VAGUEZAS

Minha professora de literatura italiana diz que os livros hoje são tão detalhistas, longos e pouco filosóficos porquê o modernismo foi vago, ousado e filosófico demais. Daí o retorno do bom enredo e da biografia. Well...
Reli CIDADES INVISÍVEIS, do Ítalo Calvino. Um livro escrito em modo de tarot e que pode ser lido em qualquer ordem. Calvino descreve cidades e dá uma bela conclusão: as cidades modernas são um inferno, cabe àqueles que ainda percebem isso salvar e valorizar aquilo que não é inferno.
Andei lendo AS MEMÓRIAS DE SHERLOCK HOLMES. Leio e me acalmo. Incrível como Conan Doyle tem esse dom. Holmes é um doido, tenso, isolado, mas os contos têm algo de tranquilizador. Talvez o clima onde tudo se passa.
Estou lendo um livro espanhol escrito agora. Incrível como não engulo bem esse país. Quando terminar de ler eu conto.
Telmo Martino não deve ser esquecido.
Minhas aulas de Wittgenstein, Rousseau e Dewey serviram para perceber o quanto admiro Kant.
O Brasil, como se fosse um quarentão que se vê falido está caindo na real. Todas as nossas certezas se foram.
Um cão dá ao homem o que ele mais precisa, comunicação sem palavras. O entendimento do silêncio.
Oriente e ocidente, de novo, se olham olho no olho.

REX HARRISON/ MIKE LEIGH/ RUPERT EVERETT/ GRETA GARBO/ GUINESS

A CASA DA COLINA de Will Malone com Geoffrey Rush e Famke Janssen.
Grupo de pessoas ficam uma noite numa casa assombrada para ganhar um prêmio. William Castle fez esse filme em 1960. Já era ruim. Hoje é pior. Pra que refazer tanto filme? zero.
O VALENTE TREME TREME, de Norman Z. McLeod com Bob Hope e Jane Russell.
Um dentista medroso se casa com Calamity Jane e assim se envolve em missão junto aos índios. Hope é ótimo, mas é Jane quem domina o filme. Frank Tashlin escreveu o roteiro e detestou o resultado. Foi um big sucesso, visto hoje é apenas OK. Nota cinco.

GUN CRAZY de Joseph H. Lewis, com Peggy Cummins e John Dahl.
Rapaz que sempre foi boa pessoa, mas amante de armas, vira bandido ao conhecer uma garota de circo ambiciosa. O filme é um dos grandes cults da história. Muito adiante de seu tempo, quando lançado fracassou, mas era visto pelo pessoal do cinema com admiração. Tem duas cenas antológicas: o assalto visto de dentro do carro, com diálogos improvisados, e o final, no pântano. Um filme que lembra Godard. Ainda moderno. Nota 9.
THE LAST HOLIDAY de Henry Casa com Alec Guiness
Encantador. Um humano filme inglês sobre um homem simples que tem uma doença rara. Sabendo que vai morrer, gasta suas economias em hotel de luxo. Vários personagens bem desenvolvidos, bem humano sem ser meloso. E Guiness numa atuação mágica. Nota 7.
FARSA DIABÓLICA, de Bryan Forbes com Kim Stanley e Richard Attenborough.
Na época causou impressão. Forbes parecia um novo mestre. Mas em dez anos ele cairia na rotina. Mas este é um grande pequeno filme. Ele nos faz entrar na mente de uma mulher muito perturbada. Ela é uma vidente, o marido é um capacho. Sequestram uma menina. O casal é magnifico! O filme, lento e desagradável, feio de se olhar, é inesquecível. Nota 8.
TOPSY TURVY de Mike Leigh com Jim Broadbent, Allan Corduner, Timothy Spall.
Brilhante! Delicioso! Poucos filmes conseguiram retratar de forma tão perfeita a Londres vitoriana. Gilbert e Sullivan foram Lennon e MacCartney de 1880. Um era fechado e ponderado, o outro ambicioso e farrista. Os atores são tocantes. O filme, dirigido com amor, é quase perfeito. Delicioso. Nota Dez!
O MARIDO IDEAL de Oliver Parker com Rupert Everett, Julianne Moore, Cate Blanchett, Minnie Driver e Jeremy Northam.
Oscar Wilde no cinema é sempre um show. E Rupert nasceu para recitar as frases do irlandês. Mas...Julianne estraga as cenas. O rosto choroso dessa atriz melancólica não combina com o wit de Wilde. De todo modo, é OK. Nota 6.
WITHOUT RESERVATIONS de Mervyn LeRoy com Claudette Colbert e John Wayne.
Uma autora de de best seller cruza os EUA com dois soldados. Ela cai de amores por um deles. Hollywood hiper profissional. Eis o filme bem feito padrão de então. Nada tolo, fantasioso e com atores excelentes. Colbert está very hot, Wayne super boa gente. Bela diversão. Nota 7.
SUSAN LENOX, de Robert Z. Leonard, com Greta Garbo e Clark Gable.
Garbo nunca esteve tão frágil. Ela nos apaixona neste melodrama onde uma garota pobre e abusada em casa foge. Ela se envolve com vários homens, mas Gable é o cara. Os primeiros trinta minutos têm altura de obra prima. Expressionistas e belos. Depois cai um pouco, mas é um filme forte. Gable bem jovem, nota 7.
TODOS OS IRMÃOS ERAM VALENTES de Richard Thorpe com Robert Taylor e Stewart Granger.
Uma aventura perfeita. Tem rivalidade entre irmãos, caça à baleia, motim, romance, ilhas, reviravoltas. É diversão que nunca cessa. Excelente! Nota 9.
ODEIO-TE MEU AMOR de Preston Sturges com Rex Harrison e Linda Darnell.
Foi o primeiro fracadsofracasso de Sturges, hoje está reabilitado. Rex dá um show como o maestro que desconfia da esposa mais jovem. Escutar Rex atuar é um dos grandes prazeres do cinema. O filme é criativo e eu o adoro. Humor negro. Nota Dez.

NOVA ABORDAGEM AO CINEMA

WHIPLASH,é à isso que ficou confinado o jazz? Escolas de nerds e professores exibicionistas? Pobre Jelly Roll.
BIRDMAN, o que artistas fazem com um super herói.
INTERESTELAR, filosofia quântica para leigos. Ou, Vejam caipiras! Eu sou um gênio!
A TEORIA DE TUDO, que fofinho é o meu nerd...
CISNE NEGRO, ballet com neuras mais suspense, resultado: risos.
NOÉ, a Bíblia é Marvel!

O OLHAR DE BORGES, UMA BIOGRAFIA SENTIMENTAL. SOLANGE FERNÁNDEZ ORDONEZ.

Bem...um problema sério neste livro: a autora, psicóloga de crianças, é amiga e fã de Borges. Desse modo, chega a irritar a quantidade de elogios.
Mesmo assim tem muita coisa boa. Começa com uma cena linda: Borges criança jogando xadrez com o pai na biblioteca. Ele foi tão feliz nessa época que bibliotecas se tornaram para sempre seu mundo. Borges foi apegado e amigo do pai, da mãe e da irmã. Seu problema era na rua, onde parecia fraco, mimado e muito snob. Nunca foi, se sentia um estrangeiro. Amava os livros, a realidade era aquela, sua curiosidade o fazia ler tudo.
Foram para a Suíça, e lá ele sentiu saudades da Argentina. Voltou já adulto. Aos 40 anos fica famoso em seu país, dez anos depois é uma figura mundial. Morre aos 87 anos como um mito. Caminhava, de bengala, altivo, pelas ruas de Buenos Aires e todos o apontavam, lá vai Borges!
Nunca se casou, viveu com a mãe até a morte dela, aos 90 anos. Ela escrevia o que ele ditava e lia para ele: Stevenson, DeQuincey, Hume, Henry James, textos do inglês medieval, Cervantes. Borges amava a literatura inglesa, Keats, e pesquisava misticismo, religiões. Se considerava um judeu porquê o judaísmo é todo baseado em escrituras, no texto, na palavra. Achava o catolicismo infantil.
Felzmente a autoraautora evita psicologismos. Ela diz que um grande artista tem seu mundo, não pode ser reduzido.
Borges buscava mostrar que a realidade é mais irreal que o sonho. Seus contos confundem, desorientam. Místico verdadeiro, ele aceitava a incerteza. Abominava dogmas. Não gostava da literatura psicológica, jornalistica. Sabia que a verdade está na fantasia.

WHATS GOIN ON, MARVIN GAYE...NOBRE, MUITO NOBRE.

Uma sinfonia de dor e de ira sob controle, esta obra prima vem sendo considerada desde 1988 um dos cinco ou seis melhores discos de de todos os tempos. Why? Porquê ele é adulto, e nobre, de uma clareza e superioridade artística tão alta que apenas Astral Weeks e Low lá conseguiram estar.
Ouça este disco com as letras em mão, e o encare como sinfonia. As faixas devem ser sentidas como uma alma una. Rico em instrumentação, é surpreendente, rico, vasto e único.
Marvin, ídolo e rei desde 1962, arriscou tudo aqui. A Motown não queria o lançar. Marvin insistiu, foi sucesso pop e de arte. A critica percebeu que havia alta arte no soul. Foi o nocaute ao racismo. Marvin era maior que Dylan ou Lennon. Este disco foi admirado por Miles Davis.
Wholy Holy faz chorar. Em crise, Marvin pede ajuda à nós, mortais. Todas as faixas são superlativas, impossível tirar uma da obra, é um todo elevado, a epifania, dolorosa, se faz.
Atenção ao baixo de James Jamerson, segundo MacCartney e Jagger, é the best. Ele conduz com pulsação esta sinfonia de soul, jazz, ritmos latinos e dor. A voz de Marvin seduz, como sempre, mas tem algo mais, conhecimento. Este disco faz com que o rock pareça coisa de meninos.
Um marco, um graal para milhares de artistas, desde 1971.
Inquestionável. Grande.

ALL THINGS MUSIC PLUS

All things music plus, é um site que você pode entrar via facebook. Muito legal.
Traz dia a dia algo de importante que aconteceu no dia. Pode ser um aniversário, o lançamento de um disco. O mais fascinante é que eles republicam a critica da época do lançamento.
Duas coisas a gente constata. As criticas eram muito maiores e melhores. Li uma sobre o Lodger, de maio de 1979, em que Jon Landau explica o porque de Bowie não ser confiável. Há injustiças a rodo. RAM é chamado de medíocre, bobo, insuportável. Dá pra notar como a ROLLING STONE dos anos 70 era exigente, metida,elitista. É legal ler hoje, mesmo para discordar!
Entra lá e veja o que rolou em 21 de maio....

O LIVRO DE AREIA, JORGE LUIS BORGES

Não se irrite, continuo vendo Borges como um dos dez gigantes de seu século. Mas...este livro, escrito quando ele contava 75 anos, tem problemas. Treze contos curtos, treze narrativas com tempos e lugares dos mais insólitos. Treze contos que me deram prazer, mas...
Duas coisas aqui incomodam, primeiro a concisão genial das Ficções, aqui parece simples preguiça, pressa. Segundo e pior, os contos tem cara de imitação. O genial argentino parece um imitador de si mesmo. O horror tem tintas pouco sutis, a filosofia parece pedante, o estilo pobre.
Penso que este é um bom livro para um primeiro leitor de Borges, mas para quem conhece seu melhor, o dom mágico que ele tem de nos confundir e de fazer sonhar, este magro volume terá um insosso sabor de prato mal feito.

ARCABOUÇOS SIMBOLICOS

Aula sobre ANTONIO VIEIRA. Século XVII. Havia uma construção cristã que conformava o modo de ver a vida. Exemplo. Um evento da natureza era visto sempre como uma manifestação divina. Mais que isso, a espuma do mar era um manto de um santo, uma flor vermelha o coração de Cristo.
A partir do iluminismo tudo passa para a razão. A razão não obriga a negação da existência de Deus, mas transforma Deus em Ser Super Racional. Um novo arcabouço, agora tudo é prova da racionalidade do universo.
Outra construção. Com Darwin e o capitalismo, tudo passa s ser uma luta. A espuma é palco de uma briga, a flor é chamariz de insetos, o mundo é uma disputa.
Os freudianos construirão um edifício alicerçado em libido e sexo. Cada imagem da vida será sexualizado. O que podemos dizer com certeza? Há hoje um menu onde você escolhe seu simbolismo. Única verdade é que precisamos simbolizar, ler a vida. 

BOÊMIOS.... DAN FRANCK. AQUILO QUE SOMOS HOJE. SÓ QUE NA IMITAÇÃO DA IMITAÇÃO DA IMITAÇÃO DA IMITAÇÃO...

Um andava com uma camisa feita de papel. Outro fez uma gravata de madeira. Todos tinham visual ultrajante. Todos passavam frio e muita fome. Mas não desistiam. Este livro fala deles. Cada capitulo, de duas paginas, fala um causo. Uma piada, um drama. Nisso lembra o livro do Ruy sobre Ipanema. Mas este é francês. Muito Paris.
Vai de 1900 até 1930. Começa com Picasso. O cubismo. E Apollinaire, o poeta. Em Montmartre. Primeiro choque: em estilo, palavras, as pessoas hoje, cem anos depois, imitam todos eles sem saber. Mesmo quem nunca ouviu falar de Max Jacob ou de Modigliani. Cocaína, absinto, ópio, arte. Se morria pela arte. Este livro explica Patti Smith e Mapplethorpe. Boêmios.
Triste é a parte final. Após cubismo, fauvismo e o dadá, vem o surrealismo, e esse movimento estraga tudo. Mete política e poder no meio. Porquê antes todos eram anarquistas. E estrangeiros. Os inimigos dizem isso, que todos são estrangeiros, que eles destroem a verdadeira França. E há a guerra de 14, que mata tantos...
Foujita, um japonês que se vestia de mulher e seduzia as damas burguesas. Man Ray, o fotógrafo americano que amou Kiki, a menina de rua que virou musa da época.
Jarry, o autor do Ubu, que andava armado e dava tiros em bares, na rua.
Tzara, líder do dadaísmo, onde nada fazia sentido e tudo era piada. As festas dadas, as mentiras como forma de arte.
É tanta gente. Brigas em bares, delegacias, peças que viram lutas, vaias, socos, fogo e tiros.
E as mulheres. Modelos, putas, dançarinas. Uma esfuziante fé na vida, mesmo sem comida, com piolhos, doença e criação. A vida como obra de arte.
Lá tudo isso ainda era de verdade. Porquê eram os primeiros. Não imitavam ninguém. Não queriam ser como boêmios. Eles eram Os boêmios. Faziam o que queriam da forma que podiam.
Picasso ficou rico. Foujita, Derain, Van Dongen, Matisse, Braque...todos ricos. Mas ainda duros. Como dizia Picasso: o ideal é ser pobre tendo dinheiro.
Livro inspirador! 

OLHE TODA ESSA GENTE...

Oh... Olhe para toda essa gente solitária...
Deve ter sido uma emoção sublime a de ligar o rádio em 66 e ser surpreendido por esse início... E então o quarteto de cordas...
Descobri a canção, feita por Paul, aos 12 anos, bem depois. Lembro de grava-la num k7 e ficar repetindo a música várias vezes. Ela me raptou. Entrada para Bach.
Paul prova que inteligência musical é diferente de inteligência verbal. Como Schubert, Mozart ou Satie, você pode ser um gênio com os sons e nada ter a dizer com o verbo. Números, palavras e música, três línguas que não se misturam.
Essa a inveja e o ressentimento, quem ligava o rádio em 66 era surpreendido...

KUROSAWA/ KEVIN KLINE/ STEVE MARTIN/ DORIS DAY/ TOM COURTNEY

A SOLIDÃO DE UMA CORRIDA SEM FIM de Tony Richardson com Tom Courtney e Michael Redgrave
Com seu lançamento em DVD, muito critico inglês passou a colocar este filme entre os dez mais da ilha. Feito em 1963, conta a saga de um teen pobre e desiludido. A mãe tem amantes, a casa é suja e cheia, as namoradas tolas. Ele rouba uma padaria e é preso. Na Febem inglesa ele se destaca como atleta. Mas as coisas nunca são fáceis. Richardson faria Tom Jones em seguida, e Redgrave faz o diretor da Febem. Tom Courtney tem um desempenho mágico. Sujo. O filme é magnifico. Nota 9.
UM FILME FALADO de Manoel de Oliveira
Uma enfadonha aula de historia. Melhora na interação final entre os atores. O sentido é óbvio, a Europa começou no mar de Portugal e termina na nova ordem atual. Bem...não deixa de ser bonito.
A ESPIÃ DAS CALCINHAS DE RENDA de Frank Tashlin com Doris Day e Rod Taylor.
O titulo ridículo não estraga o prazer de ver este tolo filme pop. Tashlin começou como cartunista do Pica Pau. Seus filmes têm sempre a leveza do humor visual. Doris é confundida com uma espiã. Ruy Castro, fã de Doris, não gosta do filme. Eu gosto.
MY BLUE HEAVEN de Herbert Ross com Steve Martin, Joan Fusão e Rick Moranis
Não gosto. Um dos piores filmes do grande Martin. Nem ele salva essa chatice sobre um delator de NY sendo protegido pelo tira do FBI Moranis. Fuja!
TEMPO DE RECOMECAR de Irwin Winkler com Kevin Kline, Hayden Christensen e Kristine Scott Thomas.
Um homem que fracassou como pai e marido descobre que vai morrer. E dá sentido a sua vida reformando sua casa. Kevin está excelente. Mas...em 1952 Kurosawa fez o mais triste dos filmes, Viver, onde Shimura faz uma praça antes de morrer. Impossível comparar.  O japonês é a obra de um deus.
SONHO DE AMOR de Charles Vidor Com Dirk Bogarde e CapucineHorrivel! É sobre Liszt… mas nada faz sentido.
AS AVENTURAS DO CAPITÃO GRANT de Robert Stevenson com Hayley Mills e Maurice Chevalier.
Bela adaptação de Verne. Ação na medida certa. Apesar dos efeitos ruins, tem boa direção, bom roteiro e produção Disney. Os atores são ótimos!
A MAIOR HISTORIA DE TODOS OS TEMPOS de George Stevens com Max Von Sydow
O diretor de Shane e de tantos grandes filmes faz a vida de Jesus sem emoção. O ator favorito de Bergman faz Jesus. Dura quatro horas e levou anos para ficar pronto.

POR QUÊ TANTAS BIOS?

Suspeito que biografias funcionam como auto-ajuda. Quem tem vergonha de ler auto, lê bio. Ou quase isso.
Ao ler uma bio podemos experimentar três impulsos: pensar que se ele pode eu posso, se ele superou eu supera rei, ou a pura satisfação de uma curiosidade.
A bio parece útil por isso, dá exemplos de força de vontade, mostra que até os bacanas sofrem, e principalmente acariciam nosso ego ao provar que sou parecido com o artista X, ou com a celebridade Y. Vida real, o leitor é real, o livro se faz útil por ser um exemplo.
A questão é, para que serve a ficção ? Quem garante que aquilo pode ter algo a ver com m8nha vida?
Na patológica sociedade narcisista de hoje, só interessa o que pode me fazer bem. E por incrível que pareça, a biografia se torna um espelho. Útil, uma ferramenta.
Mal sabe esse leitor que no minimo a ficção pode lhe dar o alivio da pressão sobre o ego, a distancia do espelho. A ficção dá a chance de se conhecer outra forma de ver e de pensar. Porque na verdade, fora brilhantes exceções, toda bio é a mesma escrita, a mesma forma, o mesmo espelho.
Ficção aumenta nosso repertorio de mundos, de chances, de liberdades.
Quem quer?

SO' GAROTOS....PATTI SMITH

A frase que revela a alma de Patti é dita quando ela diz que Robert não conseguia perceber o romantismo da febre, de se estar doente. Ela percebe. Patti é uma romantica. Rimbaud, Baudelaire, Rousseau são guias. Sua geração foi a ultima geração culta do rock. Depois existiram românticos, mas artísticos de verdade não.
O rock é coisa pura, energia sem razão. Isso é maravilhoso, isso foi único. Com Dylan o intelectualismo invadiu a coisa. Esse intelectualismo quase matou o rock, mas trouxe Zappa, Joni Mitchell e acima de tudo o VELVET UNDERGROUND. Patti nada tinha a ver com o mundo do rock. ComoLaurie Anderson, David Byrne ou August Darnell, sua praia é outra, a poesia. Patti poderia ser uma chata. Não é. Ingenua sempre. Uma pessoa adorável.
Sam Sheppard namorou Patti Smith! Isso é incrível! Para quem não lembra, Sam escreveu o roteiro de PARIS/TEXAS, fez o papel de Chuck Yeager em OS ELEITOS, e é marido de JESSICA LANGE desde os anos 80.
Não espere ler aqui sobre rock. Ele é sobre boemia. Sobre um casal apaixonado. Sobre o estranho Mapplethorpe e a boazinha Patti Smith. A Esta ira, e o modo como Rimbaud, Keith Richards e JESUS CRISTO guiaram a vida dessa menina sem igual.
O livro também mostra o contraste entre a década de 60 e a de 70. A primeira foi utópica, trágica e infantil. A dos 70 foi cínica, egocêntrica e centrada no culto às celebridades.
Eu lembro de quando saiu Horses. Causou surpresa por ser sem rótulo. Não era folk, nem hard, prog ou pop. Lançado em ano de transição, foi, ao lado de Born to Run, de Springsteen, disco do ano. Depois inventaram que ela era punk!???!!! Nunca foi! Patti ignora Stooges, MC5 E OS DOLLS. PATTI foi da mesma matriz de Lou Reed, arte, Andy Warhol, beats, cinema, franceses.
França... Faz falta essa influência boemia/Montmartre no rock de hoje. Ambição...
Devore o livro! É bom pacas!

MONGES

Quando os vikings invadiram a Europa, e estupraram, queimaram, massacraram, nosso mundo sobreviveu graças a meros monges irlandeses. Eles esconderam textos antigos e esperaram a poeira baixar. Então andaram a pé por todo o continente, fundando mosteiros, escolas. Sem eles a Europa seria hoje um apêndice do mundo e eu seria um muçulmano. Quais serão os monges de hoje? Quem salvará os textos?
Quando comecei a ler jornais, nos cadernos culturais os autores vivos mais comentados eram NABOKOV, BORGES, CORTÁZAR, BELLOW, GRAHAM GREENE, BECKETT. Ainda se falava de Gide e Malraux. Hoje se fala do que? Aliás, ainda há caderno cultural?
Hoje um amigo falou de Paulo Francis. Francis dizia que quando fumava maconha ouvia Wagner a todo volume.
Em 1752 Samuel Johnson mandou uma carta para um nobre inglês dizendo dispensar um mecenas. Um artista não mais obedeceria a ninguém. O publico culto o sustentaria. O mundo do que conhecemos nasceu nesse dia. Ainda existe?

PLATO E VICO

Uns dias depois do livro de Frenkel, releio um pouco de Vico e já nem sei se Frenkel não estaria errado. Ele é completa e assumidamente platônico. Para ele a Matemática existe independente do homem. Um mundo ideal, perfeito, um continente que cabe ao homem descobrir e procurar traduzir. Mas Vico me recorda que não é nisso que acredito.
Vico conta que o homem pode conhecer completamente apenas aquilo que ele produz. Um homem saberá tudo sobre um trem, mas não sobre o que seja a energia que move o Cosmos. Saberá tudo sobre um coração mecânico, mas não poderá jamais criar um coração de carne a partir do nada. Do que não fizemos saberemos apenas uma ínfima parte, e a cada parte compreendida, milhões de novas duvidas virão. Isso é Vico, dizendo que o homem poderá compreender todo o mecanismo da historia, da sociologia, mas nunca tudo sobre a física ou a biologia, pois se nós construímos a historia e a sociedade, não fomos nós os criadores da vida ou da mecânica do universo.
Creio nisso. E para mim a matemática é uma criação humana, abstrata, e suas leis existem dentro do mundo do homem, em sua razão, e morrerão se um dia o homem sumir.
Como sempre disse, o Um existe apenas como invenção racional, e o Zero é uma soberba convenção humana. Fora de nosso cérebro inexiste o Um e o Zero.
Vico sabia disso.

FISH RISING...STEVE HILLAGE. A CARA DO LSD.

A capa surge em meu caminho. STEVE HILLAGE? Esse guitarrista tocou no GONG! E com um monte de gente. Faz parte da cena de Canterbury.
Canterbury... Sul da. Inglaterra. Centro da igreja. Foco de romaria na idade média. Nos anos. 60 viu o nascimento do rock mais LSD da ilha.
Steve Hillage...e é um LP nacional. Não sabia que lançaram coisas assim por aqui em 1975. Esse tipo de som vendia pouco. Era muito bagunçado para os Progs,  muito leve para os Heavy, e nada Pop para os demais.
Olho a capa. Parece coisa de cigano. Feia. Desenho de peixes. Varas de pesca. Rio. Letras mal escritas. Viro o disco e vejo a capa de trás. Fotos. Steve no mato, pescando e tocando. Roupas largas, touca de lã. Barba e o olhar. Cara de ácido. Sabe como é? O sorriso LSD. Membros da banda. Parece gente voltando de rave em Ibiza em 1992. Vou com a cara de todos. Um está com seu cão.
O som.
Os títulos dizem tudo: Song of the Salmon. I love the Holy. Song Sacred.
Steve sola o disco todo. Sem parar. O resto da banda cria ritmos. A sensação, primeira, é de aversão, mas após dez minutos você começa a viajar. O vocal lembra Perry Farrell. O som é  meio Soft Machine, meio Janes Addiction, com doses de Gong. Gosto.
A gravadora é Virgin. Virgin? Poda! Richard Branson! Foi aqui que o hippie Branson começou sua saga! A gravadora mais hippie de Londres! E que em 1977 iria ser a única a ousar gravar os PISTOLS!
E hoje Branson é o cara que 99% dos caras queria ser.
O povo da cena de Canterbury acreditava em magia. Bruxas. A história da Virgin provou que eles estavam certos.

AMOR E MATEMÁTICA, O CORAÇÃO DA REALIDADE ESCONDIDA- EDWARD FRENKEL

Primeiro peço que não se confunda física com matemática. A física lida com aquilo que pode ser mensurado no mundo real, a matemática procura descobrir aquilo que sempre existiu, independente do homem, no mundo das idéias perfeitas. Platonismo? Sim, Frenkel defende o platonismo puro da matemática. É a única coisa conhecida no mundo que nada tem de física ou de mental. A matemática não está numa caverna para ser encontrada, não mora no mundo microscópio, não é acessada por telescópio, portanto ela não é solida. Ao mesmo tempo, a matemática não é criada por alguma mente genial. Pitágoras nunca inventou nada, ele descobriu algo que já estava lá desde antes do homem. O mesmo se dá com toda a matemática, nada nela foi criada, inventada, ela existe independente de nossa existência. É atemporal. Nosso cérebro jamais poderia a ter criado, ela vai além de nosso entendimento. Tudo o que fazemos é tentar conhecer seu universo.
Desse modo, todo conhecimento matemático não tem e não pode ter dono, ele é parte de todos, é uma linguagem sem tempo e sem fronteira, mas, ao contrário das línguas gramaticais, a lingua dos números não foi inventada, ela é desvendada.
O que se percebe é que o universo é todo feito de matemática, e este livro tenta nos fazer perceber alguma coisa do que seja essa matemática.
Esqueça a velha matéria da escola. Frenkel diz que o que nos ensinam são rabiscos sem sentido. O que o livro dá é aquilo que surgiu nos últimos 50 anos. Feixes, cordas, planos, campos morfológicos, correspondências. Claro que entendi pouca coisa, sou um homem da linha e do ponto, da palavra, a abstração, um número que simboliza dez dimensões...isso me é quase inalcançável. Mas percebi a nobre humildade desse conhecimento, a quase assustadora imensidão de seu questionamento. A matemática procura as perguntas certas e vai atrás do mundo das idéias puras, dos segredos menos humanos, os segredos matemáticos.

HOBBIT/REX HARRISON/ AL PACINO/ RAY/ SODERBERGH/ DORIS DAY

JUMBO de Charles Walters com Doris Day, Jimmy Durante, Martha Raye.
A vida no circo, onde Doris é a filha do dono, que por sua vez gasta tudo em jogo. O filme é simples, alegre, e entretém. O trio central brilha com sua simpatia. Nota 6.
O ENXAME de Irwin Allen com Michael Caine, Henry Fonda, Richard Widmark.
Abelhas africanas botam pra quebrar no Texas. Caine é um cientista. O filme tem uma direção inábil. Tão trash que fica até funny.
O ÚLTIMO ATO de Barry Levinson com Al Pacino
Birdman? Ator em crise tem ataque no palco. Fica preso do lado de fora, vai morar isolado, se envolve com gente doida... O filme é o mais árido da boa carreira de Levinson, e Pacino está interessado. Confuso, não é um bom filme, mas é interessante. Nota 4.
ADEUS À LINGUAGEM de Godard
Incompreensível. Cenas de um casal, muita nudez, frases inteligentes, imagens trêmulas, confusão. Godard aina é difícil, rebelde, ácido. Atira contra tudo e parece concluir que a linguagem se desfez, não faz mais sentido.
O HOBBIT, TODOS OS TRÊS. de Peter Jackson com Martin Freeman, Ian McKellen
Jackson tem coragem! Após os anéis ele arrisca os dedos. Volta à Tolkien e usa um livro muito mais pobre do autor. E o estica em quase nove horas de cinema. A parte um é boa, a segunda é ruim e a terceira é a melhor. Um erro está no elenco. Freeman é um hobbit ótimo, mas o líder dos anões é fraco. De todo modo, há uma beleza estética que não cansa. O maravilhamento dos anéis se perdeu, mas é boa diversão. Nota 6, 3 e 6.
FULL FRONTAL de Soderbergh com Julia Roberts, David Duchovny,Catherine Keener
Soderbergh e seu medíocre lado artístico. Ele brilha quando pop, mas, inseguro, acha que precisa provar ser arteiro, e faz suas besteiras metidas à Cassavetes ou Godard. Aqui é um filme dentro de um filme. Só what?
THE CHESS PLAYERS de Satyajit Ray
No século dezenove enquanto a Inglaterra se apossa da Índia, dois nobres se distraem jogando xadrez. O filme é chato e é forte. Ficamos entediados, mas depois que ele acaba não nos larga. Lembramos dele com admiração. Isso é arte. Nota 7.
ASFALTO de Joe May
Filme mudo alemão de um dos mais poderosos nomes da época. Um tenente de policia é seduzido por uma mulher fatal. O filme tem um belo clima sensual. Pode ser um bom começo para aqueles que desejam adentrar o mundo do cinema dos anos vinte. Nota 6.
ANNA E O REI DO SIÃO de John Cromwell com Irene Dunne e Rex Harrison.
Primeira versão da historia da professora que vai à Tailândia ensinar rei a ser moderno. Lindo, dramático, serio e muito bem interpretado. Rex consegue ser duro, frio, e frágil ao mesmo tempo. Envelheceu nada esta produção Fox. Nota 8.