BOTAFOGO, SERGIO AUGUSTO/ FLAMENGO, RUY CASTRO, O NASCIMENTO DA PAIXÃO NACIONAL

   Muito mais que bundas, samba ou cerveja, a grande paixão nacional é a bola. Em dois livros, com textos épicos, belas fotos e revelações emocionantes, o flamenguista Ruy Castro e o botafoguense Sergio Augusto ( um dos melhores críticos de cinema deste país, talvez o maior ), escrevem sobre suas paixões. Há uma foto de Didi, no livro sobre o Fogão que chega a ser pura obra de arte. Didi anda pela rua, terno e gravata. A esposa vai a seu lado e atrás dos dois, uma multidão de meninos caminha respeitosa e sorridentemente o "guardando". Didi acabara de dar mais um show no Maracanã lotado e voltava para casa a pé, no meio da torcida. A foto transmite a mesma impressão que nos causa a visão de uma pirâmide do Egito. A admiração pela arte de uma civilização perdida.
 Castro explica o porque do Flamengo ser o mais amado do Brasil. Paulistas rancorosos gostam de falar que o Mengo é o maior ( em torcida ) por causa do Rio ter sido capital e seus jogos correrem Brasil afora. Bem...o Flu veio antes, sempre foi elite e não se popularizou do mesmo modo. Why? O Flamengo nasce como time de remo em fins do século XIX. As meninas do bairro davam trela aos remadores do Botafogo e enciumados, os garotos do Flamengo resolveram fundar seu clube náutico. Nascia o Mengão. Na primeira travessia pelo mar alto eles se perdem e ficam dias à deriva. A população do Rio em suspense. Afinal todos conseguem ser resgatados ( por remadores do Botafogo ). Nascia aí a popularidade do Flamengo. Nacionalmente ela se fez porque logo na década de 10, com o futebol fundado no clube, o time passa a ser o primeiro a excursionar pelo nordeste. Quanto ao futebol, é verdade, o clube é cria do Fluminense. O Flu sempre fora do futebol e existiam jogadores do Flu que remavam pelo Flamengo. Quando os cartolas das Laranjeiras peitaram um jogador rebelde, todo o time do Flu se bandeou para o Flamengo e lá fundaram o futebol dentro do clube de remo. Não vamos esquecer que o esporte mais popular do Brasil entre 1880/1920 era o remo e o segundo era o ciclismo. Com um futuro que lhes traria Leônidas, Zizinho, Domingos da Guia e Zico a popularidade do Flamengo estava assegurada.
   A história do Botafogo é bem diferente. Ela começa com o muito aristocrático Botafogo de regatas e o "juvenil" Botafogo futebol clube. Na década de 40 os dois se unem e nasce o BFR, Botafogo de futebol e regatas. O clube de futebol é fundado por um bando de adolescentes, sendo o único clube do Brasil fundado por rapazes. É engraçado o tipo de nome que os jogadores da época têm: Olimpio Tavares Gomes, José Augusto Nunes Prado ou Oscar Smith-Clifford. Era a mais fina flor da aristocracia que jogava bola. Fora o Vasco da Gama, o patinho feio que tinha até negros no time. O Botafogo é logo visto como clube para poucos, de gente "diferente", intelectuais, desajustados e nobres decaídos ( os rivais dizem que é um clube para masoquistas ). Pouca gente sabe que é o Botafogo o clube que mais cedeu jogadores para a seleção nacional, dentre a lista imensa Garrincha, Gerson, Amarildo, Heleno, Jairzinho, Paulo César Caju e Nilton Santos. Clube que "faliu" várias vezes e que sempre renasce.
   São dois livros que se lê com sorriso nos lábios e um prazer idêntico ao de se ver um bom jogo. Times que deram alegria a todo uma nação, histórias de fundação que se movem entre a saga e a anedota. Mesmo não sendo flamenguista ( fui "Zico" de 1976 até 1983 ), ou botafogo ( tive uma admiração pelo fogão na mais tenra infância ), são duas leituras obrigatórias para quem gosta do jogo. Mais, para quem gosta de história.