Sedmikrásky (Daisies) - Girls causing a ruckus at night club



leia e escreva já!

PIQUENIQUE NA PROVENCE- ELIZABETH BARD...AFINAL, ESSE LUGAR EXISTE MESMO...

   O primeiro contato que tive com essa mítica Provence foi lá por 1992, quando tomei contato com os trovadores do século XII. Ou...espere, foi antes! Nos anos 70 vi um filme do Philipe De Brocca que se passava por lá. Esse filme mostrava uma vila cheia de gente sorridente e sexy, vivendo entre vinho e flores. Depois, já neste século, li os livros de Peter Mayle. TODOS. A Provence de Mayle é um sonho de simpatia. E a vida que ele descreve é bastante privilegiada. Por mais que ele fale de suas aflições com serviços, contas altas e pisos gelados, é uma vida de fartura e de mesas de mármore. Mayle come e bebe. E nada mais que isso.
  Aqui é diferente. Elizabeth é uma americana que se casa com um francês e numa viagem de turismo, já casada, se encanta por uma minúscula casa de vila. Os dois se mudam de Paris para lá e logo ela engravida e tem seu primeiro filho. Além disso, ela é judia e tem depressão. O melhor do livro é isso, Bard compara a vida americana à francesa e a França vence em seguro social, comida e saúde. Além da natureza e do tempo livre. Os EUA vencem na aceitação da religião alheia e em simpatia. Só isso. De todo modo, Bard, que se apaixona pela Provence, tem muito de outsider e mesmo a maternidade lhe é difícil. Ela precisa aprender a ser mãe, a ser francesa e a ser dona de casa.
  É um livro leve, solar, com alguns momentos cinzentos. Elizabeth Bard se mostra muito mais humana que Mayle. Embora Mayle divirta mais. Gostei muito e recomendo este livro lilás.
  Quanto a Provence...recomendo a Bretanha. Vento, seca, muita poeira e muita pedra. Tórrido no verão, gélido no inverno. Caro, bem caro. O "romantismo" que voce espera achar na Provence vive na Bretanha, na Champagne, ao redor de Estrasburgo. A Provence é dura. Encanta ingleses por seu calor. E agora, mais ainda, por ser moda. Mas não é o lugar mais belo da França. Nem o segundo ou terceiro mais belo. Mas...escrever um livro com o nome "COMO VIVER NA PROVENCE" venderia mais que "VIVENDO EM BORDEAUX"...
  É isso.

RUSSELL CROWE* RYAN GOSLING# SACHA BARON COHEN+ AVA GARDNER* LAUREL E HARDY * BURT LANCASTER

   THE NICE GUYS de Shane Black com Russell Crowe, Ryan Gosling
Acho que ainda não passou por aqui este muito, muito, muito bom policial. Não há um só minuto que seja menos que bom, são 150 minutos de completa diversão. É sexy, é irado, é cheio de ação, tem diálogos nonsense, e é muito engraçado sem ser bobo. Tem 3 momentos que me fizeram gargalhar. A história fala sobre cinema pornô, politica, fracasso e bebidas. Crowe é um ajustador de contas, um cara que voce contrata para bater em alguém. Gosling é um detetive doidão que tem uma filha esperta ( uma excelente atriz jovem, Angourie Rice ). Os dois, por acidente, se conhecem e passam a trabalhar juntos numa história de chantagem e assassinatos. O roteiro tem furos, mas quem liga pra isso se o filme funciona hiper bem... Russell trabalha com vontade ( enfim... ) e Ryan está no seu momento, ele é engraçado, tem o dom. Shane Black dirige poucos filmes. Os que vi são sempre inteligentes, leves e muito sedutores. Diálogos, ele sabe fazer ação com bons diálogos. Ah sim, o filme se passa em 1977 e isso me traz uma ideia: Parece que é preciso situar um filme em 77 para ele ter a licença de ser amoral, safo, esperto, com ação sem efeitos digitais, muito diálogo e com cenas sexy-alegres. Why... Se fosse em 2016 tudo isso teria de ser triste ou neurótico...É estranho... O clima de 1977 está perfeito, sem exagero nenhum. Não é de 1977 que rimos, é do belo roteiro ( de Black ). Nota 9.
   IRMÃO DE ESPIÃO de Louis Leterrier com Sacha Baron Cohen, Mark Strong e Penelope Cruz.
Um fiasco. Muito ruim, muito apelativo, sem interesse. Sacha é o irmão hooligan de um super agente. Estão separados desde crianças. E se reencontram no meio de uma ação de Strong. Aff... So What! O tipo proletário inglês de Sacha poderia ser engraçado, é apenas grosso. Um completo desastre. Nota ZERO.
   AS MARGARIDAS de Vera Chytilová com Ivana Karbanová e Jitka Cerhová.
Um filme tcheco de 1966 feminista e muito livre. Faz parte da renascença tcheca, aquele momento de liberdade que em 68 foi esmagado pelos tanques russos. E é um filme moderno, ainda, e ao mesmo tempo muito velho. Moderno por não ter regras, a diretora faz o que quer quando quer. Velho por ser bastante otimista, alegre, uma alegria que hoje nos parece antiga. O que depõe contra nós... São duas amigas que moram onde der, comem enganando velhos ricos e fazem o que dá na cabeça. Acima de tudo elas não precisam de homens. E os usam. Inocentemente. O que encanta no filme são as duas atrizes. Elas interpretam como crianças grandes. Riem de vergonha, improvisam, cantam, fazem beicinho. Uma delas é de uma beleza eslava arrebatadora..Musa. O filme é curto, apenas 80 minutos e é ainda interessante. Uma peça de museu. Nota 7.
   O NAVIO CONDENADO de Michael Anderson com Gary Cooper, Charlton Heston e Michael Redgrave.
No Canal da Mancha, uma barcaça topa com um navio abandonado. O capitão Heston entra nesse navio e lá encontra o capitão Cooper. O mistério se faz: Por que esse navio foi abandonado pela tripulação... Os primeiros 30 minutos são muito bons. Sem diálogos. Depois vira um filme bem comum. Os atores, claro, seguram a atenção. Mas ele se perde no final apressado. Nota 5.
   ZONA PROIBIDA de William Dieterle com Burt Lancaster, Claude Rains, Paul Henreid, Corinne Calvet, Peter Lorre.
Na África do Sul assistimos num pb deslumbrante, a história de um homem que escondeu diamantes de uma mina particular. O filme então mostra o embate entre esse aventureiro, Lancaster, o gerente da mina, sádico, Henreid, o dono da mina, o cínico Claude Rains e uma prostituta francesa, Calvet. O elenco não podia ser melhor. Dieterle foi ator do cinema mudo alemão e imigrou durante a guerra. Fez excelentes filmes de tudo quanto é gênero. Um profissional que sabia tudo de cinema. E sempre usando o clima do expressionismo alemão. Peter Lorre aparece pouco. E quase rouba o filme. Nota 8.
   A DEUSA DO AMOR de William A. Seiter com Robert Walker e Ava Gardner.
Um modesto vitrinista de uma loja imensa se envolve com Vênus, a deusa do amor. Ela vem à terra como uma estátua, que ganha vida quando ele a beija. Sim, é uma fantasia total. E, à beira do desastre, funciona. É um filme que grita por uma refilmagem da Disney. Ava está absolutamente linda. É este o filme que a revelou para o mundo. Walker foi um grande ator de carreira curta. A bebida o levou cedo. Para melhorar tudo, temos Speak Low, de Kurt Weill. Pra quem não sabe, Weill foi parceiro de Brecht em seus musicais. Sabia tudo de música. O filme é uma comédia leve e sublime. Veja. Nota 7.
   O FILHO DE ALI-BABÁ de Kurt Neumann com Tony Curtis e Piper Laurie.
Filme da Sessão da Tarde dos velhos tempos. Não, não é bom. Curtis, um ator sempre simpático, faz o playboy filho de Ali Babá, que perde tudo o que tem por causa de uma trama de um vizir rival. O clima é relaxado demais e a gente percebe todo o tempo ser um filme B. Envelheceu mal. Nota 3.
  ERRADO NOVAMENTE e HABEAS CORPUS de Leo McCarey com Laurel e Hardy.
Stan Laurel foi um gênio. Somente Buster Keaton e W.C.Fields chegam perto de sua genialidade. ( Os Marx eram um grupo que funcionava como grupo ). Laurel consegue ser um pateta sem nunca nos irritar. Consegue ser ingênuo sem nunca despertar pena. E Oliver, o gordo irritado, o completa à perfeição. Foi McCarey quem os burilou e lhes deu o passaporte para a eternidade. Aqui temos dois curtas silenciosos. No primeiro eles devolvem um cavalo à um milionário. No segundo eles procuram corpos em cemitério. Os dois filmes são simples, diretos e ainda engraçados. Os dois são parte do tesouro do cinema.

UMA HISTÓRIA DA MINHA VIDA

   Minha relação com a igreja começa já estranha desde cedo. Meus pais não eram casados no religioso e portanto achavam que entrar numa igreja, "solteiros", seria uma afronta à religião. Mas me faziam ir à igreja, aos domingos, com minha tia e meus primos. O que lembro dessa época é o calor, a igreja lotada, pernas de homens de pé, paletós e mulheres com véu. A igreja era a de Santo Antônio, no Caxingui, e a família toda sempre estava lá. Menos meus pais. O Caxingui era um bairro de casas grandes e chácaras, havia um sentimento de pioneirismo. Comunidade. Na calçada, na saída do culto, uma pequena multidão dava abraços e beijos e partia para o almoço do domingo.
  Eu não entendia absolutamente nada.
  Meu quarto era um horror. Quase uma cela da inquisição. Minha mãe o enchera de santos nas paredes. Havia um Cristo com o peito aberto, o coração vermelho exposto, sorrindo; havia uma Nossa Senhora em um altar de gesso, uma lâmpada vermelha acesa noite e dia iluminando sua figura azul. Eu sentia medo. Um medo inconfessável. A luz vermelha me apavorava.
  Fiz a primeira comunhão, fiz a crisma. Gostava do cheiro da Bíblia nova. Gostei de ser o leitor do versículo lá no altar. Mais nada. Um incômodo me cutucava. Eu não conseguia amar à Deus. Mal pensava nessas questões.
  Descobri a morte aos 12 anos, tive minha crise de finitude aos 16, e meu consolo não havia. Por mais que minha mãe falasse de Deus, eu sabia que Deus era somente um consolo para os fracos. E eu era forte. Havia lido Nietzsche. Era socialista. Sabia que a vida era um nada. Lera Sartre.
  Entrei em contato com Freud, e assim sabia o que nós éramos: apenas um ser que deseja. Me acostumei com esse modo de viver. Sentia superioridade perante os bobos. Eu era racional.
  Mas... eu queria crer em amor. Não para crer em Deus, não para vencer a morte, mas para ser feliz. Queria crer que o amor não era apenas vontade de procriar. Tinha de ser mais que isso.
  ...
  O tempo passa então. Décadas. E me encontro numa certa idade. Impossível precisar. E nada tenho para contar. O que devo dizer é que passei para o outro lado. E fazendo isso não me sinto mais feliz, e continuo temendo a morte como sempre temi. O que mudou em mim então que me faz ver a vida sob outro ponto de vista...
 Não tive  nenhuma experiência de quase morte. Não tenho nenhum amigo, namorada, parente, professor ou guru que me falem de religião. De concreto houve a morte de meu pai, brigado comigo. Mas antes de sua morte, oito anos atrás, eu já vinha num caminho que, lento e constante, só tem se tornado cada vez mais claro.
  Eu questiono. Eu me sinto fora de lugar. E ao mesmo tempo sinto fazer parte de algo. Mas jamais fui tão só. Sozinho e sendo parte.
  Continuo longe de Deus. Não sinto amor. Mas ao mesmo tempo sinto um profundo compromisso com a vida, com este mundo, com a continuidade. E sinto, profundamente, o quanto toda verdade não mora na razão.
  Caminho. Apenas isso, caminho uma estrada que não escolhi, vivo uma vida que não construí e sinto uma vontade da qual não dependo para ser. Vejo a vida como um dom. Tento a namorar.

A DOR

   O mundo moderno não aceita a dor. Há a ilusão, presente no consumo, na ciência, na droga, de que a vida sem dor é alcançável. Corre-se para se fugir da dor. Da lembrança da dor, da herança da dor. A ciência procura outro planeta, um planeta zero, um planeta onde não exista história, passado, dor. Casas antigas, monumentos, tudo que possa recordar uma história dolorosa é destruído. Fugimos. O tempo todo engolindo festas, séries, pílulas, sexo, compras, tudo para não sentir, ou para sentir só prazer.
  Mas a conta não fecha. A dor continua existindo. Uma dor cinza, mal aceita, negada, somatizada, emburrecida, pior de tudo: dor sem sentido. Não sabemos mais reconhecer a nossa própria dor.
  E é ela que nos dá humanidade. Nossa dor é aquela que nos diferencia radicalmente dos animais. O humano é o bicho que sofre. Nossa ilusão é voltar a ser macaco. O humano sofre porque pensa. Sabe que morrerá. Mais: o humano sente-se só. Por mais que ele faça sexo, por mais que se case, por mais que ande em grupo, o humano é o bicho que sente o abismo que existe entre seu EU e as coisas ao seu redor. Esse abismo só é transposto pelo amor. Mas amar dói. Sim, o amor é companheiro da dor. ( Mas pode ser vencida essa dor. A dor quando aceita e purgada vence a dor. Esse o preço que ninguém mais quer pagar. )
  Nietzsche errou o alvo. Como um adolescente que culpa os velhos pelo mal do mundo, ele teve a ilusão de que a dor foi inventada pelo cristianismo. A dor sempre existiu, Desde o primeiro homem a pensar na morte. Judeus não criaram a culpa. A culpa vive na consciência de que os olhos dos outros nos julgam. Humanos avaliam seus atos e portanto sentem vergonha e culpa. Nietzsche não queria aceitar a dor. Morreu brigando com sua humanidade.
  Freud, outro adolescente briguento, queria crer que toda dor vem da repressão dos impulsos e do instinto vital. Humanos reprimem seu corpo. Se humanos não reprimissem desejos e instintos seriam bichos. Essa divisão vem da divisão entre corpo e  mente, ou entre corpo e alma. Nosso EU estranha seu corpo. Não aceitamos suas fraquezas e suas necessidades. Fome, doença, dor. Essa divisão não foi inventada pela sociedade. Ela é humanidade.
  No mundo de 2016, o mundo do prazer sem culpa, a religião só é aceita se for uma religião que nos livre da dor. Que resolva problemas. Que nos faça feliz. Nada mais idiota. Nenhuma religião verdadeira livra alguém da dor. Ao contrário, toda religião é um sacrifício. A procura da graça que vem após a vivencia da dor. Ser religioso é aceitar e viver a dor de estar vivo e de ser humano. E dentro da dor sentir o porque da dor de viver.
  O que nenhuma religião ocidental tem a coragem de dizer, não mais, é que religião é dor. Por isso nosso profundo incômodo com o Islã. E com Israel.
  Quando voce sofre porque um bosque foi derrubado, uma espécie extinta, uma rua apagada, seu sofrimento é sagrado. Voce pressente que um pecado foi cometido. A ligação do humano com seu ambiente é a ligação da vida com o sagrado. A terra é voce. A terra é o outro humano que te olha. A terra é onde nossos mortos foram enterrados. É onde suas almas vivem.
  Tudo isso é uma dor. Fugir dela só te leva à essa tristeza cinzenta, vaga, que voce tenta curar com bebida, droga, risos bobos, festas, roupas novas. Encare-a de frente. Tenha a humildade de aceitar sua dor. Ame-a. E ajude o outro, sofrido como voce, a carregar sua dor. Que é sua. Que é nossa. Humana.
  PS: Mais um texto inspirado pelo filósofo inglês, vivo, Roger Scruton.

FINALMENTE ALGUÉM VERBALIZA O QUE SINTO DIANTE DA ARQUITETURA DESTRUTIVA DE HOJE

   O problema se chama ADEREÇO. A fachada de uma casa, por mais simples que fosse, tinha marcas de mãos. Algum detalhe, nem que fosse uma lata com uma muda de couve, que bradava ao universo: AQUI VIVE UMA PESSOA! A casa, o prédio, era uma face. Coisa encaixada em coisa como se houvesse lá uma vida em crescimento. Nos prédios antigos há uma raiz e uma ramificação que se espalha no design das janelas e ruma ao topo. A construção procura falar. E fala.
 No bloco de aço e vidro há a monotonia do sempre igual. Cada centímetro é igual ao centímetro do topo. Nada cresce e nada tem rosto. Mas, pior ainda, quando há uma invenção, um arrojo de construção, o modelo é a máquina, a fábrica, e jamais a COISA VIVA. Eis o mal estar que alguns-muitos sentem na moderna cidade. Ela é morta e fala sempre da morte. Não a morte dos cemitérios, muito mais radical, é a morte daquilo que nunca viveu. A absoluta negação da vida e da possibilidade de viver.
 ( R. Scruton ).
 Na fachada de casas velhas abandonadas, nas ruínas, vemos os ecos finais de lugares sagrados que se perdem para sempre.

JEAN-PIERRE MELVILLE ERA UM GÊNIO VIRIL* BELMONDO* DELON* DE PALMA* CARLYLE* CASSEL*

   DOCE VENENO de Jean-François Richet com Vincent Cassel, François Cluzet e Lola LeLann
Dois amigos levam as filhas para férias na Córsega. Daí pra frente não conto. Começa como comédia leve de depois vira drama. Começa muito bom e depois fica mais ou menos. Duas coisas legais: a beleza absurda de Lola LeLann e o não moralismo de um tema que no cinema americano acabaria em morte e vingança. Vale ver. Nota 6.
   A LENDA DE BARNEY THOMSON de Robert Carlyle com Robert Carlyle, Emma Thompson e Ray Winstone.
Um humor muito negro. Muito mesmo. Estamos na Escócia. Tem um barbeiro que não consegue ter vida, é um chato. Há uma série de crimes. E uma mãe hiper suja e perua. Mistura tudo isso e dá neste filme. Meio Tarantino ( antes dele se achar artista ), o filme é sanguinolento, colorido, esquisito e divertido. Surpreendente. Nota 7.
   EXÉRCITO DO PAI de Oliver Parker com Bill Nighy, Catherina Zeta-Jones, Toby Jones, Michael Gambon e Tom Courtney.
Em 1944, numa cidade costeira, um bando de velhos ingleses guarda o país contra um ataque alemão. Um antiquado filminho muito inglês com humor inofensivo e bobo. Não, não é um bom filme. Uma pena, os atores são ótimos. Nota 3.
   PICASSO E O ROUBO DA MONA LISA de Fernando Colomo
Filme ítalo espanhol que ao unir um monte de nomes da arte ( Picasso, Matisse, Appolinaire, Gertrude Stein etc ) pensa fazer algum tipo de coisa esperta e interessante. Não! O filme é uma besteirada. Um filme que fala de arte moderna e é totalmente previsível não pode ser grande coisa.
   TRÁGICA OBSESSÃO de Brian de Palma com Cliff Robertson e Genevieve Bujold.
Nos extras deste dvd um crítico francês diz que este filme de 1976, homenagem de De Palma à Vertigo, é melhor que o filme genial de Hitchcock. Melhor por levar mais a fundo aquilo que Hitch apenas aponta...Arre!!!! Este é um xaroposo e empetecado filme viagem hiper elaborado metido a grande arte. Um porre de uma chatice exemplar.
   O CÍRCULO VERMELHO de Jean-Pierre Melville com Alain Delon e Bourvil.
Uma obra-prima de 1970. Eis o grande tema de Melville: a honra entre ladrões. A amizade entre homens. Tudo aqui é perfeição. Vemos Delon, como um ladrão solitário. Ele ajuda um outro ladrão em fuga da policia. Tudo neste filme une extrema aridez, completa virilidade, com rigor e poesia não aparente. Imensa influência sobre os filmes de Hong Kong. Cada take é uma aula de cinema. Nota MIL.
   TÉCNICA DE UM DELATOR de Jean-Pierre Melville com Belmondo.
Uma complicada trama sobre um dedo duro, um assassinato, policiais e mulheres fatais. Belmondo dá um show como um alcagueta que anda pelo mundo do crime com nervos de aço. Tarantino sabe este filme de cor e não à toa este filme tem passagens que ecoam no episódio de Butch e Fabienne em Pulp Fiction. Muito jazz e muito ritmo e um suspense que explode em seu final sublime. Nota MIL.
   DOIS HOMENS EM MANHATTAN de Melville
Este é ruim. São dois jornalistas tentando encontrar em NY um diplomata sumido. Cenas noturnas de NY em 1959 não salvam este filme de roteiro fraco.

O ROSTO DE DEUS--- ROGER SCRUTON, MEU ROSTO E O SEU.

   O rosto é aquilo que faz de nós seres distantes dos objetos. Por causa dele, de sua individualidade e de sua mutabilidade, sentimos uma insuperável distância dos animais. Bichos não têm rosto. Apenas no mundo da Disney. Ou quando os enfeitamos com nosso olhar amoroso.
  Um corpo, mesmo o corpo humano, é objeto. Olhamos para um corpo sem cabeça como olhamos para uma coisa. Esse corpo pode ser belo ou feio, grande ou pequeno, mas nada diz. Um corpo desperta apenas dois sentimentos: indiferença ou desejo de posse. O corpo sem rosto é quase o mesmo que a comida. Fome que pode ser saciada por qualquer outro alimento.
  O amor é rosto, porque ao contrário do alimento, da comida e da fome, somente aquele único rosto pode saciar meu amor. O amor individualiza a pessoa. Só ela é o que ela é. O corpo é intercambiável. O rosto jamais.
  Em nossa sociedade astros pop escondem o rosto por detrás de óculos ou numa pose "de gato morto". O rosto torna-se um vazio. Modelos de passarela usam o rosto como fantasma. E pior que tudo, na pornografia o rosto só aparece para ser humilhado, profanado, escarrado. Vivemos a ditadura do corpo e a negação do rosto. E isso se liga diretamente a negação da individualidade, da alma, do sagrado. O corpo é animal. O rosto é o mistério, e por isso, é o rosto o centro do erótico.
  Roger Scruton desenvolve com simplicidade e clareza esse argumento. Ele baseia suas ideias em pensadores: Kant, Platão, Merleau-Ponty, Hegel, Wittgeinstein...Scruton desmascara a neurociência, a psicanálise, o marxismo. Para ele todas essas "ciências" são como brinquedos, fáceis de usar e de fantasiar com elas. Elas alimentam a ilusão. Mas trazem um perigo: a transformação do homem numa "sopa química", num acidente genético, num símio que pensa que sabe, numa máquina de desejo.
  Sabemos que algo em nós não aceita a sopa e a máquina. Sentimos que o rosto é mais que o corpo. Que o eu é único, particular, ilimitado. E que esse eu só existe perante um "você", o outro rosto, também mistério e particular. Para Scruton o ato de ser humano se explica pelo EU, a identidade que não existe em nenhum animal, o ato de observar a si-mesmo. O eu vive no limite, à margem das coisas, fora do mundo, fora inclusive do corpo. O eu olha de fora, percebe, sente, decide, analisa. Fora, fora e dentro, indefinido quanto a lugar e tempo.
  Um livro de 200 páginas de um autor central de nosso tempo e que só agora, agora que a direita deixou de ser um palavrão, começa a ser lido neste Brasil véio. Bem vindo ingleses. Vocês sabem pensar.

ROGER SCRUTON

   Meu amigo Léo. Que maravilha esse livro do Roger Scruton ! Bom ler um cara vivo que fala como um mestre. Ele é um dos maiores intelectuais conservadores do mundo. Inglês. Diz que a filosofia inglesa se baseia na discussão que busca a verdade. E que existem filosofias que aumentam a nuvem da confusão.
  Scruton fala aqui de religião. Sem ortodoxia. Aliás, ele tem um pensamento, dentre vários, brilhante: "Toda crença que persegue seus desafetos não tem certeza de sua verdade". Ele cita o marxismo e o freudismo como exemplo de fés inseguras.
  Ele fala de rostos. E critica a pornografia, imagens sem rosto, mais que isso, que odeiam a face humana.
  Ainda estou na página 50. Mas caramba!!!! É bom pacas!

LLOYD COLE.Chelsea Hotel.



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I'M YOUR MAN, A VIDA DE LEONARD COHEN- SYLVIE SIMMONS

   O Brasil se tornou um país tão chato, que penso que um colega meu da USP poderia ver na vida de Leonard Cohen apenas um caso de um privilegiado burguesinho, que sem se preocupar com dinheiro passou todo seu tempo sem saber como vencer o tédio existencial. Esse colega ainda acrescentaria que Leo foi um alienado, tendo passado indiferente a décadas de revolução social. O mundo dele foi apenas seu próprio umbigo. Mais o coração e o pênis.
   Eu escutaria esse colega falar e diria que ele está certo. Nada do que ele disse é mentira. Leo foi apenas isso. Também. Mas, como sempre ocorre com o modo raso de pensar, meu amigo esqueceu, ou não percebeu, diria que evitou perceber, que o umbigo, o coração e o pênis de Cohen podem ser os mesmos de toda uma população. E que para certos artistas, falar de si-mesmo é falar de uma nação.
  A vida de Cohen é movimentada. Mas não é interessante. Talvez seja a falta de talento da biógrafa ( a mesma de Gainsbourg ). Cohen viaja, pensa, foge, tem N amores, medita, pira, mas a impressão que temos é a de que ele evitou viver. Escrevi acima a palavra "foge". Leonard Cohen fugiu todo o tempo. Ele fugiu da fama, de compromissos, fugiu o quanto pode da paternidade, fugiu do judaísmo e do budismo e do hinduísmo. Ele evitou hippies mas também a turma de Warhol. Fugia do Canadá, de LA, de NY e da Grécia. Fugiu da mãe. E ao mesmo tempo foi profundamente ligado a tudo isso que citei. Cohen nunca corta laços, ele os acumula. Amizades para sempre. Amores para sempre. Ele diz em entrevistas não olhar para trás, ele não precisa fazer isso, ele nunca deixou nada atrás de si.
  Do livro as melhores histórias são as da meninice. E depois o começo, com Judy Collins, David Crosby e até Nico e Jackson Browne. Não sabia que ele tomava LSD. E não sabia que ele era tão deprimido ( coisa de judeu...acho ). Conheço bem a depressão e entendo o medo de compromisso. A sensação de que tudo vai acabar um dia. Para que então começar se vai acabar... E ao mesmo tempo o amor pela solidão, o pavor de depender, e a incapacidade de romper laços. Leo tem tudo isso. Me veja às vezes nele. Mas a música de Cohen é do tipo que eu jamais faria. É desanimada. Entenda, Leonard Cohen é real, um talento imenso, um escritor que fez pop, e isso é muito raro. Mas ele é pai de um monte de gente chata que bebeu em sua fonte. Cohen autorizou cantores ruins e tristes a confundir tristeza com talento e má voz com sinceridade.
  Meu primeiro contato com Leo foi já neste século. Na trilha sonora do filme de Altman, McCabe e Miss Miller. Até hoje acho a melhor coisa que ele fez. Antes eu apenas o conhecia por nome. Pensava que ele fosse um tipo de Randy Newman mais amargo. Não. Cohen é um religioso. Sua obra é uma prece e sua obra uma ode bíblica. Ele canta para Deus e só para Deus. Há interioridade verdadeira nele. E nada menos americano que interioridade, daí seu sucesso tardio por lá. ( Não esqueçamos que as religiões americanas são todas "para fora". Elas cantam e berram, evitam o silêncio ).
  Estranho Canadá. Neil Young, Joni Mitchell, The Band...se tivesse de escolher uma palavra para definir todos eles diria solidão. Ou, mais ainda, ético.
  Não é um bom livro.