UM MÉTODO PERIGOSO ( E UM FILME MEDROSO )

   Críticos podem causar mal. Veja o que aconteceu comigo...
   Lendo uma crítica leviana, que dizia que este filme era terrivelmente injusto com Jung, resolvi evitá-lo. Eu simplesmente não estava com saco para mais um discurso conservador sobre a "irracionalidade" de Jung. Nosso covarde mundinho já me expõe demais aos palpites de quem jamais leu Jung e julga por ouvir falar.
   Mas então um professor me fala que o filme, segundo ele "apesar de ruim", tem uma bela imagem do gênio suiço. Uma imagem pobre, americanizada, mas digna. Então resolvo vê-lo.
   O filme é chato, muito chato. E me impressiona seu conservadorismo. É um filme freudiano, ou seja: solene, sóbrio, controlado, modesto. O filme sobre Freud, feito por John Huston em 1962 é muito mais moderno. Talvez por ter sido feito no auge do sopro renovador de Lacan e Jung, ou simplesmente por ser de um diretor melhor.
   O filme é tão raso, que se voce, por acaso, não souber nada sobre quem foi Jung ou quem foi Freud, o que voce entenderá é que ali está uma história de amor inconvincente ( o filme de Huston é tão melhor que nem apela para qualquer tipo de love story ), e um conflito entre um velho autoritário e meio tolo e um jovem atrapalhado. Só isso.
   O que me surpreende é que o roteiro foi escrito por um grande autor, Christopher Hampton. Apesar de que desde LIGAÇÕES PERIGOSAS ele tem se perdido...
   Viggo Mortensen foi ator de teatro de Bergman. Ele faz Freud se parecer com o Bergman do tempo de FANNY E ALEXANDER. Montgomery Clift está muito mais próximo do que Freud  deve ter sido. Fassbender é o ator da moda. Qualquer coisa que ele fizer será elogiada. Não estou dizendo que eles estão ruins, apenas falo que os papéis são superficiais. Não respiram, não têm vida.
   Meu professor estava certo, o filme é lisongeiro com Jung. Ele é um jovem tentando achar uma voz própria. Freud não admite qualquer tipo de nova atitude. É o patriarca de seu condado. O filme tem a sensibilidade de mostrar a mania de todo freudiano de se colocar a salvo numa poltrona e analisar a vida, os amigos, os amores a segura distância, como se Freud os salvasse da existência. Puro comodismo conservador. 
   O final do filme é exemplar: Jung antecipa em sonho a primeira guerra mundial, e revela a diferença entre seu método ( muito perigoso ) e o de Freud ( seguro e modesto ). Jung não quer a domesticação, quer que cada um encontre seu caminho, que seja aquilo para que foi talhado a ser, seja um louco, um suicida ou um santo. Após um longo percurso ele organizaria sua teoria do "self". Freud reduz todo ser a uma questão de adaptação "ao mundo como ele é". Nada mais patriarcal que isso.
   Mas eu seria falso se não concordasse com meu professor, o filme é frio, chato, sem chama.
   E eu seria mais falso ainda se não dissesse que amo qualquer filme que se passe entre 1880/1920. A extrema elegância daquela gente, a luz fria daquelas janelas, as salas sólidas e viris, o som dos cavalos e das janelas que se abrem... é um filme bonito de se ver.
   Por fim, o filme joga uma ideia de que a separação entre Jung e Freud foi um tipo de "mal" para o futuro da psicologia. Tolice! A ruptura nos deu o livre desenvolvimento do pensamento de Jung, que jamais floresceria á sombra do vienense. E ao mesmo tempo o mais velho pode ficar em paz, sem o perigo de ideias que lhe eram intoleráveis.
   Mas na verdade o que o filme faz é reduzir tudo a uma torta love story. Báh!!!!!