A METAFÍSICA DA AÇÃO- PABLO ENRIQUE ABRAHAM ZUNINO ESCREVE SOBRE HENRI BERGSON

   Operar com o real obriga nossa mente a separar artificialmente os objetos de nós mesmos. Para usar e agir sobre a matéria temos de isolar as coisas-objetos em entidades separadas. Essa "ilusão" utilitária, faz com que nossos estados emocionais sejam também vistos como acontecimentos independentes. Como pérolas num colar, cada estado emocional se torna um mundo em si-mesmo. Mas para manter essas "pérolas" unidas é preciso um fio, esse fio se torna o tempo, e assim caímos em mais uma ilusão, aquela que diz ser o tempo uma linha que une fatos da vida.
  Bergson dá uma visão inversa: o tempo é a própria substância onde os acontecimentos ocorrem. Sem o tempo nada haveria. Ele não une nada, não pode ser utilizado para nenhum fim, não pode ser percebido, contado ou medido; é onde estamos, o que nos envolve e dele só temos consciência no tênue momento da intuição.
  Eu jamais escreveria sobre Bérgson se não tivesse tido essa intuição. Duas ou três vezes em mais de 50 anos de vida eu a senti. E por mais que tente a descrever eu não posso. Isso porque as palavras, ferramentas uteis, nada têm a dizer sobre o tempo. Palavras falam de coisas e de atos uteis. Palavras falam da nossa ação sobre o real. A vida, a realidade, são construídos enquanto são vividos, estão no tempo. Portanto não há como sairmos dele para o observar. Palavras nos aprisionam em esquemas asfixiadores, fechados, lutam para acalmar a razão. A razão, o mais útil dos instrumentos, precisa agir sobre aquilo que é real. O homem, único ser que consegue analisar com palavras a própria palavra, que pode pensar o pensamento, que consegue não reagir aos estímulos do corpo, não consegue sair do tempo, cessar o tempo, medir o tempo. É aí que Bergson situa toda sua filosofia da ação e da liberdade.
  O corpo é real. O corpo é presente. A memória não. Daí um dos nossos nós. A memória está e não está, existe e não existe, vem e vai, some e renasce. O cérebro, que para o filósofo francês, é antes um fio condutor e nunca uma máquina produtora, recolhe da memória aquilo que nos é prático, aquilo que serve para uma ação. O resto, memória que jamais desparece, fica em reserva, no sonho, no delírio, na intuição.
  Algumas frases de Bérgson são admiráveis: " Para deixar o espírito agir a liberdade faz do corpo um intermediário". " O cérebro não teria por função pensar, mas fazer com que o pensamento não se perca em sonho."
  Ele vai de Darwin á Kant, e aqui neste livro é Bérgson comentado por Merleau-Ponty e Lebrun. Se fala de William James, Barthes, Jankélevitch e Deleuze. Não se fecha nada, tudo fica em aberto, nenhuma verdade é revelada. Pode-se dizer que é o filósofo da ação, do agir, do fazer.
  O autor, Pablo Enrique Abraham Zunino, tenta abarcar amplas fatias do pensamento de nosso filósofo, quase consegue. Melhor ler diretamente Bérgson. Ele escrevia muito bem. Ganhou até o Nobel. Escrevo mais abaixo.