A APOSENTADORIA DA ARTE

   Duchamp tinha uma ideia: Após vinte anos, todo artista deveria ser obrigado a se aposentar. Isso porque depois desse tempo todos eles se repetem sem parar. Vinte anos é o limite. Então se abriria mais espaço para gente nova.
   Vinte anos. Scorsese teria parado em 88. Spielberg em 92. Fellini em 72. Bergman em 68. Acho que até não é má a ideia. Kurosawa em 65. Hitchcock em 50. Opa! Não teríamos Vertigo, Janela Indiscreta, Os Pássaros e Intriga Internacional...sei não...
   Heminguay em 45. Joyce em 40. Huxley em 42. Yeats em 1910...acho que não. Muito autor melhorou com a idade. O que não foi o caso de Heminguay e Tolstoi, que eram muito melhores quando jovens.
   Picasso em 20. Klee em 1935. Matisse em 1915. Acho que não...entendo Duchamp, a maioria dos artistas se repete já com 10 anos de trabalho, mas há exceções. Poucas, mas há.
   Rolling Stones em 1983. Bowie em 1989. Dylan em 82. Ops! A frase de Duchamp é perfeita para o mundo do rock!!!! Apesar dos ótimos discos de Dylan e de Lou Reed após os 20 anos de estrada, eles são repetições. Este ano, 2015, seria o da aposentadoria de toda a geração que começou em 1995. Certo demais! Afinal, os Beatles precisaram só de sete anos para marcar o mundo forever e o Velvet Underground de três para inventar o conceito de cult band. Acho que em rock dez anos tá bom. Bom demais.

FRÉRE....UM OBJETO SERÁ MEU BUDA.

   Então você sabe desenhar e é um artista. Pois bem. Você pinta um quadro. Muito bem feito, exatamente daquele modo que todo mundo se impressiona. Um vaso de rosas vermelhas. OK.
   O que fará dessa obra, arte? Será a escolha. A escolha do tema, a escolha da imagem, a escolha daquilo que será ressaltado. Nessas escolhas serão definidas as mensagens. OK.
   Mas pintar pode ser algo morto. Talvez após Cézanne, Van Gogh, Matisse, Kandinski, não haja mais sentido em pintar. Talvez um homem realmente LIVRE não suporte mais repetir esse ato.
   E principalmente desgoste das teses, teorias, interpretações, dos arcabouços literários que a pintura criou em cinco séculos de crítica. Talvez ele tenha HUMOR. Liberdade e humor: e veja a comédia que mora naquele circulo.
  Mas atenção! Ele é livre mas não é anarquista. Ele tem humor, mas não é anarquista. Acima de tudo ele deseja nunca se comprometer. Na vida pessoal e na vida artística seu desejo é o de ser sempre livre para fazer o que quiser e quando quiser. Ele ama, mas nunca se apaixona. Ele tem relacionamentos, mas nunca mora junto. Ele cria, mas jamais segue uma escola. E não é solitário. Tem amigos, família, colegas, mas preserva sua solidão. Ele ouve. Ele olha. Ele pensa. Observa. E fica distante. Sua filosofia é ser distante. E exala charme.
   ( Baudelaire em 1863 disse que o DANDI é aquele que em meio a multidão anônima da cidade mantém sua aristocracia. É um aristocrata porque não se mistura. Ele flui pela massa sem se misturar. Observa e não se compromete. Cria sua individualidade. Que será única. )
   Então esse homem pinta. E seus quadros, poucos, são fortes. O que ele quer é mostrar a fluidez da vida. Pintar o movimento e não a coisa. A tal da quarta dimensão. OK.
   Um dia ele pega um banco e uma roda de bike. Une os dois e os deixa num canto.
   Um dia ele pega um urinol numa loja. Vira esse urinol de cabeça para baixo. Assina R.Mutt. E o batiza de FONTE.
   Isso é arte. Porque agora não interessa mais fazer um rabisco ou um desenho. O que importa é saber ESCOLHER. Dar um nome. Assinar. E assim fazer pensar. É arte?
   O urinol é branco. E ao se chamar fonte ele remete a uma fonte de água. Mas sua forma lembra um Buda. Fonte espiritual. E uma forma feminina: fonte da vida. Não interessa o urinol. O que INTERESSA é ver algo de novo numa forma antiga. Ou, associar ao nome: Fonte, o objeto: Urinol e daí nascer um Buda e uma Vulva. Ou não::::: PORQUE SE ELE FOI LIVRE PARA FAZER, EU SOU LIVRE PARA ENTENDER. Ou não.
   Parece charlatanismo? Há um convite aqui. Faça igual. Tente. Pegue uma coisa de seu quarto e dê um nome. Quem sabe funcione. Mas sinto em dizer, hoje será apenas a repetição de algo que foi feito em 1912.
   Marcel Duchamp é meu irmão.
   O mundo de 2015 ainda está atrás de Marcel Duchamp. E eu também.
  Faz muito tempo que leio e vejo arte. E comecei como todo mundo começa, pelo mais simples. Renoir. Monet. Manet e Degas. Coloridos, bonitos de forma hoje convencional. O mundo alcançou o impressionismo em 1920. Todo o mundo. E esse mundo, todo, alcançou esse impressionismo e ficou estacionado aí.
  Depois eu cheguei em Gauguin. Chagall. E Matisse. O mundo todo nunca chegou aí. Ainda. Mas o mundo do tal "bom gosto" chegou à eles por volta de 1930. Há algo de disforme neles. E isso começa a incomodar.
  Só depois dos 30 anos comecei a me encantar por Kandinski e Klee, por Picasso e Braque. De certo modo me encantei pelo motivo errado. Pela liberdade de sentir. Errado. A coisa é mais profunda. Agora, com Duchamp, eu entendo.
  A pintura sempre foi feita para a retina. E aqui estou falando aquilo que Duchamp diz. A tela fala à retina e apenas à retina. A retina apreende as duas dimensões da pintura e transforma essa imagem em informação que vira sensação ou sentimento. No pior dos casos vira narração. Pois bem, a arte moderna deve falar não à retina, mas sim ao homem inteiro. Olhamos e criamos sobre aquilo que é dado. O que vejo não é o que você vê. Eu vejo com meu todo, e vejo o que apenas eu posso ver.
  A arte moderna, ora vejam, é a busca pela quarta dimensão, a dimensão daquilo que não se vê. Daquilo que nossa razão desconhece. Não aquilo que a retina pega, e sim aquilo que a intuição intui. O mundo de 2015 está longe disso.
  Ainda.

Akira Kurosawa - Composing Movement



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O PLANETA É AZUL

  Em conversas com meu amigo Fabio, longas conversas, ele é um bom contador de histórias, descubro que no meio dos anos 60 o primeiro americano entrou em órbita completa no espaço, e que, ao contrário de Gagarin, que não viu o planeta inteiro, viu apenas horizontes, o sol nascendo, esse americano se afastou o bastante e pode ver a Terra inteira.
  Veja bem: ele é o primeiro ser vivo a ver a Terra em sua totalidade numa olhada. Inteira. O primeiro homem a ver seu planeta.
  Sua frase dita lá de cima é famosa: - A Terra é azul...
  Depois de falar isso, o silêncio. Por 4 horas esse homem se calou. A NASA sabia que ele estava on, nada havia de errado com o rádio. Mas ele não respondia.
  Chamaram um psicólogo. E lentamente ele foi voltando... E disse que iria abrir a nave, ele precisava ir lá fora...A Terra era a coisa mais linda... da Terra...
  Meu amigo adora música, mas não exatamente o que eu gosto. Ele é músico e vê a música como um músico vê. Nota coisas que eu não percebo. Nunca falou na vida de Bowie. Mas essa conversa aconteceu para que ele me contasse sua profunda emoção ao escutar Space Oddity, que romantiza ( será que romantiza ) essa história.
  Can you hear me major Tom....Planet Earth is blue...and there's nothin i can do...
  Mais uma espécie de Leopardo foi extinta.

MAD MAX- CARY GRANT- SOPHIA LOREN-CHARLTON HESTON

   MAD MAX 2015 de George Miller com Tom Hardy e Charlize Theron
Max, o de Mel Gibson, de 1980, foi o primeiro filme que assisti no meu primeiro VHS. Não se engane, foi um filme revolucionário. Trouxe às telas, pela primeira vez, o conceito de aventura pura. Só ação, sem diálogos relevantes, pouca trama, a pura adrenalina. Era o novo cinema australiano. Uma onda que trouxe além de Miller, Peter Weir, Bruce Beresford e Gillian Armstrong. Miller construiu uma carreira interessante, fez As Bruxas de Eastwick e até o ótimo Babe, o filme do porquinho que é a mais bela defesa do vegetarianismo do cinema. Mais uma vez eu falo: não se engane, este Mad Max é muito mais profundo do que você pensa. Os primeiros quinze minutos me fizeram pensar: Deus! Este é o pior filme do ano! Temos toda a tolice, em exagero proposital, dos filmes de teenager: machos violentos, cenários de inferno, máquinas do mal, vilão horrendo e um herói calado. Há até uma banda tocando ao vivo seus riffs de metaleiro. Mas lentamente a gente vai percebendo: há inteligência aqui! Há muita ironia, e a ironia, como provaram Sterne, Thackeray e Machado, é a arma da mais fina Inteligência. A coisa fica deliciosa...O mundo desértico, sem vida, só de machos violentos, é o mundo da pura masculinidade. Ação, morte e a religião transformada em Valhala. Aqui nada nasce, nada faz conexão com nada. Tudo é um fetiche: carros, armas e morrer como num palco, rumo à Valhala. Esse mundo abomina a mulher. Nelas existe a amizade, o cuidado, e principalmente o desejo de viver. Elas sonham. Têm esperança. Dão vida à Terra. Assim que percebemos isso toda aquela correria passa a fazer sentido. O filme se agiganta e se torna a melhor aventura dos últimos anos. Uma ópera adolescente que é contra os adolescentes. Alguns sentem isso, farejam no ar e desgostam do filme. Ele é brilhante. Nota 9.
   KARTHOUM de Basil Dearden com Charlton Heston, Laurence Olivier e Ralph Richardson
Feito em 1968, ele tenta, de forma desajeitada, ser Lawrence da Arábia. Falha miseravelmente e beira o ridículo. Gordon, como Lawrence, é um herói real. Inglês, ele lutou no fim do século XIX no Sudão. Tentou salvar o país do ataque de muçulmanos fundamentalistas ( sim, isso vem de longe ). O roteiro é mal desenvolvido. O herói, feito por um Heston perdido ( ele parece perceber que nada vai dar certo ), nunca parece real. E temos Olivier no pior desempenho de sua carreira. Em sua primeira cena, quando ele abre a boca e emite um sotaque árabe de cartoon, sentimos uma vontade de rir que destrói tudo ao redor. Uma chanchada involuntária. O filme serve como exemplo de como não se gastar dinheiro em vão. Nota 1.
   HOUSEBOAT ( TENTAÇÃO MORENA ) de Melville Shavelson com Cary Grant e Sophia Loren
Em 1958 papai e mamãe iam sábado às oito da noite ao cinema e deixavam os filhos com a babá que ouvia Pat Boone no rádio. Este filme é o tipo de filme que se parou de fazer por volta de 1970. O filme para esse casal comum, porém com bom gosto, conservador, mas não exageradamente sem sal. Cary faz um viúvo que deve cuidar de seus 3 filhos. Os filhos não se dão com ele. Loren é uma italiana ( claro... ), rica, que como Audrey Hepburn em A Princesa e o Plebeu, foge de sua vida protegida e se finge pobre. Vira babá dos tais pirralhos. Vão todos viver numa casa-barco. Funciona. O profissionalismo é tamanho que funciona. Pura bobagem doce, com acentos bem amargos ( os filhos são infelizes. Há uma pitada muito séria no doce ), e algum humor leve. Papai e mamãe saem do cinema contentes. Tiveram uma boa noite de verão. Um adendo: Cary está visivelmente magro e doente. Sabemos que ele se apaixonou por Sophia durante o filme. E ela o repeliu, se casando com Carlo Ponti, o produtor. Foi então que Cary, em crise, se aproximou do LSD. E voltou a ser o cara bonito e saudável de sempre. Não aqui. Ele está abatido. Sophia, que chorava no camarim, disfarça melhor. Está absurda de tão bonita e feliz. Nota 7.
   ENQUANTO SOMOS JOVENS de Noah Baumbach com Bem Stiller, Naomi Watts
Naomi é a atriz mais interessante de sua geração. Ela aceita filmes que fogem do óbvio ( e é linda ). faz a esposa de Ben, uma quarentona que passa a dançar rap. Alguém notou que este filme pode ser a continuação, vinte anos depois, de Reality Bites, o filme que Ben dirigiu com Winona Ryder... Aquele é um filme chave dos anos 90, este é magnífico. Mostra a diferença de gerações, mas esse não é o foco! O foco é o valor da arte e o peso da verdade. Que bom ver um filme moderno que não apela para rocks geniais a fim de ganhar seu público!!! Só no final temos a exibição de duas músicas chave: Golden Years do Bowie e Let em In, do Paul. Eu amei. Nota DEZ!!!!
  

A TAÇA DE OURO ( THE GOLDEN BOWL )- HENRY JAMES

   Enredo: Maggie se casa com um príncipe italiano falido. O pai de Maggie é um americano milionário que vive em Londres. Colecionador de obras raras. O pai e a filha são extremamente unidos. E a filha, que ao se casar sente ter traído o pai, o convence a se casar novamente. O pai se casa com a melhor amiga da filha. O que ele não sabe é que essa mulher, Charlotte, foi apaixonada pelo príncipe falido. Mas tudo não é um belo arranjo! O pai e a filha podem assim continuar juntos!
  Estilo: Tortuoso. Dificílimo. Este foi um livro escrito na fase final de James. Fase famosa por sua particularidade: Um detalhismo realista-psicológico tão minucioso, tão precioso, que um paradoxo acontece: o hiper-realismo se transforma em abstracionismo! É como ver a pele de um animal em microscópio: o detalhe faz daquilo abstrato.
  Nada, ou muito pouco, acontece. O que temos são pensamentos sobre pensamentos. Todo o processo de análise, sensação e reanálise é dissecado. Longos períodos, sentenças que se dividem em vírgulas e mais virgulas, parágrafos de duas páginas, diálogos suspensos em pensamentos, a vida interior sobre a vida aparente, motivações que são secretas até para quem as vive, sentimentos que nos são irrelevados. Nunca irrelevantes.
  De tudo que já li do autor é de longe o mais árduo. E o menos satisfatório. Os climas construídos de forma tão magistral em tantos outros livros são aqui rarefeitos até a secura. Não há respiro. Nada nos é facilitado. Ao final o que fica é a certeza de que James, senhor do estilo perfeito, tentou e falhou. Quis ir mais além. Ficou aquém. 

ENQUANTO SOMOS JOVENS- NOAH BAUMBACH

   Conheço uma brilhante menina de 16 anos chamada Mika. Ela escuta rock e esta semana descobriu o Stray Cats. Ela baixou todos os discos e assistiu dois shows, um de 1981 e o outro de 1983. Eu nunca tive todos os discos e jamais vi os shows. Mas em 1981 comprei o primeiro disco deles.
   Mika nunca vai saber o que é Não Ter todos os discos dos Stray Cats. Ela nunca saberá o que é não poder ouvir todos os seus discos.
   Semana que vem Mika não mais escutará os Stray Cats. Talvez seja hora de descobrir os Hoodoo Gurus.
   O filme, brilhante é acima de tudo sobre isso. Ele toca na ferida. Pela primeira vez temos uma geração que tem tudo. Eles não sabem o que é querer e não poder. Mesmo tendo dinheiro para poder. Pois não bastava ter a grana para comprar os discos. Você tinha de achar eles. Agora querer é ter. Já. Músicas, filmes, livros, pinturas, lugares, mulheres nuas, violência. Basta querer. Toda a arte e toda a merda de séculos agora e já.
  Gente inteligente nesse mundo, como será...O filme diz que a primeira baixa é a ética. Tudo é de todos, logo, você pode roubar, usar, mentir, editar, ignorar, acrescentar. O mundo não tem dono. Ou é de todos, o que dá na mesma: Faça. Faça e use tudo.
   Um pouco de anos 80, toneladas de anos 20, uma pitada de anos 60. Misture tudo porque tudo é nosso. E seja diferente misturando mais que todos ou dando uma de quem não está nem aí. Mas está. Ser snob com o facebook já é ser hipster.
   Cada canto do globo é guardado numa foto. Cada dia é documentado numa filmagem de celular. Cada pensamento é eternizado num post. Cada opinião afirmada. Um mundinho para cada um. Faça. Eu quero ser e eu sou, agora.
   Minha geração é a última que não conheceu o celular até os 25. E que usou internet só depois dos 30. Ainda damos valor a uma canção. Um livro ainda é de seu autor. Essas coisas têm um preço. Dão trabalho e valem exatamente esse trabalho. O trabalho de achar. De comprar. De conseguir emprestado. Não percebemos que hoje NADA tem valor. São apenas COISAS para serem usufruídas. Como um copo de água ou o ar. Um direito natural.
   É o melhor filme do ano.

The Canterbury Scene on BBC Prog Rock Britannia [2008]



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IN THE LAND OF GREY AND PINK- THE CARAVAN

   Naquele tempo se juntava um grupo de músicos e se ia para o mato. Depois de seis meses numa casa junto ao nada se sabia. Se o astral batia. Se as viagens sintonizavam. Não se pensava em excelência musical ( só o Cream embarcara nessa e dera tudo errado ). O que valia era fazer um som com quem tinha a ver. Magia.
 Sim, isso tudo parece bem bobo nos olhos cínicos de hoje. But, why not...Dar preferência ao astral é no mínimo tão válido quanto escolher um baixista por ser mulher e loira.
 Então os caras nasceram em Canterbury e isso muda tudo. Além de pronunciar o H como se fosse F. Canterbury foi o centro católico da Inglaterra e ainda é o lugar do cardeal que abençoa os reis. Nascer lá é como nascer no foco espiritual da ilha. E se em 1967 toda a nação bretã mergulhava numa viagem mística medieval ( alguns mais, outros bem fake, ia de acordo à capacidade de cada um ), era lá que a coisa pegava de um modo mais "pra valer". Pra valer porque mais discreta. Basta dizer que toda a galera do lugar nunca mais saiu da viagem. Eles não viraram reis do glamour e nem funkearam nada. Continuaram ciganos ingleses. Até morrer.
 Os irmãos Sinclair, Richard e Dave fizeram parte de uma banda fundadora de lá: The Wilde Flowers. Wilde em homenagem ao Oscar. Dessa trupe saiu nenhum yeah yeah yeah. Era 1964 e eles já falavam em decadência e chás suspeitos. Ok. Em 1968, depois da estada na fazenda, gravaram um disco: Caravan. Os irmãos Sinclair com Pye Hastings e Richard Coughlan. Sem ego trip. Não há um líder. O guitarrista, Hastings, nunca sola. Richard Sinclair canta com voz de barítono e toca baixo como ninguém. Mestre. Pye canta com voz de quase falsete. E o hammond organ de Dave Sinclair comanda todo o som. Os caras além de amigos tocam bem.
 Invernal, um leve acento de melancolia, mas sempre com um espírito leve, de paz e amor, letras nonsense, eles nunca se ocupam de temas da vida lá fora. Tudo neles é pra dentro. E são ingleses pra caramba!
  Seu grande disco é o terceiro: In The Land Of Grey and Pink, de 1971. Quase um sucesso. Mas os quatro primeiros são ótimos. É pra ouvir andando no mato com uma xícara de chá. E os amigos. Ou com uma menina de olhos cinzentos enrolada num cobertor. É da lama. E dos cogumelos.
  Viciei-me.

Nicholas Brothers - I've Got a Gal in Kalamazoo



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ROBIN HOOD- AL PACINO- COLIN FIRTH- NICHOLAS BROTHERS- MIKE LEIGH- CAROL REED

   O CAMINHO DAS ESTRELAS de Carol Reed com David Niven e Stanley Holloway
Ingleses de várias camadas sociais são convocados e treinados para a guerra. A princípio são rancorosos, não compreendem a gravidade da guerra. O filme, muito simples, acompanha a transformação desses indivíduos numa unidade coesa. Bom filme. Carol Reed se tornaria em seguida o centro do cinema inglês do período 45-55. Nota 7.
   KINGSMAN, SERVIÇO SECRETO de Dave Gibbons com Colin Firth, Samuel L. Jackson
Firth é um agente secreto, elegante, conservador, um protótipo do inglês de guarda-chuva. Ele treina um garoto, típico garoto de 2015, para ser um novo agente. O filme tem a venerável presença de Michael Caine ( é o que restou... ), mas não diz a que veio. Veja bem, não é ruim, mas tudo nele é banal. Ele tenta resgatar o chique e o apelo dos velhos filmes de espiões, mas ao se dirigir aos teens de agora ele se trai. Fica num meio termo muito opaco. Nota 3.
   NÃO OLHE PARA TRÁS de Dan Fogelman com Al Pacino, Annete Bening, Jennifer Garner, Bobby Cannavale e Christopher Plummer
Mais um produto para consumidores de meia idade. Pacino é um cantor que em 1971 era uma grande promessa, mas que em 2015 é uma estrela, milionária, para velhos acomodados. Então seu empresário lhe dá uma carta perdida de 1971, uma carta que John Lennon lhe enviou e que nunca chegou. Essa carta muda sua vida. Ele tenta voltar a ser um cantor sério. Ok... a gente pode pensar em Rod Stewart, em Paul Simon...mas o cara é bem pior! Ele é Neil Diamond, um cantor que compôs canções geniais entre 1966-1971, e que desde então se contenta em ser o Roberto Carlos de Las Vegas. Eu achei o trabalho de Pacino péssimo! Preguiçoso, flácido, sem pique. O roteiro se fixa na velha ladainha do " desculpe meu filho por ter sido uma estrela "... Poderia ter sido um grande filme, o tema é excelente, mas não passa de um filme família bem comum. Nota 3.
   GRANDE JOGO de Jalmari Helander com Samuel L. Jackson
O diretor é finlandês. Samuel é o presidente americano. Ele cai no interior da Finlândia. Um menino o salva dos terroristas. Podia ser uma boa aventura. Mas tenta ser arte....Uma baboseira sobre entrada na vida adulta, compromisso, vida natural....Fuja!
   SEGREDOS E MENTIRAS de Mike Leigh com Brenda Blethyn e Timothy Spall
Escrevi sobre ele abaixo. Começa em enterro. Passa ao mundo banal de um fotógrafo, uma mãe solteira, uma filha à procura da mãe. Ninguém é bonito, nada é bacana. Tudo o que eles querem não é dito. Existem filmes que conseguem acertar o alvo. Capturam a verdade, uma verdade difícil de ser descrita. É um dos dez melhores filmes dos anos 90. O elenco faz milagres. O final é sublime. DEZ.
   E A FESTA ACABOU de W.L.Norton com Ron Howard, Cindy Willians e Paul Le Mat
American Graffitti transformou George Lucas em milionário em 1973. Ele contava um dia na vida de um bando de amigos em 1960. E é incrível como esse estilo de filme foi imitado desde então. Em 1979 foi feita sua continuação, este filme esquisito, dirigido por um dos amigos de Lucas que não deu certo. Lucas produziu. Eu o vi no cinema, na época, matando aula. Ele se passa em 1964-1967 e é todo centrado na guerra do Vietnã. Vemos o que foi feito daqueles moleques de quatro anos antes. O mundo muda demais e eles se perdem. A melhor história é a do soldado na selva, quase um tipo de Mash em sua loucura. Tem um retrato interessante de hippies em seus inícios, mas as histórias acabam parecendo mal desenvolvidas. É um filme simpático, gostoso de ver. Nota 6.
   SERENATA AZUL de Archie Mayo
Este filme é um forte argumento contra o racismo. Vejam: é um filme pavoroso, com atores ruins, cenas patéticas, roteiro bobo. E então, durante cinco minutos, ele cresce e se transforma numa obra-prima. São os cinco minutos em que os irmãos negros- Nicholas Brothers- podem se exibir. Meros cinco minutos de absoluta genialidade. Míseros cinco minutos, o tempo que o racismo permitiu. Nas cidades do sul esses cinco minutos eram cortados. Deus meu! O que perdemos!!!!!
   RIVAL SUBLIME de William A. Seiter com Deanna Durbin, Kay Francis e Walter Pidgeon
Uma bobagem gostosa. Um tipo de souflê leve e fofo. Uma menina, filha de atriz famosa, se envolve com homem mais velho que na verdade gosta da mãe. Tudo bem filmado, engraçadinho, fácil de gostar. Deanna era ótima! Nota 6.
   AS AVENTURAS DE ROBIN HOOD de Michael Curtiz com Errol Flynn, Olivia de Havilland, Claude Rains e Basil Rathbone.
A super colorida, super grandiosa e super feliz versão da Warner do clássico da aventura. Errol nasceu para ser Robin Hood, e todo o elenco tem tempo para seu solo de brilho e charme. A trilha sonora se tornou molde de vários filmes agitados e a ação escorre por todo lado. Mas...há um problema com este filme de 1938. Ele foi tão imitado, tão copiado, é tão conhecido ( mesmo por quem nunca o viu ), que a sensação de deja vu se torna pesada. O mais leve dos filmes se torna um peso... Outras aventuras de Flynn, como Dodge City ou Gentleman Jim, funcionam muito mais por serem menos conhecidas. Robin Hood tem o mesmo problema de Star Wars ou de Indiana Jones, mesmo aqueles que não os viram sabem tudo sobre o filme. Não há como se surpreender. Pena.