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LORAX/ BETTE DAVIS/ NICHOLAS RAY/ SIRK/ STATHAM/ WENDERS

   O INTOCÁVEL de Boaz Yakin com Jason Statham
Adoro os filmes de Jason. Não são hiper produzidos, eles têm ação real e Jason luta como um chinês. Sabe se mover e tem leveza. Aqui ele é um lutador a beira do suicidio que é salvo ao se involver com uma menina chinesa que está sendo usada por mafiosos russos. Nada de especial no roteiro, mas a ação é de primeira. Uma diversão sem culpa. Nota 6.
   O LORAX de Chris Renaud
É bom. Como todo desenho, tem uma mensagem certeira. No futuro tudo é de plástico e tudo é bonito e limpo. Mas por detrás disso, há um mundo destruído e morto. O ar é vendido por uma corporação que deseja manter tudo como está. Bem... como escrevi em outro lugar, crianças hoje carregam a missão de nos resgatar. Vejam o que fizemos kids! Reajam, pois nós desistimos. Eis a mensagem. É uma bela mensagem, claro. Melhor isso que o niilismo acomodado dos filmes adultos. Mas caramba! Um dia voltarão a fazer desenhos  bobos e infantis? Nota 6
   PETER PAN  de Wilfred Jackson e Disney
Mítico. São dezenas de mensagens cifradas, montes de possibilidades poéticas. O menino que não quer crescer e a menina que não pode deixar de crescer. Alguém se vê neles? Bem vindos ao mundo de 2012. Não é uma obra-prima, mas é um ícone. Nota 8.
   UM AMOR DE TESOURO de Andy Tennant com Mathew McConaughey, Kate Hudson e Donald Sutherland
Um casal brigado acha tesouro. Mas tem de disputar a descoberta com rivais "do mal". O cenário é estupendo. O filme é um café. Voce vai em um restaurante com sua namorada, vê umas vitrines e por fim assiste este filme. Um café: gostoso e tirado às dúzias toda hora. Mathew é simpático. Em tempos de melhores filmes pop ele seria rei. Kate envelhece mal. Sua mãe era melhor em tudo aquilo que ela tenta fazer. Donald apenas está lá. O filme não é ruim, é bobo. Nota 4.
   ALMAS MACULADAS de Douglas Sirk com Rock Hudson, Dorothy Malone e Robert Stack
Um repórter alcoólatra se envolve com casal de aviadores de circo. São aqueles pilotos que se exibem em circos, fazem corridas e se arriscam. O filme mostra a condição patética do repórter. Ele ama sem ser amado, é desprezado pela mulher que ele ajuda. Se destrói. Mas ao final, é ele quem dá a volta por cima. Não é dos melhores Sirk, mas tem um Rock Hudson bem dirigido ( quem falou que ele era mal ator? ) e aquele clima fatalista que esse excelente diretor sabia tão bem criar. Nota 7.
   PINA de Wim Wenders
Assisto mais uma vez e gosto mais ainda. Acachapante. A primeira cena com Stravinsky já te deixa zonzo. O filme não é apemas bom. Ele é uma aula emocionante sobre arte. O limite, a expressão e o risco. Pina Bausch ousava, errava, repetia, acertava. Os dançarinos-atores são magos. Cenas com água, humor com cachorro que late, mulheres que caem, retratos de sofrimento e de alegria. O filme te derruba, te impressiona. Os corpos vão ao limite. A alma se entrevê. Lindo. Nota 9.
   AMARGA ESPERANÇA de Nicholas Ray com Farley Granger e Cathy O'Donnell
Famoso filme de Ray que antecipa a Nouvelle Vague. Godard amava este filme e há muito de Acossado nele. Sobre um ladrão que não consegue sair do mundinho podre onde ele vive. Mas o filme não é centrado em roubos ou em tiros, o que vemos é uma hiper triste história de amor. Amor tragédia, fadado ao absoluto fracasso. Nos incomoda ainda. É invulgar, original e melancólico. Nota 7.
   MULHER MARCADA de Lloyd Bacon com Bette Davis e Humphrey Bogart
Atenção. Não é um tipico filme de Bogey. Ele aparece pouco e faz um promotor do bem. O filme é de Bette, ainda bonita e sexy, que faz uma prostituta que é usada por gangster. O que vemos é sua conscientização. O filme é esquemático e sem muito apelo. Mas é um prazer ver Bette em ação. Uma diva imensa, a única que poderia trombar com Kate Hepburn e vencer. Um filme curto, grosso e direto. Típico Warner anos 30. Nota 6.

MARIGOLD/ KLINE/ ERROL FLYNN/ WYLER/ JOE CARNAHAM/ MAGGIE SMITH/ CURTIZ

   O EXÓTICO HOTEL MARIGOLD de John Madden com Judi Dench, Bill Nighy, Maggie Smith e Tom Wilkinson
Fez algum sucesso no começo deste ano este filme que traz uma seleção de veteranos atores da Inglaterra. Todos são excelentes, mas o filme é um tédio! Madden se inscreve na lista dos piores diretores a um dia terem ganho o Oscar. Lembro de Delbert Mann, John G. Alvidsen, Anthony Minghela, Danny Boyle e provávelmente Bigelow entrará nessa lista. Um grupo de aposentados vai à India na esperança de se hospedar em belo hotel. O hotel é um lixo, eles se envolvem com a vida caótica do lugar e etc etc etc. Maggie Smith é eterna. Quando comecei a me interessar seriamente por cinema, lá por 1978, ela já era uma anciã!!!! Foi revelação no grupo de Olivier, em 1962.... Que ela ainda viva muito!!!! Nota 1.
   OS ACOMPANHANTES de Shari Springer Berman e Robert Pulcini com Kevin Kline, Paul Dano, Katie Holmes e John C. Reilly
Um jovem que é fascinado por Fitzgerald e os anos 20. Ele se hospeda com um excêntrico autor de teatro que trabalha como acompanhante de velhas ricas. O jovem não sabe se é gay ou hetero. Se veste de mulher. Well....é o mundo dos filmes alternativos made in Hollywood. Mas este até funciona. Não sei se ainda está em cartaz em SP, se estiver vale ver. Principalmente por Kevin Kline. Ele compõe um dos mais deliciosos personagens de sua rica e longa galeria. Kline não é muito do hype. Nunca foi doidão e sempre preferiu o teatro. Mas é o maior de sua geração ( aquela de Malkovich, William Hurt, Ed Harris, Dennis Quaid e Kevin Costner ). O modo como ele fala, se move e cria tiques e toques, e sempre mantendo o modo realista do personagem, nunca fazendo dele um cartoon, é fantástico. Veja e se divirta. Nota 6.
   FAUSTO de Alexander Sokurov
Eu jamais verei este filme de novo. Passada uma semana, do que me lembro? Nuvens, brumas, frases confusas, sujeira. Sokurov fez sua opção e a levou até o fim. Errou. Nota 2.
   CARAVANA DE OURO de Michael Curtiz com Erroll Flynn, Miriam Hopkins, Randolph Scott e Humphrey Bogart
Para curar a mente das bobeiras do "cinema de arte", nada como o cinema dos anos 30. O que define esse tipo de filme é sua falta de afetação. Observe este western. Um milhão de coisas acontecem em hora e meia. Lembro de aos 30 minutos pensar: "Caramba! Quanta coisa já aconteceu!" É um cinema de roteiro, de narrativa. Aqui estamos na guerra de secessão. Agentes do sul planejam levar ouro de estado do norte. Flynn é o nortista espião. Leva o filme com sua característica leveza. Ele é o paradigma daquilo que conhecemos como herói-bem humorado. Bogart faz um bandido de bigodinho. O filme foi feito antes de Casablanca e a Warner ainda não sabia do ator-ouro que tinha nas mãos. Há uma cena em carruagem onde Bogey assalta Flynn, Scott e Miriam. Eu juro que dá pra sentir o carisma de Bogey faiscar. Ele rouba a cena de Flynn, o que é muito dificil. O filme é uma delicia. Nota 8.
   A PERSEGUIÇÃO de Joe Carnaham com Liam Neeson
Tinha esperanças. Alguns criticos botaram nas nuvens esta pretensa aventura. Neeson e outros estão perdidos no Alasca após a queda de seu avião. Lobos os perseguem. Carnaham tem vergonha de fazer um filme de "mera aventura". Entope as cenas de "invenção". Um pé no saco! Nota ZERO
   INFÂMIA  de William Wyler com Merle Oberon, Miriam Hopkins e Joel McCrea
É um dos filmes que melhor exibe a maldade da infância. Duas amigas fundam uma escola feminina no campo. Uma das alunas inventa uma calunia sobre elas e as duas perdem tudo. O filme dá raiva. Odiamos a menina e seu sadismo. Wyler, tenho de dizer de novo?, é considerado o mais inteligente dos diretores da América. Ganhou 3 Oscars na carreira e é o recordista de indicações. Um mestre. Este filme é baseado em peça de Lillian Hellman. No palco a acusação era de lesbianismo, neste filme de 1936, se amenizou tudo e a acusação é de "triângulo amoroso". Nos anos 60 Wyler refez o filme, com menos censura, e o resultado foi ainda melhor. Mas mesmo assim este é um drama que consegue ainda despertar raiva, muita raiva. Nota 7.

RAYMOND CHANDLER E O ADOLESCENTE EM NÓS

   Raymond Chandler cresceu como um almofadinha. Um menino mimado que estudou na Europa. E então, surpreendentemente, se viu na maturidade como pai de Marlowe, um dos detetives durões da literatura noir. Chandler era o oposto de Marlowe. Marlowe era aquilo que Chandler imaginava que seria o "ser um homem". E nessa atitude adolescente reside o fato de ele ser tão importante até hoje. Ele dá voz ao sonho de QUASE todas as gerações mimadas do pós-guerra. Escreveu aquilo que todos nós imaginamos ser a real vida do homem urbano de ação. Uma rede de ladrões, prostitutas, falsas virgens, ricos sacanas e solidão estóica. Tudo bobagem. A realidade de Chandler é tão real quanto o cinema de Tim Burton. O que eles criam é bom, muito bom, mas é irreal. Chandler trabalhou o sonho de adolescentes de 1945. Burton, com seus filmes que são todos como quartos vitorianos de bebês insones, deu imagem ao sonho ruim de teens de 2000.
   Hammett é muito mais sólido que Chandler. Porque Dash esteve lá. Foi detetive e foi parte da sordidez. Chandler tem um pé na tradição inglesa do conto de detetive. Ainda há algo de mental nele, de puramente dedutivo. O problema é que Chandler é fraco em lógica. Seu mistério nada tem de tenebroso. A solução do crime é sempre frustrante, não se produz o "Ah!" de Conan Doyle. A arte de Chandler reside em sua descrição. Acabamos por penetrar e fazer parte do ambiente que ele descreve. Após ler Chandler nos sentimos muito mais machos. Intuitivamente ele tocou no nervo adolescente de todo proto-homenzinho urbano. O desejo de ser um cafetão, um jogador de poker de beira de porto, um velho marujo, enfim, um cara frio vivendo em perigo, um cara com história pra contar.
   Esse tipo de ideal está hoje quase extinto. Mas foi lei em várias décadas. Penso que foi substituído pelo ideal do homem saudável. Nada de cafetão, jogador ou marujo. O cafetão lembra aids, o jogador lembra cigarro e doença mental e o marujo é um velho com câncer de pele. Mas entre 1945 e 1985 essa ideia do homem marcado, meio sujo e muito estiloso era o objetivo. Chandler ajudou a criar esse ideal.
   O cinema adorou. Chandler escrevia ao estilo "cortes e sets". Pedia por um ator tipo Bogart ou Lancaster ( na verdade ele sonhava com Cary Grant, o que mostra a diferença entre Hammett e ele ).  Quando Marlowe surgiu nas telas na pele de Humphrey Bogart estava completo o feitiço. Todo homem com cojones seria Bogey.
   Autores policiais continuam a seguir a trilha de Chandler. E de Hammett, Cain, Goodis... Irônico é pensar que o melhor autor no estilo noir acabou sendo Patricia Highsmith, uma mulher....
   Ler Chandler hoje é lembrar de uma masculinidade perdida. Fria, sórdida, cheia de bebida, fumaça e ruas escuras. E que traz embutida uma nobreza modesta, a sensação de um dever que será cumprido. É um mundo que nunca existiu. Mas a qualidade de uma época não seria medida pela ilusão criada?

EM BUSCA DE MEU PAI- STEPHEN HUMPHREY BOGART

   O American Film Institute, em 2008, elegeu pela terceira vez seguida, Humphrey Bogart como a maior estrela masculina do cinema. Kate é a atriz, e Bogey deixou para trás Cary Grant, Spencer Tracy, James Stewart e Gary Cooper, ( dos atores em atividade o melhor colocado é Jack Nicholson, ele é o 17 ).
   Como é ser filho do mito? Stephen é o único filho homem de Bogey e este livro é um ajuste de contas entre os dois. Pois Stephen, hoje produtor da ESPN, cresceu com um imenso rancor em relação ao pai. O motivo é muito simples, Bogey morreu aos 56 anos e Stephen tinha apenas 8. O que o filho mais queria o pai não pode lhe dar: tempo.
   Humphrey Bogart era um homem à antiga. Ele gostava de estar com sua turma, com seus amigos homens ( Huston, Sinatra e Spencer Tracy eram os mais íntimos ), o negócio dele era whisky, cartas, bares e piadas. Bogart falava sem parar, adorava provocar, dizia sempre o que pensava e por causa da lingua solta, vivia se metendo em brigas. Adorava ser ator e quando tinha tempo livre, se dedicava a seu maior amor: navegar. Humphrey Bogart era louco pelo mar e acima de qualquer coisa, se dedicava a seu veleiro, o Santana. E o tempo para seu filho?
   Quando se casou com Lauren Bacall, 25 anos mais jovem que ele, Bogey já tinha 45 anos. Ja´fora casado 3 vezes, e em seu último casamento fora muito infeliz. Mayo Method, alcoólatra, tinha a mania de jogar copos, pratos e facas nele. Mas eram ótimos na cama, e ele aguentou 8 anos. Foi pai pela primeira vez aos 48, e é cômico ver a falta de jeito que Bogart demonstra com crianças. Vários amigos dizem que ele olhava para Stephen como se o filho fosse um tipo de ET. Essa distância, esse tempo apressado que o pai passava com ele, marcaram Stephen. ( O que o marcou também é ter crescido com milhares de pessoas lhe dizendo: "Esse é o começo de uma bela amizade", " Toque de novo Sam", "Sempre teremos Paris", ou lhe provocando: "Então voce é o filho de Bogey? Vamos ver se voce é durão...").
   Há uma história engraçada que demonstra quem foi Bogart. Uma vez um amigo pediu para que ele tomasse conta de seu filho, só por duas horas. Apavorado, Bogey perguntou: "Mas o que eu falo com ele?", o pai disse: "Sei lá...voce é o padrinho dele, fale de religião". Quando o pai voltou, duas horas depois, viu Bogart sentado dizendo para o garoto: "Então Kid...existem dez mandamentos, certo?"
   Humphrey Bogart era filho do mais famoso cirugião de New York, e de uma renomada ilustradora de revistas. Cresceu em casa com mordomo e chauffeur. Aos 8 meses de idade, Bogey se tornou famoso em todo o país, sua foto foi usada como rótulo de comida de bebês. Mas seus pais não se davam e Bogart cresceu ouvindo suas brigas.
   Ele serviu na primeira guerra e era um aluno culto e bom leitor, porém indisciplinado e brigão. Foi na guerra, que num acidente bobo, ele feriu seu lábio, que ficou paralisado. De volta pra casa, tentou vários empregos, até que um dia, um amigo, filho de um amigo de seu pai, o levou para o teatro. Bogart foi contra-regra, assistente de direção e ator. Começou fazendo pontas e era ridicularizado por alguns críticos. Aos 30 anos se destacou na peça A FLORESTA PETRIFICADA, e quando ela foi levada para o cinema, lá estava Bogart.
   Sua atuação nesse filme é das coisas mais fortes que já vi em cinema. Ele entra em cena e o resto desaparece. Mas a Warner não soube usá-lo e Bogart passa anos como coadjuvante, fazendo papéis de bandido e de vilão. Até que Raoul Walsh e depois Huston lhe dão a grande chance. Bogart estoura e se torna o ator mais bem pago da Warner. Em 1956 morre de câncer. Tinha 56 anos. Como estrela ele só viveu 15 anos. Quando fez O FALCÃO MALTÊS já tinha 41.
   Quando Bogart morreu, as grandes estrelas do cinema eram Marlon Brando, John Wayne, Burt Lancaster e William Holden. E nos anos 40, essas estrelas eram Gary Cooper, Cary Grant, Henry Fonda, Clark Gable e Tyrone Power.  O mito Bogart nasce após sua morte. Quando ele morreu, o que se noticiou foi a morte de um bom ator, um ator digno, durão, único, mas não um mito. Ninguém se matou por ele, ninguém desmaiou. No enterro, discreto, estavam apenas os amigos, Huston, Sinatra, Kate e Spencer Tracy. O que fez dele um mito?
   Uma corrente diz que o mito nasce com Godard e o filme ACOSSADO. Jean-Paul Belmondo idolatra Bogey no filme e depois em ALPHAVILLE temos essa idolatria repetida. Stephen discorda. Para ele o mito nasce logo em seguida a sua morte. Nasce no MIT e em Harvard, com um festival Bogart organizado para o homenagear. As sessões lotam e mais incrível, durante os filmes os estudantes repetem os diálogos, vão às sessões vestidos de Bogey e assistem os filmes dúzias de vezes. Logo universidades de todo o país fazem festivais Bogart. Nascia o mito.  Será?
   Há também uma terceira corrente, que diz que Bogart encarnou, sem querer, o "espírito do século". No rosto de Bogart se espelha o homem que viu tudo, que sofreu tudo, e que descobriu que a vida não pode e não deve ser levada a sério. Ele é o existencialista encarnado, personagem de um mundo vazio, ele pega a vida nas mãos e faz dela o que quer e o que pode fazer. Será?
   Stephen ainda fala de uma outra tese, a que fala que Bogey representa o pai que todos nós perdemos. Ele é o adulto que nos dá segurança, é o modelo viril a ser seguido.
   Penso que é tudo isso junto. Um mito não se faz com um fator. É uma soma de várias teses, de acasos e de acertos propositais. O que sabemos é que dá para se fabricar uma estrela, mas jamais um mito. O mito escapa ao controle da razão. ( E cá entre nós, Bogart era baixo, feio e careca. Se fosse para escolher um mito seria muito melhor Cooper ou mesmo Errol Flynn ). Mas ele é um mito. Crianças que nasceram no Brasil, décadas após sua morte, que foram expostas a Beatles, Hendrix e Bob Marley, a tantos outros "mitos", descobrem Bogart, que aparentemente seria tão estranho a elas como Carlos Gardel, e se descobrem adorando seus filmes e imitando seu estilo. Isso e´fantástico, isso faz de um ator um mito.
   Por fim, após a reconciliação com seu passado e com a imagem de seu pai, Stephen descobre que Humphrey Bogart era Humphrey Bogart. Que o segredo de Bogey é o fato de que por mais que se escave, o que se encontra não é surpreendente. Ele não tinha um lado gay, não era comunista ou nazista, não se drogava, não deixou filhos ilegítimos. Tinha sim, um lado muito culto que disfarçava com palavrões, mas era exatamente o Rick Blaine de Casablanca: duro, viril, desencantado, lingua solta, macho romântico, lider. E quando um ator consegue ser na vida o que ele é na tela, bem... o caminho para o mito se torna muito mais natural.
   PS: Veja qualquer filme com Bogey. Repare como quando ele entra em cena toda a sua atenção se volta para ele. Voce fica na expectativa, voce fica esperando pelo que ele vai falar e fazer. Isso faz de um ator uma estrela. E para isso não há curso que dê conta. 

CLINT EASTWOOD/ JEWISON/ HELEN MIRREN/ DE NIRO/ HUMPHREY BOGART/ TRUMAN CAPOTE/ JENNIFER JONES

   CAÇADOR BRANCO de Clint Eastwood
É o filme em que Clint faz o papel de John Wilson, diretor de cinema que parte à Africa para fazer um filme. É lógico que esse diretor é John Huston e que o filme é UMA AVENTURA NA AFRICA. Em 1989 foi este o filme, feito após Bird, que calou a boca da crítica que via em Clint um mero Charles Bronson que dirigia. O filme é belíssimo e tem uma grande interpretação do Eastwood ator. Nota Dez.
   ROLLERBALL, OS GLADIADORES DO FUTURO de Norman Jewison com James Caan
Eu odiei muito este filme! E o pior é que ele foi refilmado recentemente ( e foi um fiasco outra vez ). Fala de um futuro onde grandes corporações dominam tudo. E regem um esporte, o Rollerball, tipo de patinação onde vale tudo, inclusive matar. Jewison, que fez alguns bons filmes nos anos 60, erra feio aqui. Tem todo um pseudo-clima de 2001, uma seriedade tola, um visual pessimista e personagens desinteressantes. Um trombolho insuportável. Fuja!!!! Nota Zero.
   A TEMPESTADE de Julie Taymor com Helen Mirren, Chris Cooper, Alfred Molina, Djimon Noujou, Tom Conti e David Strathiam
Tenho uma enorme dificuldade para falar deste filme. O motivo principal é que sou apaixonado pela peça de Shakespeare. A Tempestade é uma sinfonia de poesia com algumas das mais belas falas já pensadas por um homem. É um texto canônico. Pois bem, Taymor toma algumas liberdades com a peça. Primeiro transforma Próspero em Próspera. Helen Mirren faz o papel. O mago que domina uma ilha se torna maga. Ok. Mas... porque? Segunda mudança: Miranda, a filha de Próspero/a vira uma magrelinha típica de filmes como Crepúsculo. E é óbvio que tanto Ariel como o amado de Miranda usam rostos e roupas de filmes teen. São todos péssimos. O filme abusa de efeitos especiais, luta para ser atraente aos jovens novos- românticos- tristinhos. Se torna um tipo de Shakespeare vampiro- pop. Em papéis menores, bons atores, atores que fiz questão de citar. E uma criação maravilhosa de Djimon Noujou, um Calibã cheio de lama e de ira, meio bicho, que domina o filme. Observe o modo como ele olha, como ele move o corpo. Uma pena o resto do filme não acompanhar esse nível. Julie Taymor faz concessões sobre concessões. Nota 3.
   OS ESPECIALISTAS de Gary McKendry com Jason Statham, Robert de Niro e Clive Owen
Os filmes de ação têm dois problemas hoje. O primeiro é a falta de vilões "aceitáveis". Os bandidos não podem ser mais simples comunas ou ladrões do terceiro mundo. Uma série de tabus, de leis do politicamente correto impede a criação de bandidos que não sejam parte do próprio país produtor do filme. Assim, os vilôes hoje são sempre parte de alguma corporação americana ou de algum grupo de ex-agentes ocidentais. Aqui os vilões são ex-soldados ingleses. Usando isso, faz de conta que o filme é "consciente". Eu prefiro a liberdade escapista de antes, os bandidos eram do mal e pouco importava de onde eles vinham ou de que raça haviam surgido. O segundo problema é aquele que aflige todo filme de ação desde que o cinema existe, a incompreensão do público "inteligente". Desde os anos 20 que filmes de ação são chamados em seu tempo de descerebrados, para trinta anos depois serem chamados de clássicos. Foi assim com Raoul Walsh, com Hawks, com Curtiz e com Hitchcock. Foi assim com Spielberg e Ridley Scott. Em seu tempo todos são chamados de vazios ou infantis, depois de algum tempo se descobre seu charme, sua eficiência, seu apelo. Creia-me, o western em seu tempo era tratado como lixo, assim como os filmes de pirata e de espiões. Hoje são o melhor do passado. Dito isso, este filme nunca será um clássico e jamais se tornará um novo Bullit ou Dirty Harry. Mas me divertiu e me deixou ligado. Jason nasceu para ser o "solitário", o cara que se vira sózinho. De Niro, pasmem, está aceitável como um velho assassino. É bacana ver em meio aquelas rugas e barba branca o velho olhar de MEAN STREETS. É o homem que fez Taxi Driver!!!! E temos Owen, que insiste em seu olhar de pedra e voz de robot. Funciona. Mas continua a me incomodar estes tempos em que assassinos assumidos são aceitos como "heróis". Matar é bonito? É cool ? Nota 6.
   O DIABO RIU POR ÚLTIMO de John Huston com Humphrey Bogart, Jennifer Jones, Robert Morley, Gina Lollobrigida e Peter Lorre.
Vejo pela terceira vez o muito famoso filme escrito por Truman Capote para John Huston. Foi o maior fracasso da vida de Huston ( que é cheia de fracassos ), é o grande "magnífico fiasco". Mas aconteceu algo de surpreendente com o filme, e com o tempo, a partir dos anos 70, ele foi criando uma fama de cult, de filme adiante de seu tempo, de modernismo radical. Hoje é chamado de obra-prima. Não é. É uma coisa estranha, carnavalesca, viva. De alegria estremada, fala de grupo de malandros, que ancorados na Itália, tentam dar golpes. É famoso o modo como ele foi feito. O roteiro era escrito por Capote no hotel, noite adentro, Huston pegando as folhas e as filmando pela manhã. Bogart nada entendia e acabou por brigar com Huston ( Bogey era o produtor e perdeu muito dinheiro com o filme ). Jennifer Jones está maravilhosa, de peruca loura, fazendo uma mentirosa obsessiva que seduz Bogey e é traída pelo marido. Todos os atores estão excelentes e são tipos engraçadíssimos. O filme é cheio de cenas hilárias. Há um naufrágio, árabes no deserto, policiais italianos e cenas de pastelão. Uma festa, mas... há algo nele que não funciona. As cenas não se grudam umas as outras, o filme parece não andar. É estranho, o filme é fascinante, nada intelectual, leve e alegre, mas ao mesmo tempo ele é truncado, sem rumo, vago. Sem dúvida um dos mais originais. Nota 7.

HUSTON/ BOGART/ HITCHCOCK/ SAM SHEPARD/ POWELL/ DIETRICH/ HARRISON FORD

   UMA AVENTURA NA ÁFRICA ( THE AFRICAN QUEEN ) de John Huston com Kate Hepburn e Humphrey Bogart
Alguém não conhece a história? Na África alemã, em plena guerra, Kate, uma missionária, tem sua igreja destruída pelos germanos. Bogey é um grosseiro barqueiro que a tira de lá. Na viagem que os dois fazem pela África ( a African Queen é o nome da velha barcaça enferrujada ), vemos o encontro de dois tipos distantes: uma senhora bem comportada e rígida e um ingênuo beberrão das classes mais baixas. O filme deu o Oscar de ator a Bogey ( derrotando Brando em "Um Bonde..." ). Peter Viertel escreveu um livro sobre as filmagens. A equipe isolada na mata, insetos, água contaminada, caçadas, tribos hostis. Clint Eastwood fez um excelente filme sobre a feitura deste filme. Clint faz um ótimo John Huston. O filme é ingênuo, tem sabor de velhas matinês, de sessões de cinema com muita pipoca e poltronas de veludo. Os dois atores estão brilhantes, Kate dando um show fazendo um tipo de velha de igreja que aos poucos se encanta com a aventura e cai de amores por Bogey. Bogart domina o filme. Faz um tipo de grosseiro sujo de bom coração. É bonito ver como ele vai perdendo a vergonha e começa a encarar aquela senhora fria como uma mulher. Um clássico. Nota DEZ.
   PAVOR NOS BASTIDORES de Alfred Hitchcock com Jane Wyman e Marlene Dietrich
No livro de Scorsese ele tece imensos elogios a O Homem Errado, um dos filmes de Hitch menos conhecidos e dos melhores. Este também é pouco conhecido, mas não é dos melhores. Há uma falha da qual Hitch nunca se perdoou: um falso flash-back no começo. Nesta história em que devemos descobrir quem é o assassino falta um vilão mais forte, mais absorvente. Nota 6.
   AS 3 FACES DO MEDO de Mario Bava
No começo dos anos 60 houve uma voga de filmes italianos de horror. Filmes baratos, exagerados, cheios de clima. Bava foi um dos principais nomes desse momento. Aqui temos três histórias de medo  e de desespero. A primeira é fraca, mas as outras duas são muito boas. Há a história de uma aldeia assombrada por vampirismo. Um visual maravilhoso ( e cliché ) leva nossa atenção até o fim. Mas a terceira história é realmente assustadora. Fala da maldição sobre uma ladra de cadáver. Bava cria um horrendo clima de pesadelo. É quase uma obra-prima. Na média, nota 7.
   ASSALTO EM DOSE DUPLA de Rob Minkoff com Patrick Dempsey e Ashley Judd
Se voce desculpar a infantilidade das falas e a tolice da situação poderá até se divertir. É sobre um assalto duplo a banco. Um bando hiper modernoso e organizado, e uma dupla de caipiras fazem esses dois assaltos. Dempsey é um "esquisito" que estava lá e Judd a caixa do banco. É uma comédia. Ok dá pra passar uma sessão razoável no cinema. Pelo menos ele é curto e não tenta ser "de arte". Minkoff dirigiu 'Stuart Little". Judd, que sempre foi belíssima, está perdida no filme, seu papel é quase nada. Nota 5.
   BLACKTHORN de Mateo Gil com Sam Shepard, Stepehen Rea e Eduardo Noriega
Todo diretor sonha em fazer seu western. É uma questão de honra. Aqui temos um western espanhol com equipe americana. Duvido que passe nos cinemas daqui. Fala de Butch Cassidy. Mas não é um tipo de continuação do célebre filme com Paul Newman e Redford. Vemos Butch morando na Bolivia, velho. Ele resolve voltar aos EUA. Mas nessa tentativa de retorno se envolve com ladrão espanhol e tudo acaba dando errado. Porque todo western de hoje tem de ser triste? Pudor de fazer um simples faroeste escapista? Shepard dá dignidade ao papel. É um cara admirável. Autor de teatro, escreveu o roteiro de Paris Texas de Wenders e de Zabriskie Point de Antonioni. Foi o herói, perfeito, em The Right Stuff ( o Chuck Yeager que ele faz é inesquecível ), e se casou com Jessica Lange!!! Que cara!!! Mas este filme é meio flácido. Nota 5.
   CAVALGADA TRÁGICA de Budd Boetticher com Randolph Scott
Um cowboy leva mulher que fora raptada pelos indios de volta a seu marido. Um bando de tipos suspeitos o acompanha. Budd faz westerns simples, crús, como devem ser. Mas este dvd recém lançado tem um grave problema: péssima imagem!!! As paisagens se tornam pálidas, o filme perde todo seu visual. Sem nota.
   COWBOYS ALIENS de Jon Favreau com Harrison Ford e Daniel Craig
Mais uma turma que sonhava em fazer seu western. Mas isto é mesmo um filme do gênero? Tem cowboys, cavalos, poeira e tiros, mas não tem espirito, alma, vida. É apenas uma barafunda de socos, sangue, correrria e pulos no vazio. Craig é um ator que segue a cartilha Stallone de interpretação: cara de fodão e grunhidos de besta; e Harrison Ford, o nobre herói de tantos filmes não soube administrar sua carreira, chega a dar pena vê-lo fazer escada para Craig. Se voce abstrair que aquilo tenta ser um western e esquecer que Craig tenta ser um ator, pode até rir das cenas de ação e do visual falso. Nota 3.
   O DETETIVE DESASTRADO de Robert Moore com Peter Falk, Ann-Margret, e um vasto time de bons atores.
Ann-Margret foi uma das atrizes mais sensuais do cinema. Vulgar, ferina, tola, esperta, bonita, inebriante. E Falk um grande ator, um soberbo comediante, e o "Columbo" da Tv. Este filme satiriza filmes de Humphrey Bogart e tem roteiro de Neil Simon, escritor que foi um dia ( anos 60/70 ) um tipo de rei da Broadway. Com tudo isso, o filme não engrena. Voce ri muito de algumas cenas, mas em seguida o ritmo cai. Daí voce dá gargalhadas, e vem outra vez uma longa sequencia sem interesse. É um exemplo de filme mal dirigido. Nas mãos de um Mel Brooks seria delicioso. Uma pena... Falk faz um Bogey maravilhoso. Nota 4.
   OS CONTOS DE HOFFMAN de Michael Powell com Moira Shearer
Powell... que diretor ambicioso!!! O que dizer deste filme? É uma obra de arte? É um fiasco? É lindo? É vulgar? Trata-se de uma ópera, não tem um só diálogo. Dança ( tipo ballet ) e canto. Fala de amor todo o tempo, do poeta e seus três tipos de amor, o puro, o profano e o artificial. O filme, hiper-colorido, com aquele technicolor do qual Scorsese tanto sente falta, tem algumas cenas que são de jamais se esquecer. Há uma que mostra uma carruagem estilizada que chega perto do sublime. Por outro lado tem várias cenas dignas de carnaval. O filme é todo feito em estúdio, cheio de trucagens, de fantasia ( penso no que Powell faria com os efeitos digitais de hoje ). Se voce viu Moulin Rouge sabe do que falo, Luhrman é fã deste filme. O elenco tem alguns dos melhores bailarinos da época, e se Moira Shearer é responsável pela inspiração de várias meninas que se fizeram bailarinas, Ludmila Tcherina é tão bonita que chega a parecer um pecado. O filme, cansativo, produz um efeito de sonho, e causa uma surpresa: ao assisti-lo voce se irrita com seus defeitos e se entedia com seus momentos longos, mas dias depois voce sente desejo de o rever. Powell foi um gênio. Barroco, exagerado, sem medidas, mas brilhante e jamais comum. Sem nota.
  

BILL MURRAY/ CLOONEY/ BOGART/ GRIFFITH/ LUBISTCH/ TYRONE POWER

TARDE DEMAIS de William Wyler com Olivia de Havilland, Montgomery Clift, Ralph Richardson e Miriam Hopkins
Perfeito. Atores de gênio, roteiro com diálogos soberbos e a direção sempre impecável de Wyler. Um exemplo de que é possível transformar um livro genial ( de Henry James ) em filme memorável. Mais cometários abaixo. Nota DEZ!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
DESEJOS PROIBIDOS de Max Ophuls com Charles Boyer, Danielle Darrieux e Vittorio de Sica
Talvez em termos visuais seja o filme mais refinado que já assisti. Um aula de estética e de gosto. A história exemplifica a perfeição a diferença em amor entre homens e mulheres. Elas têm mais coragem. Ophuls foi um dos grandes. Este é seu melhor filme. Nota DEZ!!!!!!!!!!!!!!!!!
UM DIA ESPECIAL de Michael Hoffmann com George Clooney e Michelle Pfeiffer
Um filme todo centrado no charme de dois atores. Para nossa alegria eles são realmente bons de se olhar. George Clooney ainda em seus tempos de ator leve e Michelle bela como sempre. O filme, sobre casal que se odeia e que passa a se amar, se deixa ver. É Sessão da Tarde clássica. 6.
RECRUTAS DA PESADA de Ivan Reitmann com Bill Murray, John Candy e Harold Ramis
Segundo filme de Murray e primeiro de Candy. Sobre dois caras que se alistam pensando ser a vida no quartel fácil. As comédias nos anos 80 viveram grande momento. É a época de Steve Martin, Eddie Murphy, Dan Ackroyd, Lily Tomlin, Martin Short, Leslie Nielsen, John Candy e ainda de Mel Brooks e Woody Allen. Mas, que surpresa, este filme não tem graça nenhuma!!!! Murray está especialmente ruim, exagerando seu tipo de malandro sonolento. Candy está ok mas aparece pouco. O diretor é o pai de Jason Reitmann e ficamos sabendo nos extras que este roteiro era para Cheech and Chong e que acabou com Bill e Harold. Tiraram as piadas sobre marijuana e a graça se foi. Uma chatice. Nota 3.
O FALCÃO MALTÊS de John Huston com Humphrey Bogart, Mary Astor, Peter Lorre
É o mais importante filme noir mas não é o melhor. Vemos aqui todo o nascimento de um gênero : música nervosa, imagens com sombras, mulher falsa, herói individualista e durão. O roteiro de Huston melhora o livro e Bogey está totalmente à vontade, ele nasceu para ser durão. Uma diversão de primeira e uma delicia para madrugadas frias e de chuva. Nota 9.
O FAVORITO DOS BÓRGIA de Henry King com Tyrone Power e Orson Welles
Filmado em palácios italianos, podemos ver a absurda beleza da renascença. O filme fala de tirania e de Tyrone como vassalo que muda de lado. King dirigia de tudo na Fox. Nunca foi genial, mas sabia fazer as coisas andarem. Tyrone era herói humano. O filme é ok. Nota 6.
INTOLERÂNCIA de David W. Griffith
Os Lumiere inventaram a imagem em movimento, Griffith inventou o cinema. Tudo o que pensamos ser "o cinema" foi idéia de Griffith : ação paralela, melodrama, correrias, cenários suntuosos ( aqui são gigantescos ), atores de carisma, movimento. Neste imenso filme ele conta várias histórias em várias épocas distintas, todas entrelaçadas. O filme ainda impressiona por sua inacreditável grandiosidade. Hoje ele seria impossívelmente caro. O cara era provávelmente louco. Ou não, seria o típico americano empreendedor do século XIX, o self-made man. Diversão que noventa e dois anos depois ainda se sustenta. Nota 7.
ENCONTROS E DESENCONTROS de Sofia Coppolla com Bill Murray e Scarlet Johansson
Revisto hoje após o burburinho da época o filme se mantém como modesto romance puritano. Nota-se algo de muito pudico em todo seu romantismo travado. É tristinho, engraçadinho, bobinho e bonitinho. Um belo raio x de uma geração toda "inha". Bill Murray faz bem Bill Murray no Japão. Scarlet está bonita e ruim. O filme é bacaninha. Nota 6.
MEU MELHOR COMPANHEIRO de Robert Stevenson com Dorothy McGuire e Fess Parker
Cachorro e família em fazenda texana do século XIX. Filme de cachorro de grande sucesso em seu tempo. Um dos clássicos da Disney. A diferença dos filmes de cachorro de hoje é que este cão é mais cachorro. Ele nada tem de criança, de humano, de tolinho. Briga com animais, foge, apronta e é absolutamente animalesco. Um bom filme. Nota 7.
EU NÃO QUERO SER UM HOMEM de Ernst Lubistch com Onny Oswalda
O instituto Goethe lança uma série de filmes mudos de Lubistch. Primeiro: é delicioso ver uma Alemanha em nada parecida com Lang ou Murnau. É um país muito alegre e de bem com a vida. O que pensamos da alegre Berlin dos anos 20 está aqui mostrado. A história, muito amoral, fala de moça que se veste de homem para poder sair a noite, e de dandy que se apaixona por esse "rapaz". O filme é hoje considerado um clássico gay. Lubistch faz tudo se parecer com champagne. O filme espuma e alegra. Nota 7.
GATINHA SELVAGEM de Ernst Lubistch com Pola Negri
Este vai mais longe. Soldados alegres, comandante bobão, batalhas de folia, rebeldes atrapalhados e muita malicia. Negri é a cara de Helena Bonham- Carter. Um detalhe histórico. Gente que é anti-americana gosta de dizer que foram os imigrantes do eixo Berlin-Vienna que fizeram Hollywood. Gente como Wyler, Wilder, Dieterle, Sirk, Lang, Murnau, Zinnemann, Preminger, e uma infinidade de roteiristas e fotógrafos. Dizem isso como se Ford, Buster Keaton, Vidor, Milestone, Fleming, Griffith, Wellman não estivessem lá desde sempre. O que se pode dizer é que os imigrantes trouxeram um tipo de filme mais urbano, mais ácido, mais sexy. Lubistch, que foi o imigrante de maior sucesso, se tornando um tipo de "dono" da Paramount, trouxe a comédia maliciosa, manhosa, vienense. Este filme, com sua leveza bem-humorada e seus cenários de bolo de noiva exemplifica todo seu glorioso talento. Nota 8.

PATTON/MASTROIANNI/DELIVERANCE/KATE E CARY GRANT/

CRY OF THE CITY de Robert Siodmak com Victor Mature e Richard Conte
Siodmak foi um dos vários alemães que emigraram para os EUA e que criaram o estilo noir do cinema americano. Este é um belo exemplo. Filme muito forte, sobre bandido italiano que usa todos para tentar escapar da lei. Mature está ok, como o policial que cresceu no mesmo bairro e tenta incriminá-lo. Mas é Conte quem impressiona, mais uma vez dando show. O filme tem um clima realista, sujo, feio, que o torna muito absorvente e emocionante. nota 8.
SIROCCO de Curtis Bernhardt com Humphrey Bogart, Lee J. Cobb e Marta Toren
Conhecido como um dos piores filmes de Bogey, ele incomoda por ser seu personagem um fraco. Ele nada consegue e tem um fim nada heróico. Mas tem seus méritos, nesta história onde franceses colonialistas tentam domar revolta na Siria. nota 5.
PATTON de Franklyn J. Schaffner com George C. Scott e Karl Malden
Grande vencedor do Oscar de 1970, este filme representa bem uma das melhores safras do cinema americano ( 66/74 ). Trata-se de uma bio como não se faz mais : completamente verdadeira, mas sem jamais perder o caráter de espetáculo. Caramba ! Porque não se fazem mais filmes como este ??????????? Patton, feito por um Scott endiabrado, é fascista, egocentrico, homossexual enrustido, cruel, vaidoso ao extremo. Mas o admiramos, e depois o odiamos e voltamos a admirar. Na história deste gênio da guerra, que amava ópera e acreditava em reencarnação, assistimos a um filme perfeito em seu gigantismo. Gigantismo que jamais se torna frio, falso, impessoal. Tudo nele é belo e cruel, verdadeiro e mitológico. Foi este filme que deu o primeiro Oscar à Coppolla ( é dele o roteiro ) e deu a Scott um Oscar merecido. Aliás, bem de acordo com o clima político desse tempo, Scott não aceitou o prêmio e nunca foi o buscar. Disse que atores não são esportistas para concorrer entre sí, e que o único modo de se julgar dois atores seria dar a ambos o mesmo papel no mesmo filme em condições iguais. Ele está errado ? Tudo neste filme é superior : a música de Jerry Goldsmith, a fotografia de Fred Koenekamp, e esse absoluto extase que é assistir à Scott como este magnífico e inesquecível general. Apesar da concorrência fortíssima de 1970, o filme mereceu cada prêmio ganho. Trata-se de cinema de primeira, de arte e diversão, de política e emoção. Assistir este filme é compreender o que o cinema popular pode e deve ser. nota Dez.
THE LOVE PARADE de Ernst Lubistch com Maurice Chevalier, Jeannete MacDonald e Lilian Roth
Envelheceu muito este filme do importante Ernst. É um tipo de filme realmente morto, ancião, enterrado. De bom, os cenários luxuosos e Lilian, uma maliciosa atriz de beleza sapeca, que teve a carreira destruída pelo alcoolismo. Seria uma estrela. O que encanta é a malicia do filme, feito antes da criação do código de censura. nota 4.
UN FLIC de Jean-Pierre Melville com Alain Delon, Richard Crenna e Catherine Deneuve
John Woo, Guy Ritchie e Tarantino adoram os filmes de Melville. Neste, que é seu último trabalho, dá pra se notar o porquê. É cinema policial durão, nada simpático, árido, cool, muito cheio de coisas dúbias, onde o bandido é tão ruim quanto o policial e tudo cheira a corrupção e existencialismo crú. Melville adotou este sobrenome como homenagem ao autor de Moby Dick. Amava tudo o que era americano, se vestia como Bogey, ouvia jazz e acima de tudo, assistia os noir de Huston, Wilder, Wise, Preminger e Dassin. Alain Delon, com sua cara de absurda beleza gelada, nasceu para fazer este papel. nota 7.
O BELO ANTONIO de Mauro Bolognini com Marcello Mastroianni, Claudia Cardinale e Pierre Brasseur
Em toda a história do cinema de qualquer nação, ninguém fez tantos filmes bons em tão pouco tempo quanto Marcello. Entre 55/75, a quantidade de filmes eternos que ele fez é impressionante. Mesmo tendo de concorrer com Gassman, Tognazzi, Manfredi e Sordi. Nesse período o cinema italiano era o melhor do mundo e Marcello seu rei. Este foi um de seus maiores papeis : um homem da Sicilia, lugar de machismo absoluto, que não consegue consumar seu casamento, pois ama demais sua bela esposa, que vê como um anjo. Este poderia ser tema de comédia, mas aqui, graças a sensibilidade de Bolognini, discípulo de Visconti, o que seria riso se torna melancolia. Marcello tem uma interpretação digna de um deus. Seu olhar na cena final é coisa para se guardar para a eternidade. Seu personagem, que tem fama de comedor, se torna a piada da cidade. Claudia brilha, com sua transformação de belo anjo para mulher rancorosa e Brasseur, como o pai orgulhoso e maschio, passa toda a patetice desse garanhão de meia idade. Em destaque a bela cidade de Palermo, cheia de vielas, varandas e varais. Rica de gente. Um filme belo, vivo e muito triste. nota 8.
DELIVERANCE de John Boorman com Jon Voight e Burt Reynolds
A coisa de uma semana assiti um filme de Boorman feito antes deste. Um filme em que Lee Marvin e Mifune duelam numa ilha deserta. Agora me cai em mãos este Deliverance. Outra prova da maestria desse inglês Boorman, cineasta ainda na ativa, poeta da violência e da sobrevivência. Este filme é, em seu gênero, uma pequena obra-prima da crueldade. Poderia ser feito hoje ? Com certeza não. Sua violência é real demais, seu sangue não é glamuroso, seu horror é adulto, nunca infantil. Sua história : quatro amigos partem para a mata. Irão remar num rio que será eliminado, transformado em lago de represa. O que acontece com eles ? O absoluto horror. O filme nos mostra todo o tempo o ridículo de cada um deles. Como nos tornamos seres desajeitados, anti-naturais, desconfortáveis em meio a mata, e em como tentamos crer em nossa " pureza". Eles erram em tudo e todo o tempo, e pagam caro por todo erro. Cada passo que dão é um passo de aliem num planeta que nunca é o deles. A mata os repele, e os caipiras são de um mundo distante, além do que eles podem ver. Nada neste filme é bonito. Ninguém é heróico. Não há poesia: a mata é o que é, mundo fechado, inescrutável. Surpresa : o filme não tem trilha sonora, apenas o som de pássaros, da água, de gemidos e gritos, de conversas tolas. É uma obra-prima feita por um corajoso. Cineasta que se queimou nos anos oitenta com dois filmes muito ruins ( inclusive um deles feito no Amazonas, com Sean Connery e José Wilker ). Mas Boorman é invulgar, original, forte e difícil. Este Deliverance ( grande sucesso na época ) é para se guardar e rever. nota Dez.
SYLVIA SCARLETT de George Cukor com Kate Hepburn, Cary Grant, Edmund Gwenn, Brian Aherne.
Maior prazer que ver Kate na tela ( minha atriz favorita ), só o de ver Grant na tela ( meu ator favorito ). Cukor, que apesar de grande diretor, não é ousado ou muito criativo, faz aqui um filme completamente doido. Sua primeira parte ( 40 minutos ) é deslumbrante ! Pai e filha fogem da França endividados. Na Inglaterra se envolvem com malandro cockney ( Grant fala, pela única vez, com seu sotaque de origem. Uma delícia!!). O que vemos então são os hilários golpes dos 3, e o filme, de 1935, se torna um milagre : um filme dos irmãos Coen, o melhor deles, feito mais de meio século antes. Kate se faz passar por menino e o filme brinca com travestismo, roubo, trapaça, egoísmo, pai infantil, tudo isso com imensa alegria e em cenas curtas e meio improvisadas. Kate, de paletó, cabelo de menino, leve como um Peter Pan, se mostra alegre, se diverte com seu papel, e vemos o mais bonito menino da história do cinema. Cary Grant começa neste filme a chamar a atenção do mundo sobre sua figura. Vemos o nascimento do mais adorável dos comediantes, do mais elegante dos malandros. E vendo este espetáculo pela primeira vez, penso : que fantástico show ! será meu filme favorito!!!! Mas... Kate se apaixona, larga as roupas de menino e se assume mocinha... e o filme, esquizofrenicamente, se torna outro, drama de amor. O personagem de Grant desaparece, e sentimos saudade de sua saudável malandrice. São 40 minutos de romance inconvincente, empolado, sem motivo. Nunca ví tal sucídio de expectativas na tela. Quando o filme acaba, parece que assistimos dois filmes totalmente diferentes : um que nos mostrou a verdadeira Kate, rapazinho bissexual, leve, alegre, linda; e o verdadeiro Cary, ambicioso malandro inglês, palhação, acrobata, charme de gigolô. Mas toda essa maravilha é morta pelo covencionalismo, pelo romance banal. Você se entristece com o filme, cai na razão, esmorece. O filme, em seu tempo, foi imenso fracasso. Hoje é um cult de primeira. É tão estranho que não pode ser julgado. Toda nota seria injusta.
EFEITO DOMINÓ de Roger Donaldson com Jason Statham e Saffron Burrows
O velho Roger continua filmando ( nunca vivemos uma era com tanto diretor velho. No cinema, até os anos 90, diretores eram encostados aos 60 anos. Hoje filmam até morrer. Bergman, Minelli, Ford, Hawks, Wilder, Donen, Capra, Stevens, Renoir, todos pararam aos 60, 62. Hoje, Lumet, Chabrol, Scorsese, Donner, Resnais, Spielberg, Penn, Boorman, De Palma, Eastwood, Woody Allen, filmam e filmarão até o fim. Como filmaram Altman, Pollack e Kubrick. Bom ou mal sinal ? ) Bem... eu gosto de Jason. É um Bruce Willis atual ( eu preferia Bruce. Mas Jason é ok. ) O filme, delícia de filme de assalto, é muito agradável, ágil, divertido. E tem Burrows, uma bela atriz. nota 6.

ALTMAN/CORNEAU/JOHN WAYNE/ERA DO GELO

SIM SENHOR de Peyton Reed com Jim Carrey e Zooey Deschanel
Volto a falar deste filme para dizer algo assustador : o quanto um filme pode ser ruim. Um cara ( um Carrey apático em seu medíocre papel ), fala não para a vida. Após palestra ( dada por Terence Stamp ), começa a dizer sim a tudo. Fosse menos cretino, o filme o envolveria em confusões sexuais, confusões com patrões e com os amigos. Mas não. Para o roteirista, dizer sim é pagar bebidas aos amigos, pagar cursos e comprar coisas. Para se falar sim é preciso ter cartão de crédito dourado. Retrato de um tempo onde diversão é encher a cara e pagar algo de novo. O romance com a mocinha é inconvincente : ela canta em banda de rock tipo anos 80 mas é a imagem da caretice. E que amigos são esses ? Em todo o filme não dizem duas frases diferentes ! Um horror ! sem nota.
A ERA DO GELO 3 de Carlos Saldanha
Uma deliciosa comédia com personagens bem delineados, belo visual e que não tenta vender nada. É lógico que não procuramos arte aqui, mas ele faz algo que os filmes pop de hoje não sabem mais nos dar : uma alegre diversão que não nos agride, não nos chama de idiotas. nota 5.
MAC CABE & MRS. MILLER de Robert Altman com Warren Beatty e Julie Christie
O que primeiro salta aos olhos é a foto de Vilmos Zgismond. O filme é de uma plasticidade melancólica e gelada. Passa-se na fronteira EUA/ Canadá e estamos em 1890. Um cara otimista monta bordel em vila mineira. Ele tem bom coração e tudo que deseja é alguém que lhe dê afeto. Assistimos o que lhe acontece. O filme é difícil : lento. Talvez seja o mais triste filme americano já feito ( Pauline Kael o chama de " o mais triste e belo dos filmes " e Roger Ebbert de " um filme perfeito " ). Eu o assisti com dois sentimentos : quase irritado por sua lentidão, mas, ao final, apaixonado por sua magnífica beleza. O final, numa nevasca, é talvez o mais melancólico já visto. Tem uma beleza aterradora. Não tem trilha sonora : é pontuado por lindíssimas baladas desesperançadas de Leonard Cohen. É uma obra-prima da inocência poluída, da esperança destroçada, da solidão sem fim. Uma obra-prima de cinema ousado, sem nenhuma concessão, heróico. Nota DEZ.
IF... de Lindsay Anderson com Malcolm MacDowell
Um perfeito retrato da rebeldia e do desamparo adolescente. Eles tentam ser diferentes e não conseguem, tentam ser livres e não sabem o que é a liberdade. O que fazem então ? Destroem. Surrealista, cheio de significados e fácil de se assistir, é um filme manifesto, um poema à ira, um filme de ação. nota 9.
WEEK-END de Godard com Mireille Darc, Jean Yanne e Leaud
Não pode ser analisado a luz da razão. Ele vai contra tudo e todos. Do dinheiro ao sexo, de burgueses aos grupos extremistas, sobra pra todo mundo. Sem nota, pois um zero seria absurdo e um dez impossível.
NUNCA AOS DOMINGOS de Jules Dassin com Melina Mercouri
Um americano vai à Grécia atrás de respostas. Ele quer saber onde a Grécia errou. Lá, conhece uma prostituta que é a personificação da alegria grega. Mas ele tenta lhe dar cultura, filosofia, e a estraga. No fim, a alegria vence. Dassin foi um ótimo diretor. Na América fez alguns dos melhores policiais da história. Perseguido pelo MacCarthismo, teve na Europa uma segunda e excelente carreira. Aqui ele encontra a estrela grega Melina, com quem se casaria. Ela lutaria contra a ditadura grega e terminaria ministra da república livre de seu país. O filme, comédia bela e despretensiosa, encanta por sua alegria genuína e a bela paisagem grega. nota 7.
A TRÁGICA FARSA de Mark Robson com Humphrey Bogart e Rod Steiger
Último filme de Bogey. Fala do submundo do box. Um lutador tipo Maguila, inocente e manipulado, vence lutas arranjadas até um quase título. Bogey é o jornalista que manipula essa verdade falsa. Um derrotado. O filme é ok. nota 5.
MALPETIUS de Harry Kummel com Mathieu Carriere e Orson Welles.
Pretensioso e chato. Algo sobre deuses e mitos. Uma bomba! nota Zero!!!
TRUE GRIT de Henry Hathaway com John Wayne e Kim Darby
O filme que deu o oscar à Wayne ( vencendo maravilhosos Dustin Hoffman e Jon Voigt em Perdidos na Noite ). Ele está comovente como um justiceiro bêbado e amargo que ajuda mocinha a vingar a morte do pai. Belas paisagens, ação na medida exata, algum humor e o carisma do mito da aventura. Muito satisfatório. nota 7.
NO VELHO CHICAGO de Henry King com Tyrone Power, Don Ameche e Alice Faye
A primeira hora é um melô envelhecido sobre família irlandesa que enriquece na Chicago de 1870. Mas a meia hora final é um primor. Um incendio que devasta a cidade. Efeitos especiais que ainda impressionam e um senso de suspense e movimento soberbos. Os figurantes, centenas, estão maravilhosamente bem dirigidos e fotografados. Fogo, água e multidões se movendo sem cessar. Vale o filme. nota 6.
TODAS AS MANHÃS DO MUNDO de Alain Corneau com Jean-Pierre Marielle e Gerard Depardieu
A vida do músico Saint-Colombe ( que nunca ouví falar ) narrada por Marin Marais, seu aluno bem sucedido. O filme é tudo aquilo que Amadeus não pode ser : místico, reverente, artístico. Talvez por a arte de Mozart ser terrena, comunicativa e leve. O ambiente é o do Jansenismo do século xviii. O filme tem uma austeridade rígida, fria, severa. Marielle brilha. Vemos e sentimos sua dor. O filme quase faz um milagre : ele chega perto de nos comunicar o segredo da música. Há um diálogo final entre Marielle e Depardieu que é absoluto sublime. O aluno tenta obter o segredo do mestre. Nós o obtemos. O filme é também um manifesto de um mundo perdido : mundo em que se criava e se vivia para Deus, para a eternidade, para o atemporal. Corneau venceu 8 césares em 1991. Mereceu todos. Eis um corajoso e original ! nota 8.
COWBOY de Delmer Daves com Glenn Ford e Jack Lemmon
Nesta história de um atendente de hotel que quer ser cowboy temos tudo aquilo que pedimos : ação, emoção e boas atuações. Entramos na vida de bois, cavalos, índios, espaço aberto, poeira. A violência é constante e para sobreviver é preciso ser individualista e frio. Jack dá show, mas Ford, ator subestimado, impressiona mais. Seu cowboy é a imagem da vida na estrada. Belíssimo. Nota 8.

JEAN BECKER/ASQUITH/BERGMAN/BOGART/SOLARIS

CONVERSAS COM MEU JARDINEIRO de Jean Becker com Daniel Auteill
Becker, filho do grande Jacques Becker, é um dos bons diretores franceses atuais ( apesar de já veterano ). Aqui ele mostra uma linda história sobre amizade. Um pintor bem sucedido, pensa em reformar sua horta. Chama um jardineiro, que é, para sua surpresa, um antigo colega de escola. Amor, família, vida. Tudo é falado e vivido pelos dois. O filme jamais se torna chato. Ele flui, leve, colorido, saudável, bonito. Muito bom. nota 7.
O AMOR EM CINCO TEMPOS de François Ozon com Valeria Bruni-Tedeschi
Cansei de Ozon. Seu cinema frio, analítico, me entedia. Um saco este chatíssimo drama. Que me interessa a vida de dois malas que nada têm a dizer ? nota zero.
NUNCA TE AMEI de Anthony Asquith com Michael Redgrave e Jean Kent
Foram 400 anos de teatro inglês para se atingir a excelência da atuação de Mr. Redgrave. Ele é um anti-"sociedade dos poetas mortos". Um professor chato, duro, amorfo. A cena em que sua fortaleza desmorona é de uma comovente verdade. Redgrave se reclina, lendo uma dedicatória, e chora de costas para a câmera. O choro não é teatral, é contido, doído, magistral. Um filme absolutamente perfeito, levado com nobresa pelo elegante Sir. Asquith. E com um ator que é um Mozart do palco e da tela. Inesquecível e obrigatório. nota Dez!!!!!
O TÚMULO VAZIO de Robert Wise com Boris Karloff e Bela Lugosi
Muito bom esse Wise. Em mais de trinta anos de carreira dirigiu musicais como West Side Story ou A Noviça Rebelde; e mais faroestes, policiais e um clássico como O Dia em que a Terra Parou. Este é seu segundo filme, um terror da RKO. Karloff está muito bem, compondo um fascinante vilão. nota 5.
HORAS DE TORMENTA de William Wyler com Humphrey Bogart e Frederic March
Na velha Hollywood, quatro diretores eram todo-poderosos : George Stevens, Frank Capra, John Ford e principalmente William Wyler. Um diretor considerado até hoje o mais " capaz" da história. O que significa esse "capaz" ? Que Wyler nunca errava. Jamais alguém poderia chamá-lo de gênio, ou de ousado; mas ele era a certeza de fluidez, competencia e muita inteligência. Ele sabia fazer, sabia dirigir atores, sabia narrar. Conquistou três prêmios de direção e mais seis indicações não premiadas. Dirigiu de tudo : musical, western, filme noir, romance de fadas, filme de arte, de tribunal, comédia maluca, filme de guerra. De Ben-Hur à Princesa e o Plebeu. Sempre acertando. Este é de seus últimos filmes. Bogart é um muito desagradável bandido. Invade uma casa e mantém a família como refém. O filme é um duelo entre Bogey e o chefe da casa-March. Um filme tenso, rico em desdobramentos e que flui com rapidez. Um tipo de filme de Scorsese antes do tempo. Muito, muito imitado. Nota 8.
JUVENTUDE de Ingmar Bergman com Maj-Britt Nilsson
É impressionantemente o décimo filme de Bergman. Aos 30 anos!!!!! Bom tempo em que um diretor de trinta anos já dirigira dez filmes... Ele considerava este seu primeiro trabalho "de verdade". É sua primeira obra-prima. E talvez, seu filme mais simples. Uma bailarina, aos 28 anos, sente-se pela primeira vez na vida, "velha". Ela viaja à uma ilha, onde recorda um amor que viveu aos 15 anos. O filme é sómente isso. Uma sessão de terapia onde vemos a bailarina tomar consciência de quem ela foi, é, e será para sempre. Mas é também, como Bergman sempre faz, muito mais. Trata-se de uma exposição. Mostra a vida dos adultos em contraste com os jovens. Uns, cínicos, cruéis, desesperançosos; e os jovens, leves, risonhos, apaixonados, crentes. As cenas de namoro entre o jovem casal são reais, graciosas, e maravilhosamente atuais ( o filme é de 1951, mas, que estranho, parece ser de 2009 ). Maj-Britt, mais uma das maravilhosas atrizes de Bergmann, linda-moderna-enfeitiçante, tem uma atuação natural, uma menina cheia de sexo, de encanto e de alegria. Mas seu rude amadurecimento nos corta a respiração, porque é exatamente como se dá com todos nós : um amadurecimento amargo, cruel e surpreendente. Tudo que Bergman faria depois já se encontra aqui : a beleza da fotografia ( há filme mais belo que este ? ), as falas solenes, os atores geniais, a preocupação com sexo/morte/alma. Um encantador trabalho, um leve e delicioso filme, onde roteiro, música e atores se esmeram em criar duas horas de absoluto prazer e de intenso drama. Gênial. nota Dez!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
SOLARIS de Andrei Tarkovski
É tido por obra-prima. Que nota darei ? A fotografia é linda ( há uma cena com um cavalo de estarrecer de tão bonita ), o roteiro é poesia filosófica, a câmera é precisa. Mas o que dizer ? O filme tem o único defeito que não poderia ter : é grotescamente chato. O divino Oscar Wilde já dizia : perdoamos tudo em alguém. Ele pode roubar, pode mentir, pode ser falso e enganar, mas ser chato é imperdoável. nota zero!!!!!!

KEY LARGO ( PARA TUCORI )

Key Largo, de Huston. O cinema viril de Huston. A história vem direta, sem frescuras. Ele liga a câmera e conta o que se tem para ser dito.
Key Largo, roteiro de Maxwell Anderson. Autor sério, liberal, que fez música com Kurt Weill ( a melhor canção da história- September Song-é da dupla ). Neste roteiro, Anderrson cria uma mini-américa. Num hotel, cercado de vazio. O gangster ( que representa aquilo que a nação se tornou ), um velho aleijado ( o bom cidadão, impotente ), e o existencialista ( Bogart ). E um bando de índios, perdidos e sem lugar, levando a culpa de tudo e jogados ao vento.
Key Largo, com Edward G. Robinson, ator perseguido por ser judeu, perseguido por ser de esquerda, mas que sempre recebeu apoio de Huston, Bogey, Mankiewicz. Aqui ele domina o filme. Rouba as cenas de Bogey. Brilha em sua maldade perversa.
E Humphrey, fazendo aquilo que tanto encantou os franceses ( Sartre, Goddard, Truffaut, Genet ), um homem sem endereço, sem família, sem ilusões, sem futuro. Bogart nos exibindo o homem de hoje e de amanhã, livre- perdido- sem se comprometer, mas obrigado a agir.
Key Largo, com fotografia do genial Karl Freund ( de Lang, de Murnau, e a América sempre foi esperta em acolher os " sem endereço " úteis ).
Um filme direto, simples, de texto, de testosterona-adulta, de furacão ( e exemplar na cena em que Robinson teme a chuva " pois não póde a dominar"- sina de todo super-homem ).
Único ponto fraco: a trilha sonora de Max Steiner, que quase põe tudo abaixo com sua melosidade fútil.