Bryan Ferry - TOKYO JOE



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Bryan Ferry - This Is Tomorrow



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UMA CRÔNICA SOBRE O AMOR: DE LONDRES 1977 ATÉ SP 2013- IN YOUR MIND, DISCO CHAVE DE BRYAN FERRY

   Existem discos que ficam mofados. Acabo de tentar escutar Avalon do Roxy. Que coisa! Como pode um disco que gostei tanto parecer agora tão vazio? Nenhuma emoção consigo capturar. Faz dançar, é bonito, mas está distante de mim. É isso, o cara que vibrava com Avalon talvez seja hoje muito pouco eu.
   Não é o caso de In Your Mind. O disco é de 1977, mas comprei-o apenas em 1993. Na época pré-cd e muito pré-internet, certos discos eram muito raros. Este era um deles. Vendeu tão pouco que nunca foi lançado no Brasil. E o fato de ter vendido pouco foi uma surpresa.
   Em 1976, com o ego inflado, Bryan Ferry encerra o Roxy Music e se dedica apenas a carreira solo. Com o Roxy acontecera um fato que também ocorrera na mesma época com The Faces: o cantor dar mais atenção a sua carreira fora da banda, e acabar por deixar os companheiros de grupo de lado. Rod Stewart lançava todo ano um disco solo e um disco com The Faces. Ao mesmo tempo, todo ano, Ferry lançava um disco com Roxy e um solo. E ambos,  Rod em 1975, Ferry em 1976, dão um chute final na banda.
   Então em 1976 Bryan Ferry lança seu primeiro disco solo com o Roxy desintegrado ( é seu quarto album solo na verdade ). Let's Stick Together é um disco excelente e é um big hit na Inglaterra ( nunca na América ). Com Rod Stewart cada vez mais longe de seus fãs, Bowie gravando soul music e Elton John começando a decair, Bryan Ferry se torna o nome mais IN de Londres. Todas as modelos querem ele, os fotógrafos lhe perseguem e até cinema ele faz. Escolhe Jerry Hall como namorada, se apaixonam ( a texana Hall era a top model number one do mundo ). Mas, voce sabe, ele é Bryan Ferry, as coisas tinham de se melancolizar.
    Em fins de 1976 Mick Jagger vai assistir um show de Ferry, e nos camarins conhece a namorada de Bryan, Jerry Hall. Fulminante paixão! Mick e Hall serão marido e mulher por mais de vinte anos. Bryan Ferry entra numa dor de cotovelo abissal e há quem diga que seu estilo até hoje é esse: abandonado por Jerry Hall.
   In Your Mind é gravado nesse espirito. Todas as faixas falam de Hall e as vendas foram as piores de sua vida. Era 1977, Londres só tinha ouvidos para disco, punk e ska, reggae e new wave. Em questão de meses Bryan Ferry passou a parecer careta, saudosista, velho. ( Ele estava com 31 ). In Your Mind é soberbo.
   Existem discos que são "bíblias" sobre o amor. São poucos esses discos. Consigo lembrar de Forever Changes do Love, Rattlesnakes de Lloyd Cole, o disco Steve McQueen dos Prefab Sprouts... São albuns que mergulham na paixão amorosa, dialogam com nossos corações, narram os começos e os finais de histórias, nos consolam e nos guiam. In Your Mind é assim.
   This is Tomorrow abre em alto-astral. E tem um solo de guitarra espetacular de Chris Spedding. O som é rico: sinos, teclados, sax e trompete, guitarra, percussão e montes de vozes. É o Pop perfeito, o Pop refinado de Mr.Ferry. All Night Operator começa a mudar o clima e quando entra One Kiss entramos na coisa. One Kiss é um baladão. Uma canção épica de amor comum. O vocal é sublime. Ela é triste mas jamais deprimida. Bryan Ferry sempre chora como Homem, nunca como menino.
   Love Me Madly Again é uma obra-prima. Tem um arranjo de violinos no final que é coisa de gênio. Há tanto para se dizer e tanto para se ouvir nessas canções...
   Tokyo Joe foi a faixa que chegou mais perto do sucesso. É esperta, dançável, muda de andamento toda hora, cheia de barulhinhos à La Eno. E vem Party Doll.
   Party Doll é uma balada-culto. Ferry canta como se estivesse num púlpito, e não a toa ela termina com um "Amém". Tudo nessa canção tem a simplicidade dos clássicos e a complexidade dos eternos. A voz está afirmativa, se impõe e todos os instrumentos soam em coesão. É um desses momentos em que o Pop surpreende. Há muita perfeição aqui.
   Rock of Ages é uma canção que empurra a vida avante e o disco fecha em ponto sublime com In Your Mind. A sequencia dessas duas jóias poucas vezes foi igualada.
   Quando ouvi o disco a primeira vez, numa tarde de dezembro em 1993, eu estava apaixonado. Eu e a menina que amava havíamos combinado: em Janeiro ela terminaria seu noivado e ficaríamos juntos então. Claro que nada deu certo e ela ficou com o cara. Mas em dezembro eu não sabia. Eu apenas sabia que a dividia com outro. In Your Mind caiu feito uma bomba nesse momento. Era a voz certa e a música certa. O disco me consolava e me fazia esperar.
   Hoje, quase vinte anos depois, ele poderia ser mofo, como Avalon. Ser apenas uma lembrança de um amor passado. Bonito. E distante. Mas não. In Your Mind está vivo. Cada acorde dessa multidão de instrumentos, dos baixos sinuosos às percussões fortes, cada palavra da voz de Ferry estão vivos como estavam em 77 e em 93.
  Amém.

MALICIA NEGRA, UM LIVRO MUITO MUITO CRUEL DE EVELYN WAUGH

   Tudo se passa na África oriental. Uma revolução. Imagens de crueldade e personagens ridiculos. Um armênio que só pensa em negociatas. O novo rei, que por ter estudado em Oxford pensa ser um homem muito acima da média. O povo do país, que tem hábitos como os de comer carne de brancos e fazer filhos sem parar. O embaixador da França, que vê tramóias da Inglaterra em tudo. O general do exército do país, um mercenário irlandês bêbado, casado com uma mulher da África, mulher esta que tem por nome "Black Bitch". E no meio de tudo, os ingleses.
   Na embaixada inglesa todos se preocupam com o que é "civilizado". O chá, os cavalos, o correio, os jogos e o jardim. Isso é importante, não essas tais de revoluções, ou guerras ou seja lá o que for... Assim, o embaixador passa o tempo se escondendo do trabalho. A esposa cuida das rosas e a filha pensa em sexo, em homens e em...mais sexo. Enquanto isso, na Inglaterra, um jovem sujo e sexy, aproveitador falido cansado de pegar dinheiro emprestado da mãe e de ir em festas que duram três dias, resolve ir para a África. E vai.
   O novo rei logo o faz seu ministro, o ministro da modernização. O rei baixa novas leis todo dia: proibe o uso de saias para os homens, inaugura um museu, faz uma estrada de ferro, pensa em metrô, proibe a matança de animais, obriga o uso de botas...Explode uma nova revolução. O povo não aceita a obrigatoriedade de se usar camisinha.
   O livro é mirabolante, enfeitiçante e politicamente incorretíssimo. Voce dá gargalhadas com esse mundo duro, absurdo e muito real ( infelizmente ), lugar em que o terceiro mundo se obriga a crescer e a se civilizar, onde reis vaidosos dão titulos de condes e duques a canibais mentirosos. Mundo onde os europeus pouco se importam com o que acontece desde que sejam deixados com suas festas e seus palácios. E não precisem se misturar aos selvagens. Nada é sério e tudo é fatal. Os africanos nada compreendem dessas coisas como democracia, educação ou bons modos brancos; e os brancos nada querem com os africanos. Vivem no país como em sonho.
   Como o livro termina? O que posso falar é que um deles é comido e um outro nada aprende com a história.
   Uma lição que fica: a Inglaterra, como todo império, deveu sua grandeza a algumas gerações de ousados aventureiros e espertos homens de dinheiro; no começo de seu final, uma casta de mimados sem iniciativa e sem ideias passa a dirigir o país. Que funciona ainda graças aos dividendos da riquesa acumulada pelos heróicos primeiros anos. Sempre é assim na história de todo império, seja EUA ou seja Roma, e este livro exibe essa casta em toda sua mediocridade.
   Waugh era uma víbora.

The Kon-Tiki expedition-color film



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New Kon Tiki Trailer 2012



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EXPEDIÇÃO KON-TIKI, FILME DE RONNING E SANDBERG

   Chuck Yeager é um dos meus heróis. E ele foi tema de uma obra-prima do cinema: Os Eleitos de Philip Kauffman. Sam Shepard interpretou Yeager. Agora meu outro grande herói, Thor Heyerdahl, ganha um filme, candidato ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2013. EXPEDIÇÃO KON TIKI é um belíssimo filme da Noruega. Simples, emocionante, discreto, como Thor.
   Em 2005 li em duas semanas dois livros de Heyerdahl: NA TRILHA DE ADÃO e A EXPEDIÇÃO KON TIKI. Digo sem medo de errar, que são dois dos livros que li com mais prazer em minha vida. Cheios de fotos, texto maravilhoso, eles conseguem fazer com que fiquemos plenos de alegria, de fé na vida e principalmente curiosos. Viver é ser curioso, ser inteligente é ter curiosidade, querer conhecer aquilo que não se conhece. Thor é um desses e por isso eu o venero.
   O filme conta a história sem enfeites. Heyerdahl estuda antropologia e lança a teoria ( ridicularizada ) de que os nativos da Polinésia tiveram sua origem não na Asia, mas sim na América do Sul. Ora, diziam todos, como os peruanos poderiam ter povoado as ilhas? Eles não sabiam fazer barcos, só jangadas, e uma jangada jamais poderia cruzar 8000 km no Pacifico. Heyerdahl insiste na ideia, junta uma equipe e parte. Sim, parte! Quase sem recursos vai ao Perú e lá constrói uma jangada, usando os mesmos materiais que os peruanos de 1500 anos atrás teriam a disposição. E parte.
   Detalhe importante: Thor Heyerdahl nada sabia de navegação, e pasmem, não sabia nadar! Forma uma equipe onde um é vendedor de geladeiras, outro é herói de guerra ( é 1947 ) e dos sete homens apenas um já esteve no mar. Fazem a jangada : troncos de madeira, cordas e uma cabana de folhas. Uma vela e nada de leme ou de remos. As correntes do mar irão os guiar, soltos, do Perú até a Polinésia. Essa é a certeza de Thor. E eles se jogam.
   O mar neste filme á mais belo que em PI. Não tem enfeites. E quando eles chegam a ilha, após 101 dias, voce chora com o riso de Thor Heyerdahl. Ele tinha apenas uma certeza, baseada apenas numa fé, sem qualquer evidência, e chegou. Nada pode ser comparado a bela aventura desse não-aventureiro. Nada se compara a alegre jornada desse grupo. Isso se chama heroísmo: um homem e sua certeza se dirige a seu destino sem ajuda de nada mais que sua fé. Obstinadamente ele prova sua verdade e jamais deixa de acreditar naquilo que o move. Se para mais alguém crer naquilo que ele crê era preciso refazer a viagem, ele a refez.
   O filme termina falando do destino da tripulação, e é com alegria que vejo que todos morreram velhinhos, se aventurando em outras paragens.
   Tenho neste momento em minhas mãos os dois livros. Preciso reler. Preciso novamente estar nesse mar. O filme, feito apenas de momentos claros, apenas daquilo que importa, sem firulas e sem exibições, é delicioso. Provávelmente jamais será exibido por aqui. Corram atrás! Voces irão adorar!

BERÇO DO CINEMA COMO O CONHECEMOS: A HISTÓRIA DA UNIVERSAL, CLIVE HIRSCHHORN

   Me surpreende a pobreza da história da Universal. Sempre soube que ela era, dentre as grandes, de segundo escalão. Mas não pensava que ela fosse tão de segunda! Porém, neste grande livro de Clive Hirschhorn, o que salta aos olhos é a ironia: a Universal, de certo modo, inventou sem querer aquilo que chamamos de cinema contemporâneo. Já explico como.
   O livro, cheio de fotos, traz comentários sobre todos os filmes feitos pela Universal. De 1916 até 1985. Daí em diante nem seria interessante continuar, pois aquilo que entendemos por produção deixa de ter a marca, o DNA de um estúdio e passa a ser objeto de produção indistinta, geralmente um conglomerado. Quando voce vê num filme a chancela da Paramount ou da Warner, saiba que o que essas empresas fizeram foi apenas alugar estúdios e distribuir o produto. Mas não era assim, e os pioneiros, amantes de cinema com faro para aquilo que o povo queria, inventaram e criaram os gêneros de filme, aquilo que até hoje chamamos de cinema americano.
   Ricas eram a MGM e a Paramount. Esbanjavam valores de produção e tinham as grandes estrelas nas mãos. A MGM criava filmes históricos, dramas românticos e os musicais. Aquilo que até hoje chamamos de filme de bom gosto, de filme luxuoso, é marca registrada da MGM. Já a Paramount ia pelo caminho da grande aventura e da malicia. Filmes sobre expedições a lugares exóticos, comédias escapistas, diálogos afiados. A marca da Paramount era a de ser liberal. Das companhias grandes era a que dava maior liberdade a escritores e diretores.
   Abaixo das duas, ainda ricas mas não opulentas, vinham a Warner e a Columbia. A Warner tendo como trademark um certo realismo. Warner era sinônimo de filmes mais duros, mais crús e menos escapistas ( o que não a impedia de ser a casa de Erroll Flynn ). Policiais e dramas com Bette Davis, esses eram os filmes com a cara da Warner. Já a Columbia era a casa do pão-durismo. Fazia-se o máximo com o minimo e seus filmes falavam diretamente com o povão. Eram os filmes mais simples.
   A Universal vinha abaixo desses quatro, vinha ao lado da RKO e da United Artists. Falo agora da Universal.
   Em setenta anos apenas dois Oscars de melhor filme foi ganho pela companhia. Dois grandes filmes aliás: Nada de Novo no Front e Golpe de Mestre, 1930 e 1973. Foram quarenta e três anos sem prêmio. O que era a Universal ?
   A casa de Drácula, de Frankenstein e da Múmia. A empresa nasce como a produtora de filmes de terror e de westerns baratos. As companhias mais ricas eram donas de redes de cinema, a Universal não. Imagine que desigualdade: a MGM fazia um filme e o exibia em seus cinemas, assim como a Warner, e até a RKO faziam. A Universal não. Para sobreviver ela precisou se concentrar nas cidades não atendidas pelas grandes, ou seja, o interior do país. A Universal passa a ser marcada pelos filmes populares, filmes curtos, baratos e de apelo. Terror e westerns.
   É assustador ver a pouca presença de grandes diretores e grandes atores na Universal. Claro, às vezes há um filme com James Stewart ou de Hitchcock, mas isso é bem mais tarde. Em seu começo ela é a casa de Bela Lugosi e de Boris Karloff. Voce começa a perceber o que quero dizer? A Universal como criadora do cinema de hoje?
   Séries de fantasia também são produtos da empresa. Maria Montez e Jon Hall fazem dúzias de filmes sobre As Mil e Uma Noites, assim como se fazem séries sobre um mulo que fala e uma familia de caipiras. Não há sutileza na Universal. A MGM jamais faria um filme sobre um mulo que fala!
   Musicais pobres também são produzidos e Deanna Durbin, um fenômeno, consegue estar em bons filmes. Ela se torna a primeira grande estrela da companhia. Tudo fica nesse clima até os anos 50 que é quando a empresa muda de donos. A MCA compra a Universal e uma mudança ocorre, os filmes ficam mais "bonitos". Dinheiro começa a ser gasto, É quando eles produzem seus melhores filmes: os westerns de Anthony Mann e mais tarde Spartacus para Kubrick e Os Pássaros para Hitchcock ( e observe, nada de Kubrick e Hitch é tão "cinema de agora" como Spartacus e Os Pássaros ). Nos anos 50 o produtor Ross Hunter cria na empresa aquilo que conhecemos como "comédia romântica", molde que dura até hoje e que tinha Rock Hudson e Doris Day como ícones da empresa.
   Assusta ver como a revolução dos anos 60 passou longe da Universal. Fizeram filmes ótimos como Charada de Stanley Donen, mas ignoraram o cinema de Lumet, Pollack e Frankenheimer. Penn, Nichols e Altman não teriam a menor chance lá.
   Mas sim os disaster movies. Em 1970 eles estouram com Aeroporto, e de 1970 até 1977 a empresa vive seu apogeu em bilheteria. Se desde 1930, com seus filmes de terror e suas séries para o povão, eles indicavam sem saber o que seria o cinema do futuro, na década de 70 eles criaram o cinema de 2013.
   Na década de 70, Warner e Paramount apostavam nos diretores. A Warner dava total liberdade a Altman e a Paramount bancava Coppolla, Polanski e sua turma. Essas empresas imaginaram que o futuro seria um certo tipo de filme autoral, contestador, de arte. Mas não a Universal. Ela apostou em Robert Redford, em Paul Newman e em Steven Spielberg. Em 1973, Golpe de Mestre quebra a banca ( é um filme maravilhoso ) e por toda a década Redford e Newman irão continuar fazendo seus big hits baseados em humor, ação e bons roteiros. E chega então 1975, e com ele o primeiro blockbuster como o conhecemos. Tubarão é lançado em centenas de salas, com marketing agressivo e se torna a segunda maior bilheteria da história. Mais, vira mania. As companhias grandes torcem o nariz, acham o filme careta, mas logo em seguida a Paramount dá espaço a Lucas e vem Star Wars. Pronto, nasceu o cinema como o conhecemos. Tubarão foi o primeiro, e não deixemos de falar, Lucas começou na Universal, American Graffitti é da companhia.
   No fim da década a Universal lança mais um estilo de filme desconhecido até então, a comédia grosseira e sem roteiro. John Belushi se torna star da tela grande em 1978. Um novo filão. Devo dizer também que a Universal foi a primeira grande empresa a produzir muitos filmes para a tv. Columbo é da Universal e Clint Eastwood começou também por lá.
   A MGM em seu auge tinha Garbo, Gable e Judy Garland. A Paramount tinha Dietrich, Cary Grant e Gary Cooper. A Warner era o lar de Bette Davis, Bogart e Erroll Flynn e a Columbia tinha James Stewart, Frank Capra e John Wayne. A RKO ia de Kate Hepburn e Fred Astaire....a Universal tinha Drácula, Flash Gordon e O Mulo Falante.
   Filmes de terror, séries baratas, comédias românticas, blockbusters, disasters movies e comédias grosseiras. Tudo DNA da Universal. Quem criou nosso cinema?
  PS: Imperdoavel falha! Esqueci da FOX!!!! Coloque-a logo abaixo da MGM e da PARAMOUNT. Seu caráter era o de seguir os passos das grandes. Fazia muitos musicais como a MGM. Comédias como a Paramount e aventuras tipo Warner. Só que sempre um tantinho mais pobres, mais bobinhas. Tyrone Power e Jennifer Jones eram as estrelas. E junto com a Columbia, colecionava prêmios Oscar.

  

CLOONEY/ SEAN CONNERY/ MARLOWE/ ANG LEE/ ALDRICH

   SETE PSICOPATAS E UM SHIH TZU de Martin McDonagh com Colin Farrell, Sam Rockwell, Abbie Cornish, Woody Harrelson, Christopher Walken e Tom Waits
Um elenco interessante em mais uma imitação de Tarantino. Diálogos sem sentido, violência de HQ, musiquinhas cool e uns personagens esquisitos. Tempere essa receita com humor e cores fortes. Certo? Não, tudo errado. Neste filmeco sobre um escritor sem inspiração e seu amigo tonto ( que vive de sequestros a cães ), tudo dá errado. O humor é medíocre e pior, os personagens são frouxos. Insuportável de tão vazio. Nota Zero.
   UM HOMEM MISTERIOSO de Anton Corbijn com George Clooney
Clooney é um assassino de aluguel que se refugia na Itália. Anton foi um famoso diretor de clips. Isso se percebe logo, ele é incapaz de encenar um diálogo. O filme é uma série de imagens frias, mal montadas e sem porque. Clooney posa e o filme é um nada absoluto. Nota Zero.
   NUNCA MAIS OUTRA VEZ de Irvin Kershner com Sean Connery, Klaus Maria Brandauer, Kim Basinger e Max Von Sydow
Em 1983 dois filmes de James Bond foram feitos. Um oficial, produzido por Saltzman e Brocolli; e um alternativo feito por outra equipe, mas com o trunfo de ter Sean Connery de volta ao papel, após 12 anos longe. É estranho, porque é um Bond sem o tipo de letreiro habitual e sem a trilha sonora de John Barry. Mas é 100% o velho Bond de sempre. A trama é sobre o roubo de arma nuclear e Connery está excelente no papel: cínico, mulherengo e frio como aço. De bônus há o fato de ele brincar com sua idade. James Fox faz seu patrão e diz que Bond está ultrapassado. O filme tem uma ótima primeira parte ( e uma péssima trilha sonora, de Michel Legrand ), mas perde ritmo no fim. Kershner vinha de dirigir O Império Contra-Ataca e Kim Basinger começava a chamar a atenção. É uma aventura que jamais se leva a sério. Nota 5.
   LOCAL HERO de Bill Forsyth com Peter Riegert e Burt Lancaster
Faz muito tempo que eu queria ver esse filme. Isso porque ele é sempre eleito pelos ingleses um de seus filmes favoritos de todos os tempos. Trata-se de um modesto filme dos anos 80 que fala de um jovem americano que vai à uma vila escocesa. Esse jovem trabalha numa enorme companhia de petróleo e seu objetivo é comprar a vila para construir uma refinaria. O filme tem seus primeiros quinze minutos sem nada de especial, mas de repente ele cresce e nos seduz completamente. A população adora a ideia de vender a vila inteira e o filme transcorre desse jeito: as coisas acontecem imprevisíveis e em ritmo normal. Nada de chocante acontece, nada é grande ou esquisito, entramos na vida banal daquela gente, que não são tristes e nem alegres, e sentimos estar diante de gente real e de vida de verdade. O lugar nem é tão bonito! Lancaster está excelente como o dono da empresa de petróleo, um solitário que é apaixonado por astronomia. O filme, discreto e bonito, é cheio de vida. Nota 8.
   MURDER, MY SWEET de Edward Dmytryck com Dick Powell
Excelente filme noir. Powell faz Marlowe, o mitico detetive de Raymond Chandler, e sua abordagem é completamente diferente daquela de Bogart. Powell faz um Marlowe muito mais pé de chinelo, sem moral, cheio de humor. Dmytryck era um ótimo diretor antes de ser pego pela comissão de McCarthy e demonstra isso aqui. O filme tem estilo, tem ritmo, ótimas cenas e diverte muito. Todo passado no mundinho de botecos, becos e sombras, é boa opção para quem quer conhecer esse maravilhoso gênero de cinema. Másculo, direto, e muito influente. Nota 7.
   COM A MALDADE NA ALMA de Robert Aldrich com Bette Davis, Olivia de Havilland, Joseph Cotten e Agnes Moorehead
Após o sucesso de Baby Jane, Aldrich reconvoca Bette Davis e lhe dá mais uma vez um filme de horror em que ela faz uma velha doida. E coloca outros veteranos a seu lado. Mas se Baby Jane foi inesquecível, este é apenas correto. Não assusta como o filme anterior e Bette não tem um papel tão forte como foi aquele. A gente percebe que alguma coisa aqui foi forçada. De qualquer modo, é um prazer ouvir Bette Davis e temos Agnes Moorehead dando um show como a maltrapilha empregada da casa. Nota 5.
   AS AVENTURAS DE PI de Ang Lee
Visualmente belíssimo, ele passa por alto das implicações contidas no primeiro terço do livro de Martell. Dessa forma, deixamos de conhecer Piscine em profundidade e nem sabemos o porque de sua familia. Mesmo assim Ang Lee produz mais um filme que nos surpreende. Vivemos uma época de cineastas pouco versáteis. Um filme de Wes Anderson ou de Thomas Anderson ou de Tarantino, por melhor que seja, sempre se parece com tudo aquilo que seu diretor sempre fez e faz. Mas não Ang Lee. Ao melhor estilo John Huston ou William Wyler ou Fred Zinnemann, Lee faz filmes em função da história a ser contada. Desse modo, Hulk nada tem que lembre Brokeback Mountain que nada tem a ver com Tempestade de Gelo. É um dos maiores talentos de nosso tempo. O filme é o que poderia ser, nem mais nem menos. Emociona menos que deveria, erra menos do que seria provável. Em mãos menos hábeis teria tudo para ser ridiculo. Nota 7.

AS AVENTURAS DE PI, FILME DE ANG LEE

   Ao contrário do que o pai de Piscine lhe tenta ensinar ( Tigres são diferentes de nós. Tenha medo. ), o jovem Piscine insiste em seu maravilhamento. Ele ama a vida e esse amor o leva a curiosidade. Dentre as várias maravilhas do mundo, nada tem um caráter tão maravilhoso: Deus. Ele passa então a procurar Deus. Onde? Nas religiões. E lá se vai o jovem inquieto na busca por maravilhamento. Mas a pressão da familia, a cobrança por coerência lhe entristece. Eis um momento importante: A vida perde seu encanto, o tédio se impõe. Piscine está pronto para ser "mais um".
   No belo livro de Yann Martel, toda essa primeira parte ocupa quase metade da narrativa. E é a melhor. Com soberbo humor e sabendo fugir do clima "auto-ajuda", voce lê tudo isso com prazer e surpresa. Os animais passam a ocupar o lugar de Deus na vida de Piscine. E vem a saga.
   Ang Lee é um dos melhores diretores vivos. Mas não é David Lean. Com todos os recursos digitais, ele não dá ao mar o que Lean deu ao deserto. O oceano de Lee é lindo, o deserto em Lawrence da Arábia era aterrador. Cada tomada de David Lean era entrada no sagrado ( como foi também o espaço em 2001 de Kubrick, para mim, o melhor dos filmes religiosos ), cada tomada de Ang Lee é apenas Disney. E que belo Disney!!! O vôo dos peixes-voadores já é uma cena clássica.
   A história é narrada para um escritor sem inspiração. E ao final ele dirá que Richard Parker, o tigre, era Piscine. Mas então quem era Piscine?
   Conhecendo alguma coisa de poesia inglesa a gente logo percebe que existem cinco poemas centrais no idioma. Aqueles que todo estudante mediano conhece. Ode ao Vento Oeste, Ao Rouxinol, Se... e de William Blake temos The Tyger ( na grafia antiga com um Y ). O poeta vê o tigre e hipnotizado sente que aquela imagem é mais do que um bicho: pode ser Deus. É impossível Yann Martell não conhecer esse poema. Ele já foi citado centenas de vezes em filmes e até em música pop. Pois bem...
   O tigre se vai na mais bela cena do filme ( e a única que me emocionou ). Com sua missão cumprida, uma terrível missão, pois o Tigre que salvou Piscine também poderia tê-lo matado ( O que não me mata me fortalece ), ele desaparece na floresta e não deixa rastros. Vem então a chave do filme: Qual a história verdadeira?
   Desde a muito eu sei que exsitem dois tipos de espirito. E saiba que eu vivo/vivi ambos. Existe gente que olha o mar e vê água e sal. E um monte de bichos. São simplificadores, sempre diminuem tudo, inclusive a si-mesmos.  Existe gente que olha o mar e vê o infinito. E trilhões de caminhos. Mais que isso, vê um mistério SEM POSSIBILIDADE DE RESPOSTA. Portanto, mesmo não admitindo, essa pessoa vê Deus no mar. Já o outro, míope, só consegue perceber o óbvio, água e sal.
   Piscine diz ao ouvinte que a história o fará crer em Deus. E muita gente se decepciona pois o ouvinte não vê uma prova de Deus. Mas não é caso de julgamento, é uma questão de ESCOLHA. Ao optar pela história de Richard Parker e não pela do cozinheiro louco, o ouvinte está se abrindo ao maravilhoso, ao além do banal, a Deus portanto. Ele não crê em Deus, mas tem uma porta aberta a Sua possibilidade.
   Dito isso o que desejo deixar claro é que acredito na religião da BELEZA, e fico entristecido e com pena daqueles que só conseguem ver a fealdade na vida. O senso de beleza pode salvar uma vida, dar dignidade a dor, dar sentido ao caminho. O maravilhamento de Piscine com Richard Parker abre seus olhos a beleza inenarrável de sua saga. E na morte em vida ele encontra a Ilha que lhe dá outra-nova vida. Sua tragédia é um reencontro com a liberdade da infância, a curiosidade e a busca.
   Tenho amigos que vivem comigo nesse Oceano. Tenho outros amigos que só querem ver o cozinheiro louco, a água e o sal, o tigre sem nome. É sempre uma questão de QUERER CRER.
   O melhor filme de Ang Lee continua sendo sua magnífica versão de RAZÃO E SENSIBILIDADE de Jane Austen, mas este filme é uma obra de coragem e de simplicidade invulgar.
   Um PS: É dito no filme que os Super-Heróis são os deuses-indianos de hoje. Sempre repito isso, nossa necessidade, humana, de transcendência nos faz adotar heróis, gurus, profetas e curandeiros, mesmo os mais medíocres. Richard Parker me parece um bom tipo de transcendência. Parker não dá nada com facilidade, não banaliza as coisas, nunca se vende. É uma força que tem de ser entendida, compreendida e aceita. Nisso reside sua beleza.

PORQUE A MEMÓRIA?

   Um dos grandes mistérios da vida: Porque certas coisas se fixam em nossa memória, para sempre, e outras desaparecem? Não falo das "grandes coisas", tipo um pé na bunda ou uma cirurgia. Falo de pedaços de imagens, momentos que parecem tão banais, mas que sobrevivem, exatos, próximos, enigmáticos, por todos os seus dias. Porque?
   Olho uma imagem na tv. E ainda estou numa idade em que aquilo que vejo na tv é tão real como o que observo pela janela. Um homem numa floresta, cercado de fadas, olha sua imagem refletida num lago e percebe que não é mais um homem, é agora um animal. Fascinado pelas imagens em preto e branco, guardo esse momento por toda a minha vida, com a força de algo recente. Tenho dúvidas se isso foi um sonho ou um filme na tv. Até que em 2008 compro o dvd de SONHO DE UMA NOITE DE VERÃO, a versão da Warner de 1932, e descubro que essa era a imagem, que o homem era James Cagney e que aquilo era um filme na tv que passou de noite, num especial de Natal. E o fato de um filme clássico, de 1932,  ter passado na tv como especial, demonstra o quanto essa minha lembrança é antiga. Foi em 1966? 67? Eu tinha então três ou seriam quatro anos?
   Muito mais importante: Porque essa cena me impressionou tanto e não alguma cena de meus programas favoritos de então ( segundo meus pais ), que eram Bat Masterson e Circo do Arrelia? As fadas e a floresta, o lago e a transformação, a tristeza profunda e melancólica que James Cagney demonstrou ao se ver como bicho, porque isso me pegou tanto?
   No quintal de casa uma menina passa rodo no chão. Faz sol e venta muito e ela trabalha descalça. Usa um vestido leve e uma tachinha que não sei porque estava por lá, entra na sola de seu pé. Sem sentir dor, ela sorri e tira a tachinha do pé.
   Eu desço a rua dos Três Irmãos e olho as luzes, fracas, dos postes que se acendem lentamente.
   Uma manhã em que encosto meu rosto contra o vidro da janela de um táxi na avenida Angélica.
   Cheiro de chocolate no Itaim, andando na rua da Kopenhaguen.
   O sol entrando pela janela da sala de manhã.
   ...Todos esses são momentos comuns, preservados pela minha memória. Flashs sem enredo, sem antes e sem depois. São como planetas que orbitam ao meu redor, eternos e impassíveis, idestrutiveis. Porque esses planetas e não tantos outros?
   Talvez a chave esteja exatamente no fato de serem momentos sem enredo. Esses momentos não são prosa, não podem ser narrados, eles são poesia. O que os preserva e os faz vivos é uma qualidade de luz que eles possuem. São imagens, quadros que exibem a eternidade de um momento. Descobertas de mistérios. Nesses momentos eu vislumbrei o mistério da melancolia, da mulher, da noite, do cheiro. E todos eles, e tantos mais, são banhados por uma luz diferente, uma sombra, ou um brilho intenso. Segundos que duram para sempre e que me avisaram aquilo que eu era e não sabia ser.
   Tantos outros...Num Jeep em meio a chuva...Um graveto no mato que fura minha pele...O ruido da chuva nas calhas de lata que fazem eco...A roupa voando no varal ao sol....
   Fellini usava muito essas imagens em seus filmes. Imagens da infância em Rimini, imagens de sonho-verdade, flashs da memória, descobertas... E eu sei disso: Nossa mente ansia por poesia, por momentos de revelação. Amamos para isso, para viver esse momento, ter revelações, ter segundos de criação de planetas. É pra isso que amamos, lemos e viajamos. O resto nada vale.