A INGLATERRA É ENGRAÇADA
Para entender qualquer coisa inglesa, pelo menos aquilo que se chamava de inglês até mais ou menos 1990, voce precisa entender que a ilha é engraçada. Sem a consciência de que o inglês é marcado pelo humor, e não necessariamente pela alegria, voce nunca fruirá totalmente da arte ou da vida inglesa. --------------- Quem já cruzou o país sabe, a Inglaterra, a GB, é pequena, fria, úmida, escura, estranhamente pobre. Os bosques são monótonos, as ruínas são decepcionantes, os lagos escuros e as praias medíocres. Ao contrário da França, que sempre parece rica, bem feita, risonha, a Grá Bretanha sempre tem um aspecto de mofo, de neblina, de fim de tarde. Vivendo nessa ilha, isolados da Europa, acossados por vikings e depois franceses, dinamarqueses, espanhois, franceses, nazistas, russos, o britânico desenvolveu o humor. Ou voce bebe até cair ou voce percebe que nada daquilo faz muito sentido, que a terra é hostil e a vida dificil e então começa a rir da piada. ------------- Eu falo não apenas do óbvio, os melhores humoristas são de lá, de Chaplin e Stan Laurel à Monty Python e Steve Coogan, Rick Gervais e Jason Statham ( sim, ele é um humorista 100% do tempo ), mas cito Lewis Carroll, Dickens, Joyce, Woodehouse, Swift, e até mesmo Shakespeare. Voce jamais entenderá a arte da Inglaterra e Irlanda se não tiver em mente que Beckett escreve do pub, sempre do pub, um bando de homens rindo e falando blasfêmias. Beatles é sempre irônico, assim como Mick e Keith são, desde 1962, uma piada. Não leve totalmente a sério Oasis, Smiths, Bowie, os saltos de Townshend, Blur ou Primal Scream. Tudo aquilo é folia, é gozação, é brincadeira de moleques no pub. Mesmo aqueles que se percebem como muito sérios, penso em D.H.Lawrence, Wells ou Bertrand Russell, têm seu lado de " Ora eu não falava tão a sério". Ao lado de uma frase trágica de Keats ou Shelley vive sempre a ironia do bebedor de cerveja preta. Robert Burns e Oscar Wilde são a alma das ilhas. -------------- E no entanto eles são tristes... Pois esse tipo de humor nasce sempre da tristeza, é uma fuga, e nisso se parece muito com o humor judeu. Italianos e americanos, outras duas nações do humor, riem de verdade, eles realmente se descontraem, mas o britânico, repare, ele ri sem perder o pudor. Daí sua genialidade. O absurdo levado como fato real. Quando Chesterton nos faz rir, e ele faz, sabemos que a vida pede por sentido, que a vida é limitada, que somos ilhas a procura de um continente. Já quando Steve Martin nos faz rir, sentimos que somos garotos de high school rindo de alegria pura. O americano ri porque sente-se vivo, o inglês ri para sentir-se vivo. ---------- Não estou falando de humor inteligente. Nada há de inteligente no humor do Monty Python e quem fala de humor inteligente nada sabe de humor e muito menos de inteligência. Humor é ser engraçado, só isso, e fazer rir é sempre um ato inteligente, seja Rodney Dangerfield seja Buster Keaton. O humor inglês ou judaico não é mais inteligente que o humor italiano ou americano, é apenas mais absurdo. E, ao contrário dos USA, na GB o humor faz parte do caráter nacional. ------------------ Posto alguns momentos de Peter Sellers. Ele revela o segredo. Aproveite.