LOLLAPALOOZA PARTE DOIS

   Uma banda como o Friendly Fire consegue um milagre: fazer todo um show baseado em um refrão do Duran Duran! Em todas as músicas deles voce tem a impressão de que o cara vai passar a cantar, "Dance into the Fire...", experimente cantar junto com eles e enxertar esse refrão de Simon Le Bon....sempre encaixa!!!! Friendly Fire é uma banda para não se esquecer de esquecer. Se em 1985 os Durans comprassem suas roupas nas Casas Pernambucanas e bebessem cerveja em lugar de champagne teríamos os Friendly. Mas como tudo sempre pode ser piorado, os Foster deveriam ser os Fofos. Que coisinha tão lindinha do papai !!!!! Eles conseguem fazer com que o Coldplay pareça o Velvet Underground e que Elton John soe perigoso. Assexualidade, teu nome é Foster.
   O Manchester Orchestra promete pelo visual. Os caras têm cara de homem, e isso é muito raro no pop. Dizem que fazem um tipo de grunge furioso. Mas quando tudo começa voce vê que é apenas mais um som à Live. Anódino. O público adora. Aliás o público adora tudo. Parece que desgostar é um pecado mortal. Saudades das latas que atingiram Carlinhos Brown....
   Gypsy Punk não merece ser comentado. Gypsy Kings piorado. Uns tiozinhos disfarçando sua caretice com uma guitarrinha "punk". E um cantor que é xerox de Ian Anderson em 1975. Só faltou a flauta. Se ele parasse tudo e começasse com "Aqualung my friend...." nada seria estranho. O modo como ele pula e joga o violão é Ianandersoniano puro.
   Será que tudo hoje é anos 80? Veja os Monkeys. Eu juro que já ouvi musica deles no radio achando ser alguma musiquinha de 1983 que eu esqueci de quem fosse. Pelo menos eles tocam ok.
   Fazem décadas que eu sonho com uma avalanche punk que lave o marasmo e mude tudo. Não virá. Antes dessa nova tempestade se formar as bandas já estarão na rede, popularizadas e separadas em suas carreiras virtuais. No mundo hiper-globalizado não há como uma banda amadurecer quieta e isolada. Então ficamos assim: o festival foi deslumbrante... pra quem nunca havia visto show nenhum e pra quem acha que o rock começou em 1980 com o Joy Division.
PS: gostei dos TV ON THE RADIO. E os CAGE THE ELEPHANT foram muuuuito bons.

CONTEMPLAÇÃO

    Prometi e aqui está o texto de Oscar Wilde sobre poesia. Após falar sobre o maravilhoso dom romântico de Yeats, Wilde cita este parágrafo de Walter Pater.... leiam....
    "O fim da vida não é ação, é sim a contemplação- ser se diferenciando de fazer- uma certa disposição da mente: isto é, em um aspecto ou outro, o principio de toda a mais alta moralidade. Em poesia em arte, se voce penetra no seu verdadeiro espirito, voce toca rapidamente seus principios que, devido a sua esterilidade, são uma espécie de observador que está aí pelo simples prazer de observar. Tratar da vida no espirito da arte é fazer dela algo cujos significados e fins já são conhecidos: encorajar de fato este tratamento, o verdadeiro significado moral da arte e da poesia. Seus trabalhos não são para dar lições ou criar regras, ou mesmo para nos estimular a nobres fins, mas para remover por um certo tempo os pensamentos do simples mecanismo da vida e prepará-los para as emoções , seja sobre o espetáculo de grandes fatos da existência humana sem qualquer sentimento mecãnico, as grandes e universais paixões do homem, as mais gerais e interessantes  de suas ocupações e o complexo mundo da natureza.
   Testemunhar esse espetáculo com as emoções apropriadas é a meta de toda cultura, e a poesia é a grande fomentadora e estimuladora dessas emoções. Enxergar a natureza repleto de sentimento e excitação. Observar homens como parte da natureza, excitados, apaixonados, em conexão com a beleza do mundo natural, imagens do sofrimento humano em meio a formas tão poderosas e terríveis".
   Observar. O dom da poesia é o dom da observação. Olhar sem fazer, ver e seguir o movimento que é a vida. Não conheço melhor modo de definir poesia. Observar, saber ver sem a conciência de se estar vendo. Integrar o olhar que olha ao objeto que está sendo visto. Fazer do que é observado parte de seu espirito que olha. Olhar passivo, olhar que integra.
   A poesia é então uma visão, olho. Ver tudo, o que é e aquilo que deveria ser. O que será e aquilo que era e se torna presente pela visão poética. Saber da complexidade da vida e da natureza. Intuir a linguagem do que se vê ( e não falar ).
   A verdade é poesia. Conhecer a vida, saber da vida. Liberar.
   Oscar Wilde, que disse que toda arte que merece ser arte deve ser absolutamente inútil, diz então que Pater define o que é a poesia: observar. Ver sendo o ápice da vida, ver contemplando, não julgando e nem pensando em fins ou utilidades. Apenas contemplar.
   É um dom raro, dificil, mas é o que dá valor a vida.

CHÁ DAS CINCO COM ARISTÓTELES- OSCAR WILDE

   Logo após voltar de seu tour de sucesso pelos EUA ( ele havia feito conferências por todo o país com lotações esgotadas ), Oscar Wilde volta a sua vida londrina habitual, ou seja, publica seus artigos em jornais e revistas. A grande fase de A IMPORTÂNCIA DE SER HONESTO e de DORIAN GRAY viria na década seguinte. Assim como sua prisão.
   Estamos portanto na Londres de 1885/1890 e o que agita a cidade é o embate entre clássicos e românticos, realistas e simbolistas, objetividade e poesia. O que há neste pequeno livrinho são os artigos que Wilde publicou em jornais. Críticas sobre livros e peças, dissertações sobre culinária e poesia. Sabiamente ele percebe que o cerne de seu tempo é a oposição realismo/ simbolismo, um confronto entre a alma que cria e a alma que apenas registra o que vê. Ele toma partido, e acho que não preciso dizer qual.
   Bela época em que os autores "atuais" se chamavam Tolstoi, Dostoievski e Turgueniev. Ele resenha o novo livro de Dostoievski, assim como Balzac ( uma nova tradução ), Walter Pater, e descobre um novo e promissor poeta, William Butler Yeats. Além dos citados, esse é tempo de Tchekov, Henry James, Thomas Hardy, Mark Twain, Mallarmé e Zola. Dentre muitos e muitos outros.
   Wilde evita tocar no que é muito ruim. Embora ele critique certas traduções desastrosas, no geral ele não é agressivo. Se esmera na leveza, em fazer da leitura um prazer. Oscar Wilde insiste em que toda arte deve ser prazerosa e bela. Esse é seu norte. Quem pensa que a crítica ferina é coisa de Wilde errou de irlandês, George Bernard Shaw era a fera que foi o molde Paulo Francis e que tais.
   O primeiro texto é uma emocionada homenagem ao maior dos poetas, John Keats. O autor visita seu tumulo em Roma e se encanta com a beleza do lugar. O belo escrito a seguir discorre sobre a culinária e fala da ruindade da cozinha inglesa. É divertido e acerta o alvo.
   Numa critica a peça de Shakespeare em cartaz, Wilde se detém nos excessos da cenografia, na facilitação de efeitos ribombantes. Há em sua critica um desejo pela volta a simplicidade. No começo do livro o tradutor colocou uma frase de Borges em que ele diz que Oscar Wilde não envelhece. O que ele escreveu podia ter sido escrito hoje de manhã. O que ele pede ao teatro shakespeariano é pedido válido agora: menos efeito e mais texto.
   Vem então um comentário sobre um livro que fala de casamentos e mais uma critica sobre Keats.
   Um dos melhores textos é o próximo, sobre Balzac. Wilde fala sobre a maravilhosa força do francês, o modo como ele nos ilude ao criar vida que em nada se parece com a vida, mas que "é mais real que a própria vida". Penso em Iris Murdoch, que criou toda a sua filosofia baseada nessa linha, ou seja, de que a arte é a vida real e não o dia a dia. Numa frase soberba, Oscar fala que é "muito melhor ficar em casa na companhia dos personagens de Balzac que sair para encontrar gente tão sem vida". É um texto divino do grande Oscar.
   As críticas que seguem são sobre a mania de se lançar biografias de escritores. A reclamação de Wilde é pertinente ainda hoje. Que importa quantas vezes Rossetti comia por dia? O que interessa ao leitor a quantidade de cães que um poeta tinha ou no tipo de guarda-chuva que ele usava? Wilde fala que o que importa é a obra, a vida verdadeira do artista reside naquilo que ele criou e o fato do cotidiano só importa ao ter ligação com a gênese da obra. Quem pode discordar disso?
   Essas biografias, tolas, falam de Keats, Ben Jonson e Dante Gabriel Rossetti. A de Keats é destruída de uma forma elegante por Wilde. Vale muito a pena ler.
   Mas um dos melhores textos fala de um livro que se propõe a nos ensinar a conversar. Wilde aproveita para escrever sobre a conversação, sobre o que seja uma boa e uma má conversa. A arte que há em se saber trocar ideias.
   Vêem então belos artigos sobre modelos ingleses ( modelos que posam sem entender nada de arte ), o novo presidente da academia de pintura ( um tolo ), e ao final dois maravilhosos e emocionantes artigos sobre Yeats, jovem poeta que muito prometia. Escreverei sobre eles em outra postagem.
   Lendo este livro nos sentimos muito próximos de Wilde. E o que sentimos é afeto por essa grande alma.
   PS: a "filosofia" de Wilde é; Existe mais verdade na visão de um artista que na objetiva e simples observação da natureza.

LOLLAPALOOZA, DIA 1

   Miles Davis já dizia que o musico negro não gosta de olhar pra trás. Se ele olhar muito ele chega a escravidão...Já explico porque cito essa frase.
   Dave Grohl tem a melhor profissão do mundo e ele sabe disso. Ele se diverte no palco. E o povo o adora. Ele chegou naquele ponto em que se der um arroto será imitado por vinte mil pessoas. É ok, mas se voce olhar de longe é também patético. Um monte de gente falando YEAH pra qualquer coisa lembra muito um comício nazi. Mas Grohl é legal....só podia falar um pouco menos. Acho que seus fãs ficariam bravos se ele dissesse que escuta Pink Floyd. Eu adoro quando ele faz aquele som Floyd-visita-Nirvana.
   Joan Jett tá barriguda. As Runaways em 1978 eram consideradas uma banda de quinta. Constrangedoras. Os punks as detestavam e o rock oficial as ignorava. Eu continuo achando que Joan é muito mais uma fã de rock que uma compositora/cantora/guitarrista. Tenho a impressão que hoje tudo é aceito, até mesmo O Rappa. Ainda se usa a vaia????
   Nada pode ser pior que Band of Horses. Tem até lá lá lá....Deus me salve!!!! Bando de barbudos sensíveis só The Band, os canadenses geniais que Scorsese filmou em 1976. Mas há quem goste e não adormeça.
   Cage The Elephant é bom. O som é cover, mas eles fazem com tesão. Dá pra ouvir por mais de quinze minutos. Antes de que o cantor se jogasse no povo eu já sabia que ele iria "Iggypopizar". O cômico é que as pessoas preferiam fotografar que pular e tocar no cara.  " O Lucas tem de ver isso!!!!" Tem gente que não vive mais o momento, ela apenas o registra pros "Lucas" que não estão presentes.
   Agora eu posso voltar ao Miles Davis.
   Desde 1970 tudo o que há de mais novo no pop foi feito por um negro. Desde Sly Stone/ James Brown até o Rap e suas consequencias. Meus amigos que não ouvem música de negrão sempre me parecem saudosistas ( mesmo sem o saber ). E o único show que não tentou se parecer com alguma coisa de trinta anos atrás foi o TV ON THE RADIO. Ali há uma tentativa de se fazer diferente. Em meio a bandas que compõe covers de Pixies, de Ramones e de Husker Du, alguém foge dessa estrada e procura dar uma enriquecida no som.
   O resto é o vazio....

PAYNE/ KEN RUSSELL/ JAMES STEWART/ JOHN WAYNE/ CORMAN/ LAURENCE OLIVIER/ MARILYN

   SIDEWAYS de Alexander Payne com Paul Giamamtti e Thomas Haden Church
Podem me xingar á vontade: não gosto de Paul Giamatti. Ele tem cara de quem está prestes a vomitar e esse enjôo passa pra mim. E quando não me faz sentir náuseas ele me faz dormir. O filme poderia ser bem melhor sem ele. Em compensação, gosto de Church. Merecia melhor carreira. Desde a tv que o acompanho. O filme é o mais fraco de Payne, dos poucos diretores atuais que não confunde arte com nojeira. Seu melhor filme ainda é ELEIÇÃO. Aqui é a história de amigos que partem para uma viagem atrás de vinhos. Encontram amor ( claro, é Hollywood ). Nota 5
   DELÍRIO DE AMOR de Ken Russell com Richard Chamberlain e Glenda Jackson
Eu estava meio sem pique com cinema e a revisão deste filme me fez voltar a sentir a paixão pela tela. Ken Russell nunca fez ou tentou fazer "bom cinema". Seu interesse era o carnaval. Temos aqui Tchaikovski como um gay que insiste em tentar ser hetero. E ele sofre como um São Sebastião  do pau oco. O filme, com uma foto espetacular de Douglas Slocombe, tem aquele exagero de cor e de movimento que é o estilo sem pudor de Russell. Glenda Jackson, estrela de gênio, se expõe numa patética cena de sexo. Nós não sabemos se é pra rir ou pra chorar...adoramos e nos divertimos à farta. Russell sacrifica verossimilhança ou sobriedade por cenas de furor e frenesi. O filme é um tipo de "Russia em Nilópolis by Joãozinho Trinta". Nada tem de real ou de simbólico, é somente imagem e som. Odiado em seu tempo, fracasso de público, hoje, em tempos menos exigentes, está reabilitado. Quando o assisti na tv em 1978 mudou minha vida. Lembro que pensei: "Cinema pode ser assim? " Falseando a vida e o cinema Ken Russell nos dá prazer. Escrevi critica sobre este filme abaixo, procure. Nota 8.
   O VÔO DO FÊNIX de Robert Aldrich com James Stewart, Richard Attenborough, Peter Finch, Ernest Borgnine e George Kennedy
Um grupo de soldados de várias partes do mundo, viajando de avião sobre o Sahara, se vê preso no deserto quando o avião sofre pane. O que vemos é o conflito entre esses homens em desespero. Stewart faz um muito antipático piloto americano, que tem preconceito contra um engenheiro alemão. Finch é um rigido comandante inglês. Aldrich, como disse Inácio Araújo esta semana, é um excelente diretor. Um cineasta que sabia criar conflito, drama, tensão e que era dono de um estilo nada afetado, viril. É dele o genial THE DIRTY DOZEN. Precisa dizer mais o que? Este filme foi refeito a dois anos com Dennis Quaid no lugar de Stewart. James Stewart rouba o filme, ele é ao mesmo tempo ruim, covarde, turrão e determinado. Belo filme. Nota 7.
   O CASTELO ASSOMBRADO de Roger Corman com Vincent Price e Debra Paget
Todos sabem que Corman foi o diretor classe B que sabia fazer filmes decentes com um nada de recursos. Mas o que lhe garantiu a memória é o fato de ter sido ele quem ajudou Coppolla, Bogdanovich e De Palma em seus começos. Aqui temos um filme que usa contos de Poe e de Lovecraft. É sobre um herdeiro que ao visitar o castelo abandonado da familia se vê possuído pelo fantasma de seu tataravô, um feiticeiro que foi queimado. Filmes de terror são os que envelhecem mais rápido. O que pode mantê-los vivos é seu clima e seu engenho, o medo logo se vai. Este tem algum clima de "nevoeiro com túmulos".... Price nasceu pra fazer esse tipo de canastrão do mal. Nota 4
   O CÉU MANDOU ALGUÉM de John Ford com John Wayne, Pedro Armendariz e Harry Carey Jr.
Ford ia pro deserto do Arizona. Ia com seus amigos acampar. E por acaso esses amigos eram atores e técnicos de cinema. Então ele aproveitava e fazia filmes por lá. Simples assim. Afetação zero. Este fala de 3 ladrões de banco que ao fugir pelo deserto encontram um bebê em caravana que foi dizimada. Se tornam os padrinhos desse bebê. Wayne é um dos ladrões e aqui ele mostra mais uma vez o grande ator que foi. Passa da maldade para a falta de jeito, do humor ao drama sem qualquer esforço aparente. O filme, cheio de areia, vento e muito sol faz com que nos sintamos parte do ambiente. Simples, puro, é exemplo do dominio absoluto de Ford sobre sua arte. Nota 7
   UM HOMEM CHAMADO CAVALO de Ellot Silverstein com Richard Harris
Um inglês que está caçando nos EUA de 1830 é capturado pelos sioux. Tratado com imensa crueldade, ele vai sobrevivendo e se impondo na ordem social da tribo. O filme, que é hoje um cult e que em seu tempo foi tratado como lixo, tem dois méritos: mostra a cultura do sioux sem romantizar e é ao mesmo tempo uma simples e ritmada diversão. O indio é mostrado aqui como ele era. Nada de nobre, nada de bandido. Eles possuem uma regra geral: só o que provém da dor tem valor. A vida só nasce pela dor, voce só cresce pela dor. Então o que vemos são várias cenas de auto-mutilação, sangue e a impressionante cerimônia do sol. Silverstein não está a altura de seu roteiro, dirige de forma conservadora. Mas é um filme invulgar, feito em momento ( 1971 ) de plena coragem no cinema popular. Nota 7
   SETE DIAS COM MARILYN de Simon Curtis com Michelle Williams, Kenneth Branagh e Judi Dench
Em 1955 Monroe foi a Londres filmar com o maior ator do século, Laurence Olivier. Olivier estava otimista com o filme que ele dirigiria e interpretaria, mas a experiência foi um desastre. Ele fazia parte da velha tradição inglesa de atuar, a tradição do "Vá lá e faça"; já Marilyn seguia o estilo novo, de New York, o estilo em que o ator deve se sentir o personagem, compreendê-lo, entender sua motivação. O choque se fez. A estrela falta a filmagens, se atrasa, se droga, esquece as falas. Mas ao final, em bela cena, Olivier diz que ela é uma grande estrela, nasceu para a tela, faz com que ele pareça pequeno. O filme concorreu a Oscars em 2012, perdeu todos. Michelle está ok. Frágil, confusa, cercada por bando de puxa-sacos e de pseudo intelectuais. O filme condena Arthur Miller. Já Branagh dá um show. Sua voz lembra muito a de Olivier e seus trejeitos são homenagem ao gênio de Laurence. Único senão: Olivier era bonito, Ken não. O filme cresce com sua presença. Judi Dench faz Sybil Thorndike, grande atriz que estava na filme e que entendeu Monroe. Aliás, para cinéfilos há a emoção de ver a recriação dos estúdios Pinewood e até colocaram um ator para fazer o grande Jack Cardiff, diretor de fotografia soberbo. Na vida real o filme que resultou foi responsável pelo fim das ilusões de Olivier com o cinema. Após esse fracasso ele se atiraria de vez ao teatro. Assisti esse filme algumas vezes quando criança, ele era exibido na Sessão da Tarde. Me apaixonava por Marilyn ao ver o filme e me irritava com Olivier. Eu devia ter no máximo 12 anos. Preciso o rever. Deixo de propósito de dizer que este filme é centrado no amor de um jovem diretor de terceira unidade pela estrela solitária. É uma história que dá tédio. Chatinha. O pouco dos bastidores do filme é tudo que importa. Nota 4.

NOEL COWARD, PONDÉ, ROBERTO DA MATTA, BOB GRUEN E TELMO MARTINO

   Alvíssaras! Comemorem! Dêem vivas! Noel Coward está tendo uma peça exibida em SP !!!!! Eu bem que senti que o ar de SP está um pouco mais wit. Noel Coward em cartaz é um privilégio tão sublime como ter disco novo de Bryan Ferry para ouvir. Noel é do tempo em que ser educado era objetivo de uma vida. A peça é Blythe Spirit e está no teatro que fica no Shopp Eldorado. Lugar horroroso que deve ter de súbito se tornado very classy. Essa peça, que foi filme de David Lean, trata de espirito que volta à Terra para atazanar ex-marido. Rex Harrison fazia o marido no filme. Nas telas o que eu recordo foi do colorido e das frases de Noel, uma profusão de linhas inteligentes. Humor britânico.
   O que me deixa assim assim é saber se há público na cidade para prato tão fino. Afinal, mesmo no teatro as pessoas regrediram e desaprenderam a escutar. E depois, a Inglaterra, como vimos em O DISCURSO DO REI, ainda tenta fazer peças e filmes com alguma elegância. O filme com Colin Firth, cá na selva, jamais foi apreciado como deveria. As massas preferiram o grand-guinol de segunda categoria de CISNE NEGRO e outras estultices. Bem...há quem evite o glamuroso O ARTISTA por achá-lo "dificil".... Glamour é hoje um tipo de sânscrito para o frequentador de cinema.
   Como estamos abaixo do Equador e nada aqui pode ser perfeito, Noel Coward tem em seu elenco Adriane Galisteu. Galisteu recitando Coward é como colocar Elba Ramalho para cantar Cole Porter. O encontro da buxada de bode com Dom Perignon.
   A soberba Barbara Gancia criticou Pondé na Folha. Mas Barbara é moça fina e sua critica foi apenas uma chamada à razão. Pondé se tornou um tipo de araponga de jornal. Ele grita e incomoda, mas ninguém entende o que ele fala. Eu já sabia que para a Páscoa ele mandaria algo cheio de sangue, crueldade e canibalismo. Afinal, o que ele queria dizer? Que o mundo pós-cristão é muito mais civilizado? Ora, isso qualquer intelectualzinho de barba e blusa vermelha sabe. Barbara fala que quem escreve em jornal não deveria ter uma atitude tão suicida. Pondé ataca o leitor e se coloca acima de quem o lê. Bem....Paulo Francis se colocava muito acima de quem o lia e era adorado por isso. O que me parece ser o erro de Pondé é que ele baba naquilo que redige.
   Roberto da Matta escreveu que existem obras que tomam o artista. Que quando um regente comanda uma orquestra que toca Mozart não é ele que rege Mozart mas sim Mozart que toma o maestro. Depois ele diz que até um cantor banal como Rod Stewart se torna maravilhoso quando grava Cole Porter ou Gershwin. Ora...eu tenho os cds em que Rod canta Cole e não há nada de maravilhoso lá. Como também já vi Mozart ser regido como se fora Berlioz. A grande arte só assume o comando de um artista quando ele previamente habita o mesmo endereço do autor. Rod é genial cantando folk e blues, isso porque ele vive nesse mundo. No universo do pop ninguém gravou a canção americana dos anos 20/40 decentemente. E olhe que vários tentaram, de MacCartney à Bowie e Ferry.
   Há uma expo de Bob Gruen na Oca. Bob é do tempo em que rock stars eram big stars. Suas fotos pegam a era em que o rock tinha a relevância que hoje é dada ao esporte. Se Bob fosse começar hoje e fotografasse os atuais rock stars todas as fotos teriam de ter legenda. E o visitante ganharia um Who1s Who na entrada. Bem...se começasse hoje Bob Gruen fotografaria apenas Lady Gaga. Ela em uma pose tenta imitar tudo o que Bob clicou por toda a vida.
   - Esta coluna é uma homenagem ao rei das colunas: Telmo Martino.

VOCE COLECIONA O QUE?

   Um dos temas do livro que li, de Henry James, é a mania vitoriana de colecionar coisas. Em fins do século xix se colecionava tudo e algumas dessas coleções se fizeram moda por um século. Coleções de selos, borboletas. caximbos, isqueiros, chapéus, écharpes, bengalas, gravuras japonesas, canetas, anéis, flores, posters. Essas as mais classe média, os ricaços colecionavam pinturas, esculturas, porcelana e livros raros.
   Ainda se colecionam coisas? Não era útil, de certa forma, o desenvolvimento do cuidado, do espirito de caça, da organização que uma coleção pedia e exigia?
   Penso em crianças. Até a pouco colecionava-se de tudo. Bolinhas de gude, maços de cigarro, tampinhas de garrafa, times de jogo de botão, figurinhas, soldadinhos de chumbo, miniaturas de carros raros, gibis. Não me importa a minima as razões freudianas ( Freud sempre cria razões onde elas são inescrutáveis. Acima de tudo ele era um neurótico criativo ), o que é óbvio e certo é que ao colecionar voce cria um vínculo com o mundo sólido. Voce aprende a manter, a guardar e a preservar.
  Mas é claro que nem tudo que voce tem em grande quantidade forma uma coleção. Ter milhares de dvds ou de vinis e os escutar não significa que voce é um colecionador. A base da filosofia do colecionismo é a inutilidade aparente da coleção. Um monte de discos de vinil se torna uma coleção quando:
   A- Existe a caça. Voce parte a campo para capturar o item que lhe falta. Não precisa ser um disco que voce queira ouvir, é um disco que voce deve ter para tornar sua coleção completa.
   B- A não completude. Uma coleção é sempre incompleta. Um item pede outro item que remete a um outro item.
   C- O desejo de ter não significa uma vontade de usufruir. Coleções são amostras, ficam em vitrines, são pouco usáveis.
   Já fui colecionador. De discos, de gibis, de carrinhos, e de filmes. Não sou mais. Eu comprava discos para completar coleção, hoje tudo que tenho é para ouvir e não para ter. Todos os meus filmes são assistíveis. No inicio eu ia atrás de tudo que fosse "um item que completa o acervo". Hoje só possuo o que adoro. Quem der uma olhada em minha estante vai estranhar que dentre tantos dvds não exista um só Buñuel ou um mísero Pasolini. Como disse, não é uma coleção.
   As crianças hoje fazem coleções? Não vejo isso acontecer. Bolinhas de gude, botões, figurinhas....cuidadas, preservadas, amadas...não vejo isso.
   Talvez o colecionismo fosse uma reação de um povo industrializado contra a descartabilidade. Guardar era salvar algo do fim, do lixo, do tempo. Penso que hoje tá tudo dominado, a descartabilidade venceu enfim. Se uma criança sente que seu pai, sua mãe e até ele mesmo são intercambiáveis, ele vai criar um vínculo atemporal com o que? O protesto salvacionista que nos fazia guardar uma tampinha de guaraná não faz mais sentido.
    Uma pena. Devíamos colecionar coleções.

OS ESPÓLIOS DE POYNTON- HENRY JAMES, UMA QUESTÃO DE PONTO DE VISTA

   Este é um dos livros que marca o começo da fase final de James. Sua escrita se torna muito mais elaborada, parágrafos longuíssimos, pensamentos dentro de pensamentos. Lançado em 1896, ele trata de uma mãe que ao se tornar viúva deve deixar ao filho toda a coleção de objetos que adorna sua mansão. Ela não quer legar seus objetos a um filho que é "tolo e fraco". Pior, ele irá se casar com uma jovem "ambiciosa e de péssimo gosto". Mas, entra em cena Fleda Vetch, uma amiga da mãe, moça de origem pobre, dona de bons modos e ótimo gosto, e que ama e se torna amada pelo filho "bobo". O livro trata apenas disso, da luta da mãe pelos seus bens e do amor de Fleda pelo tal filho tolo. Porém....
   A primeira coisa que ressalta é a frieza das relações familiares na Inglaterra de então. Henry James era americano, escolhera a Inglaterra para viver, mas não se fizera cego para os defeitos da vida inglesa. A lei, absurda, que dava ao filho mais velho "todos" os bens do pai lhe era odiosa. Como bom inglês de classe alta, o filho segue a lei: toma a casa e suas coisas. A mãe, que decorara a casa "com os melhores objetos artísitcos do mundo" por toda a vida, se sente roubada. A frieza entre os dois é absoluta.
  O livro é centrado no ponto de vista de Fleda. Henry James é um mestre nisso. O que vemos e sabemos é apenas aquilo que Fleda vê e escuta. Desse modo, nunca sabemos se aquilo que nos é mostrado é aquilo que de fato se pode chamar de "realidade". O grande tema de James sempre foi e é esse: a realidade vista por um único ponto de vista. Podemos confiar nessa visão? O que nos é contado é tudo o que de fato aconteceu? As emoções do personagem não poderiam distorcer aquilo que é dito? E de modo mais abrangente, a vida que nós leitores, vivemos, é real ou não seria nossa visão embaçada e pequena para um todo que jamais será percebido?
  Fleda ama ao jovem e este a ama. Ele largaria sua enfadonha noiva por ela. E a mãe dele ficaria salva se ambos se casassem, pois Fleda ama os objetos da mãe tanto quanto ela própria que os adquiriu em anos de busca. Nas mãos de Fleda todos eles seriam salvos portanto. Mas esse amor não se realiza. Há um enredamento nos pensamentos de Fleda, uma falta de decisão, medo misturado a "honra", que faz dela uma das mulheres mais irritantes já descritas por qualquer autor. Fleda erra sempre. Mente, quando deveria ousar a verdade, foge quando tinha de insistir e desiste na hora da vitória. Pior, a visão que ela tem de si-mesma é completamente tola, ela se vê como superior a tudo que a cerca, não percebe nunca seu acúmulo de erros absurdos. O amor e a felicidade, alcansáveis sem nenhum obstáculo, lhe são negados por seu próprio modo de agir e de pensar.  Fleda não se envolve, pensa ser livre e honrada, nada vê.
   A tradutora ao escrever a introdução não se contém, para ela Fleda é odiável por sua falta de visão. Já Henry James dizia ser Fleda exemplo de mulher íntegra e livre. Onde? Concordo com Onédia Célia Pereira de Queiróz, Fleda é deplorável !
   Nenhum livro de James tem parágrafos tão árduos. É dificil acompanhar os pensamentos de uma pessoa tão confusa e opaca. Fleda jamais é gostável, não admiramos nada nela. Não é inteligente, não é original, nada tem de cômico. Mas ao fim do livro, quando talvez ela tenha finalmente suspeitado da tolice que cometera ( Fleda prejudica a mãe, o filho e a si-mesma ), sentimos que ali há algo de profundamente patético, trágico de um modo corriqueiro. Então continuamos com aversão por Fleda, mas passamos, de novo, a amar a escrita desse gigante do subjetivo, Henry James.
  

AGRADEÇO A EXISTÊNCIA DE JOHN FORD ( O CINEMA DA SABEDORIA )

   John Ford crê. E esse é um dos motivos de ele ser chamado o Homero do cinema. E se voce tem a felicidade de fazer parte de seu universo, voce é feliz. Não há diretor com maior poder de regeneração. Ele te faz reviver.
   No que Ford crê?
   Ele acredita na amizade. Seus filmes sempre demonstram isso. Mas não é a neurótica amizade em que amigos ficam falando consigo mesmo. É a amizade ativa. Amigos que fazem coisas: bebem, brigam, viajam, cantam, celebram. Juntos. Amizade sem frescura, com pudor.
   Ford crê na virilidade e na feminilidade.
   Os homens em Ford são exigidos. Eles amadurecem e fazem coisas. São vastos e desajeitados. Têm humor tosco e sempre erram. Mas tentam ser Homens e às vezes chegam lá. Não são livres, eles seguem um código de conduta. São reais.
   As mulheres sentem e entendem. Não são bonecas bonitas, são fortes. Elas gritam, discutem, e acabam por mandar. Sabem como fazer e fazem sem serem percebidas. São imensas.
   Ford crê também em todos os rituais.
   No casamento como alegria da vida. Nos enterros como encontro com o mistério. Ele crê em refeições comunitárias e em festas que são reafirmações de cumplicidade. Ele acredita na comunidade, mas opta sempre pela solidão. John Ford crê em tudo que envolva tradição. Ele não joga nada fora, ele acumula conhecimento. Isso é sabedoria.
  Nos filmes de Ford existe a abundância dessa fé. Homens, mulheres e amizade. Casamentos, enterros, danças, refeições, música folk, vastidão. Todos seus filmes têm cenas assim, cenas de crença. E ele filma sem ironia e sem segundas intenções. Ele acredita no que mostra. Mas jamais é ingênuo. A gente percebe que ele pensou naquilo e que resolveu acreditar naquilo. Ele se torna dono e senhor do que filma. Um titã.
   John Ford crê em Deus. Num Deus que é pessoal, dele. E com essa crença ele filma. E isso faz com que todo herói pareça de verdade. Quando Ford filma um deserto, e ele ama o espaço vazio, o que ele filma é toda uma filosofia da fé. Porque o mundo de Ford pode estar em crise, em transição, em momento de imensa dor. Mas ele sempre parece certo, adulto, confiante, sábio. 
  Eu agradeço a existência dos filmes de John Ford.
  Às vezes amo mais a Hawks ou a Hitchcock. Às vezes admiro mais a Bergman ou a Kurosawa. Mas nenhum deles é tão quente, tão vivo, tão cheio de fé no homem.
  Triste, mas devo dizer, nenhum diretor é tão distante de nós. Seu mundo é outro mundo, sua mente nos é alienigena.
   Mas na tentativa de captar algo desse universo fordiano, na alegria de conhecer outro mundo real, nesse contato nos purificamos.
   Pode-se dizer que minha vida tem um sentido: a tentativa de conhecer o que não conheço.
   John Ford é meu pastor nesse deserto. Com seus filmes nada nunca falta.

ADEUS PONTA DO MEU NARIZ!, EDWARD LEAR ( A BOOK OF NONSENSES )

Lewis Carroll, James Barrie e Edward Lear. Na Inglaterra vitoriana homens solteiros contavam histórias para crianças, que depois viravam livros. Seriam pedófilos? No caso de Carroll é provável, mas tudo leva a crer que Alice o seduziu. Barrie, a se crer no filme, era apaixonado pela mãe das crianças. Mas aquilo me pareceu moralismo da Hollywood de hoje ( pedofilia é dos últimos tabús vivos ). Quanto a Edward Lear, ele é o que está mais distante desse perigo. Tudo leva a crer que ele foi um excêntrico. E a excêntricidade é a marca de uma sociedade repressora.
Fazem mais de 100 anos que o livro de Lear está em catálogo na Inglaterra. É um hit, um clássico, sempre lido e relido. Fora das ilhas ele é mal conhecido. Isso porque se trata de trabalho intraduzível. Mais que isso, tem o humor que os ilhéus mais amam: nonsense. E nonsense, assim como o Monty Python mostrou, é um segredo. Ou voce adora ou odeia.
Nonsense não é sentido oculto. Não é simbolismo. Isso é coisa de francês. Nonsense é a total falta de sentido. Aquilo que parece querer dizer nada, realmente não tem significado nenhum. Se tiver sentido não será nonsense. Uma sociedade cheia de regras ridiculas e "sem sentido" criou o nonsense. O Brasil também é cheio de coisas sem sentido, mas nós jamais as seguimos, nunca as levamos a sério, elas nunca funcionaram. O sem sentido da sociedade inglesa é a tradição seguida com fé, a convicção total que é posta em cheque. A vida vista em seu ridiculo, em seu grotesco. Nasce o nonsense como modo de espelhar o que é real.
Putz... voce sabe, tudo o que escrevi acima não faz qualquer sentido. Explicar o nonsense é um nonsense.
Edward Lear era pintor. E músico. Ganhava a vida como desenhista. Viajava o mundo desenhando bichos. Fazia livros com seus desenhos e assim foi famoso. Hospedado na casa de um amigo nobre, saía a passeio com as crianças. Nos bosques contava histórias para elas. Eram poemetes sem sentido nenhum. Ele brincava com as palavras e criava imagens sem razão alguma a não ser a brincadeira. Os filhos do nobre o adoravam. Lear acabou por permitir que fossem publicadas acompanhadas por desenhos seus. Um sucesso que dura mais de cem anos.
Edward Lear continuou a viajar e a desenhar. E morreu velho. Foi feliz.
A tradução de Marcos Maffei não é boa. Felizmente a edição é bilingue. Leia em inglês, o texto é simples. São sempre cinco versos, rimados, que começam invariavelmente com There Was...
E então voce lê sobre um homem de nariz longo onde pousavam pássaros, trens lerdos, vulcões e velhos, aranhas e orientais.
Lendo-os eu não ri. Não achei bonito ou especialmente engenhoso. Mas eles, se lidos em sua totalidade, em voz alta de preferência, causam um efeito estranho. Sua mente se solta então, dança, e as palavras começam a ser vistas como brinquedos, possibilidades sem fim.
Edward Lear conseguiu escrever como uma criança sem parecer infantil. Arte dificil. Dom natural. Very english, very peculiar, sem fim.

E EU SENTI MEDO....



leia e escreva já!

SÁBADO SOM ( PINK FLOYD NÃO VEIO )

   Era 1973 e eu era uma criança. Era inverno mas fazia sol e naquele sábado de tarde, 2 horas, ia estrear na Globo o Sábado Som. Apresentado por um cabeludo sorridente chamado Nelson Motta. Eu era então um grande ouvinte de rádio ( AM ). Difusora e Excelsior. A Difusora era mais rocknroll, lembro que tocava até Led Zeppelin, já a Excelsior era bastante pop, tocava de Benito di Paula à Elton John. As duas tinham uma imensa programação de black music, e 1973 foi o auge da black music ( Stevie Wonder, Al Green, Marvin Gaye, Diana Ross, Barry White, Spinners, War, Stylistics, James Brown, Billy Preston, Billy Paul, Harold Melvin, Jackson Five ). Bem, que droga seria esse tal de Sábado Som?
  Desde sempre os musicos pop faziam promos. Promo era um video de divulgação, feito em filme, que era exibido em programas de tv. Nada parecido com o video-clip. Video-clip, que seria criado pelo Queen era uma peça em tape, pensado exclusivamente para a venda do produto-disco. O promo tinha a pretensão de ser "arte", era um troço sem objetivo, mais de "curtição". Dessa forma, o que o novo programa ( em horário que hoje tem Angélica e Xuxa ) passava eram os tais promos, e shows ao vivo também. E foi no Sábado Som que assisiti pela primeira vez ao Jean Gennie, o video de Bowie que mudaria minha vida. Não acho que eu seja bissexual, mas eu realmente me apaixonei por David Bowie. Velvet Goldmine conta bem a coisa toda.
   Mas a estréia do programa foi com a exibição de Pompeeii do Pink Floyd. Eu conhecia o Floyd de Us and Them, que tocava no rádio. Mas eu era muito crianção e não estava pronto para o que foi exibido. Lembro que me deu muito medo. Senti medo daquelas ruinas, medo daqueles cabeludos de cara feia e medo das músicas. Rock era pra mim alegria ou romantismo fofo, aquilo parecia tétrico. Odiei. Odiei muito. Depois, muito mais tarde, comecei a gostar de ATOM HEART MOTHER, que é meu disco favorito do Pink Floyd. Quanto ao que tocou no especial da tv, posto ao lado um trecho que acho hoje genial.
   O tal de rock progressivo, que não morreu jamais e que é feito hoje por todos os filhos do Radiohead, se dividia em 3 vertentes. Os medievais, os exibidos e os espaciais. Os medievais adicionavam muito folk à base psicodélica. Flautas, contos sobre bruxas, pandeiros e violões. Os exibidos eram os amantes da musica clássica. Solos longos e chatos, um tipo de "olhe como toco bem"!
  Se Yes e ELP fazem parte dos exibidos, e se Genesis e Jethro Tull são os medievalistas, o Pink Floyd, assim como o rock alemão e o King Crimsom são espaciais. O que os define é a "viagem mental", o cuidado de produção, as letras desesperadas, ou o nonsense absoluto. Nada têm de medieval ou de exibicionismo gratuito. O objetivo é "fazer a cabeça".
  Meus amigos dos loucos 70's eram todos fãs de rock progressivo. Rush, Renaissance, Rick Wakeman e Gentle Giant eram mitos pra eles. Eu era o estranho conservador que odiava toda essa baboseira. O meu negócio era rock puro e preto.
   Mas que esse som ( postado ao lado ) do Pink Floyd é legal, isso é.
   Voce que vai no show hoje, aproveite: voce nunca vai esquecer. Mesmo que desgoste.
PS: Uma das piores coisas de hoje no pop é a divisão. Quem gosta de rock clássico escuta só isso, quem gosta de sons moderninhos ingleses ouve só esse som.... Antes, sem FM e muito menos internet, voce, se queria ouvir Bowie, tinha de esperar e acabava sendo exposto a Martinho da Vila, Isaac Hayes e Paul Simon. Abrir a cabeça era isso.