LUA DE PAPEL - PETER BOGDANOVICH. COMO FAZER VOCE SE APAIXONAR POR UMA PERSONAGEM

Peter Bogdanovich era apaixonado pelo cinema clássico americano, aquele feito entre 1930-1945. E dentre seus diretores mais amados, dois se destacavam: John Ford e Howard Hawks. Ele também amava, claro, o cinema europeu e apesar de seu americanismo, o estilo de Peter era muito mais próximo de Jean Renoir que de Ford ou Hawks. Isso porque não importava muito à Peter o tema, o fio da história, o climax. Seu foco era o personagem. Como em Renoir, tudo era pretexto para mostrar o caráter dos seres que viviam em seus filmes. E também como em Renoir, mesmo seus vilões eram pessoas "gostáveis". Não há gente ruim em seus filmes. Mas há maldade, uma condição que independe de quem a produza. É como se o mal acontecesse, apesar de ninguém ser realmente ruim. É um cinema risonho, mesmo quando triste. E os filmes de Bogdanovich estão sempre próximos da melancolia, mesmo quando são comédias. ------------------- Foi feito em preto e branco, uma fotografia absurdamente bela de Laszlo Kovacs, observe a profundidade das cenas, tudo em foco o tempo todo, sua vista se aprofunda nas paisagens do Kansas, planas a se perder. É visualmente, um dos mais lindos filmes dos anos 70 e um dos mais simpáticos. -------------- Ano de 1935. Na primeira cena há um big close do rosto de Tatum O'Neal. Já percebemos: visualmente é um filme perfeito. Então olhamos as primeiras cenas: o enterro da mãe da criança, o homem que vem ao enterro ( provavelmente o pai da criança, feito, muito bem, por Ryan O'Neal, pai de Tatum na vida real ). Ele terá de levar a menina à tia, em outro estado. Até então o filme parece OK, nada mais que isso. Então ele dá um golpe e obtém dinheiro que seria da menina. Ela percebe e na lanchonete diz à ele: Voce me deve 200 dólares! ------------ Pronto. Como bem nota Peter nos extras do filme, nessa fala o público é conquistado. A partir daí nos apaixonamos pelo filme porque nos apaixonamos por Tatum O'Neal. É, talvez, a mais eletrizante atuação infantil em um filme americano em todos os tempos. Não a toa ela é até a hoje a ganhadora de Oscar mais jovem da história, apenas 10 anos em 1973. -------------- Os dois passam a rodar pelas estradas aplicando golpes. Ele sempre simpático ao estilo Clark Gable, ela sempre esperta e querendo ser aceita por ele, ao estilo...Tatum O'Neal. Ele se apaixona por uma vigarista, Madeline Kahn, a menina os separa numa intriga bem feita, roubam bebida ilegal, fogem da polícia, e então chegam ao destino. O final é perfeito e não conto como é. ----------------- Paper Moon foi um grande sucesso em seu tempo e hoje não parece velho porque em 1973 ele já fora feito como peça de museu. Não é uma comédia, não é um drama, não é uma aventura. É uma observação, acurada, próxima, sobre personagens adoráveis e que jamais são bobos, melosos ou forçados. A menina não é doce e nem mesmo boazinha, mas é justa, correta, sabe o que é certo. Ele é apenas um homem tentando sobreviver. Não há uma só cena emocional entre pai e filha enjeitada. Mas sabemos que ele a ama, apesar de odiar isso. E ela...ela precisa dele. ------------- Nos vemos desejando ver qual o próximo golpe, para onde eles irão agora e ficamos tristes quando o filme termina. Queremos conviver com os dois. O que mais um filme precisa nos dar?