O AMOR- ANDRÉ COMTE-SPONVILLE

Um pequeno livro lançado primeiro no Brasil. Trata-se de uma compilação de alguns dvds em que André discorre sobre o amor. Para quem leu o obrigatório "PEQUENO TRATADO DAS GRANDES VIRTUDES", este livro é um complemento.
Existem 3 formas de amor, como voces sabem. Eros, Philía e Agápe. Eros sendo o mais básico e comum, e Agápe o mais raro. Platão institui o amor Eros, Schopenhauer o desenvolve e Freud, discípulo de Schopenhauer, o cristaliza. O que seria esse amor-Eros? No Banquete, Aristófanes fala da história dos hermafroditas. Seríamos esses seres incompletos, e o amor seria a busca por essa outra metade. Todos conhecem essa lenda. O que muitos esquecem é que Platão discorda dessa crença. No Banquete, como em tudo, Platão está ao lado de Sócrates, e Sócrates fala que amor é falta, vazio, desejo puro. Desejamos aquilo que não temos, e como desejar aquilo que temos? Impossível. O amor nada mais é que essa insatisfação sem fim, miragem que ao ser atingida se desfaz. Desejamos, obtemos e descobrimos então que não era aquilo que queríamos. Partimos pra outra busca. Schopenhauer vai mais longe, é famosa sua frase que diz que viver é estar num pêndulo: balançamos entre o desejo e o tédio, pois sempre que conseguimos o que queremos ( seja trabalho, bens materiais ou vida amorosa ) nos deparamos com o desencanto que leva ao tédio. Um homem, ou uma sociedade que satisfaça todos os desejos será uma sociedade desencantada e entediada.
Mas Comte-Sponville diz que algo não bate aí. Existem casais que permanecem em constante desejo. Existem amores ( ao trabalho, a arte, a vida, aos amigos ) que não morrem, embora sejam raros. O que os explica? Que amor é esse?
Surgem Aristóteles e Espinoza dizendo que o amor é "regozijar-se". O amor não é um vazio que ansiamos por preencher, ele é antes uma potência, uma força que nos leva ao prazer, ao usufruto da vida. Não somos seres desesperados, incompletos, que sem livre-arbítrio algum, correm em busca de um amor que será sempre uma decepção. Somos sim seres que nascem com uma potência amorosa, uma vontade de amar, e livremente, partimos em busca desse amor pleno. Ao ser encontrado podemos gozar essa potência, podemos nos realizar como seres potentes. Esse é o amor Philia, amigo.
Comte-Sponville alerta que principalmente para jovens adolescentes, esse amor descrito lhes parecerá decepcionante. Estamos condicionados ao sofrimento romântico e pior, ao eterno mercado da atualidade. Um amor Eros consome sem parar, um amor Philia usufrui do que já possui. É um amor que dá todo o tempo, se doa, pensa no prazer do outro. Nele existe a chance de se livrar do Ego ( e Sponville cita a terrível frase de Pascal : "Odeie seu Ego", e a explica. Todo o inferno do mundo vive no ego. Matar o ego, que é o que ocorre em Philia, é viver o outro, se dar, livrar-se de si. ), é um amor que aumenta com o convívio, que procura mais no que já se tem.
Por fim, e estou condensando bastante o texto, há o amor Agape, amor a Deus. André é ateu, mas ele explica algo que me intriga: Como é possível que pessoas que se dizem "cultas" possam ignorar a religião? Nada pensar e nada saber sobre religião é como estudar medicina sem querer entender de biologia. Nosso mundo, nossa filosofia, nossa arte, nossa mente, nossos sentimentos são todos consequencia de um mundo de religião. Nada saber sobre isso é optar pela cegueira.
O que seria então esse amor Agape? André confessa que nunca o viu. O que não o invalida. Seria um amor que existe como ideal, como meta máxima a nos guiar. É o amor que se retira, o amor que dá espaço, que dá vida. Explico. André usa como exemplo o amor de mãe. A mãe ama seu bebê. E provávelmente não é amada do mesmo modo. Primeiro fato: Agape é um amor que existe por si-mesmo, não precisa de reciprocidade. Segundo: a mãe, que ama seu filho, poderia sufocá-lo de amor. Fazer dele seu brinquedo, ser para ele TUDO. Mas, e essa é a maior prova de amor possível, ela lhe dá espaço, afasta-se para que ele possa crescer, para que ele possa SER. Esse é o amor de Agape, amor que não é comentado entre os gregos e que nasce com o cristianismo. O amor da potência que se nega, da força que se torna conscientemente fraca, da auto-anulação. É o amor que se retira. Entre homens e mulheres é um amor que André jamais viu. Mas entre mãe e filho ele ocorre a toda hora. Amar e abrir mão. Sponville cita então a mais perfeita filósofa moderna do amor, Simone Weill: "Amar um estranho é transformar a si-mesmo num estranho". Esse é o caminho de Agape, o ego deixa de ser o centro, o outro é o que importa.
Leiam. Amorosamente.