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OS NEW ROMANTIC E SUA OBRA PRIMA: AVALON, DISCO DO ROXY MUSIC DE 1982.

Toda ação tem sua reação, e em 1981 a Inglaterra, para reagir ao pessimismo violento dos punks, criou o new romantic ( mas não só ele ). Politicamente conservadores, fantasiosos e em eterno estado de festa, eles colocavam o estilo acima da substância. John Taylor, o excelente baixista do Duran Duran, dizia que suas calças eram muito mais importantes no palco que o modo como ele tocava. ( E eu, crescido nesse meio, ainda fico chocado com calças sem estilo num palco de rock ). Na realidade o que eles eram: fãs do Bowie pós 1974, de Marc Bolan e de Bryan Ferry. Misturaram o som dos três com beats disco music e climas Kraftwerk e voilá! Eis o new romantic. -------------- Visage com The Anvil e Ultravox com Vienna talvez sejam os mais representativos discos do movimento. Ambos são ótimos, mas Avalon, do Roxy, é a obra prima da coisa toda. Único caso em que a influência produziu algo mais moderno que a própria cria. Isso porque Ferry e seus amigos entenderam que o new romantic almejava ser Young Americans e não Low. Avalon é soul music branca, funk gelado, modernismo contido, e acima de tudo é luxo explícito. É o chique assumido no rock. É o pico do estilo. E nos anos 80, é a cartilha de tudo de classudo feito após 1982. ------------ É um disco, então tudo isso está no som e não numa calça. Lembro quando o escutei pela primeira vez. Senti algo novo alí e a novidade não era a invenção, não era um novo tipo de composição, a novidade era o estilo. Belas canções pop embaladas em seda. E a seda era a mixagem. Rhett Davies e Bob Clearmountain, cada um em seu campo. Rhett vindo da escola Fripp e Eno de som, ou seja, teclados embrulhando guitarras, gelo nos amplificadores, e Bob vindo do sucesso da mixagem da bateria de Start me Up dos Stones. Bob mixaria, por toda década, todo disco com som de bateria no talo, Born in The USA é obra dele também. --------------- Avalon é isso: um emaranhado de percussão e bateria, sutil, volumoso, angular, com um contra baixo que rege o todo. Na época eu nunca escutara baixo e bateria tão bem mixados. Acho que ainda não ouvi. A guitarra, o sax, a voz, o teclado, existem em função do baixo, rodeiam sua linha, nunca comandam. E do que fala Avalon? Amor e só amor. Punks não falam dele. Punks odeiam ( era o que se dizia ). Os new romantics amam. Tudo se resume a um casal. O resto é distração. ------------- To Turn me On exemplifica o disco inteiro. Eis o baixo à la Chic- Bernard Edwards ( o baixo aqui é Alan Spenner ). A voz de Ferry em seu auge e um solo de Manzanera que não pode ser melhorado. Acordes de um grande piano que é imenso e a volta do baixo que pontua e dialoga. Obra prima. -------------- Lembro de a escutar no carro, madrugada de chuva, novembro de 1984, apaixonado......não há como ser mais feliz que isso. O final da canção brilha como miragem inalcansável. O cume do estilo. ---------------- Ouvir Avalon em 2021 é estranho. Ele está tão distante de nosso mundo atual como Mozart está. Fala de uma sensibilidade e de valores perdidos. Hoje o estilo se chama escândalo e a sensibilidade é a do histerismo. Falo como velho? Eu o sou baby. Sou do tempo de Avalon. Tenho uns 97 anos de idade...

PRIMAL SCREAM - VANISHING POINT

A ideia de se fazer um disco inteiro sobre um filme não é original, mas para mim, é sempre boa. Eu adoraria fazer um disco sobre MASH do Altman por exemplo. Bobby Gillespie e seus comparsas resolveram fazer sobre o filme cult de Richard Sarafian de 1971. Ouvindo o disco eu observo que para eles o filme é outro que aquele que eu vejo. Para mim é um quase western, para eles é uma viagem lisérgica. Não é um disco ruim. É apenas incompleto. ----------------- Espertamente, cada faixa traz um tempero da época em que o filme foi feito. Há psicodelismo aqui, uma guitarra wah wah lá. Percussão primitiva-eletrônica tipo 1971 à Timmy Thomas numa faixa, riffs à Sticky Fingers em outra ( Bobby tem fixação por músicas como Sway e Cant you hear me knocking ). Falta voz, claro. O Primal Scream sempre deveu um vocal que fugisse da vala comum dos filhos dos Stone Roses. Bobby Gillespie é mais uma voz da geração Baggy Trousers que parece fazer imitação de Ian e Shawn. O irônico é que Primal Scream é mais velho que Stone Roses e Happy Mondays. ---------------- A melhor faixa é Kowalski, um eletrônico safo típico do fim dos anos 90. As piores são aquelas em que Bobby inventa de viajar num tipo de embalo orientalista psico colorido incenso e velas que corta qualquer chance de tesão. É um disco muuuuuito irregular. As faixas variam: uma boa, uma ruim, uma ruim, uma boa. ------------- Por fim: que filme é esse? Eu o vejo como um western dos mais simples transportado para 1971. Um cara leva uma carga, a diligência é um carro veloz. Para Bobby é uma viagem doida movida à LSD e maconha. Tudo um tipo de ilusão onde ao final se encontra o tal "ponto de desvanecimento", uma passagem para outro mundo. Para mim, esse tal ponto é apenas a morte do motorista. Sim, ele é morto ao fim, e em super velocidade, ele leva o carro com ele. --------------- Qual versão está certa? Nenhuma! Vanishing Point é apenas um filme feito no estilo em moda então: O filme de carro e estrada. Um filme POP feito para agradar os caras de 18 anos de 1971. Décadas mais tarde ele pode parecer "arte", mas não é. E talvez Bobby, como eu, não veja arte alguma nele ( o que é uma benção ), mas tão somente uma diversão bem doida que nos remete, eu e Bobby, à nossa infãncia. --------------- Crescemos, eu, Bobby, Ian e Shawn no mesmo caldeirão POP. E Vanishing Point nos fala desse tempero todo. -------------- Can you dig it?

OS INGLESES SÃO POBRES E A MEMÓRIA NÃO MORRE

A geração inglesa que hoje tem entre 70-80 anos conheceu a fome em seus primeiros anos de vida. Eles têm memória da ração em lata ( spam ), do um ovo por semana, do leite em pó. Memórias felizes de quarteirões derrubados, espaços livres, vida na rua e centenas de milhares de crianças ( era o baby boom pós guerra ). Cresceram nas ruínas da guerra e jamais esquecem isso. Apaixonados pela comida farta da América, seus carros imensos, as casas grandes, a confiança na vida. O sol. Portanto, quando voce analisar um rock n roll star inglês dessa geração, tenha sempre isso em mente, ele foi pobre, muito pobre. E portanto, seu maior medo, eterno, é não só passar necessidade, como ver um dos seus em apuros. Eles festejam poder ter uma casa imensa, vários carros, mulheres ricas, joias e comida, muita comida. -------------- E apesar da boa educação da Inglaterra de então, são ex-suburbanos, ex-famintos, ex-moleques da rua. Para entender o que é sua história, tenha essa certeza: sua carreira é uma luta contra a carência. ---------------- Nenhum rock star inglês é realmente chique. Mesmo Bryan Ferry e David Bowie, os ícones do glamour, possuem uma breguice extrema. Ferry exagera tanto no chique, no ar de aristocrata, que trai sua insegurança. E Bowie sempre teve, principalmente em seus melhores momentos, algo do rapaz deslumbrado pela vida na cidade grande. Ele era exibicionista. Nada menos chique que isso. Isso que falo explica gente como Mick Jagger, que simplesmente não consegue parar de fazer dinheiro, que mesmo com tanto nos cofres ainda mantém um jeito brega de vestir e de ser. Não preciso falar de Elton John, Rod Stewart, Ozzy, Robert Plant, Ian Gillan e todo o resto. O próprio rock progressivo é uma tentativa de parecer culto e superior, atitude só prezada por quem se sente caipira e acossado por snobs. O rock inglês é filho de moleques famintos, crianças que ficaram ricas mais tarde. Nos EUA a história é completamente diferente. Toda esta minha conversa não faz sentido lá. -------------- O piano brega de Paul MacCartney, com um pano cheio de cores, é a lembrança do jovem faminto que ele foi. Assim como a carreira de Rod Stewart pós 1975, toda voltada para fazer dinheiro e ganhar mulheres. Mas não só eles. É brega Van Morrison com suas roupas ridículas, Pete Townshend e sua insegurança social, Ray Davies tentando parecer um dandy de 1910. Todos seguiram o mesmo caminho: um começo sincero e soberbo, confessional, ainda dentro do mundo duro e pobre da juventude inglesa de então, mas depois, quando a grana começa a chegar aos quilos e quilos, o desejo de não mais voltar a ser pobre toma conta e ser rico se torna mais importante que ser autêntico. -------------- Nada há aqui que os desabone. Eu sou como eles são. São humanos. Estão longe da estranha desumanidade mimada dos stars de 2021. -------------------- Há neles o orgulho de quem venceu. E isso é o mais importante. Em todos há o espírito do "VEJA MÃE! OLHA ONDE ESTOU!" Jeff Beck compra dúzias de carros antigos, aqueles que ele sonhava aos 12 anos e Jimmy Page mora em castelos, os que ele via no cinema e sonhava em morar. Não há muito espaço para compor um novo Immigrant Song quando seus dias são dedicados a usufruir seu novo status. ----------------- Rod Stewart foi um dos mais pobres, e por isso, seu deslumbre foi o maior. Quando se viu rico ele mergulhou na farra. O gênio, sim gênio, de seus primeiros discos morreu. Saiba que entre 1970-1974 era ele o artista mais nobre da ilha ( não, não era Bowie ). Pego aqui um CD do cara: GREAT ROCK CLASSICS OF OUR TIME. O Rod dos insuportáveis AMERICAN SONGBOOKS, caso voce não saiba ele vendeu toneladas da série de CDs que revivem as cançõea americanas clássicas, coisas que Sinatra e Fred Astaire cantavam. Esses Cds são de uma breguice soberba. Música para quem quer ser chique e não consegue ouvir os originais. Pois bem, aqui ele faz o mesmo com alguns rocks e pops. Um disco para vender mais alguns milhões. --------------------- Rod é o melhor cantor cover da história. Ao contrário de Bryan Ferry, outro cantor famoso por gravar covers, Rod não muda as canções radicalmente. Ferry as torna canções de Bryan Ferry, todas ficam parecendo composições dele mesmo. Rod não, ele canta dentro do formato imaginado pelo compositor. O diferencial é que ele canta sempre muito melhor que qualquer um. Por isso ele é o melhor intérprete de Bob Dylan da história. Ele dá à Dylan aquilo que Bob não tem: poder vocal para falar tudo que a canção pode dizer. IF NOT FOR YOU é o Dylan deste CD. Simples, alegre, confiante. Se com Dylan era ela uma linda canção, com Rod ela é perfeita. OH ROD!!!!! QUanta coisa maravilhosa voce não poderia ter feito!!!!! ---------------- O disco abre com Have you ever seen the rain, e não dá pra ser melhor que John Fogerty. Nem precisava ter gravado essa. Mas a gente sempre imaginou como seria Rod cantando Creedence, então okay. Depois vêm dois pontos baixos: Elvin Bishop e Chrissie Hynde. Fooled Around de Bishop é só uma cançãozinha boba, e I'll stand by you é daquelas coisas pavorosas que Chrissie fez depois que virou vegetariana e militante do bem. A Chrissie punk morreu em 1981. ------------------ Bob Seger é cantado com Still The Same, um linda canção e apesar de Bob ser um grande vocal, Rod a melhora. Profissional. Rod está ganhando dólares com dignidade. Mas às vezes não....cantar Its a Heartache, a horrenda música de Bonnie Tyler beira o apelativo. Rod canta uma peça de uma imitadora dele mesmo! Pra que? Por Caipirice.--------------- Day After Day é um dos amores da minha vida. Rod canta exatamente como na versão original. Não há um acorde diferente. A canção é uma obra prima, Rod a repete. Bem....em 1975 Rod Stewart nos deixou às lágrimas com uma versão mágica de First Cut is The Deepest, de Cat Stevens. Tantos anos depois ele revisita Stevens e canta Father and Son. Não é nem sobra do cantor de então, mas a composição de Cat é também menos genial. Então temos os Eagles e Best of My Love. Alguém disse que Rod canta com uma sedução maravilhosa, não houve cantor mais sedutor para as mulheres, sua voz as leva à cama. Aqui temos um cara que aos 70 anos ainda dá seus botes. E então vem If Not For You e a verdade se revela. É a única faixa onde Rod é ele mesmo. Um simples e ingênuo cantor. Vale todo o resto. ---------------- Não vou ouvir Love Hurts. Gram Parsons a gravou do modo perfeito e o Nazareth a destruiu para sempre. --------------- Na minha infância e adolescência, já disse isso, fomos educados a sofrer por amor. Os grandes sucessos, 80% deles, eram músicas feitas para chorar. Everything I Own é uma linda canção da mais chorosa das bandas, Bread. É uma canção tão linda que é impossível a estragar. Até Boy George ganhou dinheiro com ela. Rod nos dá um presente. ( Fico ainda mais tocado ao saber que a letra não é sobre uma mulher que deu tudo ao homem, é sobre o pai do autor, que havia morrido sem ver seu sucesso. David Gates, o compositor, agradece por tudo que o pai lhe deu ). Para fechar do CD, o óbvio: Van Morrison e mais uma de suas canções de motel. ----------------- A seleção diz muito sobre quem Rod é. Simples e direto. E fala mais sobre o que ele faz desde 1975: Produtos que vendem muito. Mas as faixas sobre Dylan, Bob Seger e o Bread mostram que ainda há um sopro de magia nele. E eu amo esse cara.

DIE SCHONE MULLERIN, ou porque os Beatles e os Kinks não soam como os Beach Boys ou os Byrds

Há uma diferença entre rock inglês e rock americano. Ouvir este cd de 1962 fará com que voce perceba o porque. ------------------------- eM UM DOS GRUPOS QUE acompanho, sobre rock progressivo, grupo muito engraçado por ser pretensioso, se discute porque o rock inglês é tão sinfônico, já que em termos de música clássica a Inglaterra nem é tão grande coisa. Ora...tive de lhes explicar que o fato do país ter menos compositores grandes não significa ter menos música clássica. A Inglaterra tem uma profusão imensa de orquestras top e nos anos 40 e 50 se ensinava música em toda escola. Isso fez com que não só o progressivo, mas mesmo o heavy metal tivesse influencias eruditas. Um músico inglês sempre pensava em termos de sinfonia e de lied. Eu disse lied? O que esse povo esquece é que a forma musical mais popular do erudito é o lied. ----------------------------------- Lied são canções. Pegava-se um poema de Goethe ou Heine e colocava-se música. Era esse tipo de música que frequentava os lares, pois era preciso apenas a partitura, um piano e uma voz para executar a obra. ------------------------------------ Este cd traz 22 obras de Schubert. Gerald Moore toca o piano de forma sublime e impetuosa e Dietrich Fischer - Dieskau canta de forma magnífica. Das Wanderen, a primeira canção já entrega tudo: eis em 1822 a melodia que Ray Davies, Paul MacCartney e Syd Barret carregaram no inconsciente por toda vida. É lindo. É mais que lindo, é atemporal. Por todo o cd, um clássico da EMI, gravado em Abbey Road, Dietrich, um dos maiores cantores do século, e Moore, um amado irlandês. nos elevam ao mundo do mágico. De 2 a 4 minutos por faixa dando-nos uma imensa gratificação. Dizem ser Schubert o maior autor de lieds. Não sei se é, mas este disco é absoluto.

DOIS MESES DE MÚSICA

   Neste meu reencontro com um tipo de rock "não filtrado pelo gosto da imprensa musical", eis o que andei ouvindo... ( Com notas e de forma objetiva )
   Arch Enemy- Rise of The Tyrant....2
  Jack Johnson...To The Sea......2
  Muse-The Second Law.....1
  Arch Enemy é metal sueco com cantora que tem voz de homem. É melódico e fala daquelas coisas medievais. Falta originalidade. Jack é apenas um Chris Isaak do mar. Prefiro o de San Francisco. Muse seria bom se o cantor não fosse um Bono Vox histérico.
  White Stripes- Elephant.....7
  Offspring- Americana.......1
  The Best of Jethro Tull....5
  White Stripes é legal. Envelheceu bem. Offspring eu não reouvia desde 1999. Vinte anos! Parece ter uns 50. Impossível de se escutar agora. O Jethro tem um album que gosto muito, Aqualung. Esta coletânea, 20 canções, tem 4 que são ótimas.
  Black Sabbath volume 4......8
  Sabbath Bloody Sabbath.....DEZ
  Sabotage........4
  Paranoid............7
  Black Sabbath first album.....5
  Eu sei que Paranoid foi eleito o maior album metal da história, mas não acho isso. Bloody é um maldito de um disco perfeito. E o Volume 4 é o ensaio para se fazer o Bloody. Sabotage é o mais pesado e é o menos criativo. Pior capa da história do mundo!
  The Doors.......8
  Morrison Hotel.....8
  LA Woman......9
  Redescobri que Jim foi o cara. The Doors tem a insuportável The End. Morrison Hotel é um belo album de estrada e LA Woman é quase perfeito.
  Gorillaz.......6
  Judas Priest-British Steel.....6
  Metallica Album Preto.....DEZ
  Jeff Beck-Blow by Blow......7
  Gorillaz eu nunca tinha escutado o disco inteiro. É uma versão inglesa dos discos do Beck. Ok. Judas Priest é considerado o terceiro maior disco de heavy da história. Não é heavy! É glitter. Lembra Sweet. Lembra até Suzi Quatro. Gostei. Mega POP. O Album Preto é imenso. Jeff Beck é o melhor guitarrista da história. E que nunca gravou um disco perfeito. Dizem que ele é impossível de conviver e por isso nunca durou numa banda. Este disco, instrumental, é jazz rock que dá pra ouvir. Jazz rock é muito chato, mas este é legal porque é bem funk. A versão dele de She's a Woman é de cair de quatro.
  Rush- 2112........6
  Genesis-Whutering and Wind.....ZERO
  Sim, até prog fui xeretar. O disco do Genesis é impossível de ouvir. Chaaaaaatooooooo. Já o Rush foi uma surpresa! Geddy Lee tem voz de pernilongo, mas o som é bem dinâmico. Não é chato não.
  ZZ Top- Tres Hombres......5
  Happy Mondays-Pills and Thrills.......6
  The Stone  Roses........5
  A banda de Shaun Ryder é mais divertida e muito mais dance. Os Roses são passado bem distante. A voz de Ian enche o saco. Já o ZZ é sempre o mesmo.

 
  

PAUL MAcCARTNEY POR BARRY MILES.

   Se o rock ou o POP um dia tiveram um gênio, seu nome é Paul, e ele nasceu em Liverpool.
  Sua infância foi sem dramas. Ok, a mãe morreu cedo, de câncer, mas Paul teve a sorte de crescer em meio a tias, tios, primas, irmão, e o pai, com quem ele sempre se deu bem. Eram pobres, mas eram felizes.
  O garoto aprendeu a tocar em casa, começou a cantar e entrou na banda de John Lennon. Foram para Hamburgo, a cidade mais cheia de sexo da Europa. Ficaram famosos lá. Voltaram. Foram recusados pela Decca. A EMI os quis.
  O primeiro LP foi gravado em uma tarde. Inteiro. De uma vez só. O resto é lenda. O que entendemos por POP foi inventado pelos quatro.
  Paul compõe como Mozart: sem dor, sem esforço, sem problemas. E rápido, bem rápido. Alguns clássicos foram compostos em meia hora. Outros em dois dias. Raramente mais que isso. As músicas fluíam. Centenas e centenas. No livro Paul as comenta sem grandes pretensões. Fala coisas como; "Esta é boa", esta foi só pra completar um LP.
  Eu havia lido este longo e delicioso livro em 2001. Releio. Gosto. Muito.
  A vida de Paul foi uma vida, entre 1960-1970, o livro vai apenas até o fim dos Beatles, de galerias de arte, cinema, muitas festas e a procura por novos sons. Lennon estava a maior parte do tempo enfurnado em sua casa tomando heroína. Paul ia pesquisar. Vemos isso em fotos: Paul com Jagger, Paul com Ginsberg, Paul com hippies de Londres, Paul defendendo a maconha, Paul em shows de Hendrix e de John Cage. Geminianamente em movimento todo o tempo.
  O segredo dos Beatles é que eles foram a única banda, até hoje, a ser ao mesmo tempo hiper popular e de vanguarda. Eles eram como Michael Jackson misturado com Brian Eno em 1980. Ou como Madonna com Radiohead em 1996. Vendiam como ninguém, e ao mesmo tempo apontavam as novidades, o futuro. Em meio aos mais encantadores POP, uma colagem sonora, um loop, um solo ao contrário, um quarteto à Bach, um ruído. Entre 63 e 68 eles foram a ponta. Em vendas e em arrojo. Em 69 perderam o pé. No mundo novo de Sly Stone e de Led Zeppelin começaram a ficar apenas POP.
  Leiam.

ULTRAVOX! , UM GRANDE, GRANDE PRIMEIRO DISCO.

   Em 1976 o Ultravox começa a gravar seu primeiro disco. A sonoridade irá lembrar a banda pela qual eles têm profundo amor: Roxy Music. E o acento de exclamação no nome ( ! ), é homenagem a banda alemã NEU!
   Brian Eno produz os caras. Mas larga a produção antes do final para viajar à Berlin, onde vai encontrar Bowie voce sabe pra que. Em seu lugar assume o jovem Steve Lyllywhite, que será o produtor dos primeiros 4 discos do U2. Depois será Eno. A vida é ironia.
  O disco sai pela Island em 1977. Dois produtores, Eno e Steve. E, que azar, é o ano do punk. A banda será chamada de muito velha para ser punk e muito nova para o glam rock. Entre 1977 e 1979 lançam 3 discos. Todos incensados pelos críticos. Todos amados pelos futuros músicos dos anos 80. Todos ignorados pelo público de então, povo que ouvia punk, ska e a new wave de Costello e Ian Dury. Este primeiro disco, Ultravox! antecipa em cinco anos a música de 1981, a música da primeira metade da década de 80.
  John Foxx é o vocal. Ele sairia em 1980. Midge Ure entraria no lugar e a banda estouraria nas paradas com Vienna. Mas este disco é melhor. Bem melhor. Foxx era mais ousado, mais "do mal", mais sexy. O som do disco é puro Roxy. Um Roxy em que Phil Manzanera tocasse menos e Eddie Jobson muito mais. O som do disco é o som do violino elétrico de Rusty Egan. Imagine Ferry cantando estas canções e voce imagina um disco do Roxy de 1976. ( Em 76 a banda não existia mais. Voltaria em 79 modificada ).
  Nick Rhodes diz que o disco é seu favorito. Rhodes fundaria em 1979 o Duran Duran. O Ultravox! é um Duran menos pop e bem mais perigoso. A faixa My Sex é uma obra prima. E termina cortada pelo meio, como Eno faria em Low. Mas o disco é mais que ela. São oito canções tristes. E ao mesmo tempo desafiantes. Ouça.

Duran Duran - Girls on Film (Live @ Måndagsbörsen '81)



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Duran Duran: Careless Memories (Original version!!!)



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O SOM DOS ANOS 80 E DE HOJE.

   A gente estava na Europa em 1982 e foi um momento brilhante aquele. Naquele verão os anos 70 acabavam enfim. A primeira coisa que estranhei foram os jeans. Não havia jeans. Se voce quer saber como a molecada se vestia na Europa em julho de 82 veja o clip que postei acima. Continuo: fomos para o interior do interior do continente. Ou seja, norte de Portugal, quase Galicia. Quarenta graus, aridez, pouca gente. Uma festa na cidadezinha de meia dúzias de ruas. Eu e meu irmão vamos. Uma feira de tarde. Barraca de discos. Que surpresa!!!!! Tem tudo que aqui no trópico não tinha ( e na verdade nunca teve, nem em cd ): Talking Heads 77, Gang of Four, Classix Nouveaux, Ultravox, John Foxx, Toyah Wilcox, Orange Juice, Haircut One Hundred, Adam Ant e Bow Ow Ow. Compramos. Era a época do Escudo. Um escudo era dez cents de dólar. Eram discos made in Portugal e made in France. Tenho até hoje. Andamos pelo local...meninas de enormes franjas cobrindo os olhos. Meninos com calças de mulher: laranja, roxo, pinky. Bebemos ginja.
  Na sala da minha tia tem um programa de música POP ao vivo. Um palco cheio de luzes, cores e brilhinhos. Era o nascimento da década e ela só nasceria no Brasil em 1984. E aqui ela seria para meia dúzia de moradores de bairros legais. No fim do mundo português era fenômeno popular.
  Na época eu não era fã do Roxy Music e pouco entendia de Bowie. Ouvia-o desde 1974, mas era pra mim só um rock star gay e criativo. Então não pude notar que ele e Ferry eram os vencedores do década passada. Entre 1980-1987 o POP e o ROCK que importava eram, em 90% dos casos, filhotes do glam e do funk chic.
  Chego de volta a 2018 e escuto o disco Duran Duran, o primeiro. Para mim, é a coisa mais fora de moda que existe. Teclados gelados e simples, baixo funkeado ( John Taylor é um gênio do ritmo ), guitarra exagerada, percussão lá em cima, tudo a cara do POP dos anos 80. Mas caramba!!!! Ouço uma multidão de "novas" bandas de 2018 e um monte tem esse mesmo som, mas, COM UMA DIFERENÇA: eles tocam muito, muito mal. Daí dou razão à Neil Young. O fato dos novos sons serem gravados em aparelhos ruins para se reproduzir em condições precárias, faz com que toda uma geração seja acostumada a ouvir música pobre. É um tchuc tchuc prás sem nenhuma sutileza.
   Por isso esse vinil me surpreendeu desta vez. Fico embevecido com a riqueza sonora. Tem centenas de coisas para se escutar, sons que vão e que voltam, timbres que surgem e morrem, ecos sem fim.
   A criação do LP em 1948 fez nascer o som de Sinatra, e depois o jazz adulto. A tecnologia dava campo para eles. O estéreo deu nascimento aos sons dos Beatles e todo o rock psicodélico. Os estúdios de 64 canais ensejaram o POP dos anos 70, com seus montes de músicos profissionais. A fita K7 criou o fã de bandas toscas e o CD fez nascer a dance e o eletro. Cada salto científico faz surgir um novo modo de ouvir e de fazer música popular. E faz se abandonar outro modo, antigo, de produzir e compor. O tempo do Ipod e do Spotify, do mp3, fez surgir o som sem sutileza, que luta contra o ruído das ruas e a pressa do ouvinte. Se compõe para essa tecnologia. Singles de 3 minutos. E só.

ESSES CRÍTICOS PRESOS PRA SEMPRE EM 1982...

   A crítica de rock americana pode ser chamada de preguiçosa. Em suas listas de melhores há sempre o óbvio. Mas a crítica inglesa deve ser chamada de burra. Eles, que em sua maioria foram adolescentes nos anos 80, estão presos, sem perceber, nos dogmas de 1982: tudo o que lembra o rock hedonista de 1974 deve ser jogado fora. Em seu modernismo velho, eles repetem sem parar os preconceitos, que em 1982 faziam sentido, contra aquilo que soe como Stones ou Led Zeppelin. É uma maneira grosseira de ser muito velho tentando ser sempre jovem.
  Ouço dois discos do Primal Scream. Xtrmnt foi elogiado em seu tempo. Riot City Blues foi mais que criticado, foi chamado de fiasco, vergonha. Riot vendeu bem, Xtr nem tanto. O grande pecado de Riot é lembrar muito tudo aquilo que em 1982 era vergonhoso e pouco chique: Faces, Status Quo, Deep Purple, Stones. Criticar com dogmas dá nisso: um desarranjo com a justiça e um distanciamento do gosto pop. Riot é um bom disco de rocknroll, e nisso não há pecado. Já Xtrm soa já estranhamente datado. O que é moderno sempre envelhece rápido. É um disco bacana, bom de ouvir, mas sua sonoridade é 100% virada de milênio. Nenhum problema em parecer ser de 2000, como não há problema em parecer ser de 1974. O que interessa é a criatividade. Ou a fé naquilo que se faz. A verdade que vive e respira no ato de criação. Riot é mais vivo. Parece de verdade.
  Escuto também um disco muito odiado em 1977, o Barry White daquele ano, que tem o single Ecstasy. Engraçado é que o mesmo tipo de crítico preso a 1982, hoje elogia Barry White. Exatamente por ele ter sido tão detestado nos anos 70. Justiça seja feita, o som orquestral de mr. White é de uma beleza sublime. Bateria, baixo, violinos e piano soam como se tocados por anjos negros. Ecstasy é tudo aquilo que os caras do lounge querem fazer e nunca conseguem. O sonho do Brand New Heavies e do Tricky.
  Por fim, 1974 é o ano do Status Quo e justiça seja feita: Quo é um disco do caralho!

TOMMY - THE WHO. EM PROCURA DE UM SENTIDO.

   O que mais nos surpreende ao ouvir o disco, duplo, de 1969, é sua mansidão. Ele é quase todo acústico, e tem uma suavidade de timbres que amortece a raiva da banda. Kit Lambert, o produtor, mixou a bateria lá no fundo, o que é um alívio para a harmonia musical, e coloca como guia o som do violão de Pete Townshend. Violão que é muito rítmico e ao mesmo tempo orquestral. O inglês genial faz a simplicidade ter ares de sinfonia.
  Tommy é um garoto que fica autista por ver o que não devia: o crime. É salvo ao quebrar o espelho e ver a verdade. Essa a história, religiosa, quase banal, mas que em 69 é um alívio. No tempo em que tudo era "revolução e loucura", o Who continua em sua busca por sentido e não por ação. Na verdade as 3 bandas mais interessantes da época, Stones, Kinks e Who, não se deixaram levar pela sanha hippie. Os Stones continuaram sexuais e individualistas, os Kinks com saudade de casa e flertando com o dandismo e o Who perseguindo a sua alma própria. Tommy é isso tudo.
   Nunca é simples ouvir esta banda. Eles exigem atenção. E esta "ópera pop" mais que tudo o que eles fizeram, tem de ser escutada em silêncio e em suspensão. Alguns momentos são sublimes em sua beleza franciscana, há dois tropeços, mas no geral é um disco admirável. Pete está no auge de sua inspiração.
  Falando do som: poucos discos têm uma sonoridade tão cristalina. Os couros da bateria de Moon parecem de veludo. Suas baquetas batem em bolhas de ar envoltas em veludo. O disco tem ecos discretos, ruídos quase imperceptíveis e harmonias vocais que conduzem ao estranhamento. Tudo isso com a dinâmica nuclear do dedilhado de Townshend. Tudo parece feito de ar. Há um vazio, um vácuo nas músicas; e essa é sua mensagem espiritual.
  Tommy, feito na era dos solos de meia hora e do barulho como protesto, é um disco quase silencioso. E que fala tudo o que se podia dizer.

Blur - Parklife



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UM GRANDE DISCO: PARKLIFE - BLUR

   Lançado em 1994, no auge do britpop, este terceiro disco do Blur é melhor que o mais famoso What's The Story dos rivais plebeus do Oasis. Não que o disco do irmãos desunidos seja fraco, ele é histórico. Mas Parklife é muito mais aventuroso.
  Muito se disse na época que a crítica inglesa, sempre sensacionalista, queria forçar um embate tipo Stones x Beatles, entre as bandas de Londres e de Manchester. Mas, assim como nunca houve uma rivalidade entre Jagger e Lennon, os rivais dos Beatles eram todos americanos, a rivalidade entre Blur e Oasis sempre soou artificial. Os rivais dos Gallagher eram eles mesmos. E a referência do Blur nunca foram os Stones, eram os Kinks, o Yardbirds na fase Jeff Beck e Bowie.
  Parklife começa com dance music muito boa e termina com colagens à la Lodger de David Bowie. Suas melhores faixas são comentários sociais carinhosos ao modo Ray Davies, e a obra-prima Village Green sempre paira no horizonte de Damon Albarn.
  Albarn é o mais esperto dos caras de sua geração, e seu gosto é sempre exemplar. Blur transpira informação, e em que pese sua voz ruim, a gente se acostuma até com ela e acaba aceitando. O disco, caleidoscópio vermelho e azul, jamais poderia ser aceito nos EUA. É inglês, tão chá com leite como The Fall ou Pulp. E os Kinks pós 1966.
  O britpop nunca existiu. Era apenas um rótulo feito para vender como novo algo que era continuação tradicionalista. Oasis, Pulp, Verve e que tais eram apenas a manutenção do bom e velho rock inglês guitarreiro. Um bando de garotos nascidos no auge do pop que, como eu, souberam endeusar a música feita durante sua estadia no berço. Depois, aos 14-16 anos, viram o segundo auge inglês entre 77-83, com Bowie, Clash e The Jam e o resto é o resto.
  Se voce quiser ter em sua coleção só cinco discos desse tal brit, Parklife deve ser o primeiro a ser comprado. Depois pegue o Oasis de praxe, um Pulp e complete com o primeiro do Elastica. Tá feito.
  PS: Não, Primal Scream não é britpop. Mas são os Stones da coisa.

THE WHO NO ROCK IN RIO ( E GUNS )

   Após o show, Pete Townshend dá uma entrevista para o Multishow. Completamente relaxado, Pete esbanja bom humor sem parecer engraçadinho. Ele está velho e ele está feliz. Conta que Londres em 1963 era um lixo, e que o rock e a arte nascem do lixo, da dificuldade, da pobreza material. Diz ainda que é fascinado por tecnologia, mas que essa ferramenta, surpreendentemente, afasta as pessoas. E as une também. Pete ainda segue o Baba e afirma, e é verdade, que a maioria das pessoas no ocidente detesta a palavra "Deus". Roger ( Daltrey ), não fala a palavra, quando ela surge em canções ele a substitui por "One". Pete é afirmativamente religioso. E isso explica a relação complicada que eu e muita gente tem com a banda.
  Hoje eles são despojados, mas entre 65 - 70 ele eram puro glamour. E continuam sendo um enigma. A gente lembra dos Stones como o grande show de 1972, de Hendrix em Monterey 67, de tanta gente em Woodstock, mas esquece do Who. Ou lembra deles sempre como o segundo melhor. A segunda melhor banda ao vivo, o segundo melhor show de 1968, a segunda maior banda MOD, a segunda melhor banda de Londres. Mas eles sempre foram os primeiros em muita coisa. E uma delas é o fato de ser a banda mais "à parte" da história do rock. Fracos em sucesso na parada de singles, fracos em clips, são insuperáveis em emoção espiritual. No Who original havia a mistura de força bruta e pureza de espírito que nenhuma outra banda tentava. Pete era um bêbado, louco, destruidor, frustrado, violento, mas era sempre um "puro". No rock sempre existiram puros, caras como Paul MacCartney, Donovan, Tim Buckley, mas Pete era mais profundo. Sua pureza não era aquela das crianças ou dos fofos. Era a dos santos. Dor, raiva e muita coragem.
   É a banda que mais me faz chorar. Sempre foi. Mas nunca me lembro deles quando listo minhas top five.
   A banda está melhor hoje. Muito melhor. Desde a morte de Keith em 1978 são os melhores shows do Who. Starkey, filho de Ringo e afilhado de Moon, ganhou sua primeira batera dele, é o melhor baterista do mundo hoje. E preenche bem o vazio deixado pelo maior show man das baquetas. Can't Explain começa a noite. E claro, uma lágrima cai. Pete roda o braço. Roger joga o microfone. E eles se garantem com uma banda enorme. Falar do repertório da banda é comentar o DNA do rock moderno. Eles fugiram do blues e do country da época, evitaram o virtuosismo e a psicodelia e assim abriram espaço para a emoção genuína. Não seguiam um estilo, expressavam uma fé.
  O show do Rock in Rio é um sonho. Não há momento fraco e não há "o melhor momento". São dois velhos, absolutamente velhos, tocando música de velhos e fazendo um show de antológico rocknroll. Dançam, pulam, gritam e se divertem. E não fingem. O fingimento sempre esteve longe, muito longe da banda. Roger e Pete não se dão. Agora se respeitam. Roger é um homem duro e grosso. Pete é "o artista". E isso nunca foi pose. Por isso não se dão. ( Eu amo Roger. Sem ele o Who seria muito menor. E Pete sempre soube disso, por isso o engoliu ).
  Pete anuncia os GUNS e vai embora.
  E os Guns são o outro lado da moeda. Não posso falar mal deles porque eles fazem o hard rock anos 70 que adoro. Slash e Duff são ótimos. Eles pegam o som do Aerosmith e o melhoram. Mas Axl é a coisa mais patética da história dos palcos. Gary Glitter piorado. Dá medo até. E o show não é mais que ginástica. Eles andam pelo palco, correm, caminham... Aguento 10 minutos. Chega!

MARIA ANTONIETA É UM APURADO RETRATO DE 1999.

Não é um filme feito em 1999. Ele é deste século. Mas Sofia Coppolla faz um dos mais perfeitos retratos da geração que tinha 20 anos em 99. Mas vamos por itens...
Um dos mais exaustivos problemas em estudos literários, e que serve para tudo mais, é o fato de que jamais vamos saber o que significava ler Dante em 1400 ou assistir Wagner em 1860. Nós somos, em nossa parte mais profunda e básica, os mesmos homens de 1400 ou de 1860, mas jamais saberemos o que era SER um homem desses tempos. Sabemos o que um leitor de Dickens queria, temia, pensava, mas não sabemos "como ele se sentia lendo Dickens". Aquilo lhe era engraçado, triste, perturbador, tolo, mero passatempo, inesquecível...não há como saber. Basta dizer que um livro que voce leu aos 15 anos não é o mesmo aos 40 anos. Voce é o mesmo leitor. Mas sua experiência de leitura é outra.
Sofia Coppolla foi esperta. Um dos grandes problemas das adaptações literárias e dos filmes históricos é que os personagens se tornam "limbo". Não são figuras da época retratada porque não sabemos como elas andavam, falavam ou riam. E não são de nosso tempo, pois isso pareceria "tolo". ( Game of Thrones é um exemplo desse limbo ). Sofia teve a sacada de fazer da princesa da Austria uma menina de 1999. Isso faz com que o público de hoje SINTA o que seria ser uma princesa em meio a um ambiente hostil. Ninguém no filme tem atitudes ou gestos de 1780. Eles falam, agem e pensam como nós. O rei Luis é apenas um boa vida velho, o herdeiro real é um nerd virgem e a princesa é uma patricinha gastadora e de bom coração. Eles, os verdadeiros, eram desse jeito...Impossível saber como eles eram. Então, já que tudo na história oficial é uma convenção, que se faça aqui mais uma convenção.
Kirsten Dunst mereceria o Oscar do ano. Ela consegue ser crível em um papel impossível. Seu rosto de maravilhamento e de deslumbramento é sublime. Ela quase não atua, o que sempre, como Cary Grant dizia, é o mais difícil. Atuar, super atuar é simples. Dar um show de atuação, maquiagem e trejeitos, isso é muito mais fácil e óbvio que atuar "quase" como se não se atuasse. Quem subiu em um palco sabe disso. Dunst faz isso. O filme é uma linda oferta para ela. A gift.
Muito se falou da beleza estética do filme e do fiasco que ele foi. Nem isso e nem aquilo. Hoje ele está se tornando cult e a beleza não se compara aquela de Ophuls. Quem já viu um filme histórico de Ophuls sabe que a beleza de Coppolla é simples. Nunca suntuosa.
A crítica atual é tão mal preparada que chega a dar desgosto. Ninguém percebeu que toda vez que a princesa acorda e tem seu ritual da manhã, a música que toca é a mesma de ALL THAT JAZZ. A peça de Vivaldi. Só faltou ela dizer "Showtime!", como faz Joe Giddeon no filme genial de Bob Fosse. Esse é o paralelo genial de Coppolla. Giddeon fuma, bebe, transa muito e se arrebenta. Ele é o cara de 1960-1970, o cara do século XX. Quando no futuro olharem esse século todos os historiadores dirão que foi um século onde todos eram Joe Giddeon: Loucos. O que Maria Antonieta diz, e por isso a mesma música, é que ela aposta que este século será visto no futuro como um tempo parecido com Versalhes 1780. Luxo, futilidade, festas, inocência infantil e consumo. Jogo, drogas e risos em MEIO À RUINA TOTAL. Algum crítico notou isso...Não lembro de ter visto.
A revolução francesa venceu. Nosso tempo é o tempo que ama a liberdade, a fraternidade e a igualdade. Poucos percebem que elas são miragens e que sempre vão ser. Isso porque a liberdade não existe, pois somos limitados pela natureza, a igualdade nunca pode ser completa, pois nascemos diferentes e desejamos diferente, e a fraternidade é uma mentira. Somos naturalmente competitivos. Mas, nunca tanta gente viveu bem. O mundo ocidental tem uma fartura que não foi sonhada em tempo algum. E disso o filme também trata. Pois 200 anos de capitalismo moderno fez dos ricos pessoas menos ricas ( ainda ricas demais, mas muito menos que os ricos de antes ) e fez dos pobres pessoas com um estilo de vida inimaginável em 1780. ( Falo do mundo que contava em 1780 ). Milhões de pessoas vivem hoje a vida de Maria Antonieta. Jogo, droga, festa e sapatos novos. E inocentemente ajudam os pobres lhes dando brioches.
Por fim, o filme começa com Gang of Four. Uma obra prima do rock de esquerda dos anos 80. Isso faz voce esperar um filme sobre a revolução. Mas é um blefe. A trilha sonora, maravilhosa, é sobre melancolia. Pois junto às festas, há todo o tempo a sombra cinza da tristeza que flutua. Muito anos 80. Muito 1999. Muito hoje. Nada 1780. ( Incrível como para a geração nascida nos anos 60 a trilha sonora é tão importante quanto o filme em si. Culpa dos maravilhosos hits feitos entre 1963-1983 ). A trilha tem Sioussie, Cure, New Order, Bow wow wow e até Adam Ant. É um clipão chic dos anos 80. Muita gente disse isso. Mas provo aqui que é mais, muito mais.
Enjoy it!