CUL DE SAC E O DILEMA DO FILME DE ARTE

Assisti ontem o filme CUL DE SAC de Roman Polanski. Feito em 1966. Na verdade não o vi, eu o revi. Pela terceira vez. Não há muito o que dizer sobre a história: uma dupla de bandidos atrapalhados ficam ilhados numa casa de praia. Nessa casa vive um casal, um careca fraco e traído e uma mulher maliciosa. Instala-se um jogo de poder entre eles. Mas coloco uma questão: isso importa? ------------ Eu gosto do filme. Foi feito em dos cenários mais fascinantes: Northuberland, GB. É uma praia deserta, uma maré violenta, um maravilhoso vazio em preto e branco. A casa é um kaos de coisas fora do lugar, salas e quartos sem função. Fotografia de Gil Taylor, o cara que em seguida faria 2001 com Kubrick. O careca é Donald Pleasence, pronto para ser Blofeld em 007, e a moça é François Dorleac, a irmã sexy de Deneuve, que morreria no ano seguinte em acidene de carro. Trilha sonora: jazz. Polanski sabe filmas, visualmente o filme parece um editorial de foto em PB. ------------------ Mas.... ------------------ Um crítico disse uma vez que sempre devemos desconfiar de filmes que são definidos como: Uma fotografia deslumbrante! ---- Quando o mérito principal de um filme é sua fotografia, sempre significa que não há mais nada além de belas imagens. Existem filmes geniais com imagens comuns, mas não há um só grande filme com roteiro fraco. Então falo agora do cinema de arte, aquele que teve seu auge entre 1959-1975 mais ou menos. O grande período do cinema de autor, do diretor genial, do festival de Cannes e Veneza. CUL DE SAC fez eu reparar no seguinte: todos eles tinham os melhores diretores de fotografia da época. Se tirarmos a fotografia, o que resta? ---------- Carlo di Palma, Raoul Coutard, Nicolas Roeg, Giuseppe Rotuno, Sacha Vierny, Henri Decae, Armando Nannuzzi, Tonino Delli Colli, Gordon Willis...cito alguns ao acaso, são dezenas. O que seria de Godard sem a foto clara e brilhante de Raoul Coutard? Quanto da beleza que vemos em filmes de Bertolucci ou Visconti não se deve apenas ao trabalho de fotógrafos de talento superior? O tempo do grande cineasta foi o tempo do grande fotógrafo e eu senti isso em meus olhos. Houve tempo em que para mim um grande filme era um filme bonito de se olhar. E mais nada. ------------ Quem já tentou fazer um simples video sabe do que falo. Quando voce não tem ideias, tente gravar cenas "bonitas". Sombras ou cores fortes, contrastes ou cromatismos, vale tudo para parecer "artístico". Escrever bons diálogos ou criar personagens interessantes é obra para mestres. Fotografar uma bela montanha...basta saber olhar. ( Há mérito nisso, óbvio, mas será cinema? ). ----------- Filmes de arte geniais existem, não abandonei a coisa, mas todos têm personagens e situações que nos fazem esquecer estar vendo um filme. Eles não são bonitos, são fantásticos. Não nos fazem apreciar a fotografia, nos fazem rir ou ranger os dentes. Entramos no filme ou entramos em nós mesmos com o filme nos guiando, mas nunca admiramos apenas aquele castelo ou aquela linda paisagem enevoada. Participamos ativamente. --------- CUL DE SAC é estiloso por causa de sua foto. É artístico por causa de seu visual. É bom de ver devido a Gil Taylor. E é só isso.