A primeira vez em que ouvi falar de Lou Reed foi na revista POP, da Abril, em 1975. Uma matéria de 4 páginas coloridas. Na primeira foto a gente via Lou tocando guitarra. De cara já estranhei. O cara tinha cabelo curto, a expressão era de um tipo de bandido antipático e usava roupa preta. Em 75 ninguém no rock usava preto. O texto falava de seu sucesso e do Velvet. A banda de Lou, Andy e Cale já era mito então. O som deles era descrito como barulhento, sujo, anticomercial. No mundo de então, sem internet e MTV, tudo o que podíamos fazer era criar com a imaginação. Então imaginei que o som do Velvet fosse um tipo de Led Zeppelin ainda mais alto e pesado. Só os escutei cinco anos mais tarde, no fim de 1980.
Comprei White Light no Museu do Disco, uma memorável noite no shopping Iguatemi. Pus na vitrola às 23 horas daquele sábado. Após cinco anos de imaginação o que veio não se parecia com nada do que eu havia escutado. Ou imaginado. Não era Heavy, nem Hard, nem Prog, nem Jazz, nem nada. Mas eu não estou aqui para falar desse disco, o mais amado, e sim para falar desta biografia. Foi Brian Eno quem criou a frase de que o Velvet vendeu pouco, mas cada disco vendido era uma nova banda criada. De Roxy Music à Patti Smith, de Buzzcocks à Talking Heads, todos beberam na fonte e nenhum deles se parece com o Velvet. A banda foi um milagre. O maior do rock.
Lou foi eletrocutado por ordens dos pais. Ricos judeus de NY, eles queriam curar o filho da viadagem. O amavam a seu modo, e foram vítimas da psiquiatria da época. A mente de Lou foi afetada ( ele tinha 17 anos ). Se tornou alienado de si mesmo para sempre.
Foi um universitário rebelde, briguento, boca suja. Muito desagradável. Ninguém se sentia à vontade perto dele. E mesmo assim namorou a menina mais linda de Syracuse. Por anos. Seu interesse em sexo era mínimo, o que ele queria era sair de casa e ser poeta. Caiu na vida. Se viciou em anfetaminas, em speed injetável e até a década de 90 esteve sempre chapado.
Lou foi trabalhar numa gravadora porcaria e lá compunha pop lixo. Então formou uma banda mais de garagem. E se enturmou com Andy Warhol. Lou Reed sempre soube o que queria e sempre se uniu a quem podia o ajudar. Para depois descartar a pessoa sem remorso algum. Andy quis formar uma banda para musicar seus videos. Montou o Velvet dando à Lou a liderança. Vieram Mo Tucker, uma baterista que ninguém sabia de que sexo era, Sterling Morrison, um grande guitarrista, e John Cale, um músico erudito que desejava fazer no Velvet sinfonias do caos. Enquanto eles estiveram juntos foi histórico. De 1965 à 1967, sozinhos, eles mudaram para sempre a música do ocidente. Criaram do nada aquilo que entendemos por punk, indie, alternativo, bizarro, underground, sadomasoquismo chic, cool, dark, soturno, rockn roll. Mas Lou Reed sempre foi um merda, e estragou tudo.
Chutou Andy. Por ciúmes de seu carisma. Chutou Nico, porque queria cantar sozinho. E, que merda Lou!!!!, chutou John Cale, e destruiu assim o verdadeiro Velvet Underground. O VU sem Cale é como Stones sem Keith ou Beatles sem John. Virou a banda de um cara só, Lou, e o terceiro disco, por melhor que seja, não é VU, é solo de Lou. A aventura sonora criada pelos quatro ( todos compunham tudo no estúdio, Lou assinava ), partiu. Nunca mais.
Duas curiosidades: White Light foi gravado sem engenheiro de som. Os engenheiros da Verve não suportavam ouvir a gravação e iam pra rua, deixando tudo ligado sem comando, e voltavam após 3 horas. O disco realmente se gravou sozinho.
White Light, nas palavras de Lou, é um disco sobre astrologia. Ele é de peixes e cada faixa representa a luta entre peixes e virgem. Assim, a faixa um é peixes, a dois é a resposta de virgem e a luta se derrama pelo resto do disco.
Em 1970, quando a banda acaba com o banal Loaded, tentativa de fazerem do VU um novo Beatles; Lou deprimido vai morar com os pais. Depois de um ano e meio isolado e esquecido, volta graças a ajuda de Richard Robinson, influente crítico de rock e escritor que produz seu primeiro solo: Lou Reed. Um fracasso absoluto.
Mas vinham novas da Inglaterra. Toda uma nova geração não-hippie adorava Lou. E ele foi apresentado a seu maior fã, David Bowie. E nasce TRANSFORMER. Produzido por Bowie e Mick Ronson, com o piano lindo de Ronson, a guitarra nasal de Ronson e os bcking vocals e violinos de....Ronson. Lou Reed se torna uma estrela em 1972. Mas...
Claro que ele tinha de brigar com Bowie. Com Robinson. Com todos os críticos de rock. Ah...Lou...essa sua língua....Lou adorava odiar...chamava Dylan de chorão, Zappa de hippie medíocre, Alice Cooper de palhaço, e Bowie de invejoso...Ah Lou...
Grava Berlin, o disco em que ele apostou tudo. E o disco fracassa. Os críticos são impiedosos. Quanta bobagem se escreveu na época! E Lou Reed desiste. O livro diz que ele NUNCA MAIS gravou nada com 100% de comprometimento. A ferida de Berlin ficou até o fim da vida. Uma frase de Lou define tudo: " Em 1965 eu realmente acreditei que a inteligência iria um dia mandar no rock...Não deu certo. Eu me iludi."
Vieram dois discos ao vivo, Coney Island Baby, seu casamento com um travesti, Sally Can't Dance, Metal Machine Music ( sua melhor piada ), e o punk.
Lou frequentava o CBGS. E lá, em janeiro de 1976, ele foi entrevistado por dois garotos de 16 anos. Eles lançaram o número um da revista PUNK com Lou na capa e pronto: Lou era o pai do punk, Lou era o cara. Os punks podiam atacar tudo, mas Lou e o Velvet não. ( Não vamos esquecer que John Cale produziu os primeiros discos de Patti Smith, Stooges, Modern Lovers ).
E como sempre Lou estragou tudo. Hiper viciado em tudo, tudo, tudo, ( menos drogas de hippies: maconha e LSD ), seus discos eram lentos, chatos, mal gravados. Ele não soube ou não quis se aproveitar desse bom momento punk. Perdeu mais um barco.
A história de Lou Reed é a história de um triunfo que reverbera sem fim, e de alguns poucos sucessos que ameaçam reviver o triunfo do começo. A impressão é que ele sempre teve medo do sucesso, medo de precisar segurar uma missão. E ao mesmo tempo tinha a vaidade de um Mick Jagger, queria ser amado, seguido, idolatrado. Nessa briga interna ele gastou quase toda sua energia. O pouco que restava ia para os discos e os shows.
Mas ninguém nunca vai esquecer o VU. Fazem já longos 36 anos que os ouvi pela primeira vez. Nenhum dos meus amigos gostou. Só eu e meu irmão. Mas hoje, em 2016, meio século depois do auge da banda, eles continuam soando corajosos, esquisitos, darks, o símbolo de tudo o que é independente, sem compromissos...genial.
Em toda a história do rock NADA se compara ao VU. E se John, Sterling, Nico, Mo eram parte vital da coisa, Lou era dono das letras, das ideias, da primeira fagulha.
Não aceito a morte de Lou. Sua partida para mim foi mais dolorosa que a de Bowie. Esqueço que ele morreu. Não quero acreditar. Porque o rock fica vazio, bobo, estúpido sem ele.
Lou Reed era um grande merda. Vaidoso, mentiroso, egocêntrico, injusto, violento, mau...mas todos nós o amamos. E isso é genial.
Comprei White Light no Museu do Disco, uma memorável noite no shopping Iguatemi. Pus na vitrola às 23 horas daquele sábado. Após cinco anos de imaginação o que veio não se parecia com nada do que eu havia escutado. Ou imaginado. Não era Heavy, nem Hard, nem Prog, nem Jazz, nem nada. Mas eu não estou aqui para falar desse disco, o mais amado, e sim para falar desta biografia. Foi Brian Eno quem criou a frase de que o Velvet vendeu pouco, mas cada disco vendido era uma nova banda criada. De Roxy Music à Patti Smith, de Buzzcocks à Talking Heads, todos beberam na fonte e nenhum deles se parece com o Velvet. A banda foi um milagre. O maior do rock.
Lou foi eletrocutado por ordens dos pais. Ricos judeus de NY, eles queriam curar o filho da viadagem. O amavam a seu modo, e foram vítimas da psiquiatria da época. A mente de Lou foi afetada ( ele tinha 17 anos ). Se tornou alienado de si mesmo para sempre.
Foi um universitário rebelde, briguento, boca suja. Muito desagradável. Ninguém se sentia à vontade perto dele. E mesmo assim namorou a menina mais linda de Syracuse. Por anos. Seu interesse em sexo era mínimo, o que ele queria era sair de casa e ser poeta. Caiu na vida. Se viciou em anfetaminas, em speed injetável e até a década de 90 esteve sempre chapado.
Lou foi trabalhar numa gravadora porcaria e lá compunha pop lixo. Então formou uma banda mais de garagem. E se enturmou com Andy Warhol. Lou Reed sempre soube o que queria e sempre se uniu a quem podia o ajudar. Para depois descartar a pessoa sem remorso algum. Andy quis formar uma banda para musicar seus videos. Montou o Velvet dando à Lou a liderança. Vieram Mo Tucker, uma baterista que ninguém sabia de que sexo era, Sterling Morrison, um grande guitarrista, e John Cale, um músico erudito que desejava fazer no Velvet sinfonias do caos. Enquanto eles estiveram juntos foi histórico. De 1965 à 1967, sozinhos, eles mudaram para sempre a música do ocidente. Criaram do nada aquilo que entendemos por punk, indie, alternativo, bizarro, underground, sadomasoquismo chic, cool, dark, soturno, rockn roll. Mas Lou Reed sempre foi um merda, e estragou tudo.
Chutou Andy. Por ciúmes de seu carisma. Chutou Nico, porque queria cantar sozinho. E, que merda Lou!!!!, chutou John Cale, e destruiu assim o verdadeiro Velvet Underground. O VU sem Cale é como Stones sem Keith ou Beatles sem John. Virou a banda de um cara só, Lou, e o terceiro disco, por melhor que seja, não é VU, é solo de Lou. A aventura sonora criada pelos quatro ( todos compunham tudo no estúdio, Lou assinava ), partiu. Nunca mais.
Duas curiosidades: White Light foi gravado sem engenheiro de som. Os engenheiros da Verve não suportavam ouvir a gravação e iam pra rua, deixando tudo ligado sem comando, e voltavam após 3 horas. O disco realmente se gravou sozinho.
White Light, nas palavras de Lou, é um disco sobre astrologia. Ele é de peixes e cada faixa representa a luta entre peixes e virgem. Assim, a faixa um é peixes, a dois é a resposta de virgem e a luta se derrama pelo resto do disco.
Em 1970, quando a banda acaba com o banal Loaded, tentativa de fazerem do VU um novo Beatles; Lou deprimido vai morar com os pais. Depois de um ano e meio isolado e esquecido, volta graças a ajuda de Richard Robinson, influente crítico de rock e escritor que produz seu primeiro solo: Lou Reed. Um fracasso absoluto.
Mas vinham novas da Inglaterra. Toda uma nova geração não-hippie adorava Lou. E ele foi apresentado a seu maior fã, David Bowie. E nasce TRANSFORMER. Produzido por Bowie e Mick Ronson, com o piano lindo de Ronson, a guitarra nasal de Ronson e os bcking vocals e violinos de....Ronson. Lou Reed se torna uma estrela em 1972. Mas...
Claro que ele tinha de brigar com Bowie. Com Robinson. Com todos os críticos de rock. Ah...Lou...essa sua língua....Lou adorava odiar...chamava Dylan de chorão, Zappa de hippie medíocre, Alice Cooper de palhaço, e Bowie de invejoso...Ah Lou...
Grava Berlin, o disco em que ele apostou tudo. E o disco fracassa. Os críticos são impiedosos. Quanta bobagem se escreveu na época! E Lou Reed desiste. O livro diz que ele NUNCA MAIS gravou nada com 100% de comprometimento. A ferida de Berlin ficou até o fim da vida. Uma frase de Lou define tudo: " Em 1965 eu realmente acreditei que a inteligência iria um dia mandar no rock...Não deu certo. Eu me iludi."
Vieram dois discos ao vivo, Coney Island Baby, seu casamento com um travesti, Sally Can't Dance, Metal Machine Music ( sua melhor piada ), e o punk.
Lou frequentava o CBGS. E lá, em janeiro de 1976, ele foi entrevistado por dois garotos de 16 anos. Eles lançaram o número um da revista PUNK com Lou na capa e pronto: Lou era o pai do punk, Lou era o cara. Os punks podiam atacar tudo, mas Lou e o Velvet não. ( Não vamos esquecer que John Cale produziu os primeiros discos de Patti Smith, Stooges, Modern Lovers ).
E como sempre Lou estragou tudo. Hiper viciado em tudo, tudo, tudo, ( menos drogas de hippies: maconha e LSD ), seus discos eram lentos, chatos, mal gravados. Ele não soube ou não quis se aproveitar desse bom momento punk. Perdeu mais um barco.
A história de Lou Reed é a história de um triunfo que reverbera sem fim, e de alguns poucos sucessos que ameaçam reviver o triunfo do começo. A impressão é que ele sempre teve medo do sucesso, medo de precisar segurar uma missão. E ao mesmo tempo tinha a vaidade de um Mick Jagger, queria ser amado, seguido, idolatrado. Nessa briga interna ele gastou quase toda sua energia. O pouco que restava ia para os discos e os shows.
Mas ninguém nunca vai esquecer o VU. Fazem já longos 36 anos que os ouvi pela primeira vez. Nenhum dos meus amigos gostou. Só eu e meu irmão. Mas hoje, em 2016, meio século depois do auge da banda, eles continuam soando corajosos, esquisitos, darks, o símbolo de tudo o que é independente, sem compromissos...genial.
Em toda a história do rock NADA se compara ao VU. E se John, Sterling, Nico, Mo eram parte vital da coisa, Lou era dono das letras, das ideias, da primeira fagulha.
Não aceito a morte de Lou. Sua partida para mim foi mais dolorosa que a de Bowie. Esqueço que ele morreu. Não quero acreditar. Porque o rock fica vazio, bobo, estúpido sem ele.
Lou Reed era um grande merda. Vaidoso, mentiroso, egocêntrico, injusto, violento, mau...mas todos nós o amamos. E isso é genial.