Byron escreve sobre um anjo caído, anjo do mal. Lúcifer. Um ser-coisa, que se guia pelo desejo de seu coração, o desejo de seguir o mal. Esse desejo o leva a absoluta solidão. Byron se via nesse anjo caído. Lord Byron viveu isso. E tombou na revolução grega, arma na mão, famoso em todo mundo, maldito na Inglaterra, voluntário pela causa da liberdade. Tinha 36 anos. Sua vida foi um tumulto de sexo, drogas e liberdade. E poemas endereçados aos céus.
Gauguin nasceu no Peru. Pais franceses, logo voltaram para a França. Paul se casou, teve filhos e enriqueceu como corretor da bolsa de valores. Pintava como hobby. Aos 40 anos, largou tudo, mulher e filhos, dinheiro e conforto. Passou a se dedicar exclusivamente à pintura. Viajou para o Tahiti. Defendeu a causa dos nativos contra os colonos franceses, apaixonou-se pelas jovens nativas nuas. Sentiu fome e muita dor. Vendeu quase nada e usava tintas ruins, telas ruins. Teve sifilis. Morreu no amado Tahiti.
Modigliani tinha uma absurda beleza. Nasceu em familia rica, no conforto do sangue azul italiano. Mas se apaixonou pela boemia. Largou tudo e foi viver em Paris. Rei dos bares de má fama, roubava pedras das ruas para esculpir. Enamorou-se de modelos-prostitutas. Namorou e viciou-se em absinto. Jeanne Hebuterne, jovem comportada, apaixonou-se por Modi. Tiveram uma filha. Mas o absinto cobra contas, e Modigliani pirou. Brigas, rompimentos, voltas. Ele morre jovem. Ela se atira pela janela em seguida. Nenhum pintor pintou nada tão erótico quanto Amedeo.
Rimbaud começou a escrever ainda criança. Tornou-se famoso entre os poetas franceses por isso e também por sua beleza. Verlaine, bem mais velho, larga tudo apaixonado por Rimbaud. Os dois viajam pela Europa inteira. A pé. Vivem juntos e são perseguidos pelo preconceito. Aos 17 anos Rimbaud escreve toda sua obra principal, que irá o imortalizar. Era o anúncio da sensibilidade do futuro. Larga Verlaine e vai para a Africa. Aos 19, sua carreira literária se encerra: nunca mais escreverá. Na nova vida, ele resolve ficar rico. Faz comércio de café, tráfico de armas, talvez até escravos. Endurece, cresce, torna-se um outro. Morre de gangrena, em algum buraco da selva. O que ele terá sentido ?
E há tanto mais para ser dito. 200 homens perdidos no Pólo Sul. Sem comida, sem abrigo, sem comunicação. Sobrevivem e são resgatados. Três anos depois.
Thor Heleyal atravessando o Pacífico numa balsa feita de papiro. Só. E consegue.
Jean Vigo dirigindo seu único filme deitado numa maca; morrendo de tuberculose. Termina a última tomada e morre. Deixa-nos uma obra-prima: Le Atalante.
Eddie Aikau se mandando para o fundo da tempestade para salvar náufragos. Com sua prancha, surfista famoso. Salva alguns e desaparece no mar.
Chuck Yeager voando pelo prazer de voar, indo mais rápido, mais livre, mais solitário.
O que é o heroísmo? Se sacrificar ? Por quem? Um soldado se sacrifica, é não é necessáriamente um herói. Então o que faz de um homem um herói ?
É aquele que cai na terra e segue seu desejo. Todo herói é um anjo caído. Que segue, sem se abalar, seu destino. Ele faz o que precisa ser feito e que só ele poderia fazer. Faz por sí mesmo, e como consequencia, afeta uma humanidade ao seu redor. Mas faz para satisfazer sua originalidade. Só ele sabe o que só ele deve e pode fazer. Todo herói está isolado.
O herói hoje está perdido não porque toda montanha foi conquistada ou todo mar rastreado. O que mata o heroísmo é que toda individualidade está cerceada, vigiada, acomodada num rótulo padrão. Byron seria um freak narcisista, Gauguin um irresponsável pedófilo, Rimbaud um giletão arrependido, Modigliani um playboy viciado, Aikau um cara que se deu mal, Yeager um caipira bronco, Mozart precisaria de um empresário melhor e Beethoven seria uma estrela psicótica. Thor teria cruzado o pacífico para vender os direitos do filme sobre sua vida. Rótulos para heróis. Rótulos de supermercado. Um herói precisa esquecer tudo isso : não se julgar, não se auto-analisar, não se corromper. Ele não mira um alvo definido, ele vai fundo no que sua alma quer. Seja o que for. Enxerga o fundo do escuro interior e sai para a vida, fazendo o que seu daimon ordenou. Sem se justificar, sem ser rotulado, sem pedir paz, sem desistir, sem se iludir. Jamais pensando em ser como os outros são, nunca como deveria ser. Um herói se desnuda, larga o supérfluo, não carrega malas, não tem garantias. Nada é menos heróico que um cartão de crédito, um GPS, um comprimido de Prozac. O herói tem como única garantia seu desejo. Seu desejo, não o de ninguém outro.
Cervantes escreveu Dom Quixote na prisão, longe de seu país, esquecido.
Shelley passou a vida lutando pela igualdade dos sexos e pela extrema liberdade em polìtica. E pelo ateísmo.
Tolstoi perdeu tudo por sua fazenda socialista, onde todos eram iguais.
O herói não almeja atingir fama. Ele faz porque TEM que ser feito.
Para entender o que é isso, assista O SOL É PARA TODOS, filme já analisado aqui. Tudo está lá: aquele é o único tipo de heroísmo que nos resta. E é belo, muito belo.
FABLES OF RECONSTRUCTION- REM
Posso ver. Em meio ao capinzal, há um barracão de blocos cinzas. Cercado pela chuva caindo e entupido de teias de aranhas. Posso ver. Há um vazio em todo redor e uma imensa coragem. Eu vou só. Jamais estive tão só. Aquele disco estava rodando. Era 1985 e minha vida era uma merda. Era 1985 todo mundo queria ser David Bowie ou Bryan Ferry. Todo mundo era cool e as meninas queriam namorar Sting. E O REM queria ser Robbie Robertson!!!!!! Caraca!!!!! Todo mundo queria ser moderno e eles eram Byrds e Flying Burritos !!!!!! Eles estavam no barracão, ao meu lado, eles eram comigo, eles tinham a faca que abria minha casca e estraçalhavam o meu medo. Eles me apaixonaram. Eram eu.
Gravaram FABLES OF RECONSTRUCTION na Inglaterra, com Joe Boyd, produtor de folk dos merry 60's. Mas o disco é Atlanta, é Mississipi, é do céu, do céu, do céu, do céu... No barracão cheio de teias e vinho eu me apaixonei por uma menina solitária como eu e como este disco é. Rodando ela e eles no meu coração, e rasgando minha carapaça e minha febre e traçando rastros de ódio e sendas de paixão e loucura. E o heroísmo de se ir contra. Sempre contra, pois quando eles se tornaram mainstream perderam o tesão. Que está aqui inteiro.
A capa do disco dá medo como dava o descampado. Mas há o som de tantos violões juntos e de milhares de guitarras de 6 cordas e de uma bateria pesada e Stipe está cantando rouco e parece estar dormindo ou talvez tenha morrido e tudo neste disco seja uma mensagem para quem já viu o inferno. Mas o meu barracão começa a ser aberto e as teias se vão e sinto pena das teias. Maldita década onde até quem não queria ser Bowie e Ferry queria ser poeta romântico e este disco é Rimbaud. Rimbaud viu a verdade.
Eu não sabia que a América podia ser tão profunda e eu não sabia que amar podia ser tão só. Mas eu sabia que tudo se resolve na estrada e o barracão desaba e a rua pede que eu vá com ela. Vou. Pois este disco é um milhão de estradas cruzadas. Como ele é toda uma sinfonia de cordas quando o mundo só escutava uma sinfonia de teclados. Falando de paixão todo o tempo. Falando como uma faca fala.
Lá bem no final do disco tem uma estranha que me aguarda. E nada tem a dizer a não ser que ela sabe que sou tão estranho quanto ela. E que nunca estaremos juntos como agora e aqui. E esta música, sobre amantes estranhos, chega a beira do absurdamente bonito e do magnificamente simples. E nada tem a dizer.
Ao final, uma canção para Wendell Gee. Cheiro de pinho e de café e frio de neve e cowboys que não sabem montar. E um banjo que vem como a mão quente de alguém. O REM alcança as alturas que só The Band alcançou um dia. Lá no alto, no ar claro, no absolutamente certo, no que é para sempre. Quando ainda se acreditava no ser para sempre. Quando acaba não termina. Fica. Isto fica. isto nunca vai mudar. Isto era, é, será. No mundo de Robertson, McGuinn, Parsons, Stills, Furay, Young, Dylan...
Gravaram FABLES OF RECONSTRUCTION na Inglaterra, com Joe Boyd, produtor de folk dos merry 60's. Mas o disco é Atlanta, é Mississipi, é do céu, do céu, do céu, do céu... No barracão cheio de teias e vinho eu me apaixonei por uma menina solitária como eu e como este disco é. Rodando ela e eles no meu coração, e rasgando minha carapaça e minha febre e traçando rastros de ódio e sendas de paixão e loucura. E o heroísmo de se ir contra. Sempre contra, pois quando eles se tornaram mainstream perderam o tesão. Que está aqui inteiro.
A capa do disco dá medo como dava o descampado. Mas há o som de tantos violões juntos e de milhares de guitarras de 6 cordas e de uma bateria pesada e Stipe está cantando rouco e parece estar dormindo ou talvez tenha morrido e tudo neste disco seja uma mensagem para quem já viu o inferno. Mas o meu barracão começa a ser aberto e as teias se vão e sinto pena das teias. Maldita década onde até quem não queria ser Bowie e Ferry queria ser poeta romântico e este disco é Rimbaud. Rimbaud viu a verdade.
Eu não sabia que a América podia ser tão profunda e eu não sabia que amar podia ser tão só. Mas eu sabia que tudo se resolve na estrada e o barracão desaba e a rua pede que eu vá com ela. Vou. Pois este disco é um milhão de estradas cruzadas. Como ele é toda uma sinfonia de cordas quando o mundo só escutava uma sinfonia de teclados. Falando de paixão todo o tempo. Falando como uma faca fala.
Lá bem no final do disco tem uma estranha que me aguarda. E nada tem a dizer a não ser que ela sabe que sou tão estranho quanto ela. E que nunca estaremos juntos como agora e aqui. E esta música, sobre amantes estranhos, chega a beira do absurdamente bonito e do magnificamente simples. E nada tem a dizer.
Ao final, uma canção para Wendell Gee. Cheiro de pinho e de café e frio de neve e cowboys que não sabem montar. E um banjo que vem como a mão quente de alguém. O REM alcança as alturas que só The Band alcançou um dia. Lá no alto, no ar claro, no absolutamente certo, no que é para sempre. Quando ainda se acreditava no ser para sempre. Quando acaba não termina. Fica. Isto fica. isto nunca vai mudar. Isto era, é, será. No mundo de Robertson, McGuinn, Parsons, Stills, Furay, Young, Dylan...
A RAIZ DA INFELICIDADE- PAUL AUSTER
Lendo "O inventor da solidão" de Auster. É mais uma tentativa de gostar desse autor. Lendo-o percebo o porque de me irritar sua escrita: ele é um típico escritor do estilo blog: escreve tudo o que faz e pensa, imaginando que isso possa interessar a alguém ( e pelo jeito interessa à muitos ). Quem inventou essa praga de que se voce escrever com sinceridade e com algumas citações bacanas, seu livro se fará por sí mesmo ? Fazem décadas que uma tonelada de gente que escreve fica detalhando seus pensamentos e seu cotidiano nada interessante e chama isso de literatura. Onde está o estilo? Onde a criação? A fecundidade?
Auster é estéril. O livro é uma confissão masturbatória. O estilo é o de todo narcisista-eu eu eu eu. Eu sou só. Eu moro em tal lugar. Eu penso. Eu escrevo. Para esse tipo de escritor, eu oponho Italo Calvino, Borges, Machado de Assis : o reino da criação. O autor cria um mundo, jamais copia sua realidade. Ele fecunda.
Há um belo pensamento no livro : " Toda tragédia do homem vem de um único fato- sua incapacidade de ficar quieto em seu quarto". Isso é Pascal. Isso é fecundo. Porque me faz pensar. Onde existe hoje a liberdade de se ficar quieto em seu quarto? A liberdade de se ser só. O mundo invade meu quarto : estou conectado à tudo. Pior que isso: se ficar duas horas sózinho, me sentirei, condicionado que estou, a me sentir infeliz. Será?
Minha nostalgia ( nossa? ) da infância é a nostalgia de se ficar em paz no quarto. Um lugar onde tudo parecia estar à mão: cama, brinquedos, comida, água, calor, proteção. Um ninho. Será que as crianças classe média de hoje têm essa experiência? Um espaço protegido, a prova de invasão, para elaborar sonhos e desejos? Um mundo de eterno presente e portanto, de eterna e deliciosa nostalgia?
Todos nós construimos quartos- hoje mais que nunca a vida não é comunitária. Ninguém entra na casa do amigo sem avisar ( e quando fui adolescente ainda se fazia isso. Meus amigos surgiam em meu quintal sem avisar ). Portanto, em um quarto onde há tv-computador-banheiro-geladeira-telefone, voce pode passar meses sem qualquer privação. Nunca foi tão fácil viver nesse tal quarto. Mas observe melhor a frase de Pascal : ficar quieto em seu quarto. Preciso explicar?
As mais deliciosas lembranças de minha infância são as tardes em que ficava quieto. Me deitava de barriga pra cima, sem absolutamente nada para fazer e sem pensamento algum. Logo me vinha um calor delicioso na região da barriga, um bem estar que subia pelas pernas, uma doce preguiça que me envolvia os braços. Não dormia. Ficava escutando a tarde. Os pássaros, o vento nas folhas, vozes distantes vindas de casas vizinhas. Nada mais. Quieto em meu quarto. Nada para fazer, nada desejando, nada incomodando.
Hoje, às vezes, sinto tudo isso de novo. A delicia desse calor. Mas é uma saudade: ele vem, delicioso sim, mas vem como coisa invocada, pedida, desejada. Não é natural, é um trabalho. Trabalho para atingir o vazio. Isto é uma incongruência.
Eu me propus a falar do livro de Paul Auster. Falei de Pascal. Creio que explica o que é seu livro.
Auster é estéril. O livro é uma confissão masturbatória. O estilo é o de todo narcisista-eu eu eu eu. Eu sou só. Eu moro em tal lugar. Eu penso. Eu escrevo. Para esse tipo de escritor, eu oponho Italo Calvino, Borges, Machado de Assis : o reino da criação. O autor cria um mundo, jamais copia sua realidade. Ele fecunda.
Há um belo pensamento no livro : " Toda tragédia do homem vem de um único fato- sua incapacidade de ficar quieto em seu quarto". Isso é Pascal. Isso é fecundo. Porque me faz pensar. Onde existe hoje a liberdade de se ficar quieto em seu quarto? A liberdade de se ser só. O mundo invade meu quarto : estou conectado à tudo. Pior que isso: se ficar duas horas sózinho, me sentirei, condicionado que estou, a me sentir infeliz. Será?
Minha nostalgia ( nossa? ) da infância é a nostalgia de se ficar em paz no quarto. Um lugar onde tudo parecia estar à mão: cama, brinquedos, comida, água, calor, proteção. Um ninho. Será que as crianças classe média de hoje têm essa experiência? Um espaço protegido, a prova de invasão, para elaborar sonhos e desejos? Um mundo de eterno presente e portanto, de eterna e deliciosa nostalgia?
Todos nós construimos quartos- hoje mais que nunca a vida não é comunitária. Ninguém entra na casa do amigo sem avisar ( e quando fui adolescente ainda se fazia isso. Meus amigos surgiam em meu quintal sem avisar ). Portanto, em um quarto onde há tv-computador-banheiro-geladeira-telefone, voce pode passar meses sem qualquer privação. Nunca foi tão fácil viver nesse tal quarto. Mas observe melhor a frase de Pascal : ficar quieto em seu quarto. Preciso explicar?
As mais deliciosas lembranças de minha infância são as tardes em que ficava quieto. Me deitava de barriga pra cima, sem absolutamente nada para fazer e sem pensamento algum. Logo me vinha um calor delicioso na região da barriga, um bem estar que subia pelas pernas, uma doce preguiça que me envolvia os braços. Não dormia. Ficava escutando a tarde. Os pássaros, o vento nas folhas, vozes distantes vindas de casas vizinhas. Nada mais. Quieto em meu quarto. Nada para fazer, nada desejando, nada incomodando.
Hoje, às vezes, sinto tudo isso de novo. A delicia desse calor. Mas é uma saudade: ele vem, delicioso sim, mas vem como coisa invocada, pedida, desejada. Não é natural, é um trabalho. Trabalho para atingir o vazio. Isto é uma incongruência.
Eu me propus a falar do livro de Paul Auster. Falei de Pascal. Creio que explica o que é seu livro.
3 grandes ( e muito influentes para os dias atuais ) filmes.
A MONTANHA DOS SETE ABUTRES.
Filme de Billy Wilder com Kirk Douglas. Este era o filme favorito de Wilder. Talvez por ter sido seu mais odiado filme e imenso fracasso. A partir dos anos 80 começou a ser reavaliado, se tornando um de seus mais importantes filmes. Mas porque foi tão incompreendido e hoje é tão atual ? Vamos a sua história : Douglas é um repórter fracassado que trabalhando num jornaleco de uma cidadezinha do Novo Mexico vê a chance de dar a volta por cima. Um homem está soterrado numa mina indígena. Prolongando a agonia do resgate ele poderá monopolizar jornais, rádio e tv, pois o que vende é desgraça, e se ele fizer dessa desgraça uma novela a audiência será gigantesca. Douglas passa a atrapalhar o resgate, iludir a vitima, corromper os politicos. No final, tudo dá errado, mas não há catarse no filme. Todos e tudo continuam tão podres como sempre. Wilder prova que todo comediante é um grande pessimista. Este filme, que nada tem de engraçado, desnuda o verdadeiro Billy, o artista que viu o nazismo de perto, o fim do império aus´tríaco, a degeneração da civilização européia. Nada dá alivio na tensão deste filme : o repórter é um verdadeiro filho-da-puta ( não há melhor definição ). Sua alegria com a súbita fama é revoltante. O xerife da cidade é um ladrão e o empreiteiro, um pau-mandado. A esposa do acidentado é uma vagabunda e a população da cidade aproveita a´notoriedade do lugar para faturar. Um circo grotesco se forma ao redor da tragédia. O final, em que sempre esperamos algo de xaroposo ou consolador, é duro, amargo e forte. Nada alivia. Kirk Douglas faz a perfeição o reporter. Ele nasceu para esse tipo de egoista cinico. Um forte retrato do mundo do espetáculo, onde o maior espetáculo é aquele que conjuga dor/morte/absurdo. ( Vide acidente da Air France ).
JUVENTUDE TRANSVIADA
Filme de Nicholas Ray com James Dean, Natalie Wood, Sal Mineo e Dennis Hopper.
Cenas em delegacia. Três jovens são entrevistados pelo serviço social. Natalie é uma filha que ama demais o pai e não é aceita por ele. Mineo é um garoto rico porém sem contato com os pais, e Dean é um desajustado que vive mudando de cidade. Seu pai é um fraco maricas, dominado pela esposa. Dean estréia na escola, é amado pelo personagem de Mineo e cria inimizade com a gang da escola. Vem a muito famosa cena do racha e o final, belo e dramático, em mansão abandonada. O filme inaugura o tipo de drama adolescente que seria chavão por cinco décadas seguintes. E ainda vemos nele traços daquele filme independente americano dos anos 90 e 2000. Mas porque ele é ainda tão atual, tão válido ? Vamos a apreciação: primeiro o fantástico Sal Mineo. Na época ele era namorado do diretor Ray e a bandeira que ele dá é flagrante. Seu personagem se apaixona por Dean e passa todo o filme sofrendo por esse amor gay irrealizado. Como isso passou na ferrenha censura de 1955 é um mistério! Seu rosto de baby, seus modos de efebo, tudo nos deixa surpresos e faz parte da imensa riqueza do filme. Filme, longe de ser perfeito, que afunda nas cenas dos "adultos" e que tem a minha muito querida Natalie Wood canastrona e mal definida. Ela compromete, e compromete muito. E tem, acima de tudo, James Dean.
Existe uma teoria que diz que Marlon Brando só foi Marlon Brando duas vezes : no Chefão e Último Tango, feitos no mesmo ano, para provar que ainda era o maior; e entre 50/56 com o objetivo de suplantar primeiro o gênio Montgomery Clift, e depois para esmagar o absurdamente carismático James Dean. E o que faz aqui James Dean ? Ele faz miséria! Cada cena com ele, cada pequeno gesto de mãos, toda expressão facial, a maneira de pular palavras, engolir as sílabas, balbuciar pensamentos, tudo nele nos deixa abismados, aturdidos, estupefatos. Ele sobra no filme, sobra naquela época. Todos lá parecem ser gente de 1955, mas Dean, como Brando na época, parece ser atemporal. Ele é de 55, mas é também um jovem louco de 67, um rebelde de 77, um bacana de 87, um esportista irriquieto de 97, um astro teen de 2007. Creia, sua influência é tamanha que não há ator desde então que não o tenha estudado, imitado, encorpado. Nicholson, Pacino, Cage, Depp, e todos os outros. Eles falam como Dean ( aquela voz grave e baixa, frases ditas devagar, pensamentos emitidos pelo meio, não sorrir, mas não ser sério, um ar de sofrimento superado, um charme de bad boy sensível ). Mas o mais fantástico é que eles não imitam James Dean apenas na técnica de atuar. Johnny Depp fazendo o pirata não é Dean, mas Johnny Depp numa entrevista é James Dean! A voz é a mesma, o olhar é o mesmo, o tédio identico, as roupas são as que JD usaria. ( JD e JD...). É como se todo ator americano desde então sonhasse em ser genial como Brando, mas fosse na vida pessoal um clone de James Dean. Assista este filme e deixe seu queixo cair. No mais, um comentário sobre Nick Ray : ele se tornou ídolo de Goddard e depois de Wim Wenders. Dá pra entender o porque. Este filme tem movimentos de câmera e angulações que antecipam o cinema dos dois e até mesmo o video-clip. Ray, bissexual, rebelde, esquisitão, fez aqui seu filme mais niilista. Por fim, uma tragédia: Dean morreria no ano seguinte numa Porsche Spyder. Aos 24, com apenas 3 filmes. Natalie morreria afogada aos 40, após uma vida de álcool e droga. E Sal Mineo se mataria aos 30. O que foi este filme ? Uma radiografia do que viria a seguir, para eles mesmos e para a América.
CONTOS DA LUA VAGA
Filme de Kenji Mizoguchi. Se o filme de Wilder mostra o espetáculo desagradável do mundo atual e se o filme do mito James Dean mostra o espirito desconfortado em que existimos, esta obra de Mizoguchi mostra o conflito entre dinheiro e alma e a guerra entre mulher e homem. No Japão do século XVI, assolado por cruel guerra civil, acompanhamos dois homens; um artesão ambicioso e um outro que sonha ser um samurai. Vemos então o que acontece. Massacres, ingratidões, muita crueldade ( a morte da esposa chega a ser insuportável ), estupros e assombrações. O filme começa como um libelo socialista contra o dinheiro e termina como poesia metafisica à favor das mulheres. Mizoguchi, o mais japonês dos cineastas, filma cenas de rara beleza. A travessia do lago, a princesa-fantasma seduzindo o artesão, e o final: a sequencia do retorno ao lar, momento de triste e absurda beleza poucas vezes vista igual. Um maravilhoso e inesquecível filme-poema, comentário sobre tudo aquilo que importa na vida. O diretor, ele mesmo dono de biografia dramática ( a irmã foi vendida como gueixa para salvar a familia da fome ), filma tudo com deliberada precisão. Poucos cortes, poucas fusões e uma câmera sempre leve, flutuando, observando. Este amado filme ( dos mais amados da história do cinema ) fica como documento de uma sensibilidade muito refinada, inteligente e de profundo amor às mulheres. São elas as guardiãs da sabedoria. Os homens, tolos, precipitados, erram todo o tempo, elas remendam nossos farrapos. Mizoguchi crê nessa idéia, demonstra-a com perfeita beleza e faz uma obra inesquecível.
Filme de Billy Wilder com Kirk Douglas. Este era o filme favorito de Wilder. Talvez por ter sido seu mais odiado filme e imenso fracasso. A partir dos anos 80 começou a ser reavaliado, se tornando um de seus mais importantes filmes. Mas porque foi tão incompreendido e hoje é tão atual ? Vamos a sua história : Douglas é um repórter fracassado que trabalhando num jornaleco de uma cidadezinha do Novo Mexico vê a chance de dar a volta por cima. Um homem está soterrado numa mina indígena. Prolongando a agonia do resgate ele poderá monopolizar jornais, rádio e tv, pois o que vende é desgraça, e se ele fizer dessa desgraça uma novela a audiência será gigantesca. Douglas passa a atrapalhar o resgate, iludir a vitima, corromper os politicos. No final, tudo dá errado, mas não há catarse no filme. Todos e tudo continuam tão podres como sempre. Wilder prova que todo comediante é um grande pessimista. Este filme, que nada tem de engraçado, desnuda o verdadeiro Billy, o artista que viu o nazismo de perto, o fim do império aus´tríaco, a degeneração da civilização européia. Nada dá alivio na tensão deste filme : o repórter é um verdadeiro filho-da-puta ( não há melhor definição ). Sua alegria com a súbita fama é revoltante. O xerife da cidade é um ladrão e o empreiteiro, um pau-mandado. A esposa do acidentado é uma vagabunda e a população da cidade aproveita a´notoriedade do lugar para faturar. Um circo grotesco se forma ao redor da tragédia. O final, em que sempre esperamos algo de xaroposo ou consolador, é duro, amargo e forte. Nada alivia. Kirk Douglas faz a perfeição o reporter. Ele nasceu para esse tipo de egoista cinico. Um forte retrato do mundo do espetáculo, onde o maior espetáculo é aquele que conjuga dor/morte/absurdo. ( Vide acidente da Air France ).
JUVENTUDE TRANSVIADA
Filme de Nicholas Ray com James Dean, Natalie Wood, Sal Mineo e Dennis Hopper.
Cenas em delegacia. Três jovens são entrevistados pelo serviço social. Natalie é uma filha que ama demais o pai e não é aceita por ele. Mineo é um garoto rico porém sem contato com os pais, e Dean é um desajustado que vive mudando de cidade. Seu pai é um fraco maricas, dominado pela esposa. Dean estréia na escola, é amado pelo personagem de Mineo e cria inimizade com a gang da escola. Vem a muito famosa cena do racha e o final, belo e dramático, em mansão abandonada. O filme inaugura o tipo de drama adolescente que seria chavão por cinco décadas seguintes. E ainda vemos nele traços daquele filme independente americano dos anos 90 e 2000. Mas porque ele é ainda tão atual, tão válido ? Vamos a apreciação: primeiro o fantástico Sal Mineo. Na época ele era namorado do diretor Ray e a bandeira que ele dá é flagrante. Seu personagem se apaixona por Dean e passa todo o filme sofrendo por esse amor gay irrealizado. Como isso passou na ferrenha censura de 1955 é um mistério! Seu rosto de baby, seus modos de efebo, tudo nos deixa surpresos e faz parte da imensa riqueza do filme. Filme, longe de ser perfeito, que afunda nas cenas dos "adultos" e que tem a minha muito querida Natalie Wood canastrona e mal definida. Ela compromete, e compromete muito. E tem, acima de tudo, James Dean.
Existe uma teoria que diz que Marlon Brando só foi Marlon Brando duas vezes : no Chefão e Último Tango, feitos no mesmo ano, para provar que ainda era o maior; e entre 50/56 com o objetivo de suplantar primeiro o gênio Montgomery Clift, e depois para esmagar o absurdamente carismático James Dean. E o que faz aqui James Dean ? Ele faz miséria! Cada cena com ele, cada pequeno gesto de mãos, toda expressão facial, a maneira de pular palavras, engolir as sílabas, balbuciar pensamentos, tudo nele nos deixa abismados, aturdidos, estupefatos. Ele sobra no filme, sobra naquela época. Todos lá parecem ser gente de 1955, mas Dean, como Brando na época, parece ser atemporal. Ele é de 55, mas é também um jovem louco de 67, um rebelde de 77, um bacana de 87, um esportista irriquieto de 97, um astro teen de 2007. Creia, sua influência é tamanha que não há ator desde então que não o tenha estudado, imitado, encorpado. Nicholson, Pacino, Cage, Depp, e todos os outros. Eles falam como Dean ( aquela voz grave e baixa, frases ditas devagar, pensamentos emitidos pelo meio, não sorrir, mas não ser sério, um ar de sofrimento superado, um charme de bad boy sensível ). Mas o mais fantástico é que eles não imitam James Dean apenas na técnica de atuar. Johnny Depp fazendo o pirata não é Dean, mas Johnny Depp numa entrevista é James Dean! A voz é a mesma, o olhar é o mesmo, o tédio identico, as roupas são as que JD usaria. ( JD e JD...). É como se todo ator americano desde então sonhasse em ser genial como Brando, mas fosse na vida pessoal um clone de James Dean. Assista este filme e deixe seu queixo cair. No mais, um comentário sobre Nick Ray : ele se tornou ídolo de Goddard e depois de Wim Wenders. Dá pra entender o porque. Este filme tem movimentos de câmera e angulações que antecipam o cinema dos dois e até mesmo o video-clip. Ray, bissexual, rebelde, esquisitão, fez aqui seu filme mais niilista. Por fim, uma tragédia: Dean morreria no ano seguinte numa Porsche Spyder. Aos 24, com apenas 3 filmes. Natalie morreria afogada aos 40, após uma vida de álcool e droga. E Sal Mineo se mataria aos 30. O que foi este filme ? Uma radiografia do que viria a seguir, para eles mesmos e para a América.
CONTOS DA LUA VAGA
Filme de Kenji Mizoguchi. Se o filme de Wilder mostra o espetáculo desagradável do mundo atual e se o filme do mito James Dean mostra o espirito desconfortado em que existimos, esta obra de Mizoguchi mostra o conflito entre dinheiro e alma e a guerra entre mulher e homem. No Japão do século XVI, assolado por cruel guerra civil, acompanhamos dois homens; um artesão ambicioso e um outro que sonha ser um samurai. Vemos então o que acontece. Massacres, ingratidões, muita crueldade ( a morte da esposa chega a ser insuportável ), estupros e assombrações. O filme começa como um libelo socialista contra o dinheiro e termina como poesia metafisica à favor das mulheres. Mizoguchi, o mais japonês dos cineastas, filma cenas de rara beleza. A travessia do lago, a princesa-fantasma seduzindo o artesão, e o final: a sequencia do retorno ao lar, momento de triste e absurda beleza poucas vezes vista igual. Um maravilhoso e inesquecível filme-poema, comentário sobre tudo aquilo que importa na vida. O diretor, ele mesmo dono de biografia dramática ( a irmã foi vendida como gueixa para salvar a familia da fome ), filma tudo com deliberada precisão. Poucos cortes, poucas fusões e uma câmera sempre leve, flutuando, observando. Este amado filme ( dos mais amados da história do cinema ) fica como documento de uma sensibilidade muito refinada, inteligente e de profundo amor às mulheres. São elas as guardiãs da sabedoria. Os homens, tolos, precipitados, erram todo o tempo, elas remendam nossos farrapos. Mizoguchi crê nessa idéia, demonstra-a com perfeita beleza e faz uma obra inesquecível.
ANG LEE/NICHOLAS RAY/CARROS/WALSH
RAZÃO E SENSIBILIDADE de Ang Lee com Emma Thompson, Kate Winslet, Hugh Grant, Alan Rickman
Justiça seja feita a Lee. É um muito grande diretor. Banquete, Tempestade de Gelo e mesmo Brokeback são grandes filmes. Assim como este maravilhoso Razão... Tudo funciona aqui. Cada movimento de camera, cada nuance dos atores, todo diálogo. Há a sabedoria de se compreender Jane Austen, é o dinheiro quem manda no amor. O roteiro de Emma Thompson, premidado com um justo Oscar é exemplar : nada em excesso, nada com pressa. Todo o elenco brilha, mas Emma e Hugh Grant ( com uma timidez não caricata ) chegam a comover profundamente. Uma quase obra-prima que se assiste com imenso prazer. Cheia de beleza, encanto e profunda inteligência. Pessoa magnífica deve ser Emma Thompson !!!!! Concorreu a 8 Oscars e perdeu 7. Preferiram o filme de Mel Gibson , pasmem! nota Dez!!!!!!
HORIZONTE DE GLÓRIA de Nicholas Ray com John Wayne e Robert Ryan
Filme sobre a aviação na segunda guerra. As cenas de ação valem pelo filme. São combates aéreos reais, filmados na guerra de verdade. A caça de aviões pelo ar, piloto seguindo piloto, nos emocionam pela sua verdade. Há uma cena da explosão de um destóier japonês que nos choca, o navio se desintegra, explode em chamas e nada sobra do que fora um barco. Wayne e Ryan sempre são um prazer e o filme, no gênero, é um bom exemplo. nota 6.
TAMBORES DISTANTES de Raoul Walsh com Gary Cooper.
Tenho lido um site do Cahiers du Cinema. É incrível como os franceses adoram Walsh. Vêm nele uma profundidade e uma maestria que raramente percebo. Gosto muito de seus filmes, aventuras sempre bem feitas e com heróis interessantes, mas gênio ele não foi. Este western passado nos pantanos da Flórida é muito bom, belo passatempo, mas não traz nenhum sinal de originalidade ou poesia. nota 6.
REMBRANDT de Alexander Korda com Charles Laughton
Bela bio do maior pintor da história. O cenário, recriando a Holanda da época é fascinante e Laughton, um ator nunca menos que genial, considerado por muitos o melhor da história cinematográfica, hipnotiza e fascina nosso olhar como sempre faz. Seu Rembrandt é poético e bastante convincente. Eis um ator que poderia ser Shakespeare na tela e nos convencer disso. Este filme brilha por seu trabalho e pelos ótimos diálogos que traz. nota 8.
OS INCONQUISTÁVEIS de Cecil B. de Mille com Gary Cooper e Paulette Godard
De Mille, com Hitchcock, o mais famoso diretor da história, traz aqui seu senso de show para as massas. Um pai de Spielberg, seu melhor dom é o de fazer a ação nunca parar. Esta aventura, em constante movimento, sempre indo em frente, tem de tudo : humor, tiros, correrias, paisagens de sonho, romance. Belo passatempo. nota 7. Ps. Como Paulette, ex-senhora Chaplin era bonita!!!
CARROS de John Lasseter
Por uma hora este desenho erra em tudo. Seu herói é um chato e não nos interessamos por ele. É legal vê-lo com um nome que é homenagem à Steve McQueen, de quem sou fã, mas a história não flui. Mas sua meia hora final é tudo o que queremos. Vem a crítica que a Pixar sempre faz ao mundo atual, o herói cresce, se humaniza, e nos apaixonamos pela pacata cidade perdida no tempo. No tempo, como diz o filme, em que as pessoas viajavam para ver, não para chegar. O veterano, homenagem linda à Paul Newman rouba as melhores cenas. nota 7.
OS INCRÍVEIS da Pixar, Disney
A mensagem é maravilhosa : fomos heróis um dia. Hoje, nosso medíocre mundo nos proíbe de o ser. Fomos Shakespeareanos. Hoje somos Big Brother. Mas isso é mostrado de um modo tão detalhado que chegou a me enjoar. Uma ação tão cheia de "trecos" me entedia. Bocejei ao final. Mas sem dúvida, nos cartoons de hoje, existe uma nobreza há muito ausente dos filmes com gente real. Dignificam a arte que nos deu Pinóquio e Dumbo e que tem agora esse absoluto momento de gênio chamado Wall.e. nota 6.
Justiça seja feita a Lee. É um muito grande diretor. Banquete, Tempestade de Gelo e mesmo Brokeback são grandes filmes. Assim como este maravilhoso Razão... Tudo funciona aqui. Cada movimento de camera, cada nuance dos atores, todo diálogo. Há a sabedoria de se compreender Jane Austen, é o dinheiro quem manda no amor. O roteiro de Emma Thompson, premidado com um justo Oscar é exemplar : nada em excesso, nada com pressa. Todo o elenco brilha, mas Emma e Hugh Grant ( com uma timidez não caricata ) chegam a comover profundamente. Uma quase obra-prima que se assiste com imenso prazer. Cheia de beleza, encanto e profunda inteligência. Pessoa magnífica deve ser Emma Thompson !!!!! Concorreu a 8 Oscars e perdeu 7. Preferiram o filme de Mel Gibson , pasmem! nota Dez!!!!!!
HORIZONTE DE GLÓRIA de Nicholas Ray com John Wayne e Robert Ryan
Filme sobre a aviação na segunda guerra. As cenas de ação valem pelo filme. São combates aéreos reais, filmados na guerra de verdade. A caça de aviões pelo ar, piloto seguindo piloto, nos emocionam pela sua verdade. Há uma cena da explosão de um destóier japonês que nos choca, o navio se desintegra, explode em chamas e nada sobra do que fora um barco. Wayne e Ryan sempre são um prazer e o filme, no gênero, é um bom exemplo. nota 6.
TAMBORES DISTANTES de Raoul Walsh com Gary Cooper.
Tenho lido um site do Cahiers du Cinema. É incrível como os franceses adoram Walsh. Vêm nele uma profundidade e uma maestria que raramente percebo. Gosto muito de seus filmes, aventuras sempre bem feitas e com heróis interessantes, mas gênio ele não foi. Este western passado nos pantanos da Flórida é muito bom, belo passatempo, mas não traz nenhum sinal de originalidade ou poesia. nota 6.
REMBRANDT de Alexander Korda com Charles Laughton
Bela bio do maior pintor da história. O cenário, recriando a Holanda da época é fascinante e Laughton, um ator nunca menos que genial, considerado por muitos o melhor da história cinematográfica, hipnotiza e fascina nosso olhar como sempre faz. Seu Rembrandt é poético e bastante convincente. Eis um ator que poderia ser Shakespeare na tela e nos convencer disso. Este filme brilha por seu trabalho e pelos ótimos diálogos que traz. nota 8.
OS INCONQUISTÁVEIS de Cecil B. de Mille com Gary Cooper e Paulette Godard
De Mille, com Hitchcock, o mais famoso diretor da história, traz aqui seu senso de show para as massas. Um pai de Spielberg, seu melhor dom é o de fazer a ação nunca parar. Esta aventura, em constante movimento, sempre indo em frente, tem de tudo : humor, tiros, correrias, paisagens de sonho, romance. Belo passatempo. nota 7. Ps. Como Paulette, ex-senhora Chaplin era bonita!!!
CARROS de John Lasseter
Por uma hora este desenho erra em tudo. Seu herói é um chato e não nos interessamos por ele. É legal vê-lo com um nome que é homenagem à Steve McQueen, de quem sou fã, mas a história não flui. Mas sua meia hora final é tudo o que queremos. Vem a crítica que a Pixar sempre faz ao mundo atual, o herói cresce, se humaniza, e nos apaixonamos pela pacata cidade perdida no tempo. No tempo, como diz o filme, em que as pessoas viajavam para ver, não para chegar. O veterano, homenagem linda à Paul Newman rouba as melhores cenas. nota 7.
OS INCRÍVEIS da Pixar, Disney
A mensagem é maravilhosa : fomos heróis um dia. Hoje, nosso medíocre mundo nos proíbe de o ser. Fomos Shakespeareanos. Hoje somos Big Brother. Mas isso é mostrado de um modo tão detalhado que chegou a me enjoar. Uma ação tão cheia de "trecos" me entedia. Bocejei ao final. Mas sem dúvida, nos cartoons de hoje, existe uma nobreza há muito ausente dos filmes com gente real. Dignificam a arte que nos deu Pinóquio e Dumbo e que tem agora esse absoluto momento de gênio chamado Wall.e. nota 6.
ZARATHUSTRA, A CABALA, O SUFISMO XIITA IRANIANO, OS GNÓSTICOS, ANJOS, PLATÃO E OS 40 DIAS
A tentação é imensa. Tudo se resumindo a química. Tudo estará explicado. Visões serão desequilibrios de componentes químicos. A depressão, um desarranjo, um tipo de diabetes cerebral. Xamãs são esquisofrênicos, e poetas, adultos presos na infância. O amor é desejo sexual e todo romantismo uma moralização de um instinto. Regulamos a vida revisando o motor. Domamos a dor via comprimido. Tudo é o que podemos ver, ou mais que isso, nada há fora da ciência. E tudo que é científico, é produto vendável.
Em 1986 eu repudiei o mundo sensitivo. Tudo que era visível assustava e tudo que era real perdera seu valor. O mundo se tornara novo para mim, e assustador. Como na época não existia a popularização da síndrome do pânico, eu comecei a escrever. Textos em que via na crise a chance de renascimento. Eu acreditava estar nascendo. Todos os dias eram como partos complicados e tudo que eu via, lia, sentia, tinha uma ressonância de eternidade. De maravilhamento e de pavor. Um constante perigo. Alguma coisa brotava. Espíritas e umbandistas falavam em encosto. Nunca me convenceu. Simples demais. Procurei a psicanálise. Descobri que eu odiava e amava meu pai, que todo medo era frustração sexual, que eu estava num processo de amadurecimento. Me acalmei. Mas o medo permanecia. Menos misterioso. Mais real. E intocável. Descobriram, por acaso, que anti-depressivos curavam a síndrome. Tomei-os. O medo foi domesticado. Não era um novo ser que nascia. Não era sexo. Era uma simples e vulgar doença. Um problema de quimica cerebral. Tudo aquilo que escrevi e pensei no nascer da crise,mera fuga e fantasia.
Passei a ter adoração por psiquiatras. Gurus com soluções imediatas. Adaptação sem dor. Deliciosamente me tornei o racionalista radical. Religião é medo da morte. Arte é tentativa de ser eterno. Amor é jogo de sedução narcisista. A vida é um acaso quimico. Uma sopa que deu certo. E o homem, um macaco que enlouqueceu. Pó entre pó. Cheio de respostas prontas, me sentei no trono do adulto, rindo dos ingênuos, dos amantes, dos infantis. E é assim desde 1999. Porém há uma armadilha nisso tudo : me livrei do medo desconhecido, e com ele, perdi o encanto de viver. Não há mistério. Não há poesia.
Mas houve uma noite. Cheia de tola ingenuidade. Em que me sentei ao lado de meu amor. Aos pés da árvore que plantei em minha infância. Ficamos, eu e ela, em silêncio, como dois nadas que nada desejam, quietos e abraçados, na madrugada fria, sentados na grama e encostados um no outro, assistidos pela árvore grande. Uma promessa foi feita sem que nada fosse dito: éramos um. O que aconteceu ali eu nunca soube e nem saberei.
E houve um amanhecer. Frio e sem porque. Deitado sobre uma rocha, imensa e repleta de cracas, eu escutava o mar. Violento, barulhento, ele respingava ao meu redor e se tornava prata, amanhecia. Alguém dormia a meu lado. Mas eu estava só. Reencontrava o mar. Alguma coisa aconteceu naquela rocha e naquela manhã fria.
Numa tarde de fim de solidão. Eu descobri a poesia. Yeats se desvendava inteiro. Eu compreendia e absorvia tudo. Toda imagem fazia sentido. Sua voz se tornava a minha. Eu estava no paraíso. Sua torre, sua Irlanda, sua musa, tudo era meu pois naquela tarde eu era ele. Meu Daimon falava comigo. E eu o ouvia.
Desde 1999 não sei o que é esse paraíso. Com o final da dor, foi-se o extase. O que nascia em mim, nunca mais nasceu. O que se comunicava em mim, calou-se. A voz de meu DAIMON foi perdida. A quimica me deu confiança e satisfação. Fez de mim um homem de meu tempo. Contente, nunca feliz. Satisfeito, jamais realizado.
Harold Bloom escreveu em 1995 um livro. Bloom, professor de Yale, maior critico literário vivo, esteve em 1994 numa grave depressão. O livro do qual agora falo é o relato do que nasceu após esse período.
"Presságios do Milênio. Sonhos, anjos e imortalidade". Esse é o nome do livro. Cheio de erudição, e criticando com ferocidade a New-Age, o livro fala exatamente disso : anjos, sonhos e vida pós-morte. Cabala, sufismo xiita, Jesus, mórmons, Freud e Nietzsche. Xamanismo e Shakespeare.
Primeiro dado : a língua da poesia é a língua da eternidade. Shakespeare, Milton, Blake, Marlowe têm a voz de outro mundo. Quando lemos em voz alta Shakespeare, estamos falando a linguagem além das aparencias, além da linguagem. Falamos a verdade. A mais verdadeira das mensagens, o que está além do tempo. Vozes de um tempo em que o extraordinário era comum.
Depois, a partir do século XIX , a ciencia se impõe como única verdade. Esse é um fato tão acachapante que eu- Tony Roxy- me sinto um perfeito idiota em ir contra ela. É tão grande essa tirania de único partido, que falar em Deus faz de mim menos inteligente, e ousar dizer a palavra anjo, faz de minha escrita, a escrita de uma besta. Por mais que saibamos que esta realidade não é a única realidade, nos é impossível sair do universo de causa e efeito. Tudo para nós precisará ser visto, pesado e analisado. Vivemos numa única realidade. Esta tela, este botão, este eu em mim.
Nesse mundo, Deus não pode existir. Não podemos ver milagres. Como olhar aquilo que não queremos olhar ? Como perceber o que nos é indiferente ? Como ouvir uma voz que não mais entendemos? Jogamos fora um dom que era nosso mais precioso. Ninguém está aqui por nós.
Bloom fala então do nascimento dos anjos. Sim. Do nascimento dos anjos no Irã, na época do primeiro grande profeta ocidental- Zarathustra. Que mundo era esse onde as pessoas viam anjos ? Onde tudo era um milagre ? Sim, uma parte de mim diz : Claro que tudo era milagre! Eles de nada sabiam! Ok... e nós sabemos o que ? A luz do sol faz a flor se abrir. Ela é fertilizada pelas abelhas. Mas isso, se eu souber ver, é um milagre. Ou será uma máquina funcional. Ciência ou poesia. Bloom explica o que, para os sufistas xiitas do Irã de hoje, é um anjo. - Temos 3 seres em nós : a carne, que come, vive e morre. A consciencia, que apreende, enxerga e fala. E uma fagulha divina, o anjo em nós. Ele se manifesta dentro do mais profundo de nós mesmos, ele fala em momentos de aterradora crise, ou do mais desenfreado extase. É nosso rosto da eternidade. Ele nunca muda, pois jamais se fez, não pode morrer, pois nunca nasceu. Observe, este livro foi escrito antes do atentado de 2001. Bloom diz que a ruptura da Europa e América com a tradição Iraniana é a maior tragédia espiritual do ocidente. Voce lê este livro e vê o quanto somos enganados, o quanto existe de preconceito contra a beleza do pensamento do Irã e Iraque, berço de toda idéia que conhecemos de Deus, vida e eternidade.
Beleza que prossegue na Cabala. Bloom, judeu, discorre maravilhosamente sobre os sábios estudiosos da Cabala. Um pensamento fantástico : tudo o que é dito se torna angelical ( e saiba, existem anjos muito maus ). A Cabala, centro de sabedoria, prega a divindade do homem, homem que não foi criado por Deus, que nasceu com Deus. Temos o livre arbitrio de fazer nosso futuro e de modificar nosso passado, pois nossa palavra é eterna, o que falamos dura para sempre.
Bloom discorre sobre a poesia, língua angelical. Cita Shakespeare, como ser ligado ao além-tempo, dono do vocabulário celestial, assim como, em menor escala, Blake, Milton, Marlowe e mais recentemente, e em brilho cada vez menor, Yeats, Eliot, Pessoa, Rilke.
Harold Bloom é um dos maiores fãs de Freud que existem, mas ele diz, com razão, que Freud é mal lido e mal usado. E o culpado por isso é o próprio Freud. Sigmund sonhava em ser um Darwin do séculoXX. Não foi e não é. Ele é um Montaigne, um Nietzsche, um Emerson. Um homem que escreveu um diário, genial, sobre sí mesmo. Não criou uma ciência, escreveu magnifica prosa. A INTERPRETAÇÃO DOS SONHOS é o maior e mais influente livro do séculoXX, e esse livro amaldiçoou toda nossa época.
Freud tinha pavor do sonho. Observe, para Freud não existe o futuro. Os sonhos foram formados na infancia, e passamos toda a vida reelaborando o material criado nessa infancia. Bloom cita risiveis interpretações de Freud sobre sonhos e mostra como ele temia ver no sonho qualquer sinal de transcendencia ou de aviso sobre o futuro. Nosso tempo, triste sina, embarcou nessa, pois Freud trouxe a promessa da racionalidade que 1900 queria - tudo se explica pela sexualidade reprimida. Freud, e seus seguidores, se tornaram uma espécie de pai-todo-poderoso, guiando o pobre analisando para suas respostas prontas. Mesmo assim, Bloom admira Freud, pela genial obra de ficção construida.
O livro continua, cada vez mais fascinante ( e com apenas 150 páginas de saber e erudição ). Ficamos sabendo sobre Tiago, o irmão de Jesus, do porque São Paulo o ter derrotado, se tornando a voz oficial do catolicismo. Descobrimos a sabedoria dos mórmons, o que eles pensam e porque vivem como vivem; e vem um pensamento fantástico : Jesus na cruz sentiu um extase. Não houve dor, houve a iluminação da morte maravilhosa, do renascimento. Para os muçulmanos, Jesus foi um anjo, como Gabriel.
Vem um forte capítulo sobre o xamanismo. O puro, com origem na Mongólia e que migrou para o Irã ( sempre o Irã ). Voce tem duas escolhas : o xamã é um esquizofrenico, ou ele é um homem em contato com sua verdadeira face. Um cogumelo pode fazer de voce um idiota. Mas para o xamã, não. Lhe dá visões, conselhos, sabedoria. Lhe faz ir além do tempo, ou, antes do tempo. Como na crucificação de Jesus, o xamã chega à morte, e volta, trazendo sua mensagem.
O livro tem muito, muito mais. É necessário ler. Fala dos testemunhos de quem quase morreu e viu a famosa "luz" ( desancando com todos esses testemunhos e destruindo os livrinhos Nova Era ) e explicando o que seria o tal de corpo astral ( via Cabala e Xiitas ). Fala de quem viu Ets e Ovnis e porque esses testemunhos são ridiculos. E do porque os testemunhos de quem viu anjos e demonios na Palestina de 1500 A/C são não apenas possíveis, como provavelmente corretos.
Para lhes dar água na boca, cito a frase de abertura do livro ( tirada de Lawrence Durrel, grande viajante e autor ingles do século XX ) :
"O homem está numa armadilha...e a bondade de nada lhe vale na nova ordem. Ninguém mais liga para isso, de uma maneira ou de outra. Bem e mal, pessimismo e otimismo- são uma questão de grupo sanguineo, não de disposição angélica. Quem algum dia se interessava e cuidava de nós, quem se preocupava com nosso destino e do mundo, foi substituido por outro que se regozija com nossa servidão à matéria e as partes mais baixas de nossa natureza." Expulsamos os anjos de nossa vida. Mas eles não existem fora de nós. Portanto, nós reprimimos aquilo que temos de mais verdadeiro, calamos a voz divina em nós. Os expulsamos por não podermos ver, pesar e medir esse anjo ( e aceitmaos tanta teoria que nunca foi pesada, medida e vista ). A ciencia venceu. E isso é inegável. Esmagou qualquer possibilidade de qualquer outra forma de entendimento. Nos anestesiou.
E vemos, por fim, que passando pelos judeus, pelos poetas provençais, pelos primeiros cristãos, pelos mórmons, pelos sufistas, pelo platonismo;em todos há essa busca, a busca do eu-angélico, do eu-além do tempo, da parte nossa que não é só nossa, é da vida; do melhor-eu. O anjo.
Tive vislumbres desse anjo. Me aterrorizou em momentos de pânico. Me maravilhou em tardes de poesia. Ele me acariciou quando estive feliz e mostrou seu rosto para meu amor, que o viu sem o saber, quando mais a amei. Foi meu balbuciar ao nascer e esteve conduzindo meus sonhos mais simples. Mas se foi, se escondeu no escuro em mim. Se escondeu quando sorri superior, vulgarizando a vida e explicando facilmente o inexplicável. Negando o verdadeiro em mim.
Por fim, há um capítulo no livro sobre o amor. Quando voce olha para seu amor e vê nesse amor o mais misterioso conhecimento. Quando voce lê esse corpo e vê nele o que existe de eternidade na vida. Então não é apenas sexo. É para sempre.
Em 1986 eu repudiei o mundo sensitivo. Tudo que era visível assustava e tudo que era real perdera seu valor. O mundo se tornara novo para mim, e assustador. Como na época não existia a popularização da síndrome do pânico, eu comecei a escrever. Textos em que via na crise a chance de renascimento. Eu acreditava estar nascendo. Todos os dias eram como partos complicados e tudo que eu via, lia, sentia, tinha uma ressonância de eternidade. De maravilhamento e de pavor. Um constante perigo. Alguma coisa brotava. Espíritas e umbandistas falavam em encosto. Nunca me convenceu. Simples demais. Procurei a psicanálise. Descobri que eu odiava e amava meu pai, que todo medo era frustração sexual, que eu estava num processo de amadurecimento. Me acalmei. Mas o medo permanecia. Menos misterioso. Mais real. E intocável. Descobriram, por acaso, que anti-depressivos curavam a síndrome. Tomei-os. O medo foi domesticado. Não era um novo ser que nascia. Não era sexo. Era uma simples e vulgar doença. Um problema de quimica cerebral. Tudo aquilo que escrevi e pensei no nascer da crise,mera fuga e fantasia.
Passei a ter adoração por psiquiatras. Gurus com soluções imediatas. Adaptação sem dor. Deliciosamente me tornei o racionalista radical. Religião é medo da morte. Arte é tentativa de ser eterno. Amor é jogo de sedução narcisista. A vida é um acaso quimico. Uma sopa que deu certo. E o homem, um macaco que enlouqueceu. Pó entre pó. Cheio de respostas prontas, me sentei no trono do adulto, rindo dos ingênuos, dos amantes, dos infantis. E é assim desde 1999. Porém há uma armadilha nisso tudo : me livrei do medo desconhecido, e com ele, perdi o encanto de viver. Não há mistério. Não há poesia.
Mas houve uma noite. Cheia de tola ingenuidade. Em que me sentei ao lado de meu amor. Aos pés da árvore que plantei em minha infância. Ficamos, eu e ela, em silêncio, como dois nadas que nada desejam, quietos e abraçados, na madrugada fria, sentados na grama e encostados um no outro, assistidos pela árvore grande. Uma promessa foi feita sem que nada fosse dito: éramos um. O que aconteceu ali eu nunca soube e nem saberei.
E houve um amanhecer. Frio e sem porque. Deitado sobre uma rocha, imensa e repleta de cracas, eu escutava o mar. Violento, barulhento, ele respingava ao meu redor e se tornava prata, amanhecia. Alguém dormia a meu lado. Mas eu estava só. Reencontrava o mar. Alguma coisa aconteceu naquela rocha e naquela manhã fria.
Numa tarde de fim de solidão. Eu descobri a poesia. Yeats se desvendava inteiro. Eu compreendia e absorvia tudo. Toda imagem fazia sentido. Sua voz se tornava a minha. Eu estava no paraíso. Sua torre, sua Irlanda, sua musa, tudo era meu pois naquela tarde eu era ele. Meu Daimon falava comigo. E eu o ouvia.
Desde 1999 não sei o que é esse paraíso. Com o final da dor, foi-se o extase. O que nascia em mim, nunca mais nasceu. O que se comunicava em mim, calou-se. A voz de meu DAIMON foi perdida. A quimica me deu confiança e satisfação. Fez de mim um homem de meu tempo. Contente, nunca feliz. Satisfeito, jamais realizado.
Harold Bloom escreveu em 1995 um livro. Bloom, professor de Yale, maior critico literário vivo, esteve em 1994 numa grave depressão. O livro do qual agora falo é o relato do que nasceu após esse período.
"Presságios do Milênio. Sonhos, anjos e imortalidade". Esse é o nome do livro. Cheio de erudição, e criticando com ferocidade a New-Age, o livro fala exatamente disso : anjos, sonhos e vida pós-morte. Cabala, sufismo xiita, Jesus, mórmons, Freud e Nietzsche. Xamanismo e Shakespeare.
Primeiro dado : a língua da poesia é a língua da eternidade. Shakespeare, Milton, Blake, Marlowe têm a voz de outro mundo. Quando lemos em voz alta Shakespeare, estamos falando a linguagem além das aparencias, além da linguagem. Falamos a verdade. A mais verdadeira das mensagens, o que está além do tempo. Vozes de um tempo em que o extraordinário era comum.
Depois, a partir do século XIX , a ciencia se impõe como única verdade. Esse é um fato tão acachapante que eu- Tony Roxy- me sinto um perfeito idiota em ir contra ela. É tão grande essa tirania de único partido, que falar em Deus faz de mim menos inteligente, e ousar dizer a palavra anjo, faz de minha escrita, a escrita de uma besta. Por mais que saibamos que esta realidade não é a única realidade, nos é impossível sair do universo de causa e efeito. Tudo para nós precisará ser visto, pesado e analisado. Vivemos numa única realidade. Esta tela, este botão, este eu em mim.
Nesse mundo, Deus não pode existir. Não podemos ver milagres. Como olhar aquilo que não queremos olhar ? Como perceber o que nos é indiferente ? Como ouvir uma voz que não mais entendemos? Jogamos fora um dom que era nosso mais precioso. Ninguém está aqui por nós.
Bloom fala então do nascimento dos anjos. Sim. Do nascimento dos anjos no Irã, na época do primeiro grande profeta ocidental- Zarathustra. Que mundo era esse onde as pessoas viam anjos ? Onde tudo era um milagre ? Sim, uma parte de mim diz : Claro que tudo era milagre! Eles de nada sabiam! Ok... e nós sabemos o que ? A luz do sol faz a flor se abrir. Ela é fertilizada pelas abelhas. Mas isso, se eu souber ver, é um milagre. Ou será uma máquina funcional. Ciência ou poesia. Bloom explica o que, para os sufistas xiitas do Irã de hoje, é um anjo. - Temos 3 seres em nós : a carne, que come, vive e morre. A consciencia, que apreende, enxerga e fala. E uma fagulha divina, o anjo em nós. Ele se manifesta dentro do mais profundo de nós mesmos, ele fala em momentos de aterradora crise, ou do mais desenfreado extase. É nosso rosto da eternidade. Ele nunca muda, pois jamais se fez, não pode morrer, pois nunca nasceu. Observe, este livro foi escrito antes do atentado de 2001. Bloom diz que a ruptura da Europa e América com a tradição Iraniana é a maior tragédia espiritual do ocidente. Voce lê este livro e vê o quanto somos enganados, o quanto existe de preconceito contra a beleza do pensamento do Irã e Iraque, berço de toda idéia que conhecemos de Deus, vida e eternidade.
Beleza que prossegue na Cabala. Bloom, judeu, discorre maravilhosamente sobre os sábios estudiosos da Cabala. Um pensamento fantástico : tudo o que é dito se torna angelical ( e saiba, existem anjos muito maus ). A Cabala, centro de sabedoria, prega a divindade do homem, homem que não foi criado por Deus, que nasceu com Deus. Temos o livre arbitrio de fazer nosso futuro e de modificar nosso passado, pois nossa palavra é eterna, o que falamos dura para sempre.
Bloom discorre sobre a poesia, língua angelical. Cita Shakespeare, como ser ligado ao além-tempo, dono do vocabulário celestial, assim como, em menor escala, Blake, Milton, Marlowe e mais recentemente, e em brilho cada vez menor, Yeats, Eliot, Pessoa, Rilke.
Harold Bloom é um dos maiores fãs de Freud que existem, mas ele diz, com razão, que Freud é mal lido e mal usado. E o culpado por isso é o próprio Freud. Sigmund sonhava em ser um Darwin do séculoXX. Não foi e não é. Ele é um Montaigne, um Nietzsche, um Emerson. Um homem que escreveu um diário, genial, sobre sí mesmo. Não criou uma ciência, escreveu magnifica prosa. A INTERPRETAÇÃO DOS SONHOS é o maior e mais influente livro do séculoXX, e esse livro amaldiçoou toda nossa época.
Freud tinha pavor do sonho. Observe, para Freud não existe o futuro. Os sonhos foram formados na infancia, e passamos toda a vida reelaborando o material criado nessa infancia. Bloom cita risiveis interpretações de Freud sobre sonhos e mostra como ele temia ver no sonho qualquer sinal de transcendencia ou de aviso sobre o futuro. Nosso tempo, triste sina, embarcou nessa, pois Freud trouxe a promessa da racionalidade que 1900 queria - tudo se explica pela sexualidade reprimida. Freud, e seus seguidores, se tornaram uma espécie de pai-todo-poderoso, guiando o pobre analisando para suas respostas prontas. Mesmo assim, Bloom admira Freud, pela genial obra de ficção construida.
O livro continua, cada vez mais fascinante ( e com apenas 150 páginas de saber e erudição ). Ficamos sabendo sobre Tiago, o irmão de Jesus, do porque São Paulo o ter derrotado, se tornando a voz oficial do catolicismo. Descobrimos a sabedoria dos mórmons, o que eles pensam e porque vivem como vivem; e vem um pensamento fantástico : Jesus na cruz sentiu um extase. Não houve dor, houve a iluminação da morte maravilhosa, do renascimento. Para os muçulmanos, Jesus foi um anjo, como Gabriel.
Vem um forte capítulo sobre o xamanismo. O puro, com origem na Mongólia e que migrou para o Irã ( sempre o Irã ). Voce tem duas escolhas : o xamã é um esquizofrenico, ou ele é um homem em contato com sua verdadeira face. Um cogumelo pode fazer de voce um idiota. Mas para o xamã, não. Lhe dá visões, conselhos, sabedoria. Lhe faz ir além do tempo, ou, antes do tempo. Como na crucificação de Jesus, o xamã chega à morte, e volta, trazendo sua mensagem.
O livro tem muito, muito mais. É necessário ler. Fala dos testemunhos de quem quase morreu e viu a famosa "luz" ( desancando com todos esses testemunhos e destruindo os livrinhos Nova Era ) e explicando o que seria o tal de corpo astral ( via Cabala e Xiitas ). Fala de quem viu Ets e Ovnis e porque esses testemunhos são ridiculos. E do porque os testemunhos de quem viu anjos e demonios na Palestina de 1500 A/C são não apenas possíveis, como provavelmente corretos.
Para lhes dar água na boca, cito a frase de abertura do livro ( tirada de Lawrence Durrel, grande viajante e autor ingles do século XX ) :
"O homem está numa armadilha...e a bondade de nada lhe vale na nova ordem. Ninguém mais liga para isso, de uma maneira ou de outra. Bem e mal, pessimismo e otimismo- são uma questão de grupo sanguineo, não de disposição angélica. Quem algum dia se interessava e cuidava de nós, quem se preocupava com nosso destino e do mundo, foi substituido por outro que se regozija com nossa servidão à matéria e as partes mais baixas de nossa natureza." Expulsamos os anjos de nossa vida. Mas eles não existem fora de nós. Portanto, nós reprimimos aquilo que temos de mais verdadeiro, calamos a voz divina em nós. Os expulsamos por não podermos ver, pesar e medir esse anjo ( e aceitmaos tanta teoria que nunca foi pesada, medida e vista ). A ciencia venceu. E isso é inegável. Esmagou qualquer possibilidade de qualquer outra forma de entendimento. Nos anestesiou.
E vemos, por fim, que passando pelos judeus, pelos poetas provençais, pelos primeiros cristãos, pelos mórmons, pelos sufistas, pelo platonismo;em todos há essa busca, a busca do eu-angélico, do eu-além do tempo, da parte nossa que não é só nossa, é da vida; do melhor-eu. O anjo.
Tive vislumbres desse anjo. Me aterrorizou em momentos de pânico. Me maravilhou em tardes de poesia. Ele me acariciou quando estive feliz e mostrou seu rosto para meu amor, que o viu sem o saber, quando mais a amei. Foi meu balbuciar ao nascer e esteve conduzindo meus sonhos mais simples. Mas se foi, se escondeu no escuro em mim. Se escondeu quando sorri superior, vulgarizando a vida e explicando facilmente o inexplicável. Negando o verdadeiro em mim.
Por fim, há um capítulo no livro sobre o amor. Quando voce olha para seu amor e vê nesse amor o mais misterioso conhecimento. Quando voce lê esse corpo e vê nele o que existe de eternidade na vida. Então não é apenas sexo. É para sempre.
MACHINHO E FEMEÃO, UMA COMÉDIA
Quadris largos para parir e seios grandes para amamentar. Fartos e brilhantes cabelos como um sinal de boa saúde. Todos sabemos que aquilo que nos atrai sexualmente, nada mais é que um convite à reprodução. Como seres pré-históricos, animais-que somos, o instinto´de permanência através da prole, nos domina. Para as mulheres, a atração está no homem que possa garantir proteção durante a gravidez, alimentação para os filhos e tenha algo a ensinar para os herdeiros. Quando uma mulher sente atração pelo bacana de Ferrari, sua atração é pela segurança e habilidade que o veículo promete, nunca pela beleza do metal vermelho.
Mas a década da crise ( 60/70 ) mudou isso, e não digo que foi para pior, apenas nos deixou mais ansiosos. Até então, o homem desejava, a mulher fingia não querer. Era a união do querer com o ser desejado. Ao homem competia flertar e conquistar, a mulher, observar e se exibir. Um conquistava demonstrando decisão, inteligência e poder; a outra, beleza, charme e feminilidade.
Quando o soldado volta de cinco anos de guerra ( 1945 ), é dado o primeiro sinal : o mundo funcionou muito bem sem ele. As suas mulherzinhas fizeram tudo aquilo que eles faziam, e bem. Elas percebem isso, e se preparam para sair da casca. A partir de 1960, o mercado lança com grande alvoroço, uma idéia, que hoje parece óbvia, mas não era : nada vende mais que aquilo que faz o comprador sentir-se "único". Ninguém mais quer o que todos querem, voce tem a ilusão de querer aquilo que só voce conhece. A mulher é esse produto misterioso e novo, ela vende e compra a idéia de mistério, de novidade, de coragem. Ela manda.
Vem o absurdo : o homem não é mais o provedor único. Não é mais o conquistador único. A mulher tem tesão, ela deseja! O que fazer ? Se ela me deseja, preciso ser desejável. O que é desejável ? A mulher é desejável. Então, para ser desejável, usarei as armas da mulher : me torno feminino. Cômica tragédia: iludido, o homem tenta atrair fêmeas usando cremes, depilações, torneando o corpo, fazendo pose. Atrai outros homens, e todos passam a entender cada vez menos a mulher. O homem se descobre, e, narciso, fica se admirando no espelho e sendo admirado pelos amigos, que querem ser também como ele : o desejável. Para quem?
A mulher, livre para ser e para ter, exibindo o tesão livremente, perde como referencia o provedor. Em seu consciente, ela deseja um novo homem para uma nova mulher. Porém, ela, mais que ninguém, não faz a menor idéia do que seja esse novo homem. Olha ao redor e tudo que vê são pavões se pavoneando, ou faLsoso machos assustados. Erro fatal, ela passa a fazer tudo aquilo que condenava no homem : amantes descartáveis e jovens. Vazio. Seu instinto pede que seu companheiro lhe seja admirável e seguro, em vez disso ela obtèm um machinho-feminino
Homens no espelho/ mulheres no trabalho. Onde nosso modelo??????
Ps. Agradeço a Cotardo Calligaris pela inspiração.
Mas a década da crise ( 60/70 ) mudou isso, e não digo que foi para pior, apenas nos deixou mais ansiosos. Até então, o homem desejava, a mulher fingia não querer. Era a união do querer com o ser desejado. Ao homem competia flertar e conquistar, a mulher, observar e se exibir. Um conquistava demonstrando decisão, inteligência e poder; a outra, beleza, charme e feminilidade.
Quando o soldado volta de cinco anos de guerra ( 1945 ), é dado o primeiro sinal : o mundo funcionou muito bem sem ele. As suas mulherzinhas fizeram tudo aquilo que eles faziam, e bem. Elas percebem isso, e se preparam para sair da casca. A partir de 1960, o mercado lança com grande alvoroço, uma idéia, que hoje parece óbvia, mas não era : nada vende mais que aquilo que faz o comprador sentir-se "único". Ninguém mais quer o que todos querem, voce tem a ilusão de querer aquilo que só voce conhece. A mulher é esse produto misterioso e novo, ela vende e compra a idéia de mistério, de novidade, de coragem. Ela manda.
Vem o absurdo : o homem não é mais o provedor único. Não é mais o conquistador único. A mulher tem tesão, ela deseja! O que fazer ? Se ela me deseja, preciso ser desejável. O que é desejável ? A mulher é desejável. Então, para ser desejável, usarei as armas da mulher : me torno feminino. Cômica tragédia: iludido, o homem tenta atrair fêmeas usando cremes, depilações, torneando o corpo, fazendo pose. Atrai outros homens, e todos passam a entender cada vez menos a mulher. O homem se descobre, e, narciso, fica se admirando no espelho e sendo admirado pelos amigos, que querem ser também como ele : o desejável. Para quem?
A mulher, livre para ser e para ter, exibindo o tesão livremente, perde como referencia o provedor. Em seu consciente, ela deseja um novo homem para uma nova mulher. Porém, ela, mais que ninguém, não faz a menor idéia do que seja esse novo homem. Olha ao redor e tudo que vê são pavões se pavoneando, ou faLsoso machos assustados. Erro fatal, ela passa a fazer tudo aquilo que condenava no homem : amantes descartáveis e jovens. Vazio. Seu instinto pede que seu companheiro lhe seja admirável e seguro, em vez disso ela obtèm um machinho-feminino
Homens no espelho/ mulheres no trabalho. Onde nosso modelo??????
Ps. Agradeço a Cotardo Calligaris pela inspiração.
RETRATO DE UMA SENHORA- HENRY JAMES
Uma questão de linguagem. James, melhor escritor que a América já produziu, é um mestre na arte da escrita, a mais difícil das artes. Seu modo de desenvolver pensamentos, humilha todo escritor sem gênio e é a melhor das lições a quem queira aprender a não só escrever, mas a quem deseje aprender a pensar.
Ele não faz como a maioria dos autores, que nos apresentam uma personagem "tipo" alguém que já conhecemos, real ou ficcional. Não há em James um vilão tipo Iago, uma ambiciosa tipo Lady Macbeth ou uma heroína como Cordelia. Não há nada fácil assim. Ele cria gente que é como sí-mesma. Cria do nada, não usa modelos, não vulgariza, não é preto ou branco. Henry James cria um milhão de tons de cinza e bilhôes de graduações de branco. É um deus do romance.
Isabel Archer é o centro deste magnífico livro. Observamos tudo em Isabel. Suas tolices, seus encantos, seus desejos e suas ilusões. Nos apaixonamos por ela e depois a detestamos. E tornamos a amá-la. James nada teme. Para ele, gênio que é, não existe a modéstia : ele avança sem nenhum pudor. Sua arte suprema é a arte de esgotar a escrita.
Como se cada sílaba fosse uma nota musical e cada frase uma harmonia, Henry James cria em toda página um concerto digno de Mozart ( apesar que o tom é puro Schubert ). Ele domina completamente toda a habilidade de se descrever, dissecar, ritmar, encantar, expor através de verbo e substantivo. Sua escrita, com a única companhia de Proust, é a mais preciosa possível. Inimitável e inigualável, brilha como estrela e demonstra com absorvente precisão.
Dono da mais alta elegância, ele tem a coragem de nunca descrever o chocante ou o sensacional. Ele opta por aquilo que prenuncia a tragédia, salta sobre a dor e retoma a corrente a partir do final do luto. Discreto, nunca apela para a imagem grotesca, evita o choque, o que pareceria gratuito, arbitrário, forçado. Sua história é natural, verdadeira, preciosa e completamente refinada.
Ler James é sempre um prazer. Ele nos dá o testemunho de uma inteligência superior, demonstra a percepção de uma vida melhor e ensina a nossa sensibilidade a captar sinais finos, raros, especiais. Henry James paira, altaneiro, indiferente, superior, sobre todos os outros autores do século, sendo um desafio a quem pensa escrever "bem", a quem deseja pensar " bem". A escrita atinge sua mais alta definição, descrição do mundo, do sentimento, do pensamento e do abstrato. Com James, a escrita se torna um universo.
Ele não faz como a maioria dos autores, que nos apresentam uma personagem "tipo" alguém que já conhecemos, real ou ficcional. Não há em James um vilão tipo Iago, uma ambiciosa tipo Lady Macbeth ou uma heroína como Cordelia. Não há nada fácil assim. Ele cria gente que é como sí-mesma. Cria do nada, não usa modelos, não vulgariza, não é preto ou branco. Henry James cria um milhão de tons de cinza e bilhôes de graduações de branco. É um deus do romance.
Isabel Archer é o centro deste magnífico livro. Observamos tudo em Isabel. Suas tolices, seus encantos, seus desejos e suas ilusões. Nos apaixonamos por ela e depois a detestamos. E tornamos a amá-la. James nada teme. Para ele, gênio que é, não existe a modéstia : ele avança sem nenhum pudor. Sua arte suprema é a arte de esgotar a escrita.
Como se cada sílaba fosse uma nota musical e cada frase uma harmonia, Henry James cria em toda página um concerto digno de Mozart ( apesar que o tom é puro Schubert ). Ele domina completamente toda a habilidade de se descrever, dissecar, ritmar, encantar, expor através de verbo e substantivo. Sua escrita, com a única companhia de Proust, é a mais preciosa possível. Inimitável e inigualável, brilha como estrela e demonstra com absorvente precisão.
Dono da mais alta elegância, ele tem a coragem de nunca descrever o chocante ou o sensacional. Ele opta por aquilo que prenuncia a tragédia, salta sobre a dor e retoma a corrente a partir do final do luto. Discreto, nunca apela para a imagem grotesca, evita o choque, o que pareceria gratuito, arbitrário, forçado. Sua história é natural, verdadeira, preciosa e completamente refinada.
Ler James é sempre um prazer. Ele nos dá o testemunho de uma inteligência superior, demonstra a percepção de uma vida melhor e ensina a nossa sensibilidade a captar sinais finos, raros, especiais. Henry James paira, altaneiro, indiferente, superior, sobre todos os outros autores do século, sendo um desafio a quem pensa escrever "bem", a quem deseja pensar " bem". A escrita atinge sua mais alta definição, descrição do mundo, do sentimento, do pensamento e do abstrato. Com James, a escrita se torna um universo.
CHER/WONDER BOYS/JULIE ANDREWS/JAMES STEWART/O REI E EU
Filmes que assisti nesses dias de frio e de ócio...
TURNER E HOOCH de Roger Spottiswood com Tom Hanks e Hooch
Total sessão da tarde anos 90. É o filme do jovem Hanks, policial, que tem de morar com o cão mais babão do planeta. Uma bobagem que sempre me diverte. Mas sei que sou suspeito para comentar filmes com cães.....o animal é 10, o filme vale nota 4.
AO RUFAR DOS TAMBORES de John Ford com Claudette Colbert e Henry Fonda
Um muito colorido Ford, contando os apuros de jovem casal na América de 1780. Todos os temas de Ford estão presentes : a fé, a família, a união da comunidade, as festas e os enterros. Não é um dos grandes, falta a poesia estratosférica de seus momentos culminantes. nota 6.
FEITIÇO DA LUA de Norman Jewison com Cher, Nicolas Cage, Danny Aielo
Em suas listas os americanos colocam este filme entre as maiores "comédias" da história. Waaaal.... sua primeira hora é chata pacas, mas depois fica legal. Deu o Oscar para Cher e Cage faz as caras e bocas de sempre. Não é uma comédia, é mais uma crônica sobre a solidão. nota 5.
MERMAIDS de Richard Benjamin com Cher, Winona Ryder, Christina Ricci e Bob Hoskins
Vem no mesmo DVD de Feitiço, mas é muito melhor. A história de uma mãe muito moderna e doida ( em 1963 ) e suas duas filhas, uma criança com mania por água ( uma Christina Ricci maravilhosamente natural ) e outra com mania católica ( o melhor papel da vida de Winona ). Hoskins está encantador como o alegre e descomplicado namorado da mãe. Um filme muito bonito e que não teme resvalar no melô. nota 7.
WONDER BOYS de Curtis Hanson com Michael Douglas, Robert Downey Jr, Frances McDormand, Tobey Maguire.
Existem filmes que nos pegam. São obras maravilhosas, mas não são "o melhor" filme. Mas os revemos sempre e passam a nos acompanhar pela vida como amigos queridos. É assim, em minha vida com All That Jazz, Os Eleitos, My Fair Lady e Hatari. São todos filmes excelentes, atingindo às vezes o nivel mais alto imaginável; mas não são tão "arte" como são Cabaret, Oito e Meio ou Persona. Creio que tem algo a ver com ambiente. Esses filmes mostram um local onde eu gostaria de viver, pessoas com as quais eu adoraria conviver e têm um personagem com o qual me identifico cem por cento ( o que não significa que o veja como herói ). Wonder Boys, que reví pela quarta vez em cinco anos, é isso. Mostra um fim de semana desastroso de um desastrado professor de redação. Tudo no filme me seduz : a trilha sonora, os atores ( até o chatinho Tobey ), os sets, e o maravilhoso roteiro. Vemos um cão ser assassinado, uma festa de escritores chatos, vários baseados e um livro voando numa tarde fria. Hanson dirige com rara felicidade. As cenas se encadeiam sem pressa e sem morosidade, duram o tempo certo. Douglas está frágil, cativante, e muito engraçado e Downey dá uma aula de finesse em comédia. Uma festa em forma de filme, uma inspiração, uma delicia. nota Dez!!!!!!!!!!!!
APERTEM OS CINTOS O PILOTO SUMIU de Zucker, Abrahams e Abrahams
A tal enquete americana colocou este filme no top 10. Inaugura o estilo de humor muito idiota e grosseiro que se mantém até hoje. Tem poucas risadas, mas a gente se entretém, esperando até onde a doideira pode chegar. nota 4.
THE STAR! de Robert Wise com Julie Andrews e Daniel Massey
O grande Wise começou a desandar com este caro e imenso fracasso. Esta biografia de Gertrude Lawrence tem um grave problema : a vida de Lawrence tem pouco drama. A primeira parte deste filme é fascinante. É um prazer ver como era o music-hall londrino nos anos 20, ver Massey interpretar um delicioso Noel Coward e ouvir as canções de Coward, espertas e maliciosas, que revolucionaram o show-bizz da época, criando a imagem do super-star. Mas depois, nas duas horas restantes, o que vemos são suntuosos shows, cenários caríssimos e uma diva sofrendo de solidão glamurosa. É pouco para segurar o filme. Mas, pelo inicio...nota 5.
PEEPING TOM de Michael Powell
Por falar em desastre... Este é clássico. Powell, um dos mais talentosos e famosos dos diretores ingleses, após uma dúzia de clássicos maravilhosos, resolve lançar este filme. E este filme destrói sua carreira e recebe uma das reações mais iradas que um filme já recebeu. Tudo em Powell era belo. Seus filmes, pretensiosos, eruditos, muito bem escritos, agradavam ao público comum e ao público metido. Mas este filme desagradou e ofendeu a todos. Porque ? Bem... ele é ruim. Talvez o mais neurótico filme que já vi. Fala de um fotógrafo em Londres que precisa filmar assassinatos. Crimes que ele próprio comete. O filme mostra essa compulsão voyerística- a de gravar o medo. As falas são atrozes, as cenas têm cores avermelhadas e tudo no filme se parece com um pesadelo eternamente repetido. Após esta obra, Powell passou a fazer filmes classe b e perdeu toda a atenção de público e crítica. Em 1968 fez inclusive "A Idade da Reflexão", que considero o filme mais feliz já feito. Bem... em 1980 Martin Scorsese, com a ajuda de Lucas e Coppolla, fez um festival Powell em Nova York. A justiça ao brilhante diretor de Sapatinhos Vermelhos e de Coronel Blimp foi feita. Mas este filme ( que tem um clima identico ao de Taxi Driver ), não merece ser descoberto. Um clamoroso erro e um filme detestável. nota zero!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
TERRÍVEL SUSPEITA de Robert Wise com Valentina Cortese e Richard Baseheart
Filme do começo da carreira de Wise. Uma mulher dá um golpe do baú. Mas nada é o que parece ser... Falar o que? O roteiro engenhoso, convence e nos deixa totalmente ligados, o cenário é perfeito, os atores não poderiam ser mais apropriados. Repare : nenhuma cena sobra. Nada parece durar mais do que devia. Tudo é exato, enxuto, lógico, correto, bem feito. Não há um único exagero, um só take mal costurado. Isto é cinema em seu maior grau de perfeição, de diversão, de entretenimento. Pop, muito pop, mas cheio de respeito ao público. nota 8.
ANATOMIA DE UM CRIME de Otto Preminger com James Stewart, Lee Remick, Ben Gazarra, George C.Scott e Arthur O'Connel.
Filme de tribunal. Longo e sério. E impecável. Stewart é um advogado banal. O crime em que ele se envolve é banal. A corte da cidade interiorana é banal. Mas voce se entrega ao espetáculo. Torce. Tem dúvidas. Dá vereditos. Se envolve completamente. É a magia irresitível do cinema. A música é de Duke Ellington ( ele aparece numa cena ), a foto de Sam Leavitt, e James Stewart está como sempre : perfeito, nobre, um imã em nosso olhar. nota 9.
O REI E EU de Walter Lang com Deborah Kerr e Yul Brynner
Talvez o maior sucesso da história da Broadway. As músicas de Richard Rodgers são um tipo de opereta à Bizet. Mágicas. Nos deixam otimistas e em estado de encantamento. Kerr está competente, daquela forma muito inglesa, como é de se esperar nessa atriz tão agradável; mas o filme é de Brynner. Muito mal ator, mal cantor, o canastrão maior. Mas então um milagre acontece : mesmo vendo o quanto ele é ruim, nos sentimos exatamente como a professora inglesa : caímos em seu encanto, rimos com suas frases, perdoamos sua falta de talento, e sabemos que jamais nos esqueceremos desse rei. Um dos maiores mistérios e um dos mais inescrutáveis milagres do cinema : é esta atuação de sorte e de voodoo de Yul Brynner. O resto do filme é desfrutável, um pouco meloso demais... a não ser uma cena de genialidade soberba : a apresentação de A Cabana do Pai Tomás em versão tailandesa. São minutos de coreografia de Jerome Robbins superlativa. Vemos alí, cenários, roupas, música de uma modernidade, de um gosto, de uma beleza arrojada ainda insuperável. Por essa cena e pelo trabalho de Yul. nota 9.
VAN GOGH de Robert Altman com Tim Roth e Paul Rhys
Não dá. Nunca saberemos como Vincent era. Nunca saberemos como Gauguin era. Este filme tem a lenga-lenga das loucuras de Van Gogh e da empáfia de Paul. Muito chato, muito metido, muito louco, muito sujo. Uma pena, pois Roth nasceu para este papel. nota zero.
TURNER E HOOCH de Roger Spottiswood com Tom Hanks e Hooch
Total sessão da tarde anos 90. É o filme do jovem Hanks, policial, que tem de morar com o cão mais babão do planeta. Uma bobagem que sempre me diverte. Mas sei que sou suspeito para comentar filmes com cães.....o animal é 10, o filme vale nota 4.
AO RUFAR DOS TAMBORES de John Ford com Claudette Colbert e Henry Fonda
Um muito colorido Ford, contando os apuros de jovem casal na América de 1780. Todos os temas de Ford estão presentes : a fé, a família, a união da comunidade, as festas e os enterros. Não é um dos grandes, falta a poesia estratosférica de seus momentos culminantes. nota 6.
FEITIÇO DA LUA de Norman Jewison com Cher, Nicolas Cage, Danny Aielo
Em suas listas os americanos colocam este filme entre as maiores "comédias" da história. Waaaal.... sua primeira hora é chata pacas, mas depois fica legal. Deu o Oscar para Cher e Cage faz as caras e bocas de sempre. Não é uma comédia, é mais uma crônica sobre a solidão. nota 5.
MERMAIDS de Richard Benjamin com Cher, Winona Ryder, Christina Ricci e Bob Hoskins
Vem no mesmo DVD de Feitiço, mas é muito melhor. A história de uma mãe muito moderna e doida ( em 1963 ) e suas duas filhas, uma criança com mania por água ( uma Christina Ricci maravilhosamente natural ) e outra com mania católica ( o melhor papel da vida de Winona ). Hoskins está encantador como o alegre e descomplicado namorado da mãe. Um filme muito bonito e que não teme resvalar no melô. nota 7.
WONDER BOYS de Curtis Hanson com Michael Douglas, Robert Downey Jr, Frances McDormand, Tobey Maguire.
Existem filmes que nos pegam. São obras maravilhosas, mas não são "o melhor" filme. Mas os revemos sempre e passam a nos acompanhar pela vida como amigos queridos. É assim, em minha vida com All That Jazz, Os Eleitos, My Fair Lady e Hatari. São todos filmes excelentes, atingindo às vezes o nivel mais alto imaginável; mas não são tão "arte" como são Cabaret, Oito e Meio ou Persona. Creio que tem algo a ver com ambiente. Esses filmes mostram um local onde eu gostaria de viver, pessoas com as quais eu adoraria conviver e têm um personagem com o qual me identifico cem por cento ( o que não significa que o veja como herói ). Wonder Boys, que reví pela quarta vez em cinco anos, é isso. Mostra um fim de semana desastroso de um desastrado professor de redação. Tudo no filme me seduz : a trilha sonora, os atores ( até o chatinho Tobey ), os sets, e o maravilhoso roteiro. Vemos um cão ser assassinado, uma festa de escritores chatos, vários baseados e um livro voando numa tarde fria. Hanson dirige com rara felicidade. As cenas se encadeiam sem pressa e sem morosidade, duram o tempo certo. Douglas está frágil, cativante, e muito engraçado e Downey dá uma aula de finesse em comédia. Uma festa em forma de filme, uma inspiração, uma delicia. nota Dez!!!!!!!!!!!!
APERTEM OS CINTOS O PILOTO SUMIU de Zucker, Abrahams e Abrahams
A tal enquete americana colocou este filme no top 10. Inaugura o estilo de humor muito idiota e grosseiro que se mantém até hoje. Tem poucas risadas, mas a gente se entretém, esperando até onde a doideira pode chegar. nota 4.
THE STAR! de Robert Wise com Julie Andrews e Daniel Massey
O grande Wise começou a desandar com este caro e imenso fracasso. Esta biografia de Gertrude Lawrence tem um grave problema : a vida de Lawrence tem pouco drama. A primeira parte deste filme é fascinante. É um prazer ver como era o music-hall londrino nos anos 20, ver Massey interpretar um delicioso Noel Coward e ouvir as canções de Coward, espertas e maliciosas, que revolucionaram o show-bizz da época, criando a imagem do super-star. Mas depois, nas duas horas restantes, o que vemos são suntuosos shows, cenários caríssimos e uma diva sofrendo de solidão glamurosa. É pouco para segurar o filme. Mas, pelo inicio...nota 5.
PEEPING TOM de Michael Powell
Por falar em desastre... Este é clássico. Powell, um dos mais talentosos e famosos dos diretores ingleses, após uma dúzia de clássicos maravilhosos, resolve lançar este filme. E este filme destrói sua carreira e recebe uma das reações mais iradas que um filme já recebeu. Tudo em Powell era belo. Seus filmes, pretensiosos, eruditos, muito bem escritos, agradavam ao público comum e ao público metido. Mas este filme desagradou e ofendeu a todos. Porque ? Bem... ele é ruim. Talvez o mais neurótico filme que já vi. Fala de um fotógrafo em Londres que precisa filmar assassinatos. Crimes que ele próprio comete. O filme mostra essa compulsão voyerística- a de gravar o medo. As falas são atrozes, as cenas têm cores avermelhadas e tudo no filme se parece com um pesadelo eternamente repetido. Após esta obra, Powell passou a fazer filmes classe b e perdeu toda a atenção de público e crítica. Em 1968 fez inclusive "A Idade da Reflexão", que considero o filme mais feliz já feito. Bem... em 1980 Martin Scorsese, com a ajuda de Lucas e Coppolla, fez um festival Powell em Nova York. A justiça ao brilhante diretor de Sapatinhos Vermelhos e de Coronel Blimp foi feita. Mas este filme ( que tem um clima identico ao de Taxi Driver ), não merece ser descoberto. Um clamoroso erro e um filme detestável. nota zero!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
TERRÍVEL SUSPEITA de Robert Wise com Valentina Cortese e Richard Baseheart
Filme do começo da carreira de Wise. Uma mulher dá um golpe do baú. Mas nada é o que parece ser... Falar o que? O roteiro engenhoso, convence e nos deixa totalmente ligados, o cenário é perfeito, os atores não poderiam ser mais apropriados. Repare : nenhuma cena sobra. Nada parece durar mais do que devia. Tudo é exato, enxuto, lógico, correto, bem feito. Não há um único exagero, um só take mal costurado. Isto é cinema em seu maior grau de perfeição, de diversão, de entretenimento. Pop, muito pop, mas cheio de respeito ao público. nota 8.
ANATOMIA DE UM CRIME de Otto Preminger com James Stewart, Lee Remick, Ben Gazarra, George C.Scott e Arthur O'Connel.
Filme de tribunal. Longo e sério. E impecável. Stewart é um advogado banal. O crime em que ele se envolve é banal. A corte da cidade interiorana é banal. Mas voce se entrega ao espetáculo. Torce. Tem dúvidas. Dá vereditos. Se envolve completamente. É a magia irresitível do cinema. A música é de Duke Ellington ( ele aparece numa cena ), a foto de Sam Leavitt, e James Stewart está como sempre : perfeito, nobre, um imã em nosso olhar. nota 9.
O REI E EU de Walter Lang com Deborah Kerr e Yul Brynner
Talvez o maior sucesso da história da Broadway. As músicas de Richard Rodgers são um tipo de opereta à Bizet. Mágicas. Nos deixam otimistas e em estado de encantamento. Kerr está competente, daquela forma muito inglesa, como é de se esperar nessa atriz tão agradável; mas o filme é de Brynner. Muito mal ator, mal cantor, o canastrão maior. Mas então um milagre acontece : mesmo vendo o quanto ele é ruim, nos sentimos exatamente como a professora inglesa : caímos em seu encanto, rimos com suas frases, perdoamos sua falta de talento, e sabemos que jamais nos esqueceremos desse rei. Um dos maiores mistérios e um dos mais inescrutáveis milagres do cinema : é esta atuação de sorte e de voodoo de Yul Brynner. O resto do filme é desfrutável, um pouco meloso demais... a não ser uma cena de genialidade soberba : a apresentação de A Cabana do Pai Tomás em versão tailandesa. São minutos de coreografia de Jerome Robbins superlativa. Vemos alí, cenários, roupas, música de uma modernidade, de um gosto, de uma beleza arrojada ainda insuperável. Por essa cena e pelo trabalho de Yul. nota 9.
VAN GOGH de Robert Altman com Tim Roth e Paul Rhys
Não dá. Nunca saberemos como Vincent era. Nunca saberemos como Gauguin era. Este filme tem a lenga-lenga das loucuras de Van Gogh e da empáfia de Paul. Muito chato, muito metido, muito louco, muito sujo. Uma pena, pois Roth nasceu para este papel. nota zero.
A GENTE PENSA PRA CARAMBA E NÃO ACERTA UMA
Naquele ano eu tinha 17 , e aos 17 a gente tenta adivinhar o futuro. E tem certeza de ter acertado.
Foi bem louco aquele ano. Eu cantava numa banda de rock. E naquela época ninguém tava nem aí pra rock made in Brasil. A banda era ruim demais. Um som meio Yes e meio Genesis. E eu odiava Yes e Genesis. Mas sabe como é, em banda quem manda é o guitarrista e eu nunca consegui aprender a tocar nada. Meu sonho era fazer um som tipo "Their Satanic Majesties Request". E eu pensava no futuro... Tinha a certeza de que o futuro da música brasileira estava em Itamar Assumpção e também em Arrigo Barnabé. Santa inocência ! Aos 17 eu pensava que as coisas iam se refinar no futuro, que Stockhausen e Berg iam tocar no rádio e que as letras, sem censura, falariam de sexo e amor de uma forma muito criativa e ousada. Não imaginava que nos reduziríamos ao "Quadradinho" e "Vai Vagabunda!"
Torcia pelo Flamengo e tinha plena certeza que Zico e Tita seriam os dois maiores jogadores da história do Brasil e do mundo. E que o galinho ganharia duas copas do mundo. E que em 2000 o Fla teria um estádio do tamanho do Maraca e seria um clube grande como a Juve ou a Inter. Não se falava no Real e muito menos no Manchester. Aliás, eu tinha certeza que a Holanda seria sempre a melhor seleção da Europa.
Pensava que todos os nossos presidentes eleitos seriam finos intelectuais de esquerda. Aliás, eu pensava que todo cara de esquerda fosse fino e culto. Pensava que eles todos gostassem de Bergman, de Tolstoi e de Bob Dylan. E achava que seria impossível os EUA terem um presidente pior que Ronnie Reagan. Guerras seriam passado. Mas estaríamos sofrendo com o ar poluído e quase sem floresta nenhuma. A Europa seria um museu e o Japão mandaria no mundo.
Aos 17 eu achava que todo mundo no ano 2001 usaria drogas. Mas não drogas contra a depressão ou estimulantes para não dormir. Seriam drogas para aumentar a percepção e para se libertar de medos e prisões. E achava que o sexo livre faria da gente seres mais sensíveis e menos neuróticos. Pois é...
Na tv voce escolheria entre assistir uma sinfonia de Mozart, um desenho muito louco sobre viagens espaciais ou um documentário sobre Henry Moore. A gente ia fazer a própria programação e assistir quando quisesse e as pessoas mais idiotas seriam lentamente menos idiotas. Seria uma tv sem a pressão dos patrocinadores, porque a gente ia pagar por ela e isso bastaria para a manter. Santo crianção eu era !
O cinema do futuro seria algo parecido com Blow-Out de de Palma ou Mean Streets de Scorsese. As pessoas assistiriam um tipo de filme real, duro, ágil e muito honesto. Cheio de emoções verdadeiras. Os atores e diretores mandariam os produtores pra casa e fariam os filmes que quisessem. Uns 40 filmes estreiariam toda semana..... 40 escolhas......
Aos 17 eu pensei que James Bond, Rocky, quadrinhos da Marvel e Inspetor Clouseau seriam coisas de passado distante; assim como talk-show, Silvio Santos, Hebe, Renato Aragão e Woody Allen. Jamais imaginei que as pessoas iam chegar ao ponto de querer assistir uns imbecís dormindo ou jantando ! E que documentários sobre bichos mostrassem mais o apresentador-ego- estrela do que o animal apresentado !
Pensei que a pintura iria acabar ( e acho que foi meu grande acerto ) e que o teatro teria dúzias de Becketts, Pinters e Lorcas. Um otimista aos 17, eu tinha certeza que o mundo teria se esquecido da existência do Yes, do Genesis, do Rush e de Gentle Giant. Que todo mundo ia ser meio Eno ou Iggy Pop, minimalistas ou primais. Jamais pensei que em 2009 as pessoas ainda dessem bola pra jovens de cabelinhos soltos usando guitarra/baixo e bateria para falar dos mesmos assuntos/do mesmo modo; assuntos que com 17 eu já achava beeeem boring... Guitarras até poderiam ser usadas, mas como Iggy fazia naquela época, eram guitarras que anunciavam a morte das guitarras. Mas o própio Iggy se cansou e sentou a bunda no sofá de veludo.
Jamais pensei que haveria um micro-ondas, o celular e a internet. Mas tinha certeza que o câncer seria curado como uma gripe e que tuberculose, meningite e sarampo seriam doenças desaparecidas. Não pensei que as pessoas teriam horror/vergonha de serem velhos e que o padrão de beleza seria a anorexia. Pensei que as pessoas teriam o relax de aceitar sua natureza.
Tinha certeza que estaria solteiro aos 40 ( acertei ! ). Mas ver homens depilando pernas e peito... jamais ! E garotos ouvindo Chico/ Milton/ Gal... tá brincando?????
Mas errei. Todos erram aos 17. Não haverá uma base lunar, não existe jazz na tv, o cinema não evoluiu, o rock continua exatamente igual. A direita continua egoísta e a esquerda cega. O sexo satisfaz apenas a libido e não muda o mundo. A aids não tem cura completa e as neuroses se multiplicaram. Reagan foi um gênio perto de Bush e Obama é um Jimmy Carter feito por Denzel Washington. Apesar de aparelhinhos bacanas e brilharecos fugazes, o mundo mudou muito pouco. Talvez sua maior mudança seja o nascimento de uma nostalgia imensa ( as pessoas estão se tornando nostálgicas cada vez mais cedo ), um medo indefinido de tudo aquilo que é real, e jovens que hoje, aos 17, não sonham com vôos à Marte ou drogas que libertem a mente, eles sonham com uma conta bancária alta e uma plástica no nariz. E mesmo assim irão errar.
Foi bem louco aquele ano. Eu cantava numa banda de rock. E naquela época ninguém tava nem aí pra rock made in Brasil. A banda era ruim demais. Um som meio Yes e meio Genesis. E eu odiava Yes e Genesis. Mas sabe como é, em banda quem manda é o guitarrista e eu nunca consegui aprender a tocar nada. Meu sonho era fazer um som tipo "Their Satanic Majesties Request". E eu pensava no futuro... Tinha a certeza de que o futuro da música brasileira estava em Itamar Assumpção e também em Arrigo Barnabé. Santa inocência ! Aos 17 eu pensava que as coisas iam se refinar no futuro, que Stockhausen e Berg iam tocar no rádio e que as letras, sem censura, falariam de sexo e amor de uma forma muito criativa e ousada. Não imaginava que nos reduziríamos ao "Quadradinho" e "Vai Vagabunda!"
Torcia pelo Flamengo e tinha plena certeza que Zico e Tita seriam os dois maiores jogadores da história do Brasil e do mundo. E que o galinho ganharia duas copas do mundo. E que em 2000 o Fla teria um estádio do tamanho do Maraca e seria um clube grande como a Juve ou a Inter. Não se falava no Real e muito menos no Manchester. Aliás, eu tinha certeza que a Holanda seria sempre a melhor seleção da Europa.
Pensava que todos os nossos presidentes eleitos seriam finos intelectuais de esquerda. Aliás, eu pensava que todo cara de esquerda fosse fino e culto. Pensava que eles todos gostassem de Bergman, de Tolstoi e de Bob Dylan. E achava que seria impossível os EUA terem um presidente pior que Ronnie Reagan. Guerras seriam passado. Mas estaríamos sofrendo com o ar poluído e quase sem floresta nenhuma. A Europa seria um museu e o Japão mandaria no mundo.
Aos 17 eu achava que todo mundo no ano 2001 usaria drogas. Mas não drogas contra a depressão ou estimulantes para não dormir. Seriam drogas para aumentar a percepção e para se libertar de medos e prisões. E achava que o sexo livre faria da gente seres mais sensíveis e menos neuróticos. Pois é...
Na tv voce escolheria entre assistir uma sinfonia de Mozart, um desenho muito louco sobre viagens espaciais ou um documentário sobre Henry Moore. A gente ia fazer a própria programação e assistir quando quisesse e as pessoas mais idiotas seriam lentamente menos idiotas. Seria uma tv sem a pressão dos patrocinadores, porque a gente ia pagar por ela e isso bastaria para a manter. Santo crianção eu era !
O cinema do futuro seria algo parecido com Blow-Out de de Palma ou Mean Streets de Scorsese. As pessoas assistiriam um tipo de filme real, duro, ágil e muito honesto. Cheio de emoções verdadeiras. Os atores e diretores mandariam os produtores pra casa e fariam os filmes que quisessem. Uns 40 filmes estreiariam toda semana..... 40 escolhas......
Aos 17 eu pensei que James Bond, Rocky, quadrinhos da Marvel e Inspetor Clouseau seriam coisas de passado distante; assim como talk-show, Silvio Santos, Hebe, Renato Aragão e Woody Allen. Jamais imaginei que as pessoas iam chegar ao ponto de querer assistir uns imbecís dormindo ou jantando ! E que documentários sobre bichos mostrassem mais o apresentador-ego- estrela do que o animal apresentado !
Pensei que a pintura iria acabar ( e acho que foi meu grande acerto ) e que o teatro teria dúzias de Becketts, Pinters e Lorcas. Um otimista aos 17, eu tinha certeza que o mundo teria se esquecido da existência do Yes, do Genesis, do Rush e de Gentle Giant. Que todo mundo ia ser meio Eno ou Iggy Pop, minimalistas ou primais. Jamais pensei que em 2009 as pessoas ainda dessem bola pra jovens de cabelinhos soltos usando guitarra/baixo e bateria para falar dos mesmos assuntos/do mesmo modo; assuntos que com 17 eu já achava beeeem boring... Guitarras até poderiam ser usadas, mas como Iggy fazia naquela época, eram guitarras que anunciavam a morte das guitarras. Mas o própio Iggy se cansou e sentou a bunda no sofá de veludo.
Jamais pensei que haveria um micro-ondas, o celular e a internet. Mas tinha certeza que o câncer seria curado como uma gripe e que tuberculose, meningite e sarampo seriam doenças desaparecidas. Não pensei que as pessoas teriam horror/vergonha de serem velhos e que o padrão de beleza seria a anorexia. Pensei que as pessoas teriam o relax de aceitar sua natureza.
Tinha certeza que estaria solteiro aos 40 ( acertei ! ). Mas ver homens depilando pernas e peito... jamais ! E garotos ouvindo Chico/ Milton/ Gal... tá brincando?????
Mas errei. Todos erram aos 17. Não haverá uma base lunar, não existe jazz na tv, o cinema não evoluiu, o rock continua exatamente igual. A direita continua egoísta e a esquerda cega. O sexo satisfaz apenas a libido e não muda o mundo. A aids não tem cura completa e as neuroses se multiplicaram. Reagan foi um gênio perto de Bush e Obama é um Jimmy Carter feito por Denzel Washington. Apesar de aparelhinhos bacanas e brilharecos fugazes, o mundo mudou muito pouco. Talvez sua maior mudança seja o nascimento de uma nostalgia imensa ( as pessoas estão se tornando nostálgicas cada vez mais cedo ), um medo indefinido de tudo aquilo que é real, e jovens que hoje, aos 17, não sonham com vôos à Marte ou drogas que libertem a mente, eles sonham com uma conta bancária alta e uma plástica no nariz. E mesmo assim irão errar.
LSD- circo- bissexualismo: cary grant
Releio a bio de Cary Grant escrita em 88 por Warren Harris. Cary é considerado o mais elegante ator que já houve e um mestre na comédia chic ( que hoje, tolamente feita e interpretada, virou a tal da comédia romântica ). Para as crianças que não o conhecem, Cary é uma mistura de George Clooney com Hugh Grant e mais doses de Colin Firth, Ewan McGregor e Tom Cruise. Mas já me arrependo desta tosca comparação; ele era único!
Sua vida é fascinante. Nasceu em Bristol, 1904, numa familia bem pobre. Seu nome era Archibald Leach. O pai, alcoólatra, trancou a mãe num hospicio para poder viver com a amante. Cary acreditou que ela houvesse morrido e só a tirou do hospicio vinte anos depois !
Aos 13 anos, Archie; o futuro dandy, o futuro molde da elegancia masculina; ganhava a vida com pernas de pau, andando pela cidade anunciando espetáculos. Entrou para shows de acrobacia, se tornando um tipo de palhaço do vaudeville. Sempre sujo e mal vestido, aos 16 foi ilegalmente numa excursão à América, sendo preso e resgatado de volta à seu país. Mas aos 18 foi para Nova York, para não mais voltar. Fez shows com uma trupe de acrobatas, vendeu gravatas na rua, foi dançarino de aluguel. Começou a conseguir papéis no teatro ( e que beleza ler as histórias da louca Broadway dos anos vinte, com seus teatros para 10.000 pessoas ! ) . Um dia foi descoberto pelo cinema, graças a Mae West, que caiu por ele.
Na California, dividiu casa por anos com o futuro cowboy Randolph Scott, o que causava boatos. Fez 8 filmes em seu primeiro ano na Paramount, mais 6 no segundo ano e mais 6 no terceiro. De repente, em 1937 explode com duas comédias : Topper ( sobre um casal de ricos fantasmas que se recusam a morrer ) e Cupido é Moleque Teimoso ( um casal se divorcia, e ao ter de decidir quem fica com o cão, se descobrem ainda in love ). Logo Grant desbancava Gable, Cooper e Tracy, se tornando o ator número 1 de bilheteria.
Casa-se com a atriz de Luzes da Cidade, de Chaplin ( dura um ano ), casa-se com a mulher mais rica do mundo ( dura dois anos ) e com uma atriz lésbica ( arranjo que durará cinco anos ). Mas aos 49 anos conhece Sophia Loren. Esquece Randolph Scott e fica doente de paixão. Ela prefere Carlo Ponti. Em crise, Cary Grant usa um novo medicamento : LSD. Torna-se, para o resto da vida, arauto dos milagres dessa droga, capaz de fazer renascer, fazer livre o que era obscuro. Para Cary, sua vida passa a se dividir em antes e após LSD. Casa-se com Dyan Cannon, 40 anos mais jovem, e se torna um tipo de senhor bronzeado em férias eternas. O casamento dura poucos meses.
Cary Grant criou Cary Grant. O nome, a voz, o estilo. Esse foi seu único papel, mas foi um imenso papel. O homem elegantemente esportivo, o homem que gostaria de ter uma mulher, mas que não precisa delas. Grant se deixava conquistar, jamais ia à luta. Sempre com um sorriso, sempre com uma piada, jamais com paixão ou fervor. O mundo sempre o amou porque o mundo sempre ansiou por esse toque leve, refrescante, solar. Ver Cary Grant na tela é crer num mundo civilizado. É o ator do homem civilizado.
Meu primeiro contato com ele foi via rede Globo. Uma novela dos anos 80, em que um velho playboy ensinava um garoto suburbano a apreciar a vida, a ser elegante, a saber seduzir. O velho lhe dava vários filmes de Cary, e o garoto os assistia e começava a entender. Eu logo corrí para ver "Charada", logo descobrí o estilo desse ator sem igual. Grant se tornou o cara que eu queria ser. Nunca consegui. Meu tipo está mais para Gable ou March...mas caramba, como eu queria ser Cary Grant !
Sua vida é fascinante. Nasceu em Bristol, 1904, numa familia bem pobre. Seu nome era Archibald Leach. O pai, alcoólatra, trancou a mãe num hospicio para poder viver com a amante. Cary acreditou que ela houvesse morrido e só a tirou do hospicio vinte anos depois !
Aos 13 anos, Archie; o futuro dandy, o futuro molde da elegancia masculina; ganhava a vida com pernas de pau, andando pela cidade anunciando espetáculos. Entrou para shows de acrobacia, se tornando um tipo de palhaço do vaudeville. Sempre sujo e mal vestido, aos 16 foi ilegalmente numa excursão à América, sendo preso e resgatado de volta à seu país. Mas aos 18 foi para Nova York, para não mais voltar. Fez shows com uma trupe de acrobatas, vendeu gravatas na rua, foi dançarino de aluguel. Começou a conseguir papéis no teatro ( e que beleza ler as histórias da louca Broadway dos anos vinte, com seus teatros para 10.000 pessoas ! ) . Um dia foi descoberto pelo cinema, graças a Mae West, que caiu por ele.
Na California, dividiu casa por anos com o futuro cowboy Randolph Scott, o que causava boatos. Fez 8 filmes em seu primeiro ano na Paramount, mais 6 no segundo ano e mais 6 no terceiro. De repente, em 1937 explode com duas comédias : Topper ( sobre um casal de ricos fantasmas que se recusam a morrer ) e Cupido é Moleque Teimoso ( um casal se divorcia, e ao ter de decidir quem fica com o cão, se descobrem ainda in love ). Logo Grant desbancava Gable, Cooper e Tracy, se tornando o ator número 1 de bilheteria.
Casa-se com a atriz de Luzes da Cidade, de Chaplin ( dura um ano ), casa-se com a mulher mais rica do mundo ( dura dois anos ) e com uma atriz lésbica ( arranjo que durará cinco anos ). Mas aos 49 anos conhece Sophia Loren. Esquece Randolph Scott e fica doente de paixão. Ela prefere Carlo Ponti. Em crise, Cary Grant usa um novo medicamento : LSD. Torna-se, para o resto da vida, arauto dos milagres dessa droga, capaz de fazer renascer, fazer livre o que era obscuro. Para Cary, sua vida passa a se dividir em antes e após LSD. Casa-se com Dyan Cannon, 40 anos mais jovem, e se torna um tipo de senhor bronzeado em férias eternas. O casamento dura poucos meses.
Cary Grant criou Cary Grant. O nome, a voz, o estilo. Esse foi seu único papel, mas foi um imenso papel. O homem elegantemente esportivo, o homem que gostaria de ter uma mulher, mas que não precisa delas. Grant se deixava conquistar, jamais ia à luta. Sempre com um sorriso, sempre com uma piada, jamais com paixão ou fervor. O mundo sempre o amou porque o mundo sempre ansiou por esse toque leve, refrescante, solar. Ver Cary Grant na tela é crer num mundo civilizado. É o ator do homem civilizado.
Meu primeiro contato com ele foi via rede Globo. Uma novela dos anos 80, em que um velho playboy ensinava um garoto suburbano a apreciar a vida, a ser elegante, a saber seduzir. O velho lhe dava vários filmes de Cary, e o garoto os assistia e começava a entender. Eu logo corrí para ver "Charada", logo descobrí o estilo desse ator sem igual. Grant se tornou o cara que eu queria ser. Nunca consegui. Meu tipo está mais para Gable ou March...mas caramba, como eu queria ser Cary Grant !
periferia- qual teu futuro?
Foi-se o tempo do pagode. Quem tem entre 11 e 18 anos está pouco se lixando para a maliciosa ginga ( pobre ) daquele samba de quem não gosta de samba. O tempo do sertanejo também está acabado. A molecada da periferia escuta apenas funk e às vezes ( os mais radicais ) rap. Mas é rap de bandido, de tiros, de sangue. Qual vai ser o futuro dessa galerinha ?
Eles respeitam apenas quem tem. Se voce tem grana ( vinda de onde vier ) voce merece respeito. Se voce não tem, voce é um zero. Daí vem a falta de respeito pelo professor, um zero, pobre, derrotado. No funk eles aprendem tudo de errado sobre sexo : -" Como vai sua puta ? " -"E voce, sua galinha?" Eu juro, muitas meninas de 13 anos se cumprimentam assim. Os garotos ( 12 anos ) falam ( tentam ) com voz de bandido e andam pelos corredores passando a mão na bunda das meninas ( 12 anos ). Elas riem. Ou dão um soco. E fica por isso mesmo, o garoto se vai, sorrindo, pensando que isso é ser homem.O tal do Amor platônico ? Só entre os emos. ( Poucos emos ).
Sabem tudo sobre informática. Todos têm maravilhosos celulares, os mais modernos, com tv e tudo mais. Passam o dia ouvindo funk, nos corredores, na rua, na aula. Recebem e mandam mensagens de minuto em minuto, porém são incapazes de redigir um pensamento coerente e alguns mal sabem escrever o próprio nome. Mas e daí ? Têm um tênis bacana e um mp5 !
Como pessoas do século XVI, reagem visceralmente a tudo que lhes atinge. Se não gostam de alguma coisa, negam sua existência ou partem pra porrada. Se gostam, dão a vida. A periferia desconhece Voltaire e Diderot : o iluminismo não chegou lá. As luzes da razão jamais iluminaram seus becos e vielas. Não tente lhes ensinar a ter bom senso, racionalidade, a pensar nas consequencias de um ato, nada lhes pode mudar, são medievais, se guiam pela força, pelo desejo sem freio e pela superstição. Religiosos são todos, espiritualizados, nenhum.
Moderninhos pra caramba ! Sabem tudo sobre as novas séries da Universal, Warner, Sony; conhecem novas danças e adoram roupa bacana. Para eles um filme de janeiro é velho em julho e uma música de abril é passada em maio. Público consumidor melhor, não há !
Mesmo assim eu aprendi a conviver com eles, e até a gostar de alguns. Adquiri, a custa de muito esforço, seu respeito. Falando a verdade, usando seus códigos, sendo direto. Há algo de muito infantil, de muito sincero em todos eles. Se não vão com sua cara, falam no primeiro contato. Se gostam, te seguem sem jogo algum. Nada de afetação, nada de frescura. Aqui, na perifa, não tem Oscar Wilde, Oscar de La Renta ou The Oscar goes to..., tem muita giria, muito palavrão e muito contrabando de coisinhas que tocam musiquinha. É miserável, é triste, é sem futuro. E está sempre numa festa de sexo, sexo e sexo. Mas não se iluda : Seus moleques são arautos do futuro. Sempre são. Foram os caipiras do Tennessee que anunciaram os tempos do rock em 1955; foram os cockneys de Brixton que anunciaram o glitter e os favelados da Jamaica que trouxeram o reggae; negros miseráveis da Philadelphia criaram o disco e favelados de Detroit o electro; Rap-Punk-Funk- tudo vem da perifa ( e até a revolução francesa, russa e escambau vem/veio dalí ). Pois é de lá nosso futuro : Analfabeto, cheio de transas sem amor ou sentido, com muito consumo de bobagens moderninhas e uma total falta de história ou razão.
A única filosofia é : O que eu quero é agora! E agora é sempre!
Eles respeitam apenas quem tem. Se voce tem grana ( vinda de onde vier ) voce merece respeito. Se voce não tem, voce é um zero. Daí vem a falta de respeito pelo professor, um zero, pobre, derrotado. No funk eles aprendem tudo de errado sobre sexo : -" Como vai sua puta ? " -"E voce, sua galinha?" Eu juro, muitas meninas de 13 anos se cumprimentam assim. Os garotos ( 12 anos ) falam ( tentam ) com voz de bandido e andam pelos corredores passando a mão na bunda das meninas ( 12 anos ). Elas riem. Ou dão um soco. E fica por isso mesmo, o garoto se vai, sorrindo, pensando que isso é ser homem.O tal do Amor platônico ? Só entre os emos. ( Poucos emos ).
Sabem tudo sobre informática. Todos têm maravilhosos celulares, os mais modernos, com tv e tudo mais. Passam o dia ouvindo funk, nos corredores, na rua, na aula. Recebem e mandam mensagens de minuto em minuto, porém são incapazes de redigir um pensamento coerente e alguns mal sabem escrever o próprio nome. Mas e daí ? Têm um tênis bacana e um mp5 !
Como pessoas do século XVI, reagem visceralmente a tudo que lhes atinge. Se não gostam de alguma coisa, negam sua existência ou partem pra porrada. Se gostam, dão a vida. A periferia desconhece Voltaire e Diderot : o iluminismo não chegou lá. As luzes da razão jamais iluminaram seus becos e vielas. Não tente lhes ensinar a ter bom senso, racionalidade, a pensar nas consequencias de um ato, nada lhes pode mudar, são medievais, se guiam pela força, pelo desejo sem freio e pela superstição. Religiosos são todos, espiritualizados, nenhum.
Moderninhos pra caramba ! Sabem tudo sobre as novas séries da Universal, Warner, Sony; conhecem novas danças e adoram roupa bacana. Para eles um filme de janeiro é velho em julho e uma música de abril é passada em maio. Público consumidor melhor, não há !
Mesmo assim eu aprendi a conviver com eles, e até a gostar de alguns. Adquiri, a custa de muito esforço, seu respeito. Falando a verdade, usando seus códigos, sendo direto. Há algo de muito infantil, de muito sincero em todos eles. Se não vão com sua cara, falam no primeiro contato. Se gostam, te seguem sem jogo algum. Nada de afetação, nada de frescura. Aqui, na perifa, não tem Oscar Wilde, Oscar de La Renta ou The Oscar goes to..., tem muita giria, muito palavrão e muito contrabando de coisinhas que tocam musiquinha. É miserável, é triste, é sem futuro. E está sempre numa festa de sexo, sexo e sexo. Mas não se iluda : Seus moleques são arautos do futuro. Sempre são. Foram os caipiras do Tennessee que anunciaram os tempos do rock em 1955; foram os cockneys de Brixton que anunciaram o glitter e os favelados da Jamaica que trouxeram o reggae; negros miseráveis da Philadelphia criaram o disco e favelados de Detroit o electro; Rap-Punk-Funk- tudo vem da perifa ( e até a revolução francesa, russa e escambau vem/veio dalí ). Pois é de lá nosso futuro : Analfabeto, cheio de transas sem amor ou sentido, com muito consumo de bobagens moderninhas e uma total falta de história ou razão.
A única filosofia é : O que eu quero é agora! E agora é sempre!
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