DON GIOVANNI, FILME DE JOSEPH LOSEY

Lembro de 1979, quando o Jornal da Tarde anunciou a estreia de 3 filmes baseados em óperas. Um era Carmen, dirigido por Francesco Rosi, havia algo de Zeffirelli e o melhor era este Don Giovanni. Mozart no cinema feito de um modo cinematográfico. Joseph Losey encenou a ópera como fosse um filme. Os cantores eram os atores, os cenários eram os lugares reais, travellings e cortes, ação e edição. Um imenso clip antes que o video clip houvesse sido batizado. Finalmente, em dezembro de 2020, assisto a obra. E assisto no momento certo, após ler Casanova, após entrar no clima de Don Giovanni. ----- Ele é Casanova de fato, e o vemos no seu apogeu, que é ao mesmo tempo, seu fim. Lá está Veneza. Lá estão as roupas de seu tempo. E lá está Mozart. O melhor foi reunido. Quem rege a orquestra é Lorin Mazeel. Os cantores são os mais amados de seu tempo. A direção de fotografia é de Gerry Fisher, o mesmo de Star Wars. Figurinos da melhor equipe. E na direção, Losey. Ele, o homem que fez O MENSAGEIRO, um de meus filmes favoritos de sempre, e que dirigiu vários filmes fortes entre 1954-1970. Losey tinha coragem, tinha bom gosto, tinha tino para o exato. ----- Nada supera a música de Mozart. Ela é viva. Vital. Mesmo quando canta a dor e a morte, ela é hino de amor à vida. O segredo de Mozart, um dos muitos, é seu amor por tudo que seja vivo. Sua alma esbanja luz, esbanja talento, esbanja alegria de viver. A música se expande. Envolve. O cinema é pequeno para Mozart. Lembro bem que uma das salas que exibiu o filme foi o Cine Paramount, na Brigadeiro Luis Antonio, e acho que essa sala, imensa, deve ter dado à quem lá o assistiu, uma bela ilusão. No acanhamento de meu quarto Mozart fica confinado. Quando o ouço em disco fecho os olhos e sonho com a galáxia. Vendo-o na tela de minha TV, ele se encolhe. Mas....é o que se tem. ------ Nunca nos últimos 300 anos foi tão necessário ter contato com os grandes. Encolheu nosso mundo. É preciso lembrar o quanto fomos ilimitados. Mozart é um dos seres sem fronteira. O filme, empresa arriscada, é digno de sua obra. A alegria de uma obra tão perfeita escapa pelas bordas da tela.