Toda arte ( ou aquela que pensa ser ) é um organismo vivo. Ela nasce, se desenvolve e decai . Cinema mudo é a infancia dessa arte. E como toda criança é ingênuo, cheio de vitalidade e com o mágico dom de alguém que descobre o mundo. Nos anos 30 ele é um menino na escola. Fala muito, pensa ser " grande ", e vive sonhos de grandeza. O cinema se aventura mundo afora. Vem a adolescencia, e ele descobre que o mundo é cruel ( neo-realismo ) e ao mesmo tempo, se torna um rebelde cinico ( cinema noir ). Torna-se adulto. Seriedade, responsabilidade - a vida é para ser construida dia a dia - tempo dos dramas americanos dos 50, e do cinema de arte - Bergman, Fellini e muitos outros. Chegamos a maturidade. Filhos, cabelos brancos, posses, medos. È o cinema dos anos 70, que já revela um certo desencanto, um clima de fim de ilusões. Nos anos 80 estamos na terceira idade. O ser vivo tenta remoçar, faz plásticas, chora e rí, toma hormônios, luta. Mas perdeu vitalidade. Desse momento em diante é ladeira abaixo. Senilidade. Hoje ele vive ligado a aparelhos. A tecnologia faz com que ele ainda respire, mas na verdade ele vegeta. Vive pensando em seus velhos momentos de grandeza e sonha com sua última ereção. Às vezes consegue respirar sem aparelhos, revive alguma idéia esquecida e retorna ao quarto onde tenta ser criança outra vez.
Assim é com toda vida e com toda arte. E religião. E filosofia. Os gregos foram crianças, descobrindo e brincando com deuses, átomos e números. A idade média foi a primeira infancia, agarrada ao pai e cheia de medos e magia. Adolescencia renascentista em que o homem descobriu a liberdade, o universo e a independencia. Torna-se adulto no iluminismo ( estou falando de filosofia ) e maduro com Hegel, Schopennhauer e tem um surto de desejo de retorno à infancia com Nietzsche. No existencialismo ele começa a ser velho.
Mas então voce pode pensar : se toda arte se tornou velha, logo, ela irá morrer ! Talvez não. Talvez seja congelada numa espécie de limbo, onde tudo retorna indefinidamente, cada vez com mais superficialidade, cada vez dependendo mais da vida " por aparelhos ". Forçada.
Este é um tempo de ciencia. Nela, a vitalidade humana se manifesta. Pensamos em termos científicos ( sem perceber, nossos julgamentos se transformaram em conceitos da ciencia : eficiente X ineficiente, novo X ultrapassado, rápido X lento..... ), mas o trágico é que nosso espírito não é científico ! Daí a esquizofrenia da vida atual : um mundo cientificamente moderno feito para uma alma arcaica e apegada a carne, ao sol e a água. Ver a arte, a religião e a filosofia morrerem é A MAIOR TRAGÉDIA QUE A ALMA HUMANA PODERIA SENTIR, pois para ela é a perda de sua prórpia razão de ser, de consolo e de justificação. Ela irá então se alienar, encolhida em algum recanto do universo, assistindo ao nosso triste mundo de distrações vazias, de ansiedade inútil e de um progresso eternamente insatisfatório.