SPIRIT/ONIBABA/RENOIR/JASÃO E O VELO DE OURO

THE SPIRIT de F. Miller
Will Eisner criou o Spirit como um detetive noir. Ou um observador da sordidez humana. Uma genial criação, cheia de sombras e miséria. Este filme é um testemunho vivo do nível de idiotia que o cinema chegou. Uma bobagem feita por uma besta para um bando de deficientes mentais. O atorzinho desperta compaixão. nota muito abaixo de zero.
PAPAI NOEL AS AVESSAS dirigido por qualquer um. com billy bob thornton.
Isto deveria ser uma comédia. Mas não provoca qualquer riso. Elogia o mal caráter. Prova o fato: a América acabou. Se tornou um tipo de Brasilzão onde neva. Um país de "jeitinho ". nota zero!
SASKATCHEWAN de Raoul Walsh com Randolph Scott
Faroeste passado no Canadá. Paisagens deslumbrantes. Tem mensagem pró-indios e a competencia de Walsh, um diretor que vai lá e faz a ação acontecer. nota 6.
JASÃO E O VELO DE OURO de Don Chaffey
Os efeitos especiais de Ray Harryhausen tinham o encanto de brinquedos de armar : voce sabe que é um brinquedo, a diversão é ver o brinquedo se mover. Como extra, este filme traz Tom Hanks entregando Oscar especial a Harryhausen e dizendo : - Muitos dizem Cidadão Kane, muitos dizem Casablanca; pra mim é Jasão e o velo de Ouro !... nota 7.
ROMEU E JULIETA de Baz Luhrman com Leo di Caprio
Eu adoro este filme ! Muito superior a Moulin Rouge. Colorido, leve, encantador. nota 7.
A ÚLTIMA NOITE de Robert Altman com Kevin Kline, Meryl Streep, Woody Harrelson
Eis o último filme do mais livre dos cineastas. O que ele filma aqui ? Um programa de rádio do interiror dos USA. É só isso. Simples, e portanto digno. Mas ao mesmo tempo revela o maior defeito de Altman : desleixo. Longe de obras-primas como Mash, Short Stories ou Nashville. 4.
A CARRUAGEM FANTASMA de Victor Sjostrom
Antes de ser o ator de Morangos Silvestres, Sjostrom foi o maior diretor da Suécia e ídolo de Bergman. Esta é sua Obra máxima : um fantástico e lúgubre filme sobre a morte. Imagens de sonho, uma trilha de música eletrônica soturna, atores "tomados". Terrível. Um pesadelo. nota 7.
WOLWERINE com Hugh Jackman
É um ator legal. Dá vontade de ser amigo dele ( mas daí a ser grande ator existe imensa diferença. Quem quer ser amigo de Marlon Brando ? ). Os efeitos especiais destróem o filme : tudo parece falso, de plástico, irreal. É um Wolwerine domesticado, bastante boa-praça, o que aniquila sua originalidade. Mas Hugh é gente boa... nota 4.
ONIBABA de Kaneto Shindo
No Japão dos samurais, velha e nora vivem, em meio a mar de bambú, de roubos, assassinatos, pilhagem. A nora se torna amante de amigo do marido morto e o filme se faz bastante sensual. A velha intervém, e a calamidade final irrompe. Um filme muito ousado e cheio de beleza cruel, dura, sádica. O Japão dos anos 60, com seu terrorrismo de esquerda, era um país enlouquecido. Este filme, genial em seu radicalismo, prova isso. A trilha sonora é coisa de mestre. Nota 8.
SANTA FÉ de Irving Pichel com Randolph Scott
Fraco western de rotina. nota 2.
UMA FESTA NO CAMPO de Jean Renoir
Nunca entendí o porque de Renoir ser considerado o maior diretor da história do cinema ( principalmente pelos colegas diretores ). Assiti todos seus principais filmes, e embora eu goste de todos, nenhum eu chamaria de obra-prima. Mas este, curto, apenas 45 minutos, começa a mudar minha idéia. Lindo, com um ar de plena felicidade. Mostra o que era a França de Renoir-pai, de Monet, de Matisse. Alegre, safado, poético, solar. Quase um milagre em película. Detalhe: o assistente de direção é o gênio da fotografia : Henri Cartier Bresson, o que diz muito sobre suas imagens : nunca um rio foi melhor filmado. nota 8.
A FILHA DA ÁGUA de Jean Renoir
Eis o primeiro filme de Renoir. Mudo, conta as atribulações de uma orfã. No campo, em meio a ciganos, burgueses, camponeses. Não é considerado um dos melhores Renoir, mas, com surpresa, ele me conquistou. Cenas como a do quase estupro pelo tio ( com cortes rápidos e cruzados ) e do incendio na fazenda, são de estupenda genialidade. O filme flui como um sonho. É agradável, belo, poético e leve. A fotografia, cheia de estilo, seduz. Lhe colocaram uma trilha "francesa" que ajuda muito. Uma bela surpresa. Uma quase obra-prima. nota 9.

botando pingos nos issssssssssssss

Toda arte ( ou aquela que pensa ser ) é um organismo vivo. Ela nasce, se desenvolve e decai . Cinema mudo é a infancia dessa arte. E como toda criança é ingênuo, cheio de vitalidade e com o mágico dom de alguém que descobre o mundo. Nos anos 30 ele é um menino na escola. Fala muito, pensa ser " grande ", e vive sonhos de grandeza. O cinema se aventura mundo afora. Vem a adolescencia, e ele descobre que o mundo é cruel ( neo-realismo ) e ao mesmo tempo, se torna um rebelde cinico ( cinema noir ). Torna-se adulto. Seriedade, responsabilidade - a vida é para ser construida dia a dia - tempo dos dramas americanos dos 50, e do cinema de arte - Bergman, Fellini e muitos outros. Chegamos a maturidade. Filhos, cabelos brancos, posses, medos. È o cinema dos anos 70, que já revela um certo desencanto, um clima de fim de ilusões. Nos anos 80 estamos na terceira idade. O ser vivo tenta remoçar, faz plásticas, chora e rí, toma hormônios, luta. Mas perdeu vitalidade. Desse momento em diante é ladeira abaixo. Senilidade. Hoje ele vive ligado a aparelhos. A tecnologia faz com que ele ainda respire, mas na verdade ele vegeta. Vive pensando em seus velhos momentos de grandeza e sonha com sua última ereção. Às vezes consegue respirar sem aparelhos, revive alguma idéia esquecida e retorna ao quarto onde tenta ser criança outra vez.
Assim é com toda vida e com toda arte. E religião. E filosofia. Os gregos foram crianças, descobrindo e brincando com deuses, átomos e números. A idade média foi a primeira infancia, agarrada ao pai e cheia de medos e magia. Adolescencia renascentista em que o homem descobriu a liberdade, o universo e a independencia. Torna-se adulto no iluminismo ( estou falando de filosofia ) e maduro com Hegel, Schopennhauer e tem um surto de desejo de retorno à infancia com Nietzsche. No existencialismo ele começa a ser velho.
Mas então voce pode pensar : se toda arte se tornou velha, logo, ela irá morrer ! Talvez não. Talvez seja congelada numa espécie de limbo, onde tudo retorna indefinidamente, cada vez com mais superficialidade, cada vez dependendo mais da vida " por aparelhos ". Forçada.
Este é um tempo de ciencia. Nela, a vitalidade humana se manifesta. Pensamos em termos científicos ( sem perceber, nossos julgamentos se transformaram em conceitos da ciencia : eficiente X ineficiente, novo X ultrapassado, rápido X lento..... ), mas o trágico é que nosso espírito não é científico ! Daí a esquizofrenia da vida atual : um mundo cientificamente moderno feito para uma alma arcaica e apegada a carne, ao sol e a água. Ver a arte, a religião e a filosofia morrerem é A MAIOR TRAGÉDIA QUE A ALMA HUMANA PODERIA SENTIR, pois para ela é a perda de sua prórpia razão de ser, de consolo e de justificação. Ela irá então se alienar, encolhida em algum recanto do universo, assistindo ao nosso triste mundo de distrações vazias, de ansiedade inútil e de um progresso eternamente insatisfatório.

os europeus- henry james

Existem dois tipos de grande romancista : aquele que cria personagens que se tornam reais e aquele que cria um universo que respira e cresce. Lievin, Heathcliff ou o Quixote são, não apenas seres vivos, reais, como fazem parte de um mundo criado pelo autor. Ao ler esse tipo de livro, voce penetra nesse planeta, acredita nele e passa a dialogar com os seres daquele universo, usando a linguagem daquele autor. É fascinante imaginar como seria Quixote no futebol, Lievin na segunda-guerra ou Heathcliff numa rave. É totalmente real. Nós sabemos como seria porque os conhecemos como pessoas vivas, " mais reais que a própria realidade ".
Heminguay e Fitzgerald conseguem criar seres reais, mas não criam um universo. Faulkner sim. Assim como Twain ou este viciante Henry James.
O mundo de James é o mundo dos milionários sem país. Dos estrangeiros, dos em-mudança, do desterro. Mas não o exílio mundo-cão, é mais sutil, é o exílio dos privilegiados, dos que deveriam ser livres, mas não o são.
Ler "Os Europeus" é travar contato com esse mundo : Felix, Carlota, Robert e Lizzie são apaixonantes. Voce lê não para saber o que vai ocorrer, voce lê para conviver com eles. E é isso que faz de James um grande romancista. Seus personagens interessam, seu ambiente interessa. O diálogo é, portanto, interessante. O enredo fala, com humor e requintes de leveza, de dois irmãos europeus, quase falidos, que vão visitar os ricos primos de Boston. O contraste entre Europa e América é fascinante.
Europeus enchem a casa de cortinas, tapetes, bibelôs, quadros, leques, panos. Americanos têm casas claras, confortáveis e com muita luz. Europeus amam aquilo que poderia ter sido, americanos o que será um dia. Europeus se vestem para os outros, americanos se vestem para não pensar na roupa. O amor europeu é um jogo de famílias, o americano é individualizante. O europeu se diverte muito e é triste, o americano é seco e distante, mas é confiantemente feliz. O europeu rí, o americano observa. O europeu tem nome e refinamento, o americano tem dinheiro e saúde. A limpeza é da América, o perfume é europeu.
Henry James nasceu numa rica e culta família de Boston. Seu pai, Henry James Sênior, foi um médico e intelectual que criou os filhos na crença de que o ser-humano dever ver de tudo, ouvir de tudo e conhecer tudo. Henry e seu irmão, William, foram educados então, em New York, Paris, Londres e Bonn. Em Henry se formou aí o sentimento de se ser um estrangeiro eterno, um viajante em mudança contínua. O pai sofreu o primeiro ataque de pânico registrado ( em 1875 ) e ficou com a sequela de regredir à infância. William, que também sofria ataques de pânico, se tornou um dos maiores psicólogos da América e o filósofo central do pragmatismo. Henry filho, criou a maior e mais bela obra ficcional da América. Se tornou um gigante, amado por Proust, Joyce, Fitzgerald e todo escritor sério desde então. Mudou-se para Londres, naturalizou-se, mas ao contrário de Eliot ( outro americano emigrado ) James confessou ao final da vida, que se tivesse permanecido na América teria provávelmente sido mais feliz e escrito melhor.
Ler Henry James é um prazer que nenhum outro autor pode dar. Encontro nele sabedoria, humor, e o discernimento de alguém que foi o primeiro dos modernos : percebeu que a partir dalí, lar- nação- tradição, significariam cada vez menos.

a bela julie christie, franz ferdinand e harold pinter

Nada confirma melhor a validade da postura filosófica sobre o tempo, na visão oriental, que o tipo de música pop que se faz na Grã-Bretanha desde 1984. Essa postura filosófica, seguida dentre outros por Eliot e Yeats, diz que o tempo é circular e que repisamos o mesmo caminho indefinidamente. Londres 1963 foi o último suspiro do leão agonizante. O império desmoronava de vez e desde então tudo, absolutamente tudo, com alguma validade, feito por um inglês, chora o final do apogeu britânico.
Aconselho dois filmes : Billy Liar e Darling. São filmes do movimento angry-free-cinema, que evoluiu por lá entre 59/65. Um cinema que é exatamente aquilo que a Inglaterra de hoje tenta e nunca consegue ser : jovem, descompromissada, revolucionária, alegre e sexy. São filmes com imagens das chaminés de Manchester, de garotas de minissaia andando pelas ruas, de garotos de cabelo despenteado reclamando do desemprego, de gigolôs charmosos, de brigas no pub, de correr atrás do double-decker-bus... de mini-cooper e lambretas, e de bikes em Oxford. É o tempo da sofisticação ultrajante de Joe Orton e Harold Pinter no teatro, dos atores inconformados e belamente decadentes : Peter O'Toole, Alan Bates, Terence Stamp, Tom Courtney; e das musas das musas : Vanessa Redgrave, Jane Asher, Judy Geeson, e a incomparável Julie Christie, a imagem definitiva.
Quando aconteceram Beatles, Stones, Yardbirds e Them, o momento já era passado e eles haviam se tornado estranhamente saudosistas. No momento de Carnaby street e Mary Quant, Londres já tinha vivido seu apogeu e já contabilizava um glamour do passado. Não por acaso, tudo de melhor que essas bandas fizeram foi chorar pelo leite derramado ( no caso, leite com chá ).
Tudo, desde então, é um repisar de fontes anteriormente bebidas. Smiths e Morrissey são a saudade de Wilde, de Oxford, o prazer de se tomar chá lendo Evelyn Waugh e Foster. The Jam´são terninhos eduardianos, cabelos eduardianos e o radicalismo da esquerda eduardiana. Com um som todo aspirando ser Who e Small Faces. Jesus and Mary Chain é a saudade do rouxinol de Keats, trespassado pelo som elétrico do Velvet com a voz de Ian Curtis. Nem vou falar de Oasis, uma banda doentia, que obriga o baterista a tocar como Ringo e faz a mixagem de seus discos com técnicas de 68. Ou o Blur, sempre tentando ser Oasis com sexo.
Pois assisto doze clips do Franz Ferdinand. Bem... o nome da banda já é saudade, nome do arqui-duque morto em Sarajevo, 1914... os clips são citações sobre citações dos tais filmes ingleses de 59/64. Moças que são a cara de Rita Tushingham, moços que se parecem com o jovem John Hurt e roupas como a swinging London... velho, velho,velho demais... O som é Small Faces mais Kinks com toques de Roxy Music. O de sempre...
Algo de jovem nas ilhas britânicas, somente quando parte dos negros ( que querem soar como americanos- e conseguem ) dos indianos e dos africanos que lá vivem. Ingleses brancos, esquálidos e anglicanos, continuam a chorar e chorar os velhos tempos, a repetir a mesma poesia de ancião impotente e a encher de mofo uma cidade já bastante mofada.

para ler após o texto daí de baixo !

Sim, sim, sim, sim ! Iris Murdoch está certa ! Nossa vida cotidiana não é real pois não é inteira. Quando meu pai se foi eu me sentí verdadeiro como raras vezes me sentí. Eu estava triste, perdido, aturdido, mas estava inteiro. Agora entendo : eu vivia um momento de Shakespeare, de Shelley, de Bronte.
Naqueles dias, sem nada planejar, sem nada antecipar, longe do trabalho e dos amigos, longe das máscaras, eu me atirei à literatura simbolista. Yeats, meu papa Yeats me consolou, e Proust, Wilde, Keats me fizeram companhia. Os símbolos foram invocados.
Iris Murdoch acertou. Pois em todos os meus momentos de alegria, alegria inesperada, súbita, irrefreável, eu fui um personagem de Cervantes, de Chaucer ou Rabelais. Então eu entendo que os gênios nos mostram aquilo que somos sem perceber, ou melhor, aquilo que tememos saber ser.
Não seria a neurose um conformismo ao irreal ? A vitória do medo ? A negação do daimon interior ?
Yeats estava e está certo. Há um diabozinho que nos espeta internamente. Que estraga tudo quando achamos estar em paz. Que espeta nossa bunda e nos faz andar. E esse monstrengo é aquilo que negamos, que não olhamos, que tememos. Todos o tem, mas o gênio tem mais. Alguns tem tanto que fogem e negam a luta. Desabam. Qual seria a força desse demonio em Da Vinci, em Beethoven, em Goethe ? Yeats diz que o amor faz parte desse demonio ( duende ). Que todo amor é um desafio que nos destrói. Que aquela/e que amamos é sempre um rival, um enigma, uma armadilha. Mas que ao aceitar a luta, crescemos, criamos, nos igualamos ao demonio.
Portanto jamais tema a dor. Quanto maior ela lhe aparecer, maior é sua força para a vencer.
Jamais chore o que se foi. O Nada é o que lhe cabe e, portanto, tudo lhe pertence. O que voce viveu e sentiu permanece para sempre em voce. E voltará. Outra e outra vez.
Basta viver.

se voce quer saber um pouco sobre livros, harold bloom é o cara

São mais de 800 páginas. Mas vale a pena. Gênio de Harold Bloom analisa os 100 autores de toda a história que ele considera mais influentes. Não darei a lista para voces. Mas posso dizer que algumas surpresas estão presentes. E outras lógicas e esperadas : Shakespeare é o maior e os únicos que se aproximam do autor inglês são Cervantes, Dante e Tolstoi. Com Joyce e Proust por perto.
O que vou fazer é citar alguns trechos que considero magistrais.
Freud não foi um grande cientista. Ele foi o maior cronista do século. O Montaigne de nosso tempo. Para a cultura alemã, ele é o continuador de Goethe, um tipo de gênio que tudo sabe, com poderes ilimitados. Um sábio.
Como foi Thomas Mann, o mais sábio dos autores do século.
Proust nos ensina que toda perda traz um ganho. É o mais artista dos escritores. Nos ensina a transcendencia do eu. Nenhum autor tem tantos momentos de epifania ( que eu, Tony, chamo de duende ) como Proust. Seu texto traz iluminação.
Samuel Beckett é um dos muito raros santos da literatura. ( Eu explico : lendo a biografia de Beckett vemos que ele fez tudo aquilo que chamamos de santidade. Ajudou colegas desafortunados, deu dicas valiosas, lutou em duas guerras sendo considerado um herói, e jamais se vangloriou. Enquanto Heminguay falava de sua participação- mentindo muito- Beckett nunca escreveu ou falou nada sobre seu heroísmo. Para ele, a guerra é algo cruel demais para ser divulgada ). Bloom conta que a literatura cessa de evoluir em Beckett. Após seu modernismo, o romance recua e volta a ser escrito como o era no século dezenove.
Emily Bronte, com O Morro Dos Ventos Uivantes atinge o auge do encantatório em livro.
Maravilhoso é o texto sobre Walter Pater. Pater foi um crítico inglês que formou gerações. Oscar Wilde deve muito à Pater. No texto de Bloom ficamos sabendo que além do esteticismo, Pater criou a " visão psicodélica do mundo " e então Bloom transcreve um texto de Walter Pater, de 1887 que antecipa uma viagem de lsd em décadas. Uma bela viagem de lsd. Pater dizia que nossa individualidade é uma ficção, que fazemos força para nos agarrar a esse centro individual; pois não fosse isso, iríamos nos dissolver em sensações. O artista deve " arder em chama preciosa ", ir até o fim de tudo. Pater cria portanto a religião dos ateus- a religião da arte, que tanto inflenciará além de Wilde, Yeats, Virginia Wolff, Joyce e Proust.
Para nossa alegria, Harold Bloom coloca Camões nas alturas. Para ele, Os Lusíadas são tão grandes como A Eneida e dignos de Homero ou Dante.
Ninguém escreveu tão bem sobre a paixão como Stendhal, e ninguém nos diverte tanto ao mostrar a dor de amar. Stendhal tem humor, tem fantasia, tem fogo. Ele é, com Tolstoi, o maior filósofo do amor e da luta entre os sexos.
Mark Twain cria, com Whitman e Henry James, a América, terra da ficção. Se Whitman é o maior poeta americano e James o melhor escritor, Twain é o maior humorista e o mais terrível satirista.
Faulkner é de longe o maior escritor da América depois de Henry James.
Fernando Pessoa foi mais que um gênio. Ao criar suas personas ( e como Whitman, ele apenas parece sincero. Todo grande poeta não é sincero ) Pessoa se torna 3 gênios. Pessoa descende diretamente de Shelley, é um poeta da alta imaginação, do alto romantismo. Álvaro de Campos é o mais genial dos heterônimos, exuberante. Sublime. Somente um país como Portugal poderia ter gerado um poeta como Pessoa. Pois Portugal é um heterônimo em sí. Uma relíquia de um império. Daí, Harold Bloom cita uma frase de Fernando Pessoa que eu não conhecia : " Com uma tal falta de literatura, como há hoje, que pode um homem de gênio fazer senão converter-se, ele só, em literatura ? Com uma tal falta de gente coexistível, como há hoje, que pode um homem de sensibilidade fazer senão inventar os seus amigos, ou, quando menos, os seus companheiros de espírito ? "
Ao falar de Iris Murdoch, Bloom cita outro texto, de Murdoch, que considero magistral/ belo e estranhamente assustador : " Shakespeare, Tolstoi, Homero, Dickens, James- mostram-nos o mundo verdadeiro, o nosso mundo, que, normalmente não enxergaríamos. Eles nos indicam aspectos da realidade que não seríamos capazes de ver sem sua ajuda. " Ou seja, o universo das peças de Shakespeare está dentro de nós. Todos temos a intensidade de Hamlet, o horror de Macbeth, a dor de Lear e o romantismo de Romeu. Mas somos incapazes de o perceber.
Há imensos elogios para Eça de Queirós e para Machado de Assis. Bloom chama Machado de gênio e diz ser ele o maior seguidor de Laurence Sterne e Swift- mas sendo sempre original em seu terrível humor. Eça é um fino artista, também cheio de humor, um dos grandes do século dezenove.
No texto sobre Yeats há outro dado que considero fantástico. ( E que mesmo adorando Yeats como eu adoro, não conhecia ). O gênio de uma pessoa é seu demônio. Ele o fustiga, desafia, exaspera. Assim como o amor, o demônio é o inimigo, a antítese, a imagem no espelho, anima. O amor, o gênio interno, existem como forças de destruição, mas que ao serem enfrentadas, tornam-se criação. O demônio alia-se ao amor " não apenas como opositor, é nosso outro eu. " Como Goethe e Shelley, ele acreditava no seu prórpio demônio. Ser que lhe propõe tarefas cada vez mais árduas. Cabe ao artista aceitar tal desafio, e mudar, mudar sempre, na eterna descoberta de sí mesmo.
Termino esta pequena exposição do livro de Harold Bloom ( há ainda maravilhosos textos sobre Italo Calvino, Goethe, Keats, Rimbaud... ), citando Yeats, o mais fantástico dos romanticos :
SÓ PODE CRIAR A MAIOR BELEZA IMAGINÁVEL QUEM SUPORTOU TODAS AS DORES IMAGINÁVEIS, POIS SOMENTE QUANDO VIMOS E PREVIMOS AQUILO QUE TEMEMOS, SEREMOS RECOMPENSADOS PELO DESLUMBRANTE, IMPREVISTO, ANDARILHOS DE ASAS NOS PÉS. NÃO PODERÍAMOS ENCONTRÁ-LO SE ELE NÃO FIZESSE PARTE, EM CERTO SENTIDO, DO NOSSO SER, DO NOSSO PRÓPRIO SER, MAS COMO ÁGUA COM FOGO, RUÍDO COM SILÊNCIO. VEREI AS TREVAS SE TORNAREM LUMINOSAS, O VAZIO SE TORNAR FECUNDO, QUANDO COMPREENDER QUE NADA TENHO, QUE OS SINEIROS DA TORRE APONTARAM UM SINO ITINERANTE AO HÍMEM DA ALMA.
A alma sempre há de ser virginal, pois o demônio ou gênio, é a ela antitético. O gênio de Yeats floresceu quando ele se deu conta de que nada tinha, que a solidão interna era sua benção. Dotados do frêmito do mar oeste/ Pensamentos e imagens comuns/ Dos quais criei meus gemidos/ Para depois beijar uma pedra...uma pedra...
E depois disso compus uma canção...

morangos silvestres, a vida é um círculo

Aqui no ocidente, somos educados a acreditar que a vida é uma reta. Partimos de um ponto e caminhamos em direção a outro ponto. Esse ponto final pode ser o nada, Deus ou o cosmos, não importa, enxergamos sempre uma estrada reta à nossa frente.
Para o oriental, a vida é um círculo. Não existe ponto de saída, não existe ponto de chegada. Estamos eternamente repassando pelos mesmos locais e momentos. O antes é o amanhã e o ontem se repete no futuro.
Morangos Silvestres já foi meu Bergman favorito. Hoje eu prefiro O Rosto. Mas como dizer qual o melhor ? Um artista de tal nível transcende julgamento. Seus filmes são concretos, estão alí, reais e eternos. Não precisam de nossa opinião. Permanecem no circulo, estão fora do tempo. E Morangos Silvestres fala exatamente disso : o tempo.
Um velho escreve, sonha, viaja de carro e " retorna à sua casa de infância ". O que acontece ? Penso, agora assistindo o filme pela quarta vez, que na verdade esse professor já está morto quando o filme se inicia. O que assistimos não é sua memória, mas sim, sua entrada no paraíso. Será ? Hoje penso que sim.
Leio que o jogador Adriano está morando na favela. Um belo texto na Veja sobre isso. Não é questão de cultura, é questão de espírito : o lugar onde pela primeira vez fomos felizes é nosso paraíso. A primeira manhã, o primeiro amor, a primeira brincadeira, a magia da descoberta. Para Adriano, a favela será para sempre o seu ninho, sua perfeição, sua beleza.
A última cena de Morangos Silvestres é uma das mais belas já filmadas. O professor enxerga seus pais pescando, os pais o percebem e acenam. Ele acena e os olha : um olhar único : o velho senhor se torna uma criança diante de nosso olhar maravilhado. Ele acaba de adentrar o paraíso. Pois é isso que todo grande artista faz, nos exibe céu e inferno, mesmo que não o queira ou saiba. E cada vez mais me convenço disso : viver é andar no círculo : nos afastamos da infancia e a ela retornamos para nos afastar outra vez... se soubermos perceber.
Como julgar este filme ?

EM BUSCA DO OURO- J.M.G. LE CLEZIO

Leitores ( críticos inclusive ) tendem a dar uma excessiva importancia ao Nobel. Vai daí que ao não contemplar seu autor vivo favorito, façam um escandalo, como se seu ídolo houvesse sido ofendido. O prêmio não garante imortalidade, pois apesar de ter premiado imortais como Yeats, Eliot e Mann, o Nobel ignorou Borges, Joyce e Proust ( dentre vários outros ).
Esculhambaram a escolha de Le Clezio. Eu mesmo, na época, teria optado por Updike ou Roth. Bem... o prêmio já premiou gente bem pior. Recentemente temos Toni Morrison, Derek Wallcott ou Dario Fó.
Vamos ao livro, o segundo que leio de Le Clezio ( que é famoso e adorado na França ).
Nascí numa casa grande. Com um longo corredor. Longo o bastante para sevir de lugar para brincadeiras. Havia um porão também, escuro, úmido e cheio de aranhas. Lá eu sonhava em tardes muito quentes. Um imenso quintal, cheio de árvores e bichos. Me deitava ao sol e brincava de olhar nuvens passando... Um dia essa casa foi largada, deixada, e com ela todo o mundo ao redor também. Mundo de caranguejos, cobras, sapos e tardes longuíssimas com nada para fazer. Um mundo muito vivo, rico, que criou poetas, doidos ou vadios.
Ao lado desse universo existia o planeta oceano. As idas à São Vicente, que naquele tempo tinha ainda um clima de lugar distante, calmo, do mar. Um mundo de peixe fresco, camarões, chuvas assustadoras, da Serra do Mar... Esse é o mundo de onde eu vim. "Em busca do ouro" fala à esse universo.
Este livro de Clezio fala de um menino. Que perde sua casa de sonho e cai na vida do mar. Onde, adulto, ele procura um tesouro que lhe possibilite a volta ao mundo perdido. No livro existe alguma coisa de Conrad, mas é um Conrad menos viril, mais simples. Há também um pouco de Naipal, mas visto do lado europeu, não o lado nativo ( o narrador vive no oceano Índico ). A escrita é direta, em primeira pessoa, concisa, mas sem deixar de ser bastante emotiva. Fácil de ler, flui como maré, apesar de se perder um pouco no miolo da história. Mas o principal, que me faz querer escrever, é o fato, agora nítido, de que é necessário ter algum tipo de experiência pessoal para se usufruir, com profundidade, a verdadeira arte. Sem o sentimento de "doce saudade e amarga decadência " é impossível usufruir este livro. Sem amar o oceano, os pássaros e o sol, é inviável ler este texto. Sem o dom de sonhar e querer enxergar além do aparente, não há como compreender Clezio.
Não é assim com tudo que travamos contato ? Como apreciar o cinema de Visconti sem refinamento e senso estético ? E de onde vem isso ? De sua própria biografia, daquilo que voce viveu antes de ver o filme. Como compreender Fellini se voce não possui um pequeno poeta dentro de voce ? Ou usufruir de Bergmann sem ter mergulhado no sentimento de morte e dor da vida ? Só rebeldes com poeira nos olhos e uma moral a defender compreenderão a profundidade de Ford ou Hawks e somente quem viveu uma luta feroz, interna, entenderá do que Kurosawa está falando.
Aqueles que somente compreendem o que é fútil, pobre, óbvio, não viveram, ou viveram pouco.
O livro de Le Clezio me trouxe essa confirmação. Não é pouca coisa. Talvez o Nobel tenha acertado.

SATYAJIT RAY/CARNÉ/WHALE/CLAIR

PATHER PANCHALI de Satijajit Ray
Aquela casa e aquelas´pessoas não saem de minha cabeça... Poesia de primeira de um cineasta genial ( e raro ). nota Dez !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
FAUSTO de Friedrich Murnau
As imagens, imensas, insanas, cheias de sombras e brumas, são fascinantes. O filme não está a altura dos melhores de Murnau, mas é forte como um sonho ruim. nota 7.
O MONSTRO DA BOMBA H Inoshihiro Honda
Assisti com meus pais na tv aos 7 anos. Morri de medo e nunca o esquecí. Jamais o reencontrei, pois não sabia sequer seu nome. Eis que um amigo joga-o em minha mão ! Coisas da vida... thrash muito divertido ! nota 6.
THE OLD DARK HOUSE de James Whale com Melvyn Douglas, Boris Karloff, Charles Laughton, Raymond Massey.
O tipo de filme em que voce diz : Eba!!!! Gente presa em casa de horror ! Whale era um diretor fantástico! O filme é muito engraçado e transborda inteligência. ( Para quem não sabe, James Whale foi retratado por Ian McKellen em Deuses e Monstros ). Um prazer ver este raro filme cheio de gays não assumidos, frases hilárias e um discreto terror elegante. nota 8.
FROGS de George McGowan com Ray Milland e Sam Elliot
Sapos, rãs, cobras e até tartarugas atacam humanos na Flórida. Quem viu não esquece. É ridículo. O ataque do jacaré é digno de Hermes e Renato. Mas é também delicioso. Tem uma loucura de anos 70- brega, exagerado, risonho e terrível. nota 7.
TRÁGICO AMANHECER de Marcel Carné com Jean Gabin, Jules Berry e Arletty
Pessimismo, romantismo, fatalismo. Este é o tal do "realismo poético" que os franceses criaram nos anos 30. Filmes em que eles pareciam adivinhar o que aconteceria com a França diante do nazismo. O cinema noir americano chupou tudo daqui. O filme é um viagem pelo desespero amoroso de um homem. É belo, trágico e ultra chic. nota 9.
SOB OS TETOS DE PARIS de René Clair
A França nasceu para fazer filmes como este : malandros, prazerosos, sensuais. Tudo brilha em Clair, ele ama seus tipos boemios, suas mulheres charmosas, seus quartos de pensão barata. O filme sorrí bonachão e pisca para nós. É como pastis, patê e souflé. nota Dez!!!!!!!!!!!!!!!!
MOUCHETTE de Robert Bresson
Uma porrada. Ao ver o filme, sob forte emoção, escreví que a menina se torna uma heroína, e que o filme é genial ao conseguir mostrar isso. Agora penso outra coisa : ela não se tornou uma heroína, ela não despertou de sua letargia : ela afunda de vez e rola como pedra à água que a engole !!!!! Um filme que desperta duas interpretações tão opóstas só pode ser mágico. nota 9.
TROVÃO TROPICAL de Ben Stiller com o próprio, Robert Downey jr, Jack Black e Nick Nolte
Eu odiei este filme ! É talvez o pior filme que já assistí ( com excessão de Speed Racer e Evita que são imbatíveis ). A história, que apresenta várias possibilidades, é desperdiçada num roteiro frouxo, tolíssimo e infantilóide. Downey está hilário, Black tem finalmente um papel engraçado para brincar, mas... são desperdiçados com situações mal construídas, pouco engraçadas, abortadas ao meio. Quando deixam, quando não cortam para Stiller, quando deixam os dois se soltarem, o filme ameaça subir e decolar; mas não, tudo é frustrado com alguma reviravolta tola, com alguma macaquice infame, com burrice enlatada. Cansei de Ben. Ele tem um pecado mortal para todo humorista : vaidade. Vaidade assumida ( pois vaidosos todos são ). Foi o que detonou Eddie Murphy e é a não aparente vaidade que faz com que gostemos de Will Smith ou Jim Carrey. Já Ben insiste em ser engraçado-arrumado, azarado-musculoso, neurótico-com namorada. Ele não se esculhamba, não se apalhaça de vez, não se ridiculariza. Fica essa coisa mais-ou-menos ridiculo, mais-ou-menos palhaço, mais-ou-menos mal sucedido... e ele se torna um mais-ou-menos sem graça. nota 1.
DESEJO E REPARAÇÃO de Joe Wright com Keira Knightley e uma soberba Vanessa Redgrave
Revejo. E confirmo : grande filme. Adulto, bem escrito, com atuações adequadas e uma cena ( aquela na praia ) dificílima de se fazer e onde o diretor prova saber tudo. Nota 8.

para quem quiser se apaixonar...

Para quem, neste abril de sol, estiver querendo recordar o que significa estar apaixonado, recomendo que acesse no youtube- lotte lenya, cantando september song. A mais bela canção deste mundo cantada por quem a popularizou. September song foi regravada por, dentre milhares, Nick Cave, Lou Reed, Ian McCullough, Frank Sinatra... mas aqui está a vesão como foi criada por Kurt Weill- Berlin anos 30. Chore..........
E para quem desejar ter o privilégio de olhar a mais linda das mais fascinantes mulheres, acesse no mesmo tube, " le plus beau regard camera " ( para quem nada sabe de francês : o mais belo olhar... ). É a musa das musas, a mais perfeita versão da deusa, Anna Karina, dando o olhar, improvisado e súbito, mais diáfano, arrasador, inebriante e enfeitiçador da história do cinema. Musa que não rima com cachorra. Musa que tem cérebro, coração, espírito e sexo. A maravilhosa A.K. Torne-se um escravo !
September Song, a mais bela das canções, com Anna Karina, a mais bela das musas... bendito privilégio o de poder ver e rever tal momento de prazer...

3 diretores da França : Carné, Clair e Bresson

A cultura francesa é visceral em mim. Pois se os britânicos despertam minha admiração, se os americanos me divertem, são aos franceses que devo meus ódios e amores mais persistentes. É na França, naquela França que conhecí aos 13 anos e que sei que hoje está defunta, é nessa terra que encontro tudo o que desperta meu senso de boemia, de sensualidade e de inconformismo.
Vejamos 3 filmes que reví agora, dos 3 diretores que considero os mais fascinantes do país tricolor.
TRÁGICO AMANHECER de Marcel Carné, com Jean Gabin, Jules Berry e Arletty. O roteiro é de Jacques Prévert, e Prévert é um grande poeta. Ter Prévert no roteiro é como ter Murilo Mendes escrevendo filme no Brasil. Neste filme vemos um homem : um trabalhador braçal. Ele se apaixona. Mas não confia em seu amor. Acaba matando e se matando. O que é o filme ? É sobre a incapacidade de se ser feliz. Mas é muito mais : é sobre Gitanes fumados por Gabin- de um modo viril que nem mesmo Bogart foi capaz; é sobre quartos sujos, cheios de sombras e com colchões no chão; é sobre bares sórdidos esfumaçados; chuvas frias em madrugadas ansiosas e amorosas; vielas tortas que prometem romance infeliz; sobre moças indolentes que traem sem querer; sobre prédios de escadas em caracol onde vizinhos espionam; sobre pobreza e a tentativa de ser digno; sobre perder.
Carné era um gigante. Assina cada fotograma com estilo, beleza simples, sombras e brilhos; e movimenta o filme em suaves nuances de música e poesia. Carné crê na nobreza dos protagonistas, acredita no seu público, no gosto desse público e dá de presente uma obra-prima fatalista, profundamente pessimista, derrotista e apaixonadamente bela.
SOB OS TETOS DE PARIS de René Clair, com Modot e Prejean. Clair... o melhor diretor que a França nos deu. O mais parisiense, o mais gaiato, o mais feliz... amoroso Clair ! Foi dele o primeiro filme que assistí em dvd, exatamente este filme, que agora revejo... uma festa ! Do que trata este filme ? Um moço que vende partituras nas ruas se apaixona por uma romena desempregada. Entre batedores de carteiras e malandros profissionais eles se envolvem e namoram. O filme quase não tem uma história, mas as coisas não param de acontecer. Tudo nele é leve, elegante, alegre, profundamente feliz. René Clair ama a vida... ama a mulher que sorrí, as danças no bar, os copos de licor, os colchões de palha, as janelas abertas para a noite, as calçadas de pedra, os acordeões, a boemia e os amigos que se abraçam e fingem brigar. Clair ama viver, sabe viver e ama filmar. E cheio de música e de malandragem gentil, seu filme nos enche de bom-humor e nos faz ter um sorriso feliz.
Carné e Clair são dois lados da França. Em Carné há a pretensão, a poesia, o teatro, o romantismo trágico francês. Nele há Racine, Proust e Sartre. Em Clair há o descaramento, a ironia, a leveza elegante da França. Moliere, Stendhal e Rabelais.
Mas por fim existe Robert Bresson. O enigma Bresson. Meus mais queridos críticos dizem que no cinema existem 3 enigmas : Ozu, Dreyer e Bresson. São diretores que não se parecem com nada, que não podem ser julgados, não podem ser criticados e que são amados com fanatismo e odiados com persistência. Se no triste século vinte existissem santos, os 3 teriam asas. Pois seu cinema é feito de bondade, paciencia e amor à humanidade.
MOUCHETTE é de Bresson. Do que trata ? Uma menina. Muito pobre. Judiada por todos. Mas ela também não é nada simpática : joga barro nas amigas e não reage a nada. Seu pai é idiota, a mãe está morrendo. Ela é seduzida por um caçador epilético. É isso. Bresson usa seu método : atores amadores que não podem atuar - atente : eles não são ruins, e nem bons, nem frios são- não atuam, apenas estão lá, dizendo suas falas. A fotografia é bonita, mas os locais são feios. Trilha sonora não há. Portanto, é um filme árido, difícil, exigente. Então porque ele me tocou ?
Pelo seu final ? Onde ao assistir a cruel matança de coelhos numa caçada, a menina tem um estalo e percebe, finalmente, a crueldade da vida e de sua vida ? E Bresson nos mostra- por breves segundos- o momento em que uma vítima idiota se transforma numa heroína ? Ou será ao fato de que o único interesse dos filmes de Bresson é a santidade ? E que neste filme ele consegue nos mostrar, com simplicidade e rara emoção, o momento em que a menina se torna humana ( rolando na terra ) e imediatamente, morre ? ( na água, no mais belo suicídio do cinema ). Qual o segredo deste filme ? Sua imensa originalidade ? Uma originalidade modesta, despojada, portanto, real e sem possibilidade de ser copiada ou ultrapassada ? Como dar uma nota para um filme que nos mostra aquilo que a vida tem de mais real/ trágico/ banal ?
Com Robert Bresson se fecha o triangulo da alma francesa : se Carné é a literatice, a pintura e a poesia; se Clair é a malandragem, o sensualismo e a alegria; Bresson, como Rousseau, como Montaigne, como Flaubert, é o moralista, o crente racional, o radical, o homem de fé.
Num país que nos deu diretores tão maravilhosos como Tati, Clement, Vigo, Renoir, Chabrol, Godard ou Malle ( dentre vários outros ), ninguém é tão autenticamente francês como o poeta Carné, o boemio Clair e o filósofo Bresson.

eis um livro maravilhoso!!!!!!!! le grand meaulnes!!!!!!!

Belo, belo, belo, belo.
Alain-Fournier escreveu este livro, foi para a guerra, e morreu. Aos 26 anos. O livro se chama ' O BOSQUE DAS ILUSÕES PERDIDAS' em francês é chamado 'LE GRAND MEAULNES'. Meaulnes é o nome de um rapagão rebelde, que surge numa escola de vila. Lá, ele se torna ídolo do narrador. Mas um dia, Meaulnes se perde na floresta, vai à uma festa e encara a vida. Conhece a paixão, volta totalmente modificado, e então...
Jamais lí um livro tão mágico ! Uma mistura ( sem nada que cheire a plágio ) de Pinóquio, O Morro dos Ventos Uivantes, Peter Pan, O Apanhador no Campo de Centeio e tanta coisa mais.
Tudo nele se parece com sonho. Nada de fantástico acontece. Ninguém voa, ninguém é enfeitiçado... mas tudo nessa obra-prima parece irreal, inefável, encantado.
Os capítulos no bosque são de uma beleza tão intensa que chegam a alucinar e seu desfecho, hiper-romântico, trágico, rocambolesco, me fez chorar...
Fournier consegue contar toda a dor, todo o medo, todo o aturdimento da perda da infância e na sequencia, da perda da adolescência. É o melhor livro sobre a adolescência ! Pois ele consegue mostrar todo o romantico desespero dessa fase crucial. O texto verte saudade e melancolia, derrama o idealismo daqueles que já foram verdadeiramente jovens. Exibe, sem pudor, o exagero da paixão juvenil; e desenvolve um ambiente de sombras, sóis e chuvas; janelas, árvores e água.
O livro é feito para ser amado. Voce termina de ler e imediatamente tem uma vontade ( adolescente ) de ler outra vez, de conhecer Meaulnes, Yvonne, de penetrar na floresta, se perder, se afundar, cair...
Tivesse eu descoberto este livro aos 15 anos... teria ele me enlouquecido e se tornado o livro da minha vida ( este posto pertence a O MORRO DOS VENTOS UIVANTES... eu sou Heathcliff ). Hoje, ele me exibe aquilo que fui um dia, e que ainda tenho dentro de mim. È aquilo que temos de melhor, e o livro nos dá essa sensação : a de que todos os sonhos, todas as aventuras, todos os dramas que vivemos na adolescencia..... são os únicos que valem a pena, que contam, que nos definem.
O que posso dizer ? Que minha adolescencia começou a terminar com um ataque de pânico aos 22 anos ( minha floresta ) e que esse processo ainda insiste em não se encerrar.
Que num fim de tarde, aos 15 anos, no carro de meu pai, enquanto esperava meu irmão sair da escola, com muito frio e muita garoa na rua, eu ví..... uma menina loura sair dessa escola. Sózinha, os livros contra o peito, ela olhava para o chão enquanto andava. Os olhos tristes estavam mal maquiados e a blusa era feita de lã cor de rosa. Franja e um longo cabelo. Ela ergueu, então, os olhos do chão e olhou para a janela embaçada do carro de meu pai. Me viu. Eu fiquei vermelho e completamente apaixonado. Meu irmão entrou no carro e voltei para casa com os olhos úmidos.
Eu nunca mais esquecí dessa menina. Tenho procurado por ela em todas as meninas que conhecí.
Le Grand Meaulnes é sobre essa menina. Sobre amar essa menina e sobre tentar esquecer essa menina. É sobre o vidro do carro embaçado pelo frio e sobre tentar preservar esse momento para sempre. E a triste ironia é essa : Tentar esquecer a menina e tentar preservar a beleza desse momento... luta perdida em seu nascimento...
Leiam este livro. Amem o menino que voces foram. Preservem a neblina escura da maior das paixões. Sejam romanticos. Sejam exagerados. Sejam fiéis a seu amor. Meaulnes existe em cada um de nós. E ele se perde sempre...

na literatura repousa o começo e o fim

A civilização começa com um livro. E terminará com um outro. Toda arte está em irremediável queda, mas a literatura não. É a mais forte e a mais necessária das manifestações humanas. Qualquer outra forma artística se apequena perante o livro.
Lí recentemente quatro autores diferentes, e mesmo não sendo nenhum deles um gênio excepcional, colocam no chinelo qualquer músico, cineasta ou arquiteto.
MIGUEL TORGA é um português que deveria ter ganho o Nobel. Saramago é um anão afetado perto dele. Seu texto é bastante difícil, pois ele escreve sobre o povo lusitano usando o vocabulário desse povo. Para um brasileiro, ler Miguel Torga é tão trabalhoso quanto para um português ler Guimarães Rosa. Mas vale a pena : é delicioso ver aquela gente vivendo sua vida crua, simples. Sentimos que existe alguma coisa sagrada alí.
TANIZAKI é um autor japonês infinitamente inferior ao genial Kawabata. Mas vale a pena ? Vale. Ele, que escreve com extrema simplicidade, não descreve paisagens ou cenas pictóricas. Seu único interesse é sexo. No livro que lí, A Chave, um marido compra uma câmera e passa a fotografar a esposa nua. O genro descobre as fotos... O livro se tornou um filme famoso nos anos 60 e ainda impressiona sua naturalidade.
EVELYN WAUGH.... apesar do nome, é um homem. E apesar de talvez voce não o conhecer, é um dos escritores mais famosos da Inglaterra do século XX. Seu trabalho é o humor, mas não há nada de absurdo ou de exagerado em seu humor. Ele pega um detalhe real e nos revela o grotesco desse detalhe. O resultado é o tal do " witty" essa coisa hilária tipicamente britânica. O livro que lí ( Homens em Armas ) é o oitavo que leio de Waugh. Trata das lembranças da segunda guerra, guerra em que ele serviu. O livro é um tipo de Mash à inglesa. Personagens ridículos, situações absurdas, a comédia da guerra, a futilidade daquilo tudo. Waugh é sempre excelente, sempre divertido, sempre atual. Não é genial, mas é um mestre. Aliás, nada é melhor que esse período da Inglaterra : entre 1870 e 1960, as ilhas britânicas atingiram um nível de civilidade, educação, excelência que nunca fora igualado e que provàvelmente jamais o será, por nação alguma ( os franceses que me perdoem ). Era de chá das cinco, ônibus de dois andares, fog, chapéu côco, guarda chuva, pub com cerveja e fritas, da torta de rim, do cricket, do Porto e do Madeira, do futebol e do rugby, das colonias na India e na Africa, de Churchill e Lloyd George, o apogeu de Oxford e Cambridge, era de H.G.Wells, Shaw, Conan Doyle, Eliot, Yeats, Virginia Wolff, Huxley, Graham Greene, Thomas Hardy, D.H.Lawrence, Oscar Wilde, Joyce, Beckett, Pinter, Lewis Carroll, Synge, Dylan Thomas, E.M.Foster, Orwell, O'Connor, O'Brien e de Evelyn Waugh. Nada me dá mais prazer que esses autores. Um livro escrito por um autor britâncio desse período é quase sempre garantia de escelência !
YUKIO MISHIMA. É o mais famoso autor japonês do século. Estou lendo a única obra sua que enfrentei até agora : Morte na Primavera. Ele é menos oriental que Tanizaki e menos misterioso que Kawabata. Escreve como um americano. O que é contraditório : Mishima odiava a América. Deixe-me contar : Mishima foi moda nos anos 80. Sua vida se tornou um filme dirigido por Paul Schrader ( roteirista de Taxi Driver ). Foi um radical. Lutava contra a americanização do Japão. Para ele, a complexidade da alma japonesa estava sendo subjugada pelo vício no consumo desenfreado. Em vez dos interesses básicos da nação ( sexo/morte e ritualização do cotidiano ) o Japão optaria por Consumo/Pressa e Indiferença. Sua morte foi genial- após discursar numa emissora de tv, acompanhado por um general, nos telhados da emissora, Mishima realizou Seppuku com todos os requintes da tradição. Um protesto contra o futuro e um apelo para que o Japão voltasse a ser militarista. Esse é Mishima, esse é o Japão. Uma adaga samurai cravada na barriga por ele mesmo e o general terminando o serviço. Porque chamei esse suicídio de genial ? No Japão esse ato é visto de uma meneira completamente diferente. Lá, uma pessoa nobre, ao se ver sem saída, seja por doença/ desonra ou derrota, realiza uma escolha : um local bonito, uma espada perfeita, um ato de estética refinada, a liberdade de escolher quando, onde e como morrer. Para nós, é uma idéia quase repugnante, para o japonês, racional. A morte é lembrada em todo recanto : Suas casas são cheias de fotos dos antepassados ( voce acha que eles fotografam tanto porque ? Para serem lembrados ), altares para as almas dos mortos que estão presentes, em cinzas e em espírito, apego ao bom nome da fámília, apego ao chefe. Morte, sexo e rituais infindáveis... alguém deveria estudar melhor isso...
Bem... hoje divaguei como um Laurence Sterne... é minha admiração pelo modo de pensar britânico... ah, esquecí, aquele período ainda tem Bertrand Russel, provávelmente o homem mais inteligente do século.
É isso.

PS 1- um amigo já escreve reclamando do esquecimento de Joseph Conrad. Meu caro, escreví por canetada, sem pensar em mérito ou qualquer preferencia... os nomes de Auden, Stevenson e Galsworthy também não foram citados ! E ainda posso falar de Maugham e do meu muito admirado PG Wodehouse, autor divetidíssimo !!!!!

PS 2- é grande a tentação de citar o americano Henry James... afinal citei o americano TS Eliot. Mas o caso é diferente. Eliot se tornou cidadão britânico, se dizia um anglicano, monarquista e conservador. Um inglês, portanto. Para mim, James morreu americano.

pather panchali- a canção da estrada- satiajit ray

Meu caro senhor Ray.
Fazem mais de vinte anos que ouço falar em seu dom. Fazem mais de vinte anos que o senhor atiça a minha imensa curiosidade. Como seriam seus filmes ? Porque são tão amados ? O que faz com que o senhor seja chamado de o mais nobre dos cineastas ?
Bem... hoje finalmente comecei a saciar essa curiosidade. Assisti a Pather Panchali. Foi uma honra.
Primeiro a música. Que coisa misteriosa e bela é a música de Ravi Shankar feita para seu filme. Toda a India está contida nessa música. Toda a raiz de todas as árvores do mundo, portanto. É inebriante. Profundamente alegre e misteriosamente triste.
Depois os atores. Onde os achou ? A avó é tão real que chega a se sentir seu cheiro ! O pai é um pateta adorável e a mãe tem o medo e o amargor de todas as mães. A menina é maravilhosa e Apu... como o senhor conseguiu imaginar uma cena tão simples e tão especial como a primeira cena com o nascido Apu ?
O roteiro. Nada de especial acontece. A miséria é absoluta. Mas alí tem alguma coisa de muito especial, de muito original. A casa aos pedaços, os animais que são muitos e sempre presentes, a sujeira abjeta, a fome. Mas o senhor não chantageia com nossos sentimentos. Sua obra não é melosa e não é fria. É real.
Me conte por favor : como conseguiu uma sequencia tão maravilhosa como aquela da chuva ? Vemos insetos brincando sobre a água. O vento. E a chuva. A menina, numa cena inesquecivelmente perfeita, dança debaixo da chuva e corre para o irmão que sorrí. Depois aquela noite de horror e a volta do pai. Como o senhor conseguiu tanta beleza com tanta simplicidade ?
O momento em que o pai descobre o que aconteceu... são dois minutos que bastariam para colocar seu nome entre o dos grandes mestres. Mas este seu filme tem muito mais segredos.
Ele é épico, ele é forte, ele é poesia pura.
Termino lhe agradecendo por ter feito tal oferenda para a vida e celebrando a honra de ter podido apreciar tamanha maravilha do engenho humano. Seu filme repercute até hoje. Tudo aquilo que o terceiro mundo fez de melhor nasce e está contido aqui. Neste inesquecível e milagroso Pather Panchali.

Sinceras homenagens e carinhosas palavras deste teu novo fã e amigo.

GRAN TORINO/RHOMER/WC FIELDS/HOMEM DE FERRO

Gran Torino de Clint Eastwood
ele entendia de morte e não de viver. ao final, oferece sua morte por uma vida. um filme lindo e que dá vontade de rever. é também um anti- benjamin button, um anti-slumdog millionaire : não é bonitinho e empetecado. nota dez, mil, um milhão.
Che de Steven Soderbergh
de todas as pragas que os hippies nos deixaram ( herman hesse, aldous huxley, castaneda, drogas glamurizadas, músicas com flauta, camisetas podres, insenso, jung e reich...) nada é pior que a canonização de che. o que ele fez de bom pelo mundo ? vendeu posters na california e criou a imagem do guerrilheiro do bem. na real, tudo que ele tocou foi um desastre. não foi lider da revolução cubana e como dirigente do governo de fidel... bem, foi expulso da ilha à pontapés. matava qualquer um que não pensasse como ele e tinha a vaidade dos egocentricos. mas... a propaganda hippie o transformou num tipo de são francisco de assis com zorro. um robin hood latino. o filme é maniqueísta, profundamente tolo e o pior : uma chatice. nota 1.
O Joelho de Claire de Eric Rhomer com jean-claude brialy
adoro os chatos filmes de rhomer. eles são como prozacs : mostram um mundo de gente problemática mas que sempre encontra uma saída. são filmes muito otimistas, onde todos são bons e a vida é sempre uma tese. delicioso..... e chato. mas eu adoro seus contos de fada para intelectuais. nota 7.
O Jovem Lincoln de John Ford com henry fonda.
henry fonda é um tipo de ator que desapareceu após a segunda guerra : nobre. tudo nele transparece calma e sabedoria. seu lincoln é um milagre de verossimilhança. o filme é divertido e nada sério. john ford era o cara ! nota 7.
Tarantula de jack arnold
ficção barata dos anos 50- ou voce relaxa e adora, ou odeia. eu gostei. mas podia ter menos bla bla bla... nota 5.
O Inseto do Amor de fauzi mansur
eis uma pornochanchada dos 70. constrangedoramente amadora. um desfile de diálogos ridiculos, machismo inocente e mulheres nuas. é estranho, mas suas cenas de sexo são de uma infantilidade que dá o que pensar... nota 1.
Festival WC Fields
ele é o humorista que todos adoram odiar. pois seu tipo era beberrão, odiava crianças e cães, e falava com voz sulista cheia de erros e preconceitos. mas que delícia !!!!! esta é uma coletanea de curtas. pule o primeiro e delire com os outros quatro. no de golfe, há um personagem que é pura hilariedade ( o caddy ), e tem " o último gole de bebida ", para mim, a mais louca- surreal- hilária e inspiradora comédia que já tive a honra de assistir. WC não tinha a poesia de chaplin, não tinha a leveza de keaton ou o cinismo de groucho, mas ele era o mais engraçado. nota dez !!!!!!!!!
Os 1000 Olhos do Dr Mabuse de fritz lang
lang voltou a alemanha para encerrar sua genial carreira. e errou. este filme é um tipo de james bond com ressaca, um samba com tango desafinado. acontece tanta coisa que voce se perde. a direção é frouxa. nota 2.
Até o Ùltimo Homem de lewis milestone com richard widmark, richard boone, karl malden.
milestone era um grande diretor. este filme de guerra assusta por sua modernidade. os cortes e os movimentos de camera são ousados, inesperados, arrojados. filme quase genial, tem uma estranha poesia viril. mas incomoda a demonização dos japoneses... nota 7.
Juiz Priest do Grande John Ford com o Grande Will Rogers.
Estamos no mundo de Mark Twain. de Whitman. de Faulkner. O sul... repare nas pessoas... todas são profundamente interessantes, todas são inesquecíveis. repare : nada parece real, mas voce acredita no que vê- e isso se chama genialidade. Note agora : não existe arte ostensiva neste filme. o diretor- modesto- conta sua história. Mas é arte. a arte da fábula, a mais difícil de se fazer sem parecer ridículo. Olhe para Will Rogers... existe ator mais simpático ? voce quer ser seu amigo e o abraçar. e olhe sua casa : tudo nela é paz- eis um lar ! que filme fantástico ! voce ama esse filme e se entristece quando ele termina... dá saudades... após a segunda-guerra, este tipo de filme, profundamente crente na bondade humana, se tornou impossível. Perdeu-se a inocencia, ganhou-se o cinismo. Aqui não existe cinismo ou ironia. Assistir este filme é como ver uma velha foto do paraíso. nota dez.
As Damas do Bois de Boulogne de robert bresson com maria casares
jean cocteau fez o roteiro. e nada combina. bresson é árido, cocteau é barroco. o filme é muito cocteau e pouco bresson. nota 4.
Homem de Ferro de jon favreau com downey jr, gwyneth patrow e o grande lebowski ( jeff bridges )
um cara faz uma armadura vigiado por cameras e ninguém nota... e temos de engolir isso. quantas vezes voce já viu uma explosão às costas do herói enquanto ele anda para a câmera super cool ( o primeiro a fazer isso foi sam peckimpah )... quantos heróis já sairam voando de uma explosão ( duro de matar 2 fez isso pela primeira vez )... caraca ! quanto clichê ! mas é simpático downey jr. e pelo menos o filme não tem aquela seriedade babaca do batman. nota 5.
A Duquesa de saul bibbs com keira knightley e ralph fiennes
primeiro: keira está com anorexia. chega a dar medo ver seu cadavérico rosto. segundo : fiennes poderia ter feito deste filme algo muito melhor. bastaria que lhe dessem mais cenas. pois este, em seu incio, belo filme, é transformado numa tola história de feminismo óbvio. de toda forma, para quem aprecia o que é bonito, é um prazer ver a magnifica elegancia do mais refinado dos tempos. no crucial século XVIII, os nobres tinham um nivel de fausto, luxo e chic que faria com que todos os poderosos de hoje parecessem lacaios. nota 4.
Starsky e Hutch de todd phillips com ben stiller, owen wilson e vince vaughn
esquisito esse ben stiller. seus filmes o divertem mais do que a quem os assiste. aqui ele tem o prazer de dirigir um ford gran torino, dançar numa discoteque, correr atrás de bandidos e imitar marcel marceau. owen, péssimo dos péssimos, nem isso. é uma homenagem a uma das melhores séries da tv, mas é um filme bobo. parece uma peça de faculdade : tudo é improviso, as músicas são óbvias e os amigos se divertem. vale para que a gente veja como os 70 foram originais. nota 3.