O CULTO AO MEDO

Nietzsche enlouqueceria outra vez em 2020. Nunca estivemos tão distantes da ideia que ele fazia do Superhomem. A mim não surpreendeu a disposição das pessoas em crer no fim. Somos treinados nisso. Toda nossa cultura é chorosa. Nietzsche tinha amor ao trágico, pois o trágico sofre sua missão em meio à dor. O trágico entra de peito aberto e paga o que os deuses lhe cobram. Nós fugimos da tragédia porque nem sequer imaginamos do que se trata. Preferimos o melodrama e a choradeira do bebê. Não podemos ser Superhomens porque nem mesmo somos homens. Sem questionar nos entregamos ao "fim do mundo". Foi como se esperássemos por isso. E muita gente sentiu a alegria do destino cumprido. Não tivemos pudor algum em nos amordaçar, em baixar a cabeça, em obedecer. Nunca foi caso de "tomar uma decisão em bem de todos", e sim o simples ato de obedecer sem pensar. Educados para odiar a cultura "antiga", treinados para crer no "mundo que merece ser destruído", engolimos passivamente a narrativa da destruição, do final dos tempos, da punição. Masoquistas. Onde o indivíduo que dança à beira do abismo? Onde o ser que afirma orgulhosamente sua força? Nietzsche chora e voce ousa pensar ser partidário do mestre? Seja um meteoro, seja o fim do ozônio, voce crê em qualquer coisa que te puna, te dê medo, te apequene. Voce foi humilhado por um vírus de gripe. O "Superhomem" se deixou dominar pela kriptonita mais banal e comum do planeta: o vírus. Agora reza pelo milagre de uma vacina feita a toque de caixa. Se uma nave espacial pousasse na Terra e esses ETs exigissem nossa rendição, voce ó pequeno bebê, choraria desamparado e obedeceria entre soluços. E provavelmente amaria o Senhor ET com a gratidão do frango de granja pelo tratador que lhe dá milho.