grandes discos pouco ouvidos

Começo aqui a falar de grandes discos ( grandes por serem maravilhosos ) e pouco ouvidos ( venderam pouco e são dificeis de achar ).
O primeiro é SHOOTING AT THE MOON de Kevin Ayers.
Lançado em 1971. Kevin é o Oscar Wilde do pop ( porém hétero ), o Noel Coward drunk.
O disco abre com MAY I. Sons de carro. Baixo dominante e sinuoso, percussão discreta, violão. A música é puro prazer, suave, quente, cálida, cheia de vida e de vinho. Feliz. Kevin não tem uma só canção triste, e esta é das mais felizes.
" eu fui flanar pelas ruas/ procurando onde comer/ achei um pequeno café/ vejo uma garota e falo :/ posso sentar com voce/ um pouco ? / gostaria da companhia de seu sorriso e de seu sol ."
Para contar isso, ele usa flauta, e violões suaves.
Puro sol, puro romance, puro flerte. Kevin é do tempo em que se flertava.
RHEINHARDT AND GERALDINE.
Ataque forte de bateria, baixo e sax. Bateria e oboé. Vocal apocalíptico. A música fala de desejo. Então vem uma colagem de sons, de ruídos. Confusão e quase caos.
COLORES PARA DOLORES.
Agora tudo é puro Stooges. Rock ao estilo Velvet Underground. Cavalgada de heróis de garagem. Teclado simples e incisivo. Deliciosa.
LUNATICS LAMENT.
Uma ostra conversa com uma onda. Cinco minutos desse irritante diálogo.
THE OYSTER AND THE FLYING FISH.
Uma canção tão deliciosa, tão savoir faire como comer ostras à beira-mar. Violões felizes e um refrão que diz: " Uh lá lá! "
UNDERWATER
São ruídos de baixo e synth.
CLARENCE IN WONDERLAND
Quse reggae. De bêbado. Fala de Clarence sentado na areia em Wonderland. Backing vocals de polvos, lulas e mariscos. Oboé. " Vamos ao nosso small chateau/ beber com miss juliet e o luar de junho ". Sons de gaivotas. Se o mundo fosse um lugar feliz, esta música seria um hit. Nunca foi.
RED GREEN AND YOU BLUE
Ressaca. Kevin se declara a garota so blue. " Voce está sentada sobre meus sonhos ". Enorme contra-baixo, violões, clarinete e a alegria de gravatas soltas e sapatos levados nas mãos.
SHOOTING AT THE MOON
Apocalipse.Guitarra galopante, tudo corre e roda e se confunde e emite cor. E se repete, repete, repete, repete...
MAY
Em francês. Melhor que a primeira versão. Serge encontra Kevin.
GEMINI CHILD
O romantismo supremo. Forte, feliz, nebuloso, confiante e muito dissonante.
" Fiz gente chorar, me perdí, procurei/ tudo o que todos fazem/ gemini child, voce sabe que eu te amo ? / voce faz de cada dia um Camelot/ vou dividir tudo que faço com voce/ gemini child, voce sabe que te amo? / apesar de nunca ter dito, tudo foi para voce e voce esteve no que fiz."
Se Wilde fizesse pop music seria exatamente isto. Aqui Kevin atinge o Camelot das emoções, o êxtase da eternidade, o simbolismo yeatsiano, o perfeito ideal. Usando instrumentação rock- galopante e acelerada- e com absoluta ausencia de drama ou pretensão.
Um gênio feliz.