Simon Reynolds escreve no New York Times: Houve um tempo em que a música pop era algo com o qual voce podia identificar uma época. Assim, os 60 eram identificados pelo soul, pelo folk e pelo psicodélico. Os 70 pelo heavy-metal, o punk , o disco e o rock-progressivo, os anos 80 pelo rap, o tecno e o gótico, os 90 pelo grunge e o eletro. Bom.... Simon continua, e diz que no pop de hoje nada há que identifique este tempo. Tudo é xerox de algo já feito N vezes. Daí vem o fato de que a tecnologia seviu na verdade para estancar o avanço e criar o conceito de ATEMPORALIDADE. Tudo ao mesmo tempo agora. Assim, a molecada se liga em blues dos anos 30, soul dos 60 ou tecno alemão dos anos 70 e apenas recicla o que já existe. Simon ainda fala da mania de se comprar teclados de 1965, ampli valvulados de 1970 e guitarras de 1955.
Engraçado....
Uma das coisas que mais comprovam o tal inconsciente coletivo de Jung é essa coisa com a qual vivo me deparando: voce acha que só voce sente e pensa tal coisa, e aí percebe que existe uma onda mundial pensando exatamente o mesmo que voce. A tal ATEMPORALIDADE da internet, coisa com a qual me pego refletindo todo o tempo. Coisa deliciosa, mas que além de sua delicia tem o poder de destruir toda a espontaniedade em arte. Como?
Primeiro digo que Simon tenta ser otimista. O grunge e a música eletrônica dos anos 90 já não eram tão anos 90 assim. Na verdade vinham dos anos 80. E se voce pensar que os grandes nomes dos anos 90 eram Beastie Boys, Smashing Pumpkins, Oasis, Radiohead ou Pearl Jam, voce vai notar que nenhum deles trouxe algo de realmente novo. O que eles faziam era fazer de outro modo o que já havia sido feito antes. O que acontece então?
Como sou do tempo pré-informação, posso arriscar uma chave. A gente ouvia falar de novas bandas, e lia sobre grupos maravilhosos do passado, mas não tinha como os escutar. Eu fiquei dois anos lendo sobre o Velvet Underground sem ter escutado nada. Até encomendar no Museu do Disco o White-Light e finalmente o escutar ( e pirar ). Ao mesmo tempo lia sobre um tal de punk rock acontecendo, mas também sem poder ouvir disco nenhum ( só os Pistols ). O que essa condição de ilha humana fazia comigo? Fazia com que o vazio de não poder ouvir criasse a imagem do que deveria ter sido o Velvet. Ou do que era o Buzzcocks. Então eu pegava minha banda ( eu tinha uma ) e fazia um som furioso, tipo Velvet ( e que nada tinha de Velvet ). Quando os escutei, finalmente, percebi meu erro. E daí? Tentando criar "meu Velvet" eu fizera meu som.
Hoje um garoto de 12 anos pode escutar tudo o que existe agora e antes ( atemporalidade ). Nada resta para ele imaginar "como teria sido" ou "como deve ser". Ele é esmagado pela ousadia do Velvet, pelo poder do Led ou pela arte de Eno ainda na infancia. Ou pior que isso, é afogado por milhares de suas cópias, milhões de clones e cria a ideia de que "o rock e o pop são isso mesmo". Ele sabe tudo, ouve tudo, vê tudo, onde o espaço para imaginar/criar/errar?
A música de hoje nada cria de novo porque ela está ocupada descobrindo coisas como bossa-nova da letônia, punk das ilhas Fiji ou tecno da Croácia. Gente "nova" fazendo coisas velhas. Vejo ( e olhe que eu procuro...) N bandinhas novas inglesas e TODAS se parecem com Jam/Small Faces/Buzzcocks. Ou, quando piores, vão na linha Roxy/Eno/King Crimsom. Tudo com uma produzidinha à anos 90, claro. Na música negra a coisa é ainda pior. Marvin Gaye e Aretha Franklyn são as únicas referências. E tome Madonna clones.
Voce, menino, talvez não saiba, mas houve um tempo em que o hype não era por um novo nome, era por um novo estilo musical. Kraftwerk ou Mc5 criaram algo de diferente a partir de quase nada. E lembro do que era estranho ouvir Run DMC e Public Enemy em 1986. O que te pergunto é: existe hoje algum som que choque um cara de 30 anos? Não falo de músicas que revoltam por serem ruins, falo que causem reação por serem realmente jovens, inéditas e que ROMPAM com todo o passado. Que joguem Bowie, Dylan, Thom Yorke, Morrissey e Neil Young no lixo. Alguém tem essa ousadia? Como ter, se um moleque um dia vê no YouTube o grupo Love em 1967 fazendo aquilo que ele sonha em fazer?
Eu só consegui conhecer o Love em 1999. Sinal dos tempos. O Love se tornou minha "nova" banda favorita no começo do século XXI. No mundo atemporal, Beatles/Stones/Led e Dylan serão para sempre o máximo. E Velvet/ Stooges/Sabbath e Clash os exemplos a serem seguidos.
PS: No cinema a coisa é ainda mais grave. Ter tudo de todos os tempos, com boa imagem, a disposição, amassa as ambições de todo estudante de cinema. A cópia se torna uma imensa tentação. E Bogart/Brando/Kate e Audrey se fazem mais mitos que nunca.