No cinema dos anos 50 Freud era rei. Os filmes ditos sérios eram todos freudianos. Impulsos, obssessões, traumas de infância, pulsões de morte, ninfomania. Todo drama humano era explicado pela cartilha freudiana, e nesses filmes "de conteúdo", nada nunca era inocente. Tudo tinha um porque, um sentido traumático, tudo era solene.
Peças de Tennessee Willians e de William Inge eram idolatradas e os filmes de George Stevens, Elia Kazan e William Wyler eram amados pelo público analisado, culto e sofisticado. Eram filmes que mostravam a tal vida real.
Douglas Sirk estava pouco se lixando para tudo isso. Seus filmes eram berrantemente coloridos e jogavam fora toda a cartilha freudiana. Ele exagerava traumas, idolatrava absurdos, amava frases pomposas e dispensava a verossimilhança. O negócio dele era o melodrama e nesse melô, como ninguém antes, ele escancarava a doença da elite americana. Sirk inventou a novela. Toda série séria bebeu em sua fonte e as novelas da Globo ainda o seguem. Mas ele, por ser o mestre, foi além: ele gargalhava com essa profusão de homos não assumidos, ninfo desesperadas e pais incestuosos. Canastralizava as atuações e falsificava os cenários. Fazia de tudo um grande fake e exibia assim o fake geral da América.
O público-povão da época o amava. Seus filmes estouravam bilheterias e os críticos o odiavam. Viam nesses filmes apenas a superficie: atuações caricatas e roteiros sem sentido. Não tinham o humor para ir além da aparencia.
Hoje ele é desprezado pelo público. Esse público vê nele apenas um autor de dramas bregas. E é amado por cinéfilos e cineastas, que vêem nele um mestre inteligentíssimo, sutil, ferino, letal.
Fassbinder dizia ter aprendido tudo com ele, e Almodovar diz amar seus filmes. Diz Pedro: "- Já assisti Palavras ao Vento milhares de vezes. E mal posso esperar pela próxima!"
Ainda se percebe sua influência nos filmes de Todd Haynes, Ang Lee e de Wong Kar Wai. Ontem assisti um filme seu pela primeira vez. E confesso, é viciante. O drama, divertidissimo, vai acontecendo sem ceder, coisas ocorrem sem parar, tudo é rápido, grandiloquente e colorido. Lindo. Entretenimento puro e perfeito.
Douglas Sirk começou na Alemanha dirigindo teatro sério. Fugiu de Hitler e em Hollywood fez faroeste, musical e noir, até se especializar em dramas da Universal. Super sucessos que foram atacados pelos criticos dos anos 50/60. A partir dos anos 80 foi reabilitado e hoje é considerado chic e genial.
Viciei. Uma delicia proibida que "não fica bem gostar". Um Almodovar americano/alemão. E ainda tem Rock Hudson! Haja ironia........