhas odeiam boxe porque ele é violento. Bem...homens são violentos. A vida é violenta. Voce trucida um boi pra comer um hamburger e um bacaninha de um mico trucida um passarinho no ninho. Eu sou vegetariano e adoro boxe ( não o de hoje. A atual safra é a pior da história ). No ringue nada é falso, nada é cinico, não há frescura. Voce derruba o cara na sua frente. E depois o cumprimenta. Ele está lá porque quer. Voce está lá pra bater e levar na cara. Simples assim. Puro.
Tenho um certo desprezo por esportes fru fru. Coisas como volley ou ginástica olímpica. Patinação e peteca. Mas não sou tão troglô. Adoro xadrez e golfe. Curling e surfe. ( Que também deixou de produzir os Mickey Dora e Tom Curren do mar ). Mas é o boxe o esporte mais dramático, mais objetivo, mais corajoso, mais vital. Nobre.
Em mundo anônimo ele está com os dias contados. Burocratas e cientistas não suportam a doida exuberancia de um esporte de Ali e Julio Cesar Chavez. O boxe não é racional. As luvas serão penduradas. Os ringues transformados em lan houses. Tempo de guerra, de droga e de sequestros. Mas não da violencia do boxe. Tempo de mentira.
Pena......quem jamais vestiu as luvas não sabe o que perdeu.