AMOR, MEDO, SEXO, DÚVIDA E MORTE

Antes de ler este escrito seria bom voce ler o que escrevi sobre A Rainha de Sabá abaixo. Procure. Rode uns 15 posts atrás. --------------- Fui educado para o amor. Crescendo em lar cristão, vendo os filmes que vi, as novelas e os livros que li, aos 12 anos eu já sabia muito bem qual era a sensação do amor. Uma deliciosa dor. Mãos suadas, calor no coração, borboletas no estômago. A amada era uma deusa. Promessa de paraíso na terra. Eu sofria muito. Muito mesmo. Mas sempre havia uma canção, um filme, um poema para me consolar. O mais legal de tudo era SENTIR UMA NOBREZA SENTIMENTAL nisso. Eu estava em ótimas companhias. Dante e Camões eram meus avôs. Amar era o diploma que me dava direito a me considerar bom e um humano completo. A razão aceitava essa situação. Tudo no mundo apontava para minha certeza. ---------------- O sexo dentro dessa vida era parte da nobre certeza. Por amar e por ser bom, pois o amor é sempre bom, o sexo era também bom. E até mesmo belo. O sexo era parte do amor, apêndice dele, Eros, deusinho sacana. Tudo muito bonitinho, higiênico e de bom tom. Minhas doces amadas eram irmãs espirituais de mim mesmo. Admiradas. -------------- Bom....se voce acha que este texto é para glorificar tudo isso voce realmente não me conhece. Pois sempre houve algo de podre nessa equação. Afinal, Dante amava uma menina de 9 anos e Camões era um sátiro. Uma das maiores tolices que um dia acreditei é aquela que diz que o AMOR como o conhecemos foi criado no século XII pelos menestréis da Provence. Belo modo de elitizar algo que sempre existiu. Ou voce acha que um azteca ou um celta não sentiam amor? E não falo do amor pelos deuses ou pelos filhos, falo do amor sexual. Sentiam? -------------- Há aqui um maldito puritanismo. É como se ao dizer que nosso amor fosse invenção de poetas nos livrássemos da carne. Pois agora vou te falar do inferno e ele vive na sua carne. E esse inferno é conhecido pelos homens desde antes da escrita. Ao contrário do amor romântico, esse amor não precisa de pena e de papel para existir. -------------------------- Dizem os partidários do amor-romance-inocente, que gregos e romanos NUNCA sentiam esse tipo de amor. Triste e burra confusão: eles não ESCREVIAM sobre esse amor. E não escrever não prova que não o sentiam. E posso dizer porque: Eu quando o sinto não consigo escrever sobre ele. Por que? Porque é um sentimento tão carnal e sanguíneo que a razão foge apavorada. Não há verso, tese científica ou esquema filosófico que dê conta dele. É um amor que ri da razão. --------------- Nesse amor voce não admira a mulher que te envenena. Voce a odeia. E a deseja. Ela não é como voce, ela nega aquilo que voce é. Existe para destruir todo seu passado e questionar toda sua certeza. No mundo só ela existe agora, e vem daí a morte. Pois assim como a morte, ela obscurece todo interesse que não seja ela mesma. O mundo se torna noite. Não há escrita. Não há dia. E voce sabe ser uma presa e não caçador. Voce é outro. ------------ Blake, Rimbaud, tentaram traduzir esse encontro para a língua escrita. Não conseguiram. --------------- Pois ela é um corpo. Ela é a vitória do corpo e portanto a vitória da vida. Contradição: ao encarar essa morte voce se faz mais vivo. Ela é uma perna e voce é sua mão. Ela é um cheiro e voce é um ouvido. O mundo é o corpo que ela exibe. Ela é só isso, carne, e sendo carne ela é REAL. Esse encontro te revela a REALIDADE DA VIDA. Uma fome e uma febre de querer comer. Tudo de ilusório que existe em todo amor inexiste neste encontro. Pois o que voce quer é aquilo que voce vê. Tudo que a vida promete é o encontro com ela. Homem e mulher em seu mais básico momento. A saga que movimenta a vida. ------------- No título eu escrevi a palavra dúvida. Não tenho a menor dúvida do que escrevo, mas esse encontro coloca em xeque tudo aquilo que voce é. Por isso ele é tão necessário e por isso essa Rainha de Sabá surge sempre de um reino distante do seu. Ela traz em si um mundo que voce desconhece. Ela tem perfumes, gostos e vozes que voce jamais ouviu antes. Ela era aquilo que voce temia ou desprezava, e que hoje é todo seu universo. Por isso a raiva, o ódio por ela. E por isso a abertura de um outro EU MESMO. ------------- Deixe-se.