PORQUE DESPREZO TODO O CINEMA ATUAL E SOBRE AS COMÉDIAS BOBAS DOS ANOS 80
Óbvio que estou sendo injusto e é lógico que deve haver algo que preste. Mas eu desisti do cinema feito hoje porque esse cinema me enoja. Não gosto do rosto dos atores, não gosto do tom em que os filmes são feitos, não gosto da melancolia que escorre até mesmo das aventuras e comédias, odeio profundamente as chantagens emocionais. As vozes são de pessoas derrotadas, tristes, e o olhar, em todos os filmes, varia entre um ódio mal disfarçado ou o quase desespero. Qual a chance de eu assistir um filme sobre um gordo gay que sofre sem parar? ------------------ Vamos falar de algo que nos ergue? Comédias. Escrevi em outro post que o período entre 1978-1998 foi o auge da comédia. Talvez possamos traçar o começo em 1972, com o Woody Allen ainda engraçado e Mel Brooks. ------------- Os anos 30 tiveram Os Irmãos Marx, gênios absolutos e remédio certo para qualquer pensamento suicida, e ainda W.C.Fields, o mais niilista dos humoristas. Os anos 40 nos deu os filmes de Preston Sturges, um gênio, e Bob Hope. Nos anos 50 houve Abbot e Costello, Martin e Lewis e Lucille Ball. Nos 60 a comédia caiu. Peter Sellers era genial mas nunca foi humorista de verdade. Blake Edwards era bom. E havia Jerry Lewis. Mas o humor parecia nostalgia. Quando Mel Brooks sai da TV e parte a fazer filmes a coisa renasce. ----------------- Nos anos 80 teremos uma quantidade imensa de humor e humoristas. De Bill Murray à Eddie Murphy, de Steve Martin à John Candy, Lilly Tomlin, Belushi, Martin Short, Leslie Nielsen, o cinema era riso toda semana. Mesmo atores sérios se enfiavam no gênero. Tom Hanks, Travolta, Dennis Quaid, todos deram seus passos no humor. ------------------- Assisto dois filmes simples do gênero. E logo percebo a diferença, ambos seriam hoje impossíveis. Como todo humor verdadeiro, eles não estão nem aí para elegância, boas causas, não sentem medo algum e são coloridos, vibrantes de vida, atirados ao prazer. Ao contrário do humor "útil" ou "consciente" de hoje, ou seja, censurado, são filmes tolos que amam sua tolice. Eles têm luz forte, são claros, coloridos, descompromissados. Nos ensinam a não levar nada tão à sério, pecado mortal para os dias de hoje. ------------------- UM MORTO MUITO LOUCO tem uma história paupérrima e absurda. Dois caras têm de fazer com que todos acreditem que seu chefe está vivo. Isso durante todo um fim de semana na praia. O que há de bom nessa tolice? De bom não há nada, mas ele é divertido pra caramba! Os atores são bonitos, e parecem se divertir muito. A edição não tem pontos mortos e nada nele nos recorda as tristezas da vida. O cadáver se torna engraçado, o que é quase um milagre. Quando eles arrastam o corpo em ski no mar, cara, eu rolei de gargalhar! O que espanta também é a opulência de um mundo que não mais existe. Nos anos 80 as pessoas tinham muitas, muitas coisas e não sentiam vergonha alguma por isso. O que move o filme é dinheiro e sexo e eu digo que esse fato se chama honestidade. O que nos move é sexo e dinheiro e reprimir isso é viver confuso. Ou em estado de passividade. Quem dirigiu foi Ted Kotchef, diretor canadense que foi cult nos anos 70.--------------- O outro filme é DE VOLTA ÀS AULAS, e ele tem Rodney Dangerfield como um muito, muito rico grosseirão, que volta à universidade para ajudar o filho que está deprê. O início seria todo censurado hoje. Uma sequência de comerciais para roupas de gordo. Na universidade ele logo seduz todos, usando dinheiro e sendo o que ele é: um macho sexista bem humorado. Já em 1986, ano do filme, uma professora diz sentir saudades de homens que não se sentiam obrigados a chorar. Hoje ela deve ser uma lésbica. ------------------- Rodney Dangerfield era um humorista, vindo do stand up, tão bom que a gente sente sempre que todos seus filmes são menores que ele é. Caddyshack é a melhor coisa que ele fez, é uma das melhores comédias da história. Esta não. É apenas agradável. Robert Downey Jr faz um esquisito que hoje seria um cara comum. ---------------- Quando voltei à faculdade, em 2011, eu já tinha 49 anos. E de certo modo eu fui um Rodney sem grana. Lembro de entrar na sala, um silêncio deprimido entre os alunos, e começar a puxar conversa com todo mundo. Eu fazia piadas, elogiava as meninas, tirava uma das aulas e conversava com os professores. Andava pelos corredores olhando as meninas bonitas, rindo, falando aos berros, braços soltos, uma anomalia entre gente ensinada a se conter. E eles me procuravam. Me achavam excêntrico. Não sabiam que eu era apenas um homem comum dos anos 80. É isso.