TRAMA MACABRA um filme de Paul Thomas Anderson

   Uma vez, quando era criança, eu entrei na Maison de Dener Pamplona. Fui levado por uma prima mais velha que trabalhava para ele. A casa, toda branca, ficava na Paulista e hoje é um prédio banal, mais um. Recordo que minha mãe não comprava roupa, mandava fazer. A costureira tirava as medidas em casa, depois mandava a roupa quase pronta. Minha mãe a provava e eram feitos os ajustes finais. Era um tempo em que toda roupa tinha forro, se usava anágua, liga, e os paletós masculinos eram ajustados para o tamanho de braços e pescoços.
 Meu pai fazia a barba com navalha. Ele a afiava com calma e cuidado. A pele ficava lisa, e depois era aparado o bigode. Ele usava um bigode à William Powell. Camiseta para não sujar a camisa por dentro. Os cabelos eram escovados. Pessoas ricas não dirigiam um automóvel, para isso havia o chauffeur. Só os playboys malucos gostavam de dirigir. O imenso Landau era levado pelas ruas semi vazias. Descer a Rebouças era olhar uma fila de casas imensas com jardins bem cuidados. Da avenida Europa eu recordo das babás com os carrinhos de bebês, conversando calmamente com os guardas da rua.
 O início deste filme é um tipo de relembramento deste tempo. O último suspiro da calma e da beleza. A gente, nesses primeiros minutos, tem a esperança de ver um tipo de Michael Powell ou de Max Ophuls revisitado. Bem, a elegância dura todo o filme, mas o foco é outro. Logo notamos que o roteiro foca na relação entre arte e musa. O artista, ser que não pode e não deve viver no mundo real, é enredado pela musa, ser exigente que luta por tê-lo só para si. Nesse precário equilíbrio se cria a arte. A beleza, a mais dura das musas, tem um preço alto.
 O filme é chato. Digo que seu tema  se torna muito pouco atraente. Não posso dizer que é um filme ruim. Longe disso. Como dizer isso de um filme tão refinado e com uma trilha sonora tão bonita? Mas ele não emociona, não seduz e não nos toca. É frio. Seria melhor fosse gelado.
 ( Uma falha: a musa não é fascinante...ok, voce pode dizer um milhar de motivos obscuros para essa escolha, mas ela TINHA de ser fascinante...um esteta jamais se deixaria pegar por uma mulher tão comum ).