RETRATO DO ARTISTA QUANDO JOVEM - JAMES JOYCE

O pai. Acompanhar esse pai às tabernas. Ele é um bom aluno. Escola de jesuítas. Padres. O catolicismo irlandês. Jesus e Maria. Ele e ele.
Stephen Dedalus. Dedalus fala com Dedalus. No mundo infantil de Stephen só existem padres e ele mesmo. E a injustiça. Os castigos dados pelos padres.
Cada parte do livro ( pequeno volume ) é uma etapa da vida de Stephen. Para onde ele caminha ? Descobre o sexo com uma puta. A culpa. Um dos mais tortuosos capítulos já escritos : Dedalus cai do céu. Ele cai, desaba, mergulha na vida. Adeus à igreja, adeus a inocência. A consciencia culpada luta com o corpo desejante. Santos e Jesus. A escrita é um labirinto.
Stephen adora andar pelas ruas. Caminha e caminha. Para onde ele vai ?
Já crescido, um jovem. Discute teoria estética, discute a Irlanda. Um poço de rancor, de ira mansa, um caminho de solidão.
O livro é isso : da infãncia ao despertar de um jovem. Ele nunca posa de vítima, Dedalus sofre mas assume. Escolhe partir. Sem família e sem Irlanda. Nada de amigos. Todos os outros personagens do livro são fantasmas. No mundo de Stephen existe apenas Stephen. O livro é luxuriantemente moderno. O corpo começa a falar.
Não é fácil esse caminho. Nem mesmo para o leitor. O livro fala e fala e fala. A igreja ocupa o centro. Ícones e vestes de sacerdotes. E as ruas sujas. O texto é tortura tortuosa. Voltas e caminhos. E jóias entre as vielas escuras e podres.
" Viver, errar, cair, triunfar, recriar a vida para além da vida ! Um anjo selvagem lhe tinha aparecido.... " Esse é o caminho de Dedalus. Mas há mais :
Ele percebe que toda arte que nos dá repulsa ou que nos atrai não é válida. A arte superior SUSPENDE a vida. Não causa nem repulsa e nem atração. Olhamos suspensos. Paramos. Tudo o que nos pega pelo sentido da atração ou da repulsa é pornográfico. Explícito. O prazer estético se encontra na SUSPENÇÃO. O momento onde não existe nem atração e nem repulsa, nem prazer e nem dor, onde não há tempo. Voce enxerga com a alma, não com o corpo.
É esta a mais bela e perfeita definição do que seja arte que já lí. Não fosse por mais, o livro valeria por ela.
Deve ter sido duro ser Joyce. Ele não baixa a guarda nunca. Não amolece, não agrada, jamais deixa de fazer o que quer fazer. Ele tem o rigor e a fé do jesuíta. Crê no seu destino, crê em sua mente e nunca se corrompe. James Joyce era meio santo. Este duro, crispado, irado livro é um atestado de fé. A fé de Stephen Dedalus em James Joyce.