VELHOS INSTRUMENTOS

No começo dos anos de 1960 aconteceu uma revolução na música. Beatles? Também, mas não é deles que falo, embora meu assunto tenha influenciado os caras de Liverpool. O que aconteceu foi a gravação de peças clássicas com os instrumentos de seu tempo. Vendeu muito, muito mesmo, nas décadas de 60-70 e 80 ajudou a equilibrar as finanças dos departamentos de música clássica. E saiba, foram as gravações de então, versões com instrumentos de época que fizeram Beatles gravarem Yesterday e Eleanor Rigby. ------------- Até então, quando se escutava Bach, ou Vivaldi, ou Haendel, ou Corelli, o que se ouvia eram instrumentos que não existiam em 1750 tocando músicas que em 1750 deveriam soar de um modo bem diferente. Comeaçava-se a perceber que aquilo poderia ser uma traição. Música do século mais racional sendo executada de maneira romântica. À Schumann. ------- Então um grupo de jovens maestros e músicos ingleses resolveu usar instrumentos como os de 1750. Violinos com cordas feitas de tripa de animais. Flautas de madeira. Cravo no lugar do piano. Bandolin, Corne, afinações antigas. Os andamentos mais acelerados, nada de sentimento exagerado, ênfase na dança, na alegria, no ritmo incessante. Para surpresa de todos, o público comprou aos montes. A dita "Música Antiga" entrou na moda. Em 1969 ouvir Bach era chique e que coisa, era hip ! ----- Trevor Pinnock e Christopher Hogwood são dois dos grandes nomes da onda. Ouço esses dois maestros, Pinnock em Bach e Hogwood em Vivaldi. ------------------ Vivaldi com Hogwood e a Academia de Música Antiga é um compositor diferente. Ele parece muito menos doce. Vivaldi se torna mais despido, mais apimentado, o som áspero das cordas lhe dá urgência. É um som que deixa o fundo aparecer mais. Os violoncelos atacam como guerreiros, a harmonia é mais selvagem. Já escutei mais de 8 versões dessa obra, desde italianas amorosas até alemãs exatas. Após o estranhamento inicial voce começa a preferir esta. ----------------- Trevor Pinnock e o grupo The English Concert tocam os Concertos de Brandenburgo. As cordas são como fossem feitas de borracha, parecem flexíveis. É um Bach menos sangue azul e muito mais camponês. É muito menos saltitante, a complexidade harmônica se revela em nudez. --------------- Era desse modo que Bach e Vivaldi queriam ser ouvidos? Quem prefere as versões tipo século XIX diz que se eles tivessem instrumentos melhores teriam composto para eles, e que portanto seria melhor ouvir piano e violino moderno. Já os amantes destas versões dizem que cada compositor escreve para aquilo que conhece e domina, e somente respeitando isso se pode ouvir aquilo que ele desejou que fosse perpetuado. Eu penso que jamais saberemos exatamente o que eles ouviam porque não há gravação em 1750. O que nos ficou são as partituras. Então toca-las em piano ou cravo é indiferente. O que se deve respeitar é harmonia, melodia e ritmo. ----------------- São dois cds históricos.