UM ESCRITOR DA SABEDORIA E DO BOM HUMOR: GILBERT KEITH CHESTERTON

   Sou eu o homem que com maior ousadia descobriu aquilo que a muito já havia sido descoberto.
   Esse o mote do livro, brilhante, de G.K.Chesterton. Não conheço pensamento mais claro. Ele pega aquilo que temos PREGUIÇA de pensar, que temos dado como certo, e com simples bom-senso, mostra seu erro. Dessa forma Chesterton provoca um nó em sua cabeça e mesmo que voce seja um escravo do pensamento escuro e aprisionador, algo em voce balança ao término de sua exultante leitura.
   Chesterton foi uma raridade no século XX. Um escritor que foi um homem feliz. Seu método é racional. Ele pega o que é comumente dito e o leva ao pé da letra. Então compara esse pensamento com aquilo que as pessoas têm como excêntrico e demonstra assim que o que é dado como certo pode ser muito errado. E o excêntrico pode ser o muito claro. Seu estilo é aquele do bonachão professor de Oxford. Não, ele nunca lecionou. Foi jornalista e em seguida escritor de sucesso. Seus debates com amigos ilustres ( Bernard Shaw, H G Wells ) eram transmitidos ao vivo pela BBC. Grande sucesso também fez o debate com Bertrand Russel. Chesterton venceu todos. Sua bússola, ele logo o diz, é o conto de fadas. Sim, contra a ciência e o materialismo ele usa a moral do conto de fadas. O racionalismo de Branca de Neve ou do Gato de Botas ( e ele demonstra onde mora a razão pura e prática desses contos ), contra Darwin e Schopenhauer. O modo como ele demole Darwin é fabuloso.
   Livros como Zorba, poemas de Yeats, o encontro com o pensamento de Montaigne, o teatro de Shakespeare, a leitura de Bergson, todos esses momentos decisivos ( e posso incluir ainda Eliot, Keats, Whitman, Huxley ), foram passos rumo ao encontro com uma consciência maior em minha vida de leitor. Sair da vida pequena e caminhar a uma vida grande. Chesterton é a coroação desse caminho, é a cura de descaminhos. Em um mundo melhor todos leriam Chesterton. Como teriam lido Emerson. Leriam mais Stendhal.
   Melhor pegar frases do livro aleatoriamente. ( Coloco-as em negrito ).
   As pessoas não conhecem o mundo em que vivem e por isso acreditam em meia dúzia de máximas sem pensar nelas.
   Dizem que um homem bem sucedido é aquele que crê em si-mesmo. Pois eu digo que os homens que creem em si-mesmo estão todos no hospicio. Os que lá não estão, e sei que são muitos, podem ser encontrados em bares suspeitos e ruas mal frequentadas, É o poeta "genial"que agora se acha um perseguido, a estrela do cinema que nunca foi descoberta, o filósofo revolucionário que nunca foi entendido. A auto-confiança é a característica de todo fracassado.
   Os contos de fada duram para sempre porque eles têm um herói que é um ser humano normal vivendo aventuras incríveis. Os romances modernos têm um herói anormal vivendo um história banal. 
   Todos os gênios foram pessoas absolutamente normais com ideias originais. Pessoas originais com ideias normais são os charlatães. 
   Dizem que o hospício está cheio de misticos, de poetas. Mentira. A loucura é feita de um excesso de ordem, de zelo, de razão. No hospicio moram banqueiros, administradores e advogados. O poeta convive muito bem com a riqueza, com a complexidade do mundo. Ele é são. A poesia e o misticismo podem curar a loucura, a matemática e o xadrez nunca.
   O mundo do doido é sempre pequeno e nesse pequeno mundo tudo tem sua lógica. O mundo do poeta e do mistico está sempre em expansão. Ele cresce sem cessar e nesse crescimento não se procura lógica embora exista razão. 
   Materialistas fecham caminhos. Para eles vários pensamentos são tabú. Não posso pensar nisso, não posso pensar naquilo. Isto não é racional, isto não é moderno.
   O pensamento mistico abre portas. Posso pensar em tudo. Nada pode ser estranho e nada é impossível. 
   Homens que acreditam em si-mesmo, autores que acreditam no super-homem de Nietzsche, escritores que escrevem sobre seu Eu, todos vivem em vácuo imenso. Nada criam porque nada olham. Seu olhar está sempre para dentro. O mundo lhes é indiferente.
  O mundo moderno não é mau. Na verdade ele é excessivamente bonzinho.
  O mundo moderno tem a seguinte e absurda teoria: a de que é mais fácil perdoar os pecados se crermos que não existem pecados para perdoar. É um erro duplo. Absolve o mau achando-o normal e tira de nós a chance de provar a virtude do perdão.
   Se o homem quiser tornar o mundo grande deve tornar a si mesmo pequeno. Essa a virtude da humildade. 
   Na busca do prazer e no gozo absoluto perdemos o principal fator do prazer e do gozar, a surpresa.
   Os humildes criam os mais altos sonhos. Os egocêntricos os destroem.
   O homem antes duvidava de si, mas nunca da verdade. Agora ele duvida da verdade e jamais de si.
   É inutil falar na rivalidade entre fé e razão. Pois a razão, como tudo o mais, é uma questão de fé.
   O cristianismo é a única religião voltada para fora. Ela olha o exterior e trabalha sobre a matéria. É a religião dos olhos. 
   A teoria da evolução nos dá a licença para sermos tigres ou leões. 
   Não me impressiona o quanto um macaco se parece com um humano, o que me deixa abismado é a imensa e inenarrável diferença que há entre nós e eles.
   Pregar o egoísmo é praticar o altruísmo, eis a contradição de Nietzsche, um homem fraco que amava o que ele pensava ser um forte. O verdadeiro egoísta não sai a rua para pregar, ele despreza a rua.
   Cientistas modernos dizem que somos guiados por genes.  Deus nos deu o livre arbítrio. Podemos escolher o bem ou o mal. Onde a liberdade?
   A vida é em si um milagre. O pensamento é uma magia e a vontade é um mistério. O que importa não é o porque de o espaço ser infinito ou não, mas o porquê do homem desejar saber. Esse querer saber, essa vontade de ser sempre mais e melhor, essa ânsia por ir além, esse é o milagre.
  Isso tudo é uma fração minúscula do que esse livro contém. E Chesterton não escreve aforismos. Cada uma dessas frases é fruto de um raciocínio, de uma razão que é exposta. Ele nos convence. Faz filosofia.
  Lê-lo é como beber, como sonhar, como comer. Um prazer, uma coisa da vida, natural. Se algum escritor pode merecer o título de sábio, esse é o grande Gilbert Keith Chesterton.