A TECNOLOGIA DE HOJE NOS LEVOU AO LUGAR DE ANTES. ( UMA AULA ).

   Na fluidez do mundo cotidiano só podemos entender o aqui-agora se tivermos algum modo de firmar o pé em algum ponto sólido de apoio. É preciso ver o cotidiano, a contemporaneidade "de fora". O apoio pode ser o passado. Quem conhece a história tem com o que comparar o presente, e assim, tentar ter um ponto de vista distanciado.
   O que define o contemporâneo não é a razão. A razão definia o MODERNO. No pensamento moderno a razão era infalível. Todo erro seria falta de razão. Todo acerto seria primado racional. Com o reino da razão tudo seria paz. Mais importante: a história caminhava para a vitória final da razão. O caminho do Homem o levaria do irracional ao racional. À luz.
   As duas guerras mundiais derrubaram essa fé, mas mesmo assim, muitos ainda vivem na crença de que o "futuro" será a razão, e que ela, como um tipo de deus infalível, resolverá todos os problemas do mundo. Até os anos de 1980 ainda se podia seriamente acreditar, embora de forma hesitante, na vitória final da luz do saber cientifico. As pessoas seriam cientistas objetivos. A educação e a ciência seriam o fim da história.
  Mas se fez a GRANDE IRONIA. E ela nasceu dentro da própria ciência. A ironia é: Quanto mais tecnológicos nos tornamos, menos racionais ficamos. A ciência traz dúvida e não certeza e a hiper conexão faz de nós seres indagantes, vagos, incertos. Surpreendentemente, no auge tecnológico ressurgem costumes medievais. Sim, medievais. As pessoas passam a se organizar em TRIBOS, pequenos feudos que são formados pela identificação de crença, de costume, de gosto, de hábitos. Países e até famílias deixam de ser o que nos define. Somos definidos por aquilo que acreditamos. Vagamos pelo mundo, real ou digital, à procura de nossa nação.
  A tecnologia se torna uma ferramenta "da ciência" que traz em si o retorno do mais pagão misticismo. A crença no " tudo é possível". Aquilo que definia o Homem Moderno: politica, nação, razão e cidade; passa a se desvanecer. Como costumes em agonia, todos esses "espantalhos" se tornam sombras mórbidas. Hábitos mantidos por falta de opção. São ecos do passado. Mortos no futuro.
  O romance, o livro como narrativa de uma história deixa de ser possível. Se torna forçado. Cínico. Pois no mundo tecnológico NÃO HÁ MAIS HERÓI. O culto a personalidade se torna impossível, o grande HOMEM uma aberração. Ninguém mais tem interesse em UM HOMEM, porque o homem é razão e sentimento, é apenas um ser falível, como eu e como voce, portanto, inconfiável. O grande humano moderno, seja Picasso, Freud, Roosevelt ou Einstein deixa de ter lugar.
  Estamos no tempo do grupo. Do artesão. Do anônimo. Medievais nisso também.
  Nossos famosos não são gênios. São celebridades. Bobos e falíveis. Esquecíveis.
  A tecnologia trouxe a volta da sombra, do reprimido, o podre, o sujo, o irracional. Trouxe a volta não, trouxe isso para a luz. Desfez a ilusão da limpeza, do correto, do racional.
  Cada vez mais temos um único conhecimento. A certeza de que tudo é desconhecido. E de que por mais que façamos, continuamos sendo apenas "gente". Vagando, vendo, lutando, se perdendo, e tentando achar algum tipo de luz, de lugar e de paz.