CASANOVA, MUITO ALÉM DE UM GRANDE SEDUTOR - IAN KELLY
Ao final desta biografia, Ian Kelly diz que Casanova viveu na beira do abismo. Seu mundo morria ao mesmo tempo que sua vida se extinguia. Ele viveu, para Ian Kelly, em um dos raros momentos na história do ocidente, em que a alegria era maior que a tristeza. Nasceu no início dos anos 1700 e morreu nos últimos anos do século. A revolução francesa matou o universo que ele conheceu. O mundo de Casanova é irrecuperável. Para Ian Kelly, ótimo escritor, nosso momento histórico é muito parecido: o mundo que conhecemos termina aqui. E por incrível que pareça, iremos sentir saudades dos últimos 50 anos do século XX.
Casanova foi filho de pai e mãe atores venezianos. Nada nobre. Perdeu a virgindade com duas irmãs, aos 17 anos. Sua vida exemplifica o que havia de tão especial em seu tempo.
Ele jamais teve uma casa. Nem endereço. Bonito e curioso, aprendeu cinco línguas, travou contatos com as amantes dos nobres e através delas, penetrou nos meios mais seletos da Europa. Não havia fronteiras. Em todos os sentidos. Um homem culto podia e devia estudar física, poesia, música, química e história. Pessoas viajavam sem parar pelo continente. Casanova viveu em Dresden, Paris, Londres, São Petersburgo, Praga, Roma, Veneza, Madrid...Ficou milionário ao criar a loteria francesa ( Lotto ), perdeu tudo em jogo e amantes. Participou de duelos, foi estudioso da Cabala, alquimia, astrologia, numerologia. E escreveu uma auto biografia com 4000 páginas. Ian Kelly a considera uma obra-prima muito adiante de seu tempo. Casanova fala tudo: doenças venéreas, atos sexuais, comida, bebida, jogo, descreve as estradas, a vida dos reis, festas, condições das cidades, e principalmente, se auto analisa. As 4000 páginas foram escritas ao fim da vida e elas antecipam o método psicanálitico, pela primeira vez alguém escreve concientemente para vencer a depressão. Eu consegui achar um dos volumes, são 12, e achei a leitura uma delícia. Há prazer em viver em cada linha. Casanova foi feliz por toda a vida, apenas na velhice, impotente, doente, ele entristeceu e por isso, escreveu.
Teve convívio com Voltaire, Mozart, Rousseau, Catarina da Russia, Frederico da Prússia, Louis XV. Fez sexo com mulheres famosas e com empregadas de café. Amava comida, café e chocolate. Dominava a arte da conversa. Foi o molde do que seria o malandro, o safo, o esperto. Fugiu da prisão, foi famoso em todo o mundo,fez sexo a quatro, cometeu incesto, explorou mulheres mais velhas, usou homossexuais apaixonados, tudo sem a menor culpa. Como demonstram tantos romances da época, foi um tempo que conseguia unir a mais depravada vida sexual, com a mais contida etiqueta social. Fazer amor era uma arte para Casanova, e ao contrário de seus colegas de então, ele dizia só fazer sexo quando apaixonado. Casanova antecipou nisso o romantismo. Ele sofreu bastante por amor. Mas era por pouco tempo, ele logo partia para outra. Muitas outras!
Ian Kelly ama o personagem de seu livro. E consegue nos fazer ama-lo. Que mais pode se querer de uma biografia?
Ian