gran torino- um simples conto moral

Muhammad Ali, Babe Ruth, James Stewart, Abraham Lincoln, Chuck Yeager, Johnny Cash, Dashiel Hammet, John Ford, John Huston, Henry Fonda, Muddy Waters, Thelonious Monk, Leonard Bernstein, Bob Fosse, Fred Astaire, Joe Louis... a América mudou, a América muda radicalmente desde o final da guerra do Vietnã, a América termina, todo império termina se modificando, decaindo em sua educação, esquecendo sua filosofia, perdendo sua inocência, se acovardando, e afinal, sendo invadida pelos bárbaros que um dia dominou.
Clint Eastwood diz ser este seu último filme como ator. Peço aos deuses que esteja longe de ser sua última direção. Como ator, aqui, ele mistura Dirty Harry/ Bronco Billy e o cowboy do espaço. Se despede da atuação de forma elegante, altiva, digna, como sempre fez.
Mas o mundo ainda tem lugar para Clint Eastwood ? A resposta, e creio que ele sabe disso, é não. Sua imagem é de uma outra era. Mas o mundo precisa de Clint Eastwood. Sim, pois ele nos recorda valores arcaicos, broncos, conservadores e muito necessários. Clint, em seus filmes, filmes que têm por assunto básico a moralidade, sempre bate nessa tecla : a ética e a moral nascem da luta. O homem não nasce moralmente limpo, ele precisa ser refinado.
Gran Torino é um filme pequeno. Simples. Pobre. E qual de seus filmes não o é ? Ele não teme parecer antipático, esquemático e pouco " artístico ". Clint sabe que seus filmes irão parecer antipáticos para os alegrinhos fofinhos, serão esquemáticos para os filósofos da cervejaria e terão a tarja de não-arte para os meninos artistas. Gran Torino, sem afetação, sem discurso, sem fogos de artifício, diz muito em muito pouco. Mostra a morte da América. Da América que insistimos em acreditar ainda viva.
Lá está o branco fantasiado de mano, as ridículas gangues, os blacks sem razão para viver e educados por rap e droga, a neta alienada por celulares e aparelhinhos, os filhos frios e cansados. Um mundo irreconhecível. Uma América morta e enterrada.
Clint sempre se disse fã de Kurosawa e vejo muito do mestre neste filme : a relação dos filhos ( Viver ), o choque entre mundos, a vingança. O filme flui fácil, as cenas são simples e nenhuma parece estar sobrando. E termina como deveria terminar. Sem outra alternativa.
A ironia é que Walt é um imigrante ( polaco ), o barbeiro é italiano e seu amigo Kennedy é irlandês. E na relação de Walt e o garoto fica essa tênue esperança : a de que os novos americanos verdadeiros sejam novos imigrantes. Imigrantes de olhos puxados e pele amarela, mas tão estrangeiros quanto ele foi um dia.
Gran Torino é um grande filme. Gran Torino é emocionante em sua pureza e Clint, o mais moralista dos diretores ( no sentido Ford e Hawks do termo ) nos deixa um filme que será cultuado em 30, 40 anos ou enquanto durar a humanidade digna de tal nome.
E macacos me mordam... ele se interessa por tudo que me interessa !!!!!!! A decadencia do mundo ocidental e o triste fim de uma era. Meninos se preparem : a idade média bate às portas...