JOYCE, RICHARD ELLMAN

   O pai de James Joyce, John Joyce. Que homem! Foi um grande cantor, voz de tenor que se tornou lenda. Herdeiro de várias propriedades, hipotecou tudo, ano a ano, e quando James fez 21 anos, a família estava na absoluta miséria. O pai, John, tinha tantos talentos que jogou fora todos. Sabia navegar, desenhar, inventar, contava histórias, criava ideias. Jogador de rugby, de boxe, nadador mestre. Amigo de todos, mudava de casa como quem penteia o cabelo. Beberrão. Um personagem de John Ford. Real.
  John teve onze filhos. James Joyce foi o primeiro. O pai adorava o filho. O filho amava o pai. Em seus livros existem montes de personagens baseados no pai. James tinha mais seis irmãs e quatro irmãos. O pai ignorava a todos, menos James. A mãe era caseira, chorosa, forte, e morreu aos 44 anos. 
  James Joyce foi educado em escolas jesuítas. Isso serviu para lhe dar agudeza. E também para o fazer romper com o catolicismo. Joyce era egocêntrico, vaidoso, frio e terrivelmente talentoso. Sempre foi o melhor aluno da classe e sempre ofendia os professores, amigos, mestres, outros escritores, com sua mania de falar a verdade, de se achar acima de todos, mais inteligente, mais talentoso, especial. James Joyce se tinha na conta de um gênio desde cedo. Ele foi sempre áspero com Yeats, com Lady Gregory, Synge, todos talentos reconhecidos e que o ajudaram em seus começos. Todos suportavam Joyce porque viam nele o gênio.
  James não gostava de Shakespeare. Seus favoritos eram Ibsen, Tolstoi, Flaubert e principalmente Dante. Seu estilo logo se modelou. Joyce escreveria sobre gente e situações banais, mas mostraria nessa banalidade o extraordinário. Transformaria o homem do século XX, o homem anônimo, no Ulysses urbano.  Realismo extremado pintado como mito grego, lenda etrusca, arte latina. James jamais esqueceu da grandeza de John Joyce. 
  Passou fome em Paris, sempre a procura de trabalho, sempre esnobe, sempre fora do padrão. Richard Ellman não tem medo de mostrar o quanto Joyce era antipático, distante e ferino. Sua voz, era um grande cantor também, bela, feria e encantava. Impressiona a confiança que ele sempre teve em si-mesmo, inabalável. 
   Estou na página 220, Joyce com 22 anos, prestes a descobrir o estilo dos Dublinenses, seu grande livro de contos. Emocionante. Ellman também escreveu biografias de Wilde, Yeats...seu estilo é minucioso, preciso, documentado. Para quem ama literatura, este imenso volume é um paradiso.
  PS: É minha segunda leitura. Dez anos depois.