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EM BUSCA DA SOLIDÃO

O movimento mais importante da história humana é aquele que nos levou à solidão. Essa frase é de Nietzsche e eu ando o lendo com um prazer sublime. Irei então desenvolver essa ideia. ------------------ Se voce observar, mesmo hoje, um adolescente, irá notar que estar só é para ele um tipo de vergonha. de constrangimento. Esse é, pois, um sentimento arcaico que ainda sobrevive dentro dele. Observe agora uma favela. Por falta de escolha, a vida lá é totalmente comunitária. Todos vivem unidos a todos, e mesmo que voce não queira, sua vida é invadida pelas vozes, sons e atos dos vizinhos. Se então voce for a lugares onde o passado é mais vivo, aldeias indígenas, cidades da India ou núcleos tibetanos, irá perceber que ser excluído da comunidade é o pior castigo possível. Mais que isso, ser só é inimaginável, pois aquilo que cada membro da comunidade deseja, faz e teme é aquilo que o grupo deseja, faz e teme. ---------------------- Por 99% da história do homem a solidão foi o mais temido dos infernos. Mais que temer a solidão, era inimaginável que alguém pudesse a desejar. Desse modo, podemos dizer, com certeza, que a filosofia e a arte como as conhecemos, nascem no momento em que o homem se INDIVIDUALIZA. Em certo momento ele começou a ler em voz baixa ( a leitura durante séculos era feita apenas em voz alta, lia-se para ser ouvido por alguém ), morar com portas fechadas, falar em segredo, querer comer algo diferente do vizinho, e então pensar por si próprio. Esse movimento rumo à solidão começa mais ou menos em 500 AC no Ocidente. Artistas e escritores passam a fazer algo impensável: assinam sua obra! Se individualizam. ---------------------- O movimento é irrefreável. Estamos caminhando rumo à solidão total. Para isso nos livramos da corte de reis, das ruas com portas abertas, da Igreja como rebanho de ovelhas, e vemos agora o fim na família e das nações. Quando o GLOBALISMO fala em criar um mundo UNO ele não percebe estar criando um mundo UNO de pessoas distantes umas das outras. Se voce não tem uma nação, uma fé que te una á seu vizinho, se até mesmo seu sexo biológico é só seu, NADA fará de voce membro de uma comunidade. --------------- É por isso que todo movimento comunitário moderno acaba em Kaos ou decepção: Hippies, punks, veganos, e até mesmo socilistas. São movimentos que nascem como UNIÃO E IRMANDADE e se vêm depois numa espécie de SOLIDÃO EM GRUPO CADA UM NA SUA. --------------- A Direita mundial perdeu muito terreno por pregar a volta à família, à igreja, às velhas comunidades, quando na verdade seu apelo, seu Charme deveria ser falar, sem medo, daquilo que ela tem REALMENTE, no DNA, a solidão do EU Individualizado. Cada um criando sua vida e seu destino, o mais distante possível de governos, sindicatos ou modismos. --------------------- A riqueza e o poder de uma pessoa hoje é medida pelo quanto ela pode ter de solidão. Gente pobre TEM de viver em grupo. Gente rica usufrui do silêncio e da distância. Basta voltar 200 anos para ver que em 1823 gente rica NUNCA estava só e gente pobre vivia como numa granja. -------------- Toda invenção da tecnologia nos leva à solidão. Preciso citar exemplos? E no futuro, breve, a vida se fará em células auto suficientes e mesmo o trabalho e o ensino serão exercidos a sós. Quem quiser escrever um livro de sci fi relevante, que narre um momento revolucionário do futuro, passado em 2.200, que fale de um homem que ousa falar com um outro homem. Cara a cara. Se hoje ler em voz alta parece absurdo, falar com alguém será visto do mesmo modo. ---------------------- Nietzsche de certo modo elogia essa individualização. ( E essa é mais uma prova do quanto ele nunca foi fascista ). Mas ele sonha com a mesma individualização de Jung, a consciência de que há em voce uma originalidade criativa que deve ser libertada. E para isso é preciso negar o grupo. Nietzsche, como Jung, é sempre um aristocrata. O que ele pede é um movimento de aristocratização das massas, embora nenhum dos dois admita isso. O problema é que poucas pessoas têm o dom ou o interesse em se aristocratizar. Então o que vemos é que essa solidão atual e futura é aquela do ser vulgar, não criativo, comum. Uma solidão feita de depressão, negação, sem consolo. Uma solidão obrigatória, dada pela história do mundo, nunca escolhida e usufruida. Pior, solidão negada, vendida como "grupo social", " escolha", modernidade. ----------------- Se a Direita pode se vender como ideia de individualização, a Esquerda terá de trair a si mesma e inventar um tipo de socialismo de indivíduos, ideia que na verdade eles já vinculam, ideia que nada tem de socialista e muito tem de mera propaganda. ---------------------- Vale à pena tentar lutar contra esse movimento? Não, não vale. As forças da história são irrefreáveis. Mas por instinto haverá sempre aqueles que defenderão a família, a igreja, a vida em comunidade. Deveriam então perceber que são famílias sem pai ou mãe, sem refeições em grupo, sem proteção. Igrejas sem sentimento de doação e pertencimento e comunidades sem vínculos de gerações. O que digo é que o que nos resta de "velhas comunidades" já foi comido por dentro e delas só há a aparência. -------------- Melhor educar cada um para ser um Homem Criativo, um ser que ergue sua chama e constroi uma solidão só sua. ---------------- É isso.....

SWEDENBORG

O sueco Swedenborg nasceu em 1677 e morreu em 1772. Uma longa vida que na verdade foram duas. Na primeira vida ele foi um cientista. Bem sucedido. Na segunda parte ele foi um medium. Após uma vida dedicada à ciência, ele recebe a visita de espíritos e de anjos. Conversa com eles por mais de um ano e então escreve sua obra, obra que narra não só aquilo que eles lhe contaram como também aquilo que Swedenborg viu. Pois ele visitou o Outro Mundo. --------------- Primeiro entenda: Swedenborg era tão famoso em ciência que recebera até mesmo um título de nobreza. Segundo: o espiritismo na época dele não havia sido ainda divulgado por Allan Kardec. A "moda" espiritualista viria apenas no meio do século seguinte, cerca de 60 anos após a morte de Swedenborg. Mas... o que ele viu e ouviu? ------------------- Primeiro: não existe pecado original ou condenação ao céu ou inferno. A própria pessoa escolhe seu lugar no além vida. Há pessoas que se deixam seduzir pelo inferno, há pessoas que desejam o céu, e nisso se mostra o Livre Arbítrio. Deus não julga, a pessoa escolhe. ------------- Mas como? Então Swedenborg acha que o Genesis é uma mentira? Que não houve o Pecado de Adão e Eva? ------------- Não. Swedenborg crê na Bíblia mas ele diz que lemos a Bíblia de modo errado. Tudo nela é a narração do crescimento e da evolução da Alma. E sua obra é a "tradução", a exemplificação daquilo que a Bíblia diz por símbolos. Daí vem a imensa influência de Swedenborg sobre Jung. O psicólogo suiço usa, como Swedenborg, o símbolo. Jung vê na Bíblia e em toda religião uma mensagem simbólica sobre a evolução individual. Toda religião seria um código de evolução espiritual. --------------------- O livre arbítrio não termina com a morte. Após morrer, a alma sente mais afinidade com certas almas e segue então esse caminho, rumo ao céu ou ao inferno. Ela escolhe. O inferno, por ser essa alma ruim, guiada pelo mal, lhe parece apropriado. É um mundo sujo, decadente, cheio de intrigas, violência e escuridão. Não há castigo ou Demônio, Deus comanda o inferno assim como o Céu. Na eternidade infernal, a alma vive para sempre dentro do mal. Borges, que adorava Swedenborg, tem conto sobre o céu descrito pelo sueco. O que nos leva ao céu é a inteligência. Só pessoas evoluídas cognitivamente esclarecidas, amam o céu. Não é lugar de beleza ou de paz eternas, é como um local de discussão filosófica, de apreciação racional, um mundo frio, equlibrado, etéreo. --------------------- Na leitura da Bíblia, Swedenborg diz que existem 6 eras: a mais primitiva é a de Adão e Eva. A maioria das almas não consegue evoluir para além dessa era, mundo de escuridão onde a alma não percebe quase nada da Verdade e mal consegue usar a Inteligência. A terra é o recipiente do conhecimento, o lugar onde toda inteligência se concentra. O que ilumina a terra são a Fé e o Amor. Tudo que vem do homem é morto, tudo que vem de Deus é vida. O homem se comunica com o céu graças aos anjos que são mensageiros. Vem daí o conceito de intuição de Jung. Todo pensamento ou toda sensação de Bem, de Fé, de Amor vem do céu, de fora do homem, trazido pelos anjos. ------------------ Cercado por espíritos ruins, o homem celestial ouve apenas aquilo que os anjos lhe dão. Esse homem se torna a imagem do céu. A crença-fé no Divino fazem dele a mais perfeita das imagens. ----------------- Ao morrer, Swedenborg se tornou patrono de uma igreja que existe até hoje, predominantemente nos EUA. Ele previu com exatidão o dia e hora de sua morte e pouco se importou com ela, pois para ele esta passagem pela terra é apenas uma escolha a ser feita. O corpo nada significa e a alma é eterna. A vida é uma tentativa de renascer, de evoluir, de atingir o alto. Anjos não nos protegem de nada, eles apenas podem falar conosco. Tudo de bom e de melhor que há em nós não é nosso, é Deus em nós. Tudo se resume a tentar fazer o espírito falar, pois quando ele fala é Deus que fala em nós. ------------------------ Antes de terminar este texto falo agora de mim mesmo. Sim, houve momentos, raros e brilhantes, em minha vida, em que hiper inspirado, parecia ser Outra Pessoa que me guiava e que falava por mim. Mais que isso, nesses momentos houve uma felicidade calma, clara, nítida, que parecia resolver todo enigma. Esses momentos, se eu os tentar descrever, se caracterizam acima de tudo pela felicidade e pelo esquecimento de si mesmo. A inteligência fala e fala de um modo mais racional que a própria razão. O eu é surpreendido por si mesmo. Eu pareço ser mais sábio e melhor do que eu mesmo acreditava ser. ------------- Essas experiências, que vivi, se encaixam bem naquilo que Swedenborg disse, pois seria Deus falando em mim. Inspiração real. Nessa hora o corpo pouco importa e morrer não significaria nada. Esta vida, trevas que escondem símbolos, seria insignificante. Ou melhor, o que se esconde nela seria tudo. A morte de meu pai me deu essa clareza. Mas não só isso. ----------------- Por fim, devo dizer que o mundo de 2023, histérico, cheio de imagens, ordens, gritos, regras, pressão, dificulta cada vez mais qualquer chance de clareza. Um soldado numa trincheira poderia ter uma visão espiritual, mas um jovem envolto em modismos, falsos valores e confusão não tem como parar e perceber. O que digo com isso? Que nosso cotidiano, dito normal, é mais nocivo que uma guerra física real. Eu disse física porque estamos numa guerra espiritual feroz, terrível, decisiva. O mal predomina. Almas escolhem o inferno aos milhôes. ------------------------ Swedenborg estava certo?

SOBRE OS COVARDES

Quando Nietzsche falava sobre a valorização dos covardes e dos ressentidos, eu sei que ele tinha em vista muitos religiosos. O filósofo alemão percebia na religião uma forma de fugir às responsabilidades individuais e se refugiar no grupo. Nietzsche via também, com acerto, que a humildade escondia a vaidade e que o Reino dos ùltimos era uma vingança contra os fortes. Mas há algo que ele não percebeu ou não teve tempo de notar: a coragem que a religião requer. Os primeiros cristãos nada tinham de medrosos ou de acomodados. Minoria das minorias, eles eram mortos, perseguidos, acusados, viviam como ratos, escondidos em cavernas e buracos. Do mesmo modo, na Idade Média nada havia de fácil nos jejuns e nas guerras a que os cristãos se expunham. Havia a disposição em se obedecer e seguir algo que exigia imensos sacrifícios. Era sim uma forma de heroísmo. O problema é que no tempo de Nietzsche e no meio onde ele viveu, ser um luterano ou até mesmo um judeu rico nada tinha de desafiador. Era cômodo, pior, era hipócrita. --------------------- Para voce entender o que digo basta ir à USP ou a qualquer universidade moderna e OUSAR falar de Deus no meio de uma discussão filosófica. É necessário firmeza e coragem e provavelmente após a discussão voce será colocado de lado, como um tipo de "idiota parvo". Cada período histórico tem seu modo de ser covarde e se na Londres de 1900 ser gay era ato de desafio, na Londres de 2023 ser gay é quase uma rotina. O corajoso, como falo no post abaixo, segue aquilo que ele é, não importando a moda do grupo, a imposição dos amigos ou o momento histórico. Ele é um indivíduo e nisso tanto Nietzsche quanto Jung foram perfeitos. ------------- Por fim, para voce entender onde estamos, ontem falei a dois alunos que sou uma pessoa única e que eles também o são. Com horror e para minha surpresa, ambos disseram que NÃO QUEREM SER DIFERENTES, QUEREM SER COMO TODO MUNDO É. Weeellll....os dois têm 15 anos e se aos 15 anos adolescentes pensam assim, então o trabalho de repressão do poder atual está muito bem feito. É isso.

RETRATO DO MUNDO DE HOJE

leia e escreva já!

NIETZSCHE, JUNG E A PERSEGUIÇÃO AOS FORTES

Uma amiga me envia um texto de Nietzsche. Fico assombrado com aquilo que Nietzsche diz. É exatamente tudo que acontece no Ocidente hoje. Eis alguns trechos: " Os doentios são o grande perigo do homem, não os maus, as aves de rapina....são eles, sao os mais fracos aqueles que corroem a vida entre os homens, os que mais perigosamente questionam e destroem nossa confiança na vida e no homem..... Neste solo de auto desprezo cresce toda erva ruim,e tudo tão pequeno, tão insincero, tão ADOCICADO...Aqui pululam os vermes da inveja e do rancor, aqui a simples visão do vencedor é odiada! E que habilidade para esconder esse ódio!...Representar o amor, monopolizam a virtude, a justiça, a sabedoria, mas tudo que os move é o ódio....Rondam entre nós com sua censura, com a palavra justiça, exibindo suas almas belas, atacando os felizes....É uma vergonha ser feliz em tanta miséria, eis seu mote, sua censura, sua justiça....Não pode haver erro maior que os felizes, os bem sucedidos, os fortes começarem a duvidar de seu direito a ser feliz...... POIS FORA COM ESSE MUNDO AO AVESSO! FORA COM OS FRACOS! FORA COM A DITADURA DOS RESSENTIDOS!"-------------------------- Escrito em 1889, eis a antecipação do mundo de 2023, a ditadura, absoluta, completa, dos fracos, dos invejosos e dos ressentidos. Mundo onde toda exibição de força ou de auto suficiência é vista como ofensiva, cruel ou irresponsável. ---------------- Começo pelo óbvio: Casa e família. Esse sempre foi o sonho de todo ser humano, ter uma casa só sua e fazer uma família. Pois hoje nada é tão atacado e ridicularizado que esse desejo. Casa pra quê? Voce se vira, voce é livre, pra que ter uma casa? Em último caso, o estado cuida de voce! E família? Pra que? Família é o mal do mundo, fonte de neuroses, pra que isso? Una-se à uma rede de amigos, de amores, tenha um cachorro, família não! ------------- Não se engane: uma pessoa com uma casa e uma família é uma pessoa forte. Ela lutará para defender o que é seu. Ela morrerá para salvar o que tem. Uma pessoa sem lar e sem filhos é um fugitivo. Ou um ser que diz: Tanto faz!, para tudo. Ele é nômade e nômades não lutam por nada, eles se mudam. ----------------- Pessoas fracas odeiam a alegria, odeiam a força e odeiam a independência. Seu ideal é uma população que não as ofenda, que não lhes recorde de sua covardia e de sua fraqueza. Na pandemia vimos isso ao extremo, qualquer um que ousasse não ter medo, não se apavorar era taxado de vilão. Ora, se voce tem um pingo de cultura sabe que em toda história do mundo, o heroi a ser seguido sempre foi aquele que não tinha medo. Os fracos seguiam o destemido. imitavam seu modo de ser. E o que fazia o heroi? Se expunha ao perigo e mostrava que o mal não era tão horrível. Em 2019 o heroi foi chamado de anti-ciência, vilão, idiota ou INDIVIDUALISTA. Guarde essa palavra, individualista. É aí que a tirania se revela. Nada é mais odioso à ditadura que um indivíduo. --------------- Eu nada tenho de heroico, sou um covarde, mas durante toda a pandemia me obriguei a não ter medo. Eu andava pelas ruas, sempre, e sem máscara, tive uma vida normal. Minha mãe não foi contaminada por mim e nunca se usou alcool em casa. Porque fiz isso? Para me exibir? Não, por fidelidade à minha filosofia de vida. Sou um individualista que cultua herois. Eu não me perdoaria se me deixasse ser apavorado pelo poder dos ressentidos. Ressentidos que amaram a pandemia e sentem saudades dela até hoje e para sempre. ------------------------ Não se engane. A arte que se faz hoje, seja POP ou erudita, é toda feita para humilhar os fortes e idolatrar a fraqueza e o medo. Não há um só dia em que não se ameace a vida com um cometa, o aquecimento global ou um vírus que virá ( todos são desejos dos fracos, eles amam ver os fortes sentirem medo ). Filmes lembram todo tempo da maldade do homem "egoísta", o inferno que é viver, o sofrimento do "sensível e bom", o vazio que há na vida. Sempre existiram filmes tristes, mas o trágico mostrava que havia uma coisa chamada "superação", que era preciso coragem, e que, como diz Jung, é preciso se individualizar para ser forte. O problema é que hoje ensinamos as crianças que ser fraco é ser bom e ser forte é um mal. A conta na farmácia vai subir cada vez mais, as indústrias químicas agradecem. ------------------------ O mesmo com a música POP. Sempre houve a música triste, mas hoje todo artista POP não é apenas triste, ele é um doente mental. Uma criança-velha que cultua sua fraqueza fofa. ---------------- Aliás nada é mais desejado hoje que ser uma criança. Se antes o alvo era ter uma casa e uma família, hoje a meta é ficar no quarto brincando. Amiguinhos na rede, sexo virtual, um pet pra amar e um trabalho "divertido". O Estado agradece. Dominar crianças é mais fácil que dominar adultos. Crianças querem ser cuidadas. -------------------- A depressão se faz comum à todos porque nossa alma pede por realização e ela só se dá na vida adulta. Seja espiritualmente ou biologicamente, todo ser precisa amadurecer, crescer, chegar ao seu apogeu. Quando a pessoa é mutilada por um meio que a impede de crescer, de ser ela mesma, de ser forte e livre, ela se frustra e se deprime. Lhe colocam uma máscara de "bondade feliz e amorosa" e essa máscara sufoca. Estamos matando uma geração. -------------------- Perversamente nunca se falou tanto em ser voce mesmo, escolha seu sexo, sua vida, seu estilo, mas observe, voce pode ser o que quiser, desde que seja FRACO. Desde que pense no GRUPO. Desde que não ofenda ou se imponha. Isso não é liberdade! Isso é um jogo de crianças incentivado por adultos perversos. É uma castração feita com drogas recreativas e sexo sem tesão. Uma imensa palhaçada. --------------------------- Esse povo, fraco, ressentido, invejoso, vai censurar e estigmatizar todo aquele que for adulto, forte e feliz. Olha ao seu redor que voce verá isso acontecer em cada esquina, na mídia e na arte. Pior, nas escolas, lugar onde desde cedo se ensina que o mundo é ruim e toda figura histórica foi um monstro. --------------- Nietzsche estava certo e Jung sabia qual a cura. Se invidualize. Siga os fortes e os independentes. Seja ousadamente feliz. E jamais obedeça oa grupo. --------------- Depois falo mais sobre isto.

A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER - MILAN KUNDERA

Best Seller surpreendente nos anos de 1980, releio o romance mais famoso do autor tcheco e levo um choque: ele é muito mais SÁBIO do que eu lembrava. Constatação: vivemos um dos séculos mais idiotas da história e Kundera parece hoje muito melhor que em 1984. Frases e mais frases, afirmações e afirmações que ficaram fixadas na minha mente. É um dos livros que me formou e talvez seja até mesmo um dos cinco que mais me influenciou. ----------------- O eterno retorno, o tempo circular, as mulheres e seus medos, a vida dos bichos, o amor não assumido, são montanhas de frases que cito e recordo desde então e que eu já não lembrava ter lido neste livro. Kundera é um autor ao estilo de Voltaire, ele narra para ensinar, ele conta uma história para citar frases de sabedoria. Ele usa personagens para nos fazer testemunhar a história de um país humilhado. ---------------- Ler este romance, em momento que tanta gente em meu país é perseguida por não pensar "democraticamente" ( modo hipócrita de se nomear o modo dominante permitido de pensar ), me causa arrepios. Thomas, o médico do romance, é obrigado pelas autoridades a largar sua profissão e sua cidade e se tornar um agricultor. Aqui vejo pessoas sendo obrigadas a desaparecer, se afastarem, partirem para o ostracismo. O que se faz hoje em redes sociais é aquilo que se fazia na Tchecoslováquia em 1968. A diferença é que lá era feito na rua e no trabalho, aqui é feito em um clic. Mel Gibson, Ted Nugent, Donald Trump, estão na mesma situação de Thomas: para o poder dominante e para a história oficial eles não mais existem ( há muitos mais ). -------------- Teresa se adapta, Thomas não. Ele diz ter sido feliz com a vida que viveu, mas sabemos ser mentira. Pode ser uma visão só minha, mas o amor dos dois não me convence. Eles são desesperados e o apego dos dois é como um salva vidas. Ela o agarra e ele vê nela alguém a ser cuidado. Depois a coisa se inverte. Mas eles nunca parecem realmente unidos. O filme, que é ótimo, deixa isso mais claro. O amor dos dois encontra a paz minutos antes do acidente que os matará. ------------ Ou talvez, no momento histórico em que eles vivem, o amor não pode e não deve se fazer consciente. --------- Kundera tem uma escrita que sempre me parece árida, distante, é um prosador controlado. Desse modo, os personagens sofrem uma ausência de espontaniedade. São como bonecos a espera de um despertar. Servem para exemplificar aquilo que o autor quer nos demonstrar. Paulo Francis dizia que Kubrick fazia filmes que pareciam coisa de professor de filosofia alemão. Kundera é o equivalente em literatura. ------------- Mas é um bom professor. Ele tem o que falar. É sério sem ser desesperado e terminal ( como é todo autor sério de 2023 ), sofre mas não demonstra, e está longe de ser niilista. Kundera ainda crê no amor e por isso parece digno, nobre, ereto em sua posição. Houellebecq, autor que admiro, perto dele parece estranhamente inumano, tomado por emoções que não são aquelas que nos fizeram evoluir como espécie. Já Kundera, nascido em 1929, ainda podia acreditar na verdadeira democracia, no tempo, na carne de uma mulher, na doce vida de um cão. Apesar da Guerra, apesar da invasão, apesar do cancelamento, ele sabia que valia a pena. -------------- Na pós literatura do pós humanismo do pós científico mundo de agora, não se discute se vale a pena. Não se discute nada. Se crê. Naquilo que não se deve ver.

BIG SUR BY HENRY MILER + ABBEY ROAD AND LET IT BLEED + UMA CONVERSA COM UM STALINISTA + RILKE

-------------------- Big Sur foi escrito por Miller nos anos 40 e não fala de sexo e nem de drogas bebida ou tudo aquilo que os leitores teen de Miller procuravam até os anos 90. Ele se mudou para o sul da cidade de San Francisco, o Big Sur, uma região selvagem e deserta então, e nos conta como é morar lá. O livro, muito bom, é um elogio da solidão, da percepção que nasce com a observação atenta da vida e das coisas. Não chega a ser ZEN, mas o que Miller diz me agrada porque eu vivi tudo aquilo que ele narra, então eu sei do que se trata. Mas não pense que seja um isolamento radical. Miller mora num barraco, feito por ele mesmo,com dois filhos, câes e tem vizinhos, vizinhos que moram longe, que também amam a solidão, mas que o encontram de vez em quando. Ele aprende a se virar, a construir uma fossa, um chuveiro, moveis, a viver sem eletricidade. Quanto aos vizinhos, o foco do livro é falar deles. ------------- São pessoas interessantes. Gente que largou tudo e foi viver por lá. Alguns são artistas, todos são diferentes, excêntricos talvez, mas jamais malucos. Miller descreve eles, relembra conversas e nos conta suas sensações ao observar o tempo, o mar, as montanhas, uma folha seca no chão. Quando não cai em seu emocionalismo, que eu odeio e por isso não leio os Trópicos, Miller escreve bem. Ele descreve, ele pensa, ele diz. Felizmente neste livro ele se perde em emoções adolescentes poucas vezes. É um adulto falando. E como tal ele conta coisas que interessam. ----------------- Miller já era cult então, por isso recebe visitas de fãs que o acham lá. Ele tenta fugir, mas não há como. Vão a procura do escritor louco cheio de sexo, encontram um quase monge solitário. Com os moradores do lugar ele é simpático. São conversas sobre o clima, sobre consertar uma porta, sobre a escrita, sobre pintura. São companheiros. ----------------- Quanto mais voce usa esse seu celular mais distante da ONDA DO MUNDO voce está. Explico. Miller crê que ninguém cria nada, que há um criador que cria através de nossa mente. Somos antenas. Para acessar essa criação é preciso alguma solidão, silêncio, quietude. Sacou? Uma geração, inclusive eu, que vive conectada não tem chance alguma de entrar nessa onda mental. Daí a pobreza vexatória de nossa arte hoje. São criações de carne e de nervos, não de alma. ------------------ Em 1977, ano em que provei a quase solidão total, ganhei os discos Let It Bleed e Abbey Road. Os escutei diariamente por meses. Como dizia Rilke, voce só entra numa obra de arte quando dorme-vive-é inteiramente dela. A somoridade cristalina de Abbey Road e sua mistura de tragicidade com alegria criativa marcaram minha alma para sempre. Assim como a rebelde sexualidade arrogante de Let It Bleed. Eu morei, sozinho, em cada sulco daquele vinil. Não foi uma experiência estética ou sensual, foi um degrau espiritual conquistado. Minha pergunta é: quem tem uma experiência musical assim no Spotify? -------------------- Rilke diz em certo momento que livros emprestados não lhe tocam como aqueles que são dele. Pois a leitura completa só se dá em livros que têm seu cheiro, suas marcas, convívio físico entre leitor e obra. É preciso que o livro faça parte de voce. -------------------- Reencontro um velho amigo. Mais um. Ele me leva à um café chique, caro, exagerado. Não nos víamos fazia mais de 10 anos, muita coisa para se dizer. Mas.... Ele começa me contando de uma amiga negra, modelo, que só consegue trabalho na Suiça, aqui não. " Porque o Brasil é racista não é?". Depois ele me fala de um amigo que transou com um travesti, e que por isso, está sofrendo a terrível culpa cristã. Então ele fala de sua esposa, que está ganhando muito menos do que merecia, porque o Brasil é machista. Nesse ponto já entendi que aquilo não era um reencontro, ele apenas queria saber meu "grau de direitismo", como eu reagia a esse quase interrogatório. Me corrigiu várias vezes, "Não diga favela, é ofensivo, não diga gay, é machismo..." Então ele pagou a conta, alta e injusta, e disse que eu sou O CARA. --------------------- Fiquei triste. Eu sabia que ele faz parte do mundo dos Liberais Chique, mas pra mim isso é só um rótulo, ele é muito mais. Ou era muito mais. ------------- Nada das conversas sobre livros e sol, nada de mulheres bonitas e saudades, nem uma frase sobre a alegria de se rever um amigo. Apenas os assuntos minúsculos, ensaiados, aprendidos em jornais podres. Ele me pareceu morto. Vazio. Um boneco que nada percebe. --------------- Minha namorada riu. Ela trabalha com moda e diz que uma negra estilosa arruma muito mais trabalho que uma loura bonita. Nascida na favela, ela ri ao dizer que todo mundo nela diz favela. Comunidade é coisa de classe média ou de negro na TV. ----------------------- Eu queria ter falado à esse amigo dos livros que li, das experiências que tive, das pessoas que conheci. Impossível. Eu me sentiria em prova todo o tempo, ele a espera da revelação de minha condição de extremista de direita. ------------------- Enquanto isso pouco me interessa se Henry Miller amava Lenine ou não. O que importa é o modo como ele vê um pássaro e o que ele fala sobre a cor. Posso dizer que ele, morto em 1980, é muito mais próximo de mim que esse amigo perdido. O tempo.... ele é relativo.

O NASCIMENTO DA TRAGÈDIA - NIETZSCHE ( SOBRE A DITADURA DOS ESCRAVOS )

Sempre que um aluno me pede dica de um filósofo eu indico Nietzsche. E para minha imensa surpresa, eles não o leram. Nos anos 70 e 80 todo mundo que tentava ler filosofia começava por Nietzsche e na sequência Schopenhauer. Hoje não. ------------------ Que momento glorioso, lembro ainda, foi aquela tarde, em maio de 1992, ao sol, livro emprestado da biblioteca da faculdade, lendo O NASCIMENTO DA TRAGÉDIA. Uma revelação! Eu podia então ser EU MESMO. Melhor ainda, meu desejo não era um Mal. -------------- Nietzsche antecipa Jung em mais de 20 anos. Para ele, nossa missão na Terra é a de sermos nós mesmos, desenvolver nossa potência, única, individual, ao máximo. Para isso é preciso não ser parte do rebanho, não se submeter ao grupo. Nada pode ser mais útil ao mundo de 2023 que Nietzsche. O fato dele ainda não estar sendo lacrado apenas prova que os lacradores não o conhecem. --------------- A irmã de Nietzsche, que sobreviveu até os tempos do Nazismo, fez um mal terrível ao irmão genial. Apaixonada pelo grupo dos camisas pretas, ela desvirtuou o pensamento do irmão e transformou o Super-Homem em super soldado. Nada poderia irritar mais ao filósofo do egoísmo que ver o seu indivíduo solitário ( ele não cansa de repetir que o Super Homem é um solitário ), marchar anonimamente, obediente, como um ganso de botas. Não existe no filósofo alemão a ideia de líder, de comandante, de ordem unida, de grupo seguindo um único pensamento. Por isso Nietzsche irrita tanto aqueles que acreditam em união, em ideologia, em mundo único. No pensamento de Nietzsche há apenas uma certeza: eu não sou voce, eu não preciso de voce, eu me basto. ---------------------- Para quem não o leu, neste livro ele conta o desvirtuamento daquilo que seria BOM e BELO. Para homens livres, bom é a coragem, a força, a ambição; e belo é o heroi que tem esses poderes. Para escravos, bom é a humildade, a fraqueza e a doçura e belo é quem sofre. Vem então sua denúncia aos judeus. Ele prova que até a escravidão pelos egípcios, para o povo de Moisés, bom era a força do heroi, o orgulho, o poder, e que ao se tornarem cativos, eles passam a ver como a maldade tudo aquilo que seus algozes eram: fortes e ambiciosos. Como consolo por sua situação, eles começam a idolatrar a fraqueza. O cristianismo, nascido sob a escravidão romana, faz o mesmo: tudo que simboliza o poder romano passa a ser O MAL, e tudo que é do ESCRAVO se faz O BEM. --------------- Esse pensamento me iluminou para sempre, pois jogou por terra a ideia que eu tinha de que a humildade era um bem natural. E de que a força era por natureza um mal. Nietzsche me liberou para me tornar aquilo que sou, trabalho que requer uma vida inteira. trabalho que justifica uma vida. ---------------- No mundo de 2023, onde devemos ser solidários, vegetarianos, bons, onde temos de aceitar todos e tudo ( desde que esse TODOS não seja um grupo de individualistas fortes ), mundo onde a hipocrisia do grupo tenta sufocar a força do indivíduo, onde tudo é regulado, medido e vigiado, nada é mais necessário que ler Nietzsche. Ele, se vivo, ficaria em estado de irritação profunda ao observar a parva atitude de nossos jovens de hoje e perceberia que Apolo, fingindo ser Dionisio, venceu. Pois o que vemos hoje são pessoas que PARECEM ser Dionisíacas, com seu hermafroditismo, drogas, orgias, mas que em face do estado são profundamente apolíneas, vivendo sem alegria real, condenando o individualismo verdadeiro, e pobres de força moral e física. Apolo, deus da ordem, do grupo, da razão fria, venceu Dionisio, deus do instinto, do individualismo, do desejo, do sangue e da carne. ---------------- Hoje odiamos tanto o Homem Superior, que até mesmo em simples filmes de herois o problematizamos e destruimos seu heroísmo. Podemos gostar de Batman ou de Wolverine, desde que eles sofram, sejam neuróticos, humildes, uns perdedores. O mesmo se dá com cantores, esportistas, líderes políticos. Aceitamos o fraco, o doente, a vítima, o infeliz. O forte, o alegre, aquele cheio de vitalidade nos é insuportável, pois ele joga em nossa cara a nossa covardia. ----------------- Sim meus queridos, vivemos no ocidente a pior das ditaduras: a ditadura do escravo, do fraco, do rancoroso, do covarde. Neste clima não há chance alguma para que um jovem se sinta livre para ser ele mesmo: um indivíduo que não segue ordens. Sejam ordens da moda, de um grupo social ou de seu professor. ------------- É preciso algum tipo de anarquismo. É necessário o fogo de Dionisio.

MEU PAI FAZ ANIVERSÁRIO

Dia 13 de julho, se estivesse aqui, meu pai fará 97 anos de idade. Morreu em 2008, com 82. Não sofreu, de todos aqui em casa era o único sem neurose aparente. Era um homem do tipo que está acabando. Levava um pente no bolso, maços de dinheiro vivo, todas as notas colocadas no mesmo sentido, quatro bolos amarrados com elástico. Ainda me lembro da rapidez que ele tinha em contar dinheiro. Usava sempre camiseta branca por baixo da camisa. Era questão de higiene. Talco nos sapatos, nunca usou um tênis. Aliás, ele nunca saiu a rua sem vestir uma camisa, seja manga curta ou longa. Camiseta nunca. Sua juventude é aquela dos anos de 1940, uma juventude que ainda não tinha o conceito de teenager. -------------- Fazia a barba todo dia, com gilette de verdade, aquela que corta muito ( minhas primeira barbas foram com essa Gillette, aquela que tinha um cara de bigodinho na embalagem. Nunca entendi como ele conseguia se barbear sem se cortar ). Após a barba, lavava o rosto com àgua Velva, o cheiro dela é o cheiro de meu pai. Punha talco no peito e ia se vestir. Eis o modelo de masculinidade para mim. Meu pai fazia ruídos de homem enquanto se vestia na madrugada. E eu ouvia do meu quarto, sempre atento a seus movimentos: o cinto escorregando pela cintura. A camisa enfiada na calça. O amarrar dod sapatos, sempre um nó bem firme, os sapatos engraxados. Verificar a carteira e colocar os maços de dinheiro nos bolsos. Um beijo na minha mãe. Uma olhada no meu quarto, eu fingia dormir. Um arroto alto e ele ia em jejum. Eram 4 da manhã. ---------------------- Ele voltava as 4 da tarde e eu o esperava ansiosamente. Nunca me dei com meu pai, mas ele foi e é o amor da minha vida. Talvez por sempre ter tido um relacionamento fácil com minha máe, meu pai foi na minha vida um mistério, uma saudade e uma falta. E um ciúme, pois ele se dava muito bem com meu irmão mais novo, eles eram realmente amigos. -------------- Meu pai chegava e não falava com ninguém. Ia ao quarto, tirava os sapatos, colocava o dinheiro na gaveta, lavava o rosto, e só então abraçava o cachorro que a tudo observava. Uma cerveja gelada. O almoço. Um banho, sempre barulhento, e deitava no sofá onde lia o jornal e tentava ver TV. Mas adormecia. Por mais de 40 anos esses foram os dias de meu pai, de segunda à sábado, sempre assim, os mesmos gestos. E saiba, ele jamais perdeu o sono ou a fome. Meu pai dormia. Muito. -------------- Minha mãe pedia dinheiro, eu o evitava, meu irmão sabia lidar com ele: brincava. Meu pai reclamava que ninguém sabia falar com ele. Era verdade. Mas ele sabia lidar com isso, dava de ombros e esquecia. Nunca vi alguém com tamanho poder sobre sua mente. Ele dormia quando queria e esquecia o que não lhe fazia bem. Era mais que prático, era quase mágico. ---------------------- Veio para o Brasil em julho de 1950 e encontrou aqui um mundo de paletós brancos e muitas chances de vencer. Portugal era medieval então. Viveu até os 24 anos em vila que ainda não tinha eletricidade nem água encanada. Casas de pedra. Animais morando na cozinha. Minha distância do mundo medieval é de apenas uma geração. Então ele briga com o pai e vem para cá. Vai morar na Barra Funda e depois Caxingui. Eu venho quando ele já tem 36 anos. --------------- Penso o que meu pai pensaria do mundo absurdo e idiota de hoje. A miss Holanda tem um pênis. Fumam maconha nas ruas. As mulheres se esforçam para parecer feias. O clima de rivalidade boba nas ruas. A hiper violência à espreita. O uso desenfreado de palavrões em todo meio. A transformação das pessoas em zumbis incomunicáveis. O despudor do roubo e da corrupção. A derrubada de casas, ruas, praças, avenidas. O fim da tal cordialidade brasileira. Penso que ele não se revoltaria, ele ignoraria. E zombaria. Ele era bom em zombar. Teria o mesmo sentimento que tenho hoje: Este não é meu mundo porque essa gente não é da minha cultura. Mas a vida é a mesma de sempre, embora essa cultura lute para dizer que não, que agora tudo mudou. ----------------- Ah sim, meu pai seria fã do Messi e do Ronaldo, mas perceberia, a copa do mundo provou, que eles são o fim de uma linha. Os jogadores perderam individualidade, Mbappé é um jogador que todo grande time tinha. E não faz muito tempo isso. -------------- Meu pai amava faroestes porque ele acreditava em herois. Ele sabia que sem eles as pessoas perdem direção. --------------- Termino dizendo que meu pai usava um bigodinho fininho, daqueles tipo Errol Flynn, um modelo de bigode que a maioria dos homens usava nos anos 40. Meu pai, como esse modelo de bigode, não teria lugar para o mundo de 2023. E eu sei que é o mundo que perdeu.

CONSIDERAÇÕES SOBRE O LIVRO DE HOUELLEBECQ, SUBMISSÃO

O tipo de europeu contemporâneo, ateu ou agnóstico, de esquerda, que se enxerga como "da paz", existe a não mais que 100 anos. Talvez apenas 70. Diante dos 2000 anos do cristão ou dos 1500 do muçulmano, ele é um nada. Esse tipo de pessoa, o contemporâneo, costuma ter sérios problemas com sua família, seu país e sua vida sexual. Amestrado a sempre questionar, questionar aquilo que o poder deseja que ele questione, ele acaba por descrer de tudo, inclusive das coisas que poderiam lhe dar alguma felicidade. Pior, ele odeia profundamente quem aparenta não ter problema algum. Sua fuga é crer que aquele que parece feliz, na verdade esconde suas dores. A verdade é que esse miserável ser, o tal contemporâneo, é formatado para estar sempre em crise, pois o ser em crise NUNCA consegue se revoltar de fato. Ele vive no abismo do próprio umbigo. --------------------- Uma sociedade minimanente estruturada domina esse tipo de população, a do contemporâneo, com extrema facilidade. China, uma ditadura que não discute sexualidade cambiante ou patriotismo, e mundo árabe, firme na fé em Deus, ignoram e dão uma banana para o europeu que não sabe nem mesmo se é homem ou alface. Eles riem gostosamente da fraqueza repugnante da sociedade da Europa atual. --------------- Um líder ao velho estilo, uma nova Thatcher ou um novo Reagan, seria um remédio para esse status quo, mas o contemporâneo foi amestrado a reagir com o fígado, sem pensar, a simples mensão da palavra DIREITA. Ele prefere assistir a destruição de sua civilização a admitir o direito de existência à direita. Desse modo, ele tolera, ou pior, ignora, o incêndio duma catedral, o aumento da violência, o crescimento da pobreza, desde que a direita não se beneficie de nada disso. Sem nem tentar pensar, de modo automático-amestrado, ele entrega sua nação a gangues de traficantes ou a terroristas islâmicos, desde que a tal direita não fique no poder. Por que tanto ódio à uma parte da nação que deseja preservar a própria nação? Arrisco dizer que o contemporâneo vê na direita a imagem do PAI, aquele ser simbólico que lhe faz perceber o quanto ele é falho e covarde. Conviver-aceitar o PAI, o líder masculino ( masculino como símbolo, mulheres podem ocupar esse posto ), o princípio da autoridade moral, é para ele insuportável. Ele precisaria aceitar sua profunda falta de virilidade. Ele foi educado a ligar virilidade à estupro e burrice. Uma parede de aço o impede de pensar sobre o assunto. ----------------------- Eu consegui saltar fora desse mundo bobo. Lembro que nos anos 80 eu achava Reagan e Thatcher os maiores vilões da história. Não procurava saber o que de tão ruim eles haviam feito. Bastava alguém como Joe Strummer ou um colunista da Folha me mandar odiar. Então um dia eu notei que Reagan não fizera nada que Kennedy não fizera. O democrata louro começara a guerra no Vietnã e tentara invadir Cuba. Mas o vilão era Reagan que invadira Guam. Thatcher, quando morreu, vivia na mesma casa que morava antes de ser primeira ministra. Não há prova maior de retidão moral. Mas ela era, para 99% dos astros do rock dos anos 80, o mal reencarnado. Por que? Por se afirmar conservadora. Apenas isso. Seu racismo-ódio aos pobres-autoritarismo nunca se confirmam para quem lê a história dos anos 80. ------------------- Houellebecq nunca se diz de direita. Mas ele sempre diz que não conhece a direita. E não perde chance de mostrar o ridículo da esquerda francesa. A profunda hipocrisia cega de uma política de bem estar social que conduz ao desastre completo. A Europa ocidental, em apenas 30 anos, se tornou nada mais que um tipo de Bordel de milionários corruptos e príncipes árabes. O jovem europeu, sem nenhum senso de nação, passivo ao ponto da letargia, tem como desejo viver para sempre como aos 20 anos de idade: drogas, festas e sexo ocasional. Mais nada. Seu destino é ser um tipo de bibelô de quem manda de fato, um objeto que enfeita o Bordel, um pet sem poder de decisão e sem desejo de fuga. Ele questiona, veja que ridículo, aquilo que O PODER QUESTIONA!!!!!! Sua "juventude" é submissa ao líder, seja ele o bilionário da rede social, o dono da marca que patrocina sua festinha, o traficante da esquina. É uma juventuda "rebelde" que tem como rebeldia a cor do cabelo e a liberdade anal. Fora isso, são mais que conformistas, são amestrados. ------------------------ Por isso que o personagem do livro aceita a submissão ao islã. Ele vê, afinal, na religião a única chance de se salvar algo da masculinidade negada e da civilidade perdida. No cristianismo ele percebe a falência absoluta, a igreja do Papa se vendeu ao mundo temporal, tão completamente, cedeu tanto, para tentar salvar sua existência, que se tornou irrelevante. Nada se encontra hoje na igreja do ocidente. --------------------- Aceitando as regras do islã ele aceita uma nova chance de civilidade. É tudo.

O ESTRANGEIO, ALBERT CAMUS, O QUE É?

Não me lembro se já escrevi sobre este livro, se já, com certeza minha visão sobre ele é hoje outra. Isso é o bom da releitura, ela é viva, muda. Dito isso, falo que Camus não teve tempo de sair da adolescência. Este livro nada mais é que o relato sobre o cara que fui aos 17 anos, sem tirar nem por. Tempo, o da adolescência, em que voce percebe o mundo que lhe foi dado e não o aceita. Não consegue estabelecer conexão com quase nada, a não ser, de forma narcísica, com a pobre coisa que voce é. Camus erra feio ao obrigar Mersault a matar. É uma concessão ao explícito. Ele mata como quem atravessa uma rua, sem nada de muito importante nisso, mata por tédio e por estar irritado com o sol. O livro seria melhor e mais impactante sem isso. Como eu o faria também ser absolvido pela lei. Mersault sairia da prisão sentindo já saudade da prisão. -------------------- O final do livro é muito fraco e mais uma vez, apelativo. Ele sente paz e alegria. Paz no sacrifício. Vira um cristão? --------------- Entenda, eu gosto de Camus, muito mais que de Sartre, a quem eu odeio. Ao contrário de Sartre, Camus nunca foi um burguesinho vaidoso travestido de rebeldinho para poder comer as estudantes de filosofia ( Sartre é apenas isso, sua filosofia é digna da lata de lixo e na verdade já está lá ). Camus, ao contrário, era real e mesmo que eu ache este livro uma obra falha, mas nunca chata, Camus agrada por não ter criado um tipo. Ele é o que é. E entenda por favor, Camus não é Mersault. --------------------- No mundo de 2023, ao contrário do que voce pode pensar, não há mais muitos Mersault. Ele é típico dos anos 60 e 70. Reli achando que ia topar com o tipo de jovem que mata alunos numa escola sem motivo algum, mas nada. Mersault mata e vive em solidão, no vazio de uma relação sexual gelada, um trabalho bobo e a praia deserta. O jovem que mata numa escola está cheio de opiniões absurdas, grupos sinistros, vozes que o perturbam, medos, pesadelos, ansiedade. Esse assassino de 2023 pode parecer frio e sem porque, mas ele é uma bomba de ruído. Mersault, perto dele, é um muito antigo monge do Nepal. -------------------------- Tanto sucesso fez este livro, lançado nos anos 50, Nobel para Camus, porque ele falava de um certo enui-cansaço, de uma geração que surgia. Não a de Camus, mas sim a nascida pós segunda guerra. A primeira geração a viver no mundo mais "fácil" da tecnologia. A geração que nasceu e foi jogada em um mundo que mudava sem cessar e que por isso resistia a vínculos. O livro se tornou central não por ser uma obra de arte, não é, ou uma ficção genial, também não é, Camus não é criativo, mas sim por acertar um diagnóstico, diagnóstico que hoje não cabe mais. ---------------- Em 2023 não somos indiferentes, somos hiper excitados, exatamente o oposto. Nossa aparente indiferença é a dos cansados. É isso.

MEU TEMPO E SEU TEMPO

======================================== O meu tempo não é o seu tempo. E isso é corriqueiro. ---------------- Luis Schiavon morreu nesta semana e disse uma frase interessante ( frase que sinto sempre ): " O pior de ficar velho é se despedir de seu mundo. Ele desaparece dia a dia ". Não, não pense que este texto é choroso. Não faço elegias ao meu tempo. Ele existe enquanto existo. E tenho orgulho em ser dele e não deste. Muita coisa se foi, mas eu estou aqui. Sujando e poluindo o mundo de hoje. ------------------ Fui criança nos anos 60 e o que morreu daquele tempo foi o espaço. Havia espaço, não apenas uma quantidade imensa de terrenos vazios e ruas desertas, veja os mapas de então, como espaço para planejar. O futuro parecia um campo sem muros. Otimismo baby, um imenso otimismo. Nas ruas, tomadas por crianças, seja aqui seja no Japão ou em NY, o que mais lembro são dos rádios, volume alto, muita música. Música alegre. Minha cidade era muito pobre, mas não se ligava muito pra isso, porque a vida era vivida na rua. Em comunidade. Muita festa: carnaval com lançaperfume, guerra de confetes, em cada rua crianças jogando água em quem passava. Páscoa com os Judas amarrados nos postes. Festas juninas com fogueiras nos quintais e balões aos céus. Muita pipa, pião, bola, corda pra pular. --------------- Minha melhor década foram os anos 70. Quadrinhos, as bancas tinham cerca de 50 títulos mensais de quadrinhos. Discos e revistas de mulher pelada. Foi uma década colorida, de rock e de surf na alma. Carros amarelos, laranja, verdes, camisas de estampados absurdos, calças rosa e roxa. Tudo era exagero e eu exageradamente só pensava em mulheres e rock. Longos cabelos, longas noites na rua, longas conversas, Amigos vinham em casa sem avisar, porque ninguém tinha telefone, então pra ver alguém tinha de ir lá e correr o risco de dar com a cara na porta. Normal. No fim da década veio a discoteque e a coisa mudou, agora a gente tinha de ser elegante. E saber dançar. Adorei. ------------------- Os anos 80 foram uma chuva de cocaína. Todo mundo cheirava, era barato. Década de se sair toda noite e voltar com o sol. Eu detestei essa década desbundada, onde se falava muito, onde todo mundo parecia histérico, onde nada fazia sentido nenhum. Foi minha década pesadelo mas também minha década de apaixonado, em love por livros, filmes, meninas, praias, festas. Tudo sem regra, tudo free. Foi o tempo mais livre, mais irresponsável, mais over que eu vivi. ------------------ Nos anos 90 começaram os primeiros anúncios do que somos hoje. Mas ainda era louco. Foi um tempo que tentou pegar o melhor dos anos 70 e juntar ao que havia de bom dos anos 80. Não rolou. Os anos 90 foi um replay dos anos 70 em modo cínico. De repente tudo que era dos anos 70 era cool: filmes, discos, cabelos, roupas, modismos, tudo feito em 1976 parecia cool em 1996. Mas a coisa era fake, 1996 tinha uma frieza e uma melancolia que não havia em 76. --------------------- Então veio 2000 e logo veio a queda das torres e o mundo virou uma merda. A propagação do medo fez de nós um bando de dedo duros sem trégua. É um mundo de pavor, de cuidados, de receios e de policiamento absoluto. Quem nasceu dentro desta paranoia não pode a perceber, isto é tudo que se conhece, mas para a minha geração a coisa é ridícula. ------------------- Meu mundo tinha Paulo Francis e Nelson Rodrigues. E eles seriam impossíveis hoje. Meu mundo tinha Von Karajan e George Solti. Eu vivi sabendo que Dali e Miró estavam vivos. E fui acostumado a esperar um livro novo de Saul Bellow, Norman Mailer, John Updike e Graham Greene. Eu conheci o cinema lendo sobre a estreia dos novos filmes de Bunuel, Truffaut, Kurosawa e Bergman. Quando comecei a ir ao cinema sozinho, aos 13 anos, ainda produziam filmes gente como Hitchcock, Elia Kazan, Vincente Minelli e pasmem!, George Cukor!!!! Kubrick e Fellini estavam cheios de energia. ----------------- Aqui no Brasil a nova música tinha Secos e Molhados, Alceu Valença e Fagner. O país crescia a 12% ao ano. Mais que Coreia do Sul ou Singapura. Tivemos nossa chance. Mais uma. 1988 mataria nossas chances. ------------------ Esse é meu mundo e todo dia eu vejo um pouco dele sumir. O primeiro sinal faz muito tempo, foi a morte de Lennon em 1980, um sinal de que minha infancia estava partindo. Depois foram centenas: desde a casa de minha ex que é demolida, a rua que fica cheia de prédios, o amigo que morre ou enlouquece. -------------------- Mas o fim de meu tempo não é exatamente a morte de um guru ou a destruição de uma memória física, a morte do meu mundo é muito mais cruel e muito mais sutil, é o fim de um modo de viver, de pensar, a morte de valores e de sonhos. É o fim do "numa boa", a extinção do "eu quero é mais", o silenciamento do "é proibido proibir", tudo isso trocado por coisas, para mim ridículas, atitudes que cobram de todos uma espécie de eterna guarda, eterna tensão contra "o inimigo", inimigo que não existe, que é um espantalho criado para unir os diferentes em pseudo igualdade. ----------------- No meu mundo ser diferente era ser melhor. Hoje são todos falsamente iguais. A diversidade dos que pensam o mesmo e são diversos apenas na fachada. ------------------------ Meu mundo ria, ria muito. Ria do careca, do gordo, do magro, do baixo, do alto, do preto, do portuga, do gringo, do paulista, do baiano, do gaúcho, de todo mundo. Rir era recomendado e se voce era alvo de riso, então que se crie uma piada melhor como resposta. O brasileiro era famoso por contar piada. Por rir. Se contava piada no ônibus lotado, na praia, no bar, na escola. E acima de tudo, se admirava a mulher.... Se amava a beleza, as curvas, o sorriso da mulher. Drummond, Vinicius, Bandeira, eles falavam da mulher que passa, do molejo, do bamboleio, da felicidade que era a presença da mulher. ------------------------- Preciso dizer que isso morreu? As feias tiveram sua vingança. --------------------- Irreconhecível mundo meu. Amado mundo meu. -------------------Penso então que ele não morreu. Na verdade ele passa, eternamente, em looping, bamboleando como aquela mulher indo à praia. ---------------- Não falo de mulher por acaso, a beleza e o elogio à beleza são hoje atitudes rebeldes. Nada parece mais revolucionário que amar a beleza e elogiar a mulher como ser mágico e encantado encantador. -------------------- Então encerro dizendo que elas ainda existem e ainda são lindas e que o eu de 13 anos, que as descobria e as amava como fossem elas mágicas, tem seu canto em meio a melodia da moça que passa ao caminho do mar. Pois a moça bonita e o mar, esses não mudam, não morrem e resistem. E eu, ainda aqui, e esperando viver pelo menos mais 20 anos, testemunho, alimento, insisto e faço presente o meu mundo vivo. E como diria o poeta maior: Bebete vão bora pois já tá na hora!

O HOMEM QUE AMAVA AS MULHERES - FRANÇOIS TRUFFAUT

Fosse feito em 2023, seria este filme de uma chatice exemplar. O personagem central, feito por um perfeito Charles Denner, teria toda sua caça às mulheres feita em uma tela e todo o filme se passaria no seu quarto. Pior e mais provável, haveria uma redutora explicação médica a seu comportamento, ele iria se tratar e se "curar" e caso fosse um filme da Netflix, o conquistador masculino seria um vilão. Vivemos em um mundo muito policiado e por isso muito chato. ------------------------- Este é, na verdade, um dos melhores filmes de Truffaut, e como foi feito nos anos 70, ele evita simplificar. O personagem é um homem que ama as mulheres. É isso e é mais que isso. Ele as persegue na rua, as caça, mas nunca deixa de ser um cavalheiro. Não há o menor sinal de violência. Ele não quer relacionamentos íntimos, ele quer encontros carinhosos e sexuais. Não há tara, estamos longe do mundo dos vídeos pornô. Ele é, assim como era Truffaut, um homem do século XVIII. Um galanteador do mundo de Laclos. Um não romântico, racional e apaixonado. Este é, ao lado dos INCOMPREENDIDOS, o mais auto biográfico dos filmes de Truffaut. ------------------ Inclusive ele intuiu sua morte. Truffaut morreria jovem, em 1984, apenas sete anos após este filme. Caso voce não saiba, ele deveria estar dirigindo filmes até os anos 90. Ele era mais jovem que Godard. Mais jovem que Clint Eastwood. ----------------- Há um enterro onde vão apenas mulheres. Então se conta a história daquele que lá está sendo enterrado. Um homem de 40 anos, que não resiste ás mulheres, que vive para elas, que vê a beleza em cada uma delas, que não tem um tipo preferido, que adora a feminilidade. Quem leu a bio de Truffaut sabe: é ele. O diretor que se apaixonou por todas as atrizes de seus filmes. Que ia quase diariamente ao bordel. Que via nas mulheres mistério e encanto, a razão maior de sua vida. Sim, um homem que sabia a verdade: elas são totalmente diferentes dos homens. Felizmente. ---------------------- Acompanhamos seus encontros, as ruas, as casas delas, a casa dele, e o filme jamais cansa. Quando Truffaut acerta ele é o mais leve dos diretores. E aqui ele acerta. O filme é quase um ballet sem dança. Ophuls está muito presente aqui. O personagem chega a viajar quilômetros apenas para conhecer uma moça que ele viu cruzar a rua. Ele investiga, procura, descobre e encontra. fato: sua vida é um sucesso. -------------------------- Fosse feito em Hollywood, todas as atrizes seriam lindas ( ou pretensamente lindas ), aqui não. Algumas são bonitas, Brigitte Fossey é linda, mas outras são esquisitas, feias até. Isso faz do filme algo real e melhor que tudo, expõe a verdade do homem, ele ama a feminilidade, em toda sua manifestação. ---------------------- Ora, eu trabalho com adolescentes e sei que a maior crise de 2023 é a da masculinidade. Os meninos beijam, transam, como sempre foi, mas há neles uma vergonha, uma tristeza, uma falta de ação que beira o patético. As meninas agem, os meninos aguardam. O personagem de Denner é uma peça de museu. Pior, hoje não pega bem adorar A MULHER. Deve-se adorar o ser humano, fingindo então que mulheres e homens são iguais. Ora....fossem iguais não haveria a atração irresistível. A biologia nos ordena a reprodução. Basicamente é isso. O resto é invenção de nossa mente incansável. ------------------- O personagem não tem filhos. Deveria os ter. ------------------- Eis um belo e simples e grande filme. Procure ver.

ARTE HOJE

Não vá pensar que arte é como ciência. Se a produção científica avança, isso é inquestionável, a arte não. Medicina ou astronomia avançam e estão cada vez mais sofisticadas, corretas, exatas. Já na arte isso não se verifica e a ideia de progresso artístico não faz sentido. Ou melhor, ele existe, mas não atrelado ao tempo. Penso isso como produto da morte da cantora Astrud Gilberto, a mais chique cantora que o Brasil produziu em toda sua história. E a mais bonita também. Astrud, com sua voz afinada, suave, discreta, é o ponto máximo da linhagem de cantoras brasileiras. Ela pode ser igualada, jamais ultrapassada. Com Astrud, mandamos para os USA seu então marido, João Gilberto e ainda Tom Jobim, Eumir Deodato, Dom Um Romão, Laurindo de Oliveira, e mais um grande etc. Hoje mandamos, ou tentamos enviar aos USA gente como Anitta, Seu Jorge e Carlinhos Brown. Progresso? Onde ? ------------------- Por mais que eu ame a arte de Klee ou Kandinski, não se pode falar que eles são um avanço em relação à Rembrandt ou Caravaggio. Assim como a literatura de Stendhal ou de Sterne não é menos evoluída que a de Faulkner ou Nabokov. Se na ciência a história é uma escada, onde cada degrau significa um passo rumo ao alto, em arte a história é um caminho numa floresta, onde descemos e subimos, encontramos flores e trevas, e jamais temos como saber se aqui ou lá é mais "alto" ou "elevado" que onde estávamos ontem. --------------- Artes que dependem bastante da técnica, de meios científicos de apoio, tendem a enganar melhor. Um filme feito em 2000 terá, talvez, som e imagem melhores que aquele de 1930. Isso dará ao filme mais recente um brilho de papel de embrulho, uma face maquiada com mais apuro. Porém esse brilho não vem da arte, vem da ciência envolvida na produção industrial do filme. A arte do cinema vive no roteiro, na atuação dos atores, na edição, no modo como o diretor une todas as ideias, unifica o grupo numa coisa coesa. Isso independe da ciência ou tecnologia industrial do filme. Não há como dizer que o ganhador do Oscar de 2023 é mais evoluído que aquele que venceu em 1966. Ou 1945. O que se pode dizer é que o ganhador de 2017 é pior filme que o de 1951, ou que o vencedor de 1930 é bem pior que o de 1995. Não há uma linha que trace a evolução do cinema, mas há uma linha que traça a evolução, óbvia, da conservação de alimentos ou do tratamento da sifilis. Plebeus, gente que não pensa muito, tende a misturar tudo e ver em um disco ou livro de 2023 algo muito mais apurado e bem feito que um disco ou livro de 1960. ---------------------- Astrud e sua voz são pontos culminantes de um tipo de arte: a canção pop. Ela equivale à uma nave que voe à velocidade da luz ou a uma vacina contra o câncer. Um ponto evolutivo máximo. O que veio depois dela, Maria Bethania, Gal Costa, Rita Lee, Simone, são pontos mais baixos, involuções. História da arte não é uma estrada para cima, é um labirinto. Ninguém irá usar um remédio para infecção de 1950, assim como não se viaja mais com navios a vela. Mas a pessoa que exige o máximo e o melhor irá visitar uma capela italiana com afrescos de Giotto, mesmo eles tendo sido feitos a mais de 700 anos. Assim como eu prefiro um solo de guitarra de Jeff Beck à um de Satriani. Quando morre um grande artista sua arte morre com ele. Quando morre um grande cientista aquilo que ele fez é continuado por quem o estudou. É isso.

IGUALDADE LIBERDADE FRATERNIDADE

As pessoas, no atacado, sempre foram burras, o problema hoje é que os intelectuais de 2023 são muito mais idiotas que aqueles de 1953 ou 1853. ----------------- Pessoas não são bichos. Tive na vida 9 câes e todos eram iguais. Reagiam às coisas do mesmo modo, latiam pelos mesmos motivos, tinham a mesma rotina, sonhavam, possivelmente, o mesmo sonho. Eu os amei muito, e por isso via neles o reflexo de mim mesmo, via em meu boxer um filósofo. Mas isso era meu eu refletindo-se nele.-------------------- Claro que há câes farejadores, pastores, de companhia, mas atente! Eles foram formatados por criadores humanos que fizeram deles especialistas em um tipo de reação ao meio e ao comando. Essa pseudo diferença entre cães não tem a ver com personalidade canina, tem a ver com reação automática. Na "alma" todo cão é o mesmo. ------------------- Hoje, de forma canina, se diz e se impõe a ideia de que TODOS SOMOS IGUAIS. Somos? Eu sou como Einstein? Voce é como Lula? Sério mesmo? Um norueguês é igual um hindú? Não falo parecido, pois todos somos mamíferos humanos, digo IGUAL. Pois o que se impõe é que não temos diferença alguma entre nós. ----------------- O sonho de todo tirano é fazer da diversidade humana, massa anônima, que siga sem pensar. O modelo são os egípcios dos faraós, os soldados de Roma, os bolcheviques de Lenine e os nazis de Hitler. E, claro, os chineses de Mao, que eram obrigados, inclusive, a vestir sempre o mesmo uniforme. ----------------- Quem lidou com a massa humana sabe, lidar com pessoas que pensam de modo diferente é muito mais árduo. É preciso discutir, argumentar, convencer, e muitas vezes, ceder. Um tirano não admite isso. Ele manda calar. Um tirano só aceita o coro, nunca o solo. ------------------ Dizer que todos somos iguais é negar exatamente aquilo que nos diferencia dos bichos, o fato de que somos a única espécie que muda de acordo com o tempo e o desejo. Um cavalo de Julio César é exatamente o mesmo cavalo de um soldado de hoje. Um piloto de avião de hoje é muito diferente de um aborígene com seu dingo ao lado em 1500.-------------------- O objetivo é óbvio: excluir os diferentes e assim lidar apenas com a massa dos iguais. ---------------------- Mas como? E a diversidade da modernidade? Olha as ruas! Um rapaz de cabelo roxo e vestido rosa, uma moça de uniforme de soldado, um trans e um esportista, um coreano casado com uma sueca! Haja diversidade! Nunca houve tanta! ------------ Ilusão, pura ilusão. São apenas fios de cabelo, roupas, tatuagens. Por detrás do cabelo roxo há a ideia de que ele é igual ao coreano casado com a sueca. Mas!!!! Veja o embuste!!!! Igual desde que ele não desenvolva ideias originais, só dele, e comungue dessa específica igualdade, a de crer em TUDO que se deve crer. Voce será igual se se SUBMETER às mesmas normas e crenças do moço de cabelo roxo. É uma igualdade que não pode relaxar, que vigia, que observa, que cobra cooperação e obediência. Uma igualdade que produz stress eterno.------------------- É uma democracia igualitária FASCISTA. Um absurdo. ----------------------- Quem não se submete é excluído e taxado de anti democrático ou de inimigo perigoso. Perigoso por ser DIFERENTE. E é aí que a burrice extrema de nossos intelectuais toma poder. Eles pregam o tudo aceitar, a igualdade absoluta, mas não conseguem perceber, ou não admitem entender, que excluem aqueles que se afirmam diferentes do moço de cabelo roxo. --------------------- No lema da revolução francesa, nada é mais enganoso que igualdade, pois nunca haverá igualdade. O que deve haver são os mesmo direitos e deveres, não importa se voce é careca ou cabelo roxo. As mesmas aspirações, sonhos, medos, raciocínios, jamais!!!!! O progresso se fez na disputa entre pessoas diferentes que se desafiavam e se ouviam. O calar e o censurar emburrece e portanto traz a estagnação. A não discussão sobre a COVID 19, uma vergonha histórica, fez da ciência uma questão de fé, e não uma troca de experiências. ------------- Voce pode transar com uma árvore, pode querer ser um coelho ou andar nu, mas não pode, nunca, ser aquilo que só voce pode ser, único. ------------------------- O tirano diz: Brinquem seus trouxas, brinquem de coelhinho, fiquem pulando a noite toda, mas não sejam PERIGOSOS. ------------ A massa, iludida, aplaude e se sente livre por poder ficar maluca, e se pensa igual, por obedecer ao mesmo comando. -------------------- Mas isso não durará muito. Nossa alma é individual e selvagemente irritadiça, a coisa cairá como chuva. Graças a Deus.

DEUS ME LIVRE DE SER IGUAL À UM OUTRO QUALQUER

leia e escreva já!

MEU PAI ERA UM ESTOICO ( E EU ERA UM HEDONISTA ENVERGONHADO )

Se Portugal tivesse entrado na Segunda Guerra, meu pai teria idade para ter entrado nela em 1944. Ele foi pai aos 36 anos, ou seja, nossa diferença de idade era grande. O mundo onde meu pai viveu até os 30 anos não tinha TV, pouco rádio, sem telefone, quase sem jornais. Em 1950, aos 24 anos, ele pegou um navio e levou 10 dias de mar para chegar ao Brasil. Foi morar na Barra Funda, na época um lugar de fábricas e cortiços. Trabalhou com um primo, bar, prosperou e um dia se casou, em 1961. No ano seguinte eu nasci. No mundo que cresci, um baby boomer, já havia TV, muito rádio. Gosto de lembrar que nasci no ano em que os Beatles lançaram seu primeiro disco, Bob Dylan idem, ano do primeiro James Bond e da primeira Pantera Cor de Rosa. Psicose e Lawrence da Arabia eram os grandes filmes. Foi o ano de lançamento dos Flintstones. E os Rolling Stones faziam shows. No meu mundo a vida hedonista já dava as cartas. A ideia era: seja feliz, seja jovem, consuma sua juventude, viva intensamente. O mundo era vendido como shopping center, lugar das maravilhas, uma alegria ter 20 anos e poder estar vivo. --------------- Mas meu pai não era assim. Sua filosofia era radicalmente contra tudo isso. Na verdade nem era questão de ser contra, meu pai ignorava esse mundo. Ele era um estoico, e o mundo do estoicismo era o mundo de 99% das pessoas de sua geração. Não havia em meu pai nenhum traço da ideia de que o mundo era uma festa, ou de que todos nós tinhamos o direito de ser feliz. Sua filosofia era a de que nós dormimos e comemos e entre essas duas atividades, as mais importantes, nos distraímos com besteiras futeis da mente. Não havia como eu aceitar uma visão de vida tão antiga, daí nossas brigas eternas. Para meu pai, a vida era uma luta sem fim e sem trégua, felicidade era uma abstração vã e contentamento era sim uma ideia possível. Entenda: Felicidade está ligado à completa ausência de dúvida ou trsiteza, contentamento se liga ao repouso satisfeito. Meu pai não tinha neuroses visíveis, sua vida era simples, e apesar de ver o mundo como luta, ele era contente. Comida, sono e uma cerveja eram o que lhe bastava. Felicidade? Isso não existe. ---------------------- Ele estava certo e vejo isso pelo fato, simples, inquestionável, de que em casa ele foi o único "não ansioso". Ele não tinha esse sonho de felicidade, essa auto cobrança de alegria, ele não vivia a obrigação de ser jovem para sempre. Meu pai foi um senhor aos 40 anos, um senhor respeitável aos 50, um velho aos 60. Apesar de sempre aparentar menos idade do que tinha, isso para ele era indiferente. Seu contentamento era outro. Estoico sem o saber, crescido dentro do estoicismo, ele intuia que tudo era caminho para a morte e que a única coisa que contava era viver dentro dessa certeza. Tudo morre e nada dura, portanto a felicidade é impossível. Daí a ansiedade, pois se obrigar a ser feliz é uma luta perdida. Não há felicidade possível dentro de um corpo que morre a cada dia. ------------------- Triste ele? Nem um pouco. Entenda: ele não foi educado para ser estoico, não lhe impuseram isso. Ele era como seu pai, seu avô, seu bisavô, não havia ruptura alguma. A vida é isso e pronto, não se vai contra um fato tão óbvio. Apaixonado por filmes de faroeste, ele percebia naqueles cowboys a filosofia estoica colocada em termos claros: um homem solitário em briga eterna contra seu meio. Um cowboy não quer ser feliz, ele quer se safar ou resolver um conflito. E após vencer não alcança a felicidade. O cowboy fica contente e parte para a estrada. Só. ----------------- Ele também amava Sinatra, um estoico que vendia sonhos de felicidade. --------------- Minha tentativa de ser hedonista me levou ao vazio deseperado. O Paraíso não existe na Terra e ser um amante da alegria juvenil nos leva à burrice parva da busca sem fim. Ansiedade e uma decepção imensa: Me venderam a vida como festa, e ela é só isso?????? --------------------- Hoje eu entendo meu pai. E o entendi na hora certa.

É PRECISO FAZER AS PAZES COM OS ANOS 80

Eu e o mundo precisamos nos reconciliar com os anos 80. ----------- É a década em que eu tinha 20 anos, 21, 22, e desde sempre eu gosto de dizer que foi a pior década da história. Por que? Foi mesmo? ------------- Não. Esta década é muito, muito pior, assim como pior foram os anos 2000. Na atual ditadura do feio e do incompetente, é hora de voltarmos aos moços de gel e terno Armani. O ambicioso assumido e o bonito sem culpa. Chega da hipocrisia de vender Coca Cola como produto do bem, ou uma conta em banco como ato de bondade ecológica. É hora de beber Coca porque é bom e abrir conta para tentar ficar rico. Mais verdade por favor, menos babaquice infantil. --------------- O mundo nadou em dinheiro nos anos 80, o Brasil não, temos uma vocação para ir contra a maré mundial, e por isso a beleza se tornou alvo dominante. Não se usava o feio para nivelar o homem por baixo, se almejava o belo como alavanca de consumo. E esse consumo nos fazia melhores, mais belos e mais despertos. Imbecis dizem que foi a década do cinismo, mas não, foi a mais real. Somos ambiciosos e amamos o que é rico e bonito. Cinismo? Não. Mundo real. -------------- Tempo em que tudo era visual, o que se buscava era ser ou pelo menos parecer brilhante. Não havia culpa nenhuma em ser bonito ou querer ser, e o riso, ele era geral. Podia-se rir. Rir não era humilhar ninguém. Que cada um fizesse sua piada. -------------- Eu amava esse mundo até 1984, mas então, por uma crise pessoal, passei a odiar aquele tempo. De 1985 até 1990 fui profundamente infeliz e culpei a década por um mal que era apenas meu. Tudo que me recordasse aquele tempo passou a ser deprimente. Uma década feliz, em minha mente parecia ser um necrotério. Mas...2023 é um período tão negativo que agora eu me reconcilio com 1986 ou 87. Como disse, é hora de demitir o executivo de cabelo pink e delírios sobre "mundo sem mal" e chamar os yuppies de 1982 para dar um jeito na bagunça. --------------- Exatamente como aconteceu em 1981. Os anos 70, que adoro, foram um kaos provocado por líderes pressionados a puxar o freio. O mundo quase faliu e nos anos 80 os tais hiper executivos consertaram a bagunça. Hoje o que vemos é a transfomação dos ideais dos anos 60 e 70 em lei única. O que, lógico, leva o planeta à pobreza. Hippies, freaks e poetas não sabem e não querem fazer dinheiro. Eles visam uma ideia e não acumulo de capital. Não entendem que economia não é filosofia, é ciência exata. Hora dos caras que pensam em números e não em rimas. ------------------ Sim, eu era esnobe. E minha saudade é muito maior dos anos 70, quando eu tinha 12, 13 anos, que dos anos 80, onde aos 22 eu me perdi em noites de loucura sem hora para terminar. Mas as meninas eram lindas com seus vestidos de seda vermelha e suas luvas rendadas. E eu amava meu paletó branco com meus sapatos de couro azul. Tudo era uma tentativa de ser lindo. O tempo todo. Oscar Wilde dava as cartas e se hoje parecemos bregas, pense nas roupas do cara mais famoso do RAP ou do Funk de hoje e compare com isenção. Abra uma Vogue ou Elle de 1988 e compare página por página com uma edição atual de qualquer site de moda. Voce vai entender o que digo. Não há hoje nada que lembre vagamente o tempo de Linda Evangelista. --------------- A arrogancia imperava, ser vaidoso não dava raiva em ninguém. Eramos como um bando de pavões a se exibir. O futuro parecia ter duas alternativas: o fim do mundo ou uma festa sem final marcado. Quem diria que seria uma depressão do bem? Não esqueça, em 1985, até uma banda alternativa como Smiths tinha visual vaidoso. Ninguém sairia de casa ou faria um show sem pensar horas no que usar. Camiseta e jeans? Nunca! Os anos 70 estavam mortos baby. Apolo dava as regras. Então, seja David Lee Roth ou Robert Smith, o visual e a atitude devem dizer algo sobre "um estilo só seu". Vaidade e mais vaidade. Quem imaginaria que o mundo sentiria falta desse tipo de atitude? Aquela que remete ao desejo de ter e não ao querer agradar. Nós tínhamos. Não ligávamos em agradar. Qualquer filme que mostre a classe média de então vai te surpreender: a gente tinha muita coisa: brinquedos, aparelhinhos, roupas, discos, livros, móveis, carros, coleções, uma abundancia de posses. E nem pensávamos em parecer corretos ou discretos. ------------------ A frase da Nova Ordem Mundial: Voce não vai ter nada e será feliz, em 1986 seria considerada uma sentença de morte. E ela é. Hoje fomos treinados a nem mesmo pensar no que ela significa. ---------------------------- Passo agora diante da vitrine da Chanel e vejo um vestido rosa. Me alegro. Não há nenhuma das roupas dos últimos anos. Nada de ridículos casacos de croché colorido ou calças de plástico mal costuradas. É apenas um vestido rosa que Audrey usaria. Talvez a beleza seja um bem eterno e ela renasça mais uma vez. -------------------- Sorrio.

A ALEGRIA DA VIDA

Somente uma sociedade que ainda crê na alegria produz um cara como Herb Alpert. Caso voce não saiba, entre 1964-1968 ele colocava seus discos no primeiro lugar, batendo Beatles, Elvis, Sinatra, Motown, Bee Gees e Stones. Seu segredo? O dom de produzir POP na margem, se colocando exatamente na confluência de Burt Bacharach-jazz-soul-easy listening. Tenho memórias felizes desse tempo. Apesar de ter apenas 6, 7 anos de idade, tudo que recordo de feliz tem trilha de Herb Alpert. Aqui no Brasil tentam fazer crer que o período 68-71 foi um horror, para 99.99% da população foi feliz demais. Nunca antes, nunca depois, a economia cresceu tão depressa e nas ruas o que via era um bando de gente descobrindo o prazer de consumir. Era a entrada no século XX, com 70 anos de atraso. No meu bairro, Caxingui, na época um fim de mundo, entre 1970-71, se instalou esgoto, luz nas ruas, asfalto, um supermercado, e surgiu uma quantidade incrível de gente com novos Fuscas na garagem. Tudo isso era um salto imenso. E a música que dava clima para as camisas rosas do meu pai e as minissaias xadrez da minha mãe, era feita por Herb Alpert. ------------------- Se era assim neste fim de mundo, imagine como era o espírito nos USA e Europa. Sim, jovens saíram às ruas contra o Vietnã, sim, Negros lutavam contra o racismo, mas observe seus rostos. Saudáveis. Nas ruas cheios de fé. Certos de um mundo melhor. Cheios de planos. Jovens, mas também adultos. Em 1968 estamos plantando toda a merda de 2023, mas ao mesmo tempo somos totalmente diferentes de 2023. Somos dois mundos. O antes e o depois. ---------------- Encontrar nas paradas de sucesso algo remotamente parecido com Herb é hoje impossível. Algumas bandas fofas, nos anos 90 e 2000 tentaram o imitar. O som de Herb se tornara cool. Mas era fake, extremo fake. E em 2023 o que vemos é histeria, não alegria, pornografia agressiva, nunca sedução, e desespero, não revolução. O mundo que produziu esse som se foi. Morreu em algum momento de cinismo absoluto entre 1979-1982. ------------ Ouça, por exemplo, o tema de Cassino Royale. São apenas 2 minutos e meio, mas quantas ideias há nessa melodia e nesse arranjo. E todos, todos os sons apontam para cima, são leves, espertos, alegres, cheios de vida. Cada toque na bateria, cada timbre de sopro, tudo remete a luxo-calma e saber viver. A música, composição de Bacharach, é elegante, correta, perfeita, e ao mesmo tempo uma surpresa. Imagine como foi a escutar pela primeira vez, em 1967... ( No ano de Sgt Peppers foi Herb Alpert quem mais vendeu nos USA ). Ainda hoje quando estou feliz e me sinto alinhado, é uma música como Spanish Flea que vem à minha mente. ------------------- Para encerrar, a questão que coloco é: há possibilidade de uma Páscoa espiritual do mundo? As pessoas voltarão a ser otimistas, confiantes, amorosas, chiques, centradas? Afinal, passamos por momentos terríveis em 1929 e durante a Guerra de Hitler. Sinto dizer que penso que não. O que ergueu a moral em 1945-1970 foi um crescimento econômico como jamais houve antes. Pela primeira vez em toda a história do mundo, gente de 15, 16 anos não precisava trabalhar e uma porção imensa da população tinha o que comer. Isso foi mágico, incrível, uma mudança que as gerações seguintes mal conseguem imaginar. Não se morria aos 22 de tanto trabalhar. Não se morria de fome na Europa e América. Mais, a molecada de 18 tinha grana na mão pra gastar. Daí a cultura jovem. Daí a revolução. Herb Alpert era a trilha careta de quem ganhava grana, mudava de vida mas não mergulhava nas drogas. ------------ Penso que não haverá renascimento igual porque a causa profunda de nossa falência é exatamente o excesso de facilidades. E ninguém, nem eu e nem voce, vamos querer voltar a lutar pela vida. O simples aumento de caixa não salvará nossa alegria. Mais sexo ou mais drogas também não. ---------------------- Ouça o que postei de Alpert e tente sentir o que descrevi.

CHARME, NOBREZA, HUMOR E JOIE DE VIVRE

Um amigo me fala da recente entrevista na TV francesa da baronesa Nadine de Rothschild, viúva do barão Edmond. Ela, hoje com 92 anos, escreve livros sobre a arte de seduzir. Nadine nasceu pobre, se tornou cantora de boate, e seduziu Edmond, um dos homens mais ricos da Europa, vindo a se casar com ele e herdando seu título. Apesar de não ter sangue azul, Nadine é, talvez, a mais nobre das figuras da Europa hoje. Uma das últimas. -------------- Ela não é e nunca foi bonita. Mas ela atrai. Como todo nobre verdadeiro, aquele que o é por alma, Nadine esbanja bom humor, charme, savoir faire. A tal joie de vivre, expressão que na minha geração ainda era muito usada, mas que hoje deve parecer uma língua obscura para quase todos. Conversar com alguém como Nadine é se apaixonar por ela. Mesmo aos 92. --------------- Sobre a tal joie de vivre: é uma expressão francesa que significa alegria de viver, prazer em estar vivo. Mas é mais que isso. Uma tradução mais apurada teria de dizer algo como uma alegria em se descascar uma maçã no inverno e observar sua cor e sua textura e sentir o ar frio entrar no nariz e ser feliz por poder sentir e fazer aquilo que se faz. Entendeu? Joie de vivre é tirar da vida aquilo que ela dá, e observe, não significa correr atrás do prazer, mas sim saber o receber. Não é uma atitude passiva, mas é uma atitude de calma e volúpia. E que tal falar agora da tal nobreza, a aristocracia, qualidade que os herdeiros ingleses não possuem mas que a família real da Espanha tem. Na minha vida eu conhecia duas pessoas que tinham o dito sangue azul ( expressão racista? so what... ). Um era italiano e o outro português. Ambos tinham o mesmo modo light de viver. Sorriam. Sorriam muito, principalmente para estranhos. Foram treinados desde cedo a sorrir. Nunca os vi rir, muito menos gargalhar, sorriam. Jamais erguiam a voz, falavam num tom médio, nem lento e nem rápido e escolhiam o que dizer antes de dizer. Não se vestiam para chamar a atenção, nem mesmo o bom gosto era exibido. As roupas pareciam velhas, porém bem tratadas. Discretos, em tudo discretos. Uma camisa creme, uma calça jeans, um sapato marrom. Mas a pessoa observadora notava: o relógio, pequeno, era um Patek Philippe. O óculos de sol era Persol. O anel era herança do avô. Nada era usado para brilhar, mas tudo tinha o perfume do raro e do caro. O andar era sempre calmo, jamais com pressa e se dirigiam a todos os chamando de senhor e senhora, mesmo que fosse o taxista ou um garçon. Mais importante, espalhavam ao redor tudo o que sabiam, ensinavam que vinho tomar com aquela carne, que copo utilizar, onde ir e o que ler. Tudo sempre com o tal sorriso. Um deles trabalhou comigo numa escola pública e jamais me contou ser de origem nobre italiana. Me contaram depois. Em meio a alunos muito pobres, muito barulhentos e muito tolos, que o olhavam como se ele fosse um morador de favela, esse homem sempre manteve a calma, andando em meio ao Kaos como se ele jamais pudesse o atingir. Sorria e tratava os alunos com profundo respeito. E mesmo sendo simpático, havia a distância de uma galáxia entre ele e os alunos. Era como se uma redoma de vidro o protegesse. Os garotos riam, entre eles, de seus sapatos, achavam eles baratos não desconfiando que custavam mais que 5 tênis Nike. Riam de seu cashmere, desprezavam seu relógio pequeno. O amigo nobre não exibia marcas de roupas, e eles entendiam isso como pobreza. ------------------------- O outro que conheci, português, era um fidalgo em 100%. Sopa antes do jantar, pratos herdados do bisavô, silêncio à mesa, sorrisos e frases longas. Foi a única pessoa que conheci que trocava de roupa 3 vezes ao dia. E todas as 3 pareciam velhas e usadas. Tinha uma governanta que parecia mais rica que ele mesmo. Mas claro que não era. Era minha tia. Em 20 anos de convívio ela continuava a ser Senhora isso e Dona aquilo. O homem tinha uma linda coleção de livros simbolistas que ele mandara encardenar em couro. E era massom. Me convidou para o grupo mas eu nunca me interessei. E que tal voltar à Nadine? ----------------- Ela ensina que seduzir é estar atento à sedução. E a sedução se dá pelo humor. Um sedutor, um grande sedutor, faz rir. Homens feios têm sua aparência obscurecida pelo humor. Eles fazem rir e riem, eles alegram e parecem alegres. E são diferentes. Esqueça o "sedutor misterioso calado". Esse vai para a cama uma noite e é logo esquecido. Não conquista. O que seduz traz prazer à vida de quem com ele convive. E nunca esqueça, esse senso de humor NÃO SIGNIFICA CONTAR PIADAS OU FAZER GESTOS CÔMICOS. É a ironia, a maior prova de charme e inteligência que existe. É o tal distanciamento aristocrático, o dom de se observar o Kaos da vida e sorrir dele. E compartilhar esse talento com sua escolhida. ---------------------------- Eu já amei uma mulher não bonita que tinha esse dom. E ela era de uma atração irresistível. ------------- Por fim, Nadine diz que na contramão dos nobres aristocratas, não existe povo mais desprovido de charme que os acadêmicos. São de uma falta de brilho, de humor, de sorrisos que dá vontade de correr deles. Penso que o motivo é uma dose imensa de rancor. O rancoroso não sorri, gargalha como uma gralha, e não tem charme, se exibe. Por isso intelectuais odeiam aristocratas, questão de inveja rancorosa. Em 15 anos convivendo com professores, nunca vi um só com uma gota de charme. Bem...talvez duas... Inclusive eu, devo confessar, perdi 90% de meu joie de vivre ao conviver com eles. ----------------- Por fim....nosso mundo é apressado, histérico, pornográfico e prático. Se antes nossos modelos de elegância eram atores hollywoodianos e cantores que se baseavam na nobreza ( Cary Grant, Fred Astaire, Gary Cooper,Sinatra, todos eram proletários que aprenderam , com disciplina, a parecer nobres ), hoje nossos modelos são gigolôs que cantam RAP ou atores que se lamentam e têm rosto de quem frequenta os AA. Para as mulheres é pior, seus modelos são prostitutas, e nem mesmo são putas de alto luxo, são as que fazem strip em boates do cais. A situação é uma vitória dos acadêmicos que vêm assim os aristocratas esquecidos e desprezados. Mas o que pergunto é: os acadêmicos estão felizes com sua vitória? ------------------------ Charme? Voce quer saber o que é charme? Ora meu querido....assista Alain Delon em O SOL POR TESTEMUNHA e volte a ler isto. Oh sim....ele não tem humor!...mas o filme é todo ironia baby. Pura ironia.