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WOODY ALLEN, FLA X FLU E BENJAMIN

    A criatividade cala-se. Converso com um amigo, ontem. Este momento é um daqueles em que a criatividade está relegada a posição secundária. O que importa é o "mundo real", que na verdade ninguém sabe o que é. Um livro só será respeitado se falar da "triste condição humana" e quanto mais cinza melhor. O romantismo/simbolismo em baixa. O realismo/naturalismo em alta. Flaubert acima de Balzac.
   Engraçado o cinema. Aceitamos o "realismo" de Batman ou de Von Trier. Onde esse realismo? Na verdade nossa época é tão deprimida que todo filme down é aceito como real. Mesmo que tenha um tonto fantasiado de morcego ou viagens mentais de um umbigo narcisista. Toda obra cheia da alegre vitalidade da criatividade absoluta será vista com reservas.
   O fato é que as pessoas não estão ocupadas em nascer. Elas se ocupam em não morrer. Isso resume todo o mundo de agora.
   Leio um muito belo texto de João Pereira Coutinho sobre Woody Allen. Ele fala que as pessoas não levam Woody muito a sério porque ele não fez sua grande obra-prima. Ele não tem o filme perfeito. E isso é confirmado pelo próprio Woody Allen, que em entrevista recente, falou que nenhum de seus filmes podem ser comparados aos filmes de seu ídolo, Ingmar Bergman.
   Pois Coutinho diz que não é assim. Woody tem três filmes que podem ser comparados aos melhores Bergmans ( Crimes e Pecados, Manhattan e Hannah ), o problema é que Allen não teve, nunca, uma grande fase. Bergman lançou uma obra-prima atrás da outra durante 14 anos. Foram 17 filmes de alto nível e que mudaram o cinema. Woody, além de nada ter feito que mudasse o cinema, nunca conseguiu fazer mais de dois grandes filmes a cada seis ou sete anos. Mas Coutinho mata a charada ao dizer que na verdade Woody Allen, como um Proust do cinema, fez apenas um único filme, que deve ser dividido em capítulos. Cada filme é um volume de um grande filme, o filme-obra de Woody Allen, um filme único de um artista que começa como humorista satírico, se torna porta voz da inteligência de New York tipica dos anos 70 e depois envereda por traumas Bergmanianos e ironias literárias. Por fim, descobre tardiamente Fellini, e neste milênio faz sua "coda", um colorido panorama do mundo e das figuras mundanas Fellinianas. Uma carreira longa e talvez a mais interessante em seu todo, neste cinema sem direção de hoje.
   Leio também um texto de Jabor que chora o cinema sem alma.
   Ele deve ter lido Benjamin. Troque alma por aura e lá está a teoria de Benjamin. Assim como cinco Fla-Flu por ano destrói qualquer espirito Fla-Flu, filmes feitos para cinema, DVD, internet, PC, TV, acabam com toda chance de culto, de alma, de paixão secreta.
   O nome é Tame Impala. Boa banda de covers.

BERLINER ENSEMBLE, NEYMAR, BERGMAN, SHOPPING CENTER E CSN

   A BERLINER ENSEMBLE é uma das melhores instituições da Alemanha. Ela vem ao Brasil e é muito muito muito primordial que voce a veja. Com Bob Wilson na direção, eles irão apresentar A ÓPERA DOS 3 VINTÉNS e LULU. Mesmo que voce não entenda alemão, veja. E ouça também. Em A Ópera a música é de Kurt Weill. Música de Weill significa beleza e humor no mais alto grau de perfeição possível. Lulu, o texto enigmático-expressionista de Frank Wedekind, tem trilha de Lou Reed. Lulu fala de sexo como morte e de noite como sexo. Seria bom rever o filme de Pabst antes do espetáculo. Voce sabe, o filme com a feiticeira das telas, a felina Louise Brooks. A experiência deverá ser vitalmente arquetipica.
   Cee Lo Green esteve no Sónar. Se aquilo é uma amostra da atual música negra estamos muito mal. Ele canta pobremente, não tem sex-appeal e tem repertório sem sal. Um mundo negro que nos deu Al Green e Jackie Wilson viver agora de Cee Lo é mais frustrante que a literatura francesa depender de Houllebecq.
   Mais um monstrengo nasce em SP. O Shopping JK está pronto. No futuro haverá uma via elevada que unirá todos os shoppings de "gente bonita". Voce entrará num tubo de cristal e será levado por esteiras à todos eles, Iguatemi, Higienópolis e etc. Arquitetonicamente o tal complexo é aquilo de sempre, um caixotão com vidrinhos. Nossos arquitetos não pensam mais. Usam um programa que repete soluções.
   CARAVAGGIO virá ao Masp. Entre de joelhos no caixotão mediocre que não enfeita a Paulista. Caravaggio não é o melhor pintor da história. Esse posto é disputado por Rembrandt, Velazquez e Cézanne. Mas é o mais "instigante". Seus quadros são como flagrantes de feitiçaria. Ele foi um homem "do mal". Do submundo. Mas sua obra é elevada, explosiva em luz e sombra. Ninguém pintou sombras como ele. A obra-prima "São Francisco Meditando" virá ao caixotão. Como disse, se ajoelhe diante dela. Mas não ore. Olhe. Caravaggio em SP é honra que não sei se merecemos.
   Crosby, Stills and Nash passaram por aqui. O tempo é ironico. Em 1982 nada era mais passado e esquecido que os três menestréis. Seu som acústico, suave, gracinha, era a coisa menos Roxy e Bowie possível. Em 2012 eles são hiper-cult. O som que eles faziam em 1970 é o que 90% dos moços sensiveis sonha em fazer agora. A diferença é que Crosby tomava umas coisinhas que esses moços nem sabem o que é. E Stephen Stills é genial. Roxy e Bowie caem, James Taylor e Cat Stevens sobem. C'est la vie...
   Quem mora em SP deve estar vendo os filmes de Douglas Sirk no CCBB. Sirk é o idolo de Almodovar e Todd Haynes. Dramas deslavados, exagerados, quase ridiculos e maravilhosamente deliciosos. Ele nunca tem medo. Vai lá na ferida e a cutuca com vidro. Ou melhor, com cristal. Seus filmes são arrumados, engomados, bonitos como geladeiras brancas. Com postas de carne podre dentro.
   Mas quem mora no Rio pode soltar fogos. Ingmar Bergman tem 46 filmes sendo exibidos. E mais 5 documentários sobre o gênio da Suécia. Deram um jeito de trazer até mesmo os cinco comerciais de sabonetes que ele fez nos anos 50. Vai ser hilário ver Bergmaníacos como eu tentando achar nos comerciais um sinal do gênio do gênio. O mundo de hoje não merece Bergman. Ele ia ao fundo das coisas e hoje nós conseguimos ir só até onde os dogmas permitem. Mas eles estarão lá, 46 chances de crescimento espiritual.
   Dou a dica. Se voce já viu Morangos Silvestres e O Sétimo Selo, espero que sim, voce não é um analfabeto, não vá perder O ROSTO, NOITES DE CIRCO, FANNY E ALEXANDER e JUVENTUDE. Esses são imperdíveis. PERSONA, MONIKA E O DESEJO e A FONTE DA DONZELA vêm a seguir. Depois chegam em SP. Já estou no aguardo. Se voces perceberem algum careca histérico na sessão, esse sou eu.
   Neymar dá a toda uma geração, ou duas, acostumadas a ver futebol de verdade só pela TV, a chance de entender porque os quarentões falam com saudade de Zico, Sócrates e Falcão. Um jogador de gênio jogando em seu apogeu no Brasil é fato que não ocorria desde os tempos de Junior e Zico. Vimos os 4 erres brilharem na Europa, aqui, só um brilhareco. Ver Neymar no estádio é perceber o talento em ebulição plena, a mente pronta para o não-óbvio e a ambição sem limite nenhum. O ridiculo ou o sublime no fio de um cabelo. Coragem em jogar e em tentar. Um ego do tamanho do mundo. Aproveitem que logo acaba...

PRAZERES SECRETOS

Uma coisa que é só sua e de mais ninguém. A revolução da mente humana se deu quando o homem se viu, pela primeira vez, como individuo único. Ele percebeu que só ele vivia aquela vida, só ele sentia o que ele sentia e só ele sabia o que ele sabia. Mais que tudo, ele possuia sua vida e com ela seus segredos e mistérios.
Todos, ou quase todos, viveram um primeiro amor. E é nesse amor envergonhado e recolhido que pela primeira vez descobrimos o prazer de se ter um segredo. Nossos pais não podem saber disso. É aí que damos o salto, ficamos á parte da familia, temos algo que é só nosso, o amor. E o acalentamos. O deixamos crescer dentro de nós. Torna-se sagrado. Entenda, em sociedades arcaicas isso não existe. Tudo ocorre ás claras, não há segredo e individuação, voce é sua comunidade, voce é tudo.
Ontem, conversando com um amigo, ele me conta da "vida compartilhada" de agora. Tudo que voce faz deve ser dividido com os outros. Voce só existe para eles.
Ora, isso é antigo, muito antigo. E é irônico que a tecnologia nos leve cada vez mais para hábitos de um remoto passado. A certeza de que uma coisa só tem valor se for "da comunidade, da rede". Seja um show, uma festa ou uma viagem, ela só é válida e "importante" se for dividida e de preferência bastante compartilhada. A pessoa abre mão da experiência pessoal, e a transforma sempre num tipo de reportagem para todos.
O caminho que temos, cerebral, sempre foi o de sentir, absorver, guardar, elaborar e memorizar. Depois vinha a transmissão. Agora o trajeto é sentir, elaborar e transmitir. Não há tempo de absorver, nada se guarda e a memória se encurta. A experiência é logo expelida para a rede e prontamente esquecida. O cérebro se esvazia e fica ávido por mais uma experiência ( cérebros abominam o vazio ), e essa nova experiência logo vem...e outra e outra e outra.... O amadurecimento se torna impossível. A vida interior se faz rala.
Penso então nos Beatles. Sim, nos Beatles. Eles tiveram a sorte de passar anos à margem do mundo. Tocando, compondo, se afirmando. Elaborando toda uma carreira dentro de si. Pegando aquele som tão "cover", Buddy Holly e Everly Brothers, e fazendo suas tentativas de originalidade. Até que anos mais tarde explodissem e se tornassem mundiais. O que seria deles hoje? Em 1960 já teriam videos na rede e faixas para download. Sentiriam desde o inicio o "gosto" da exposição. E pior, seu espirito se atiraria para fora, para o que os outros esperam. Amadurecimento, recolhimento, espera, jamais.
Outro exemplo. Ingmar Bergman.
Bergman passou dez anos fazendo um filme por ano. E nada acontecia fora da Suécia. Ninguém o conhecia. Então o que ele podia fazer? Podia aprender. Com calma, sem se sentir exposto, dentro de si, ele foi desenvolvendo um estilo pessoal. Sem pressa, filme a filme. Quando estourou em 1956 já tinha firmeza, certeza, calejamento. Estava pronto. O que seria dele hoje? Teria desde "PORTO", em 1946, seu fã-clube. E normalmente o que ele faria? Se conformaria em ser para sempre o ídolo desse fã. Na rede, precocemente ele se acreditaria pronto. Faria fé do hype criado a seu redor.
Prazeres secretos. Alguém ainda os tem?
Existe algum segredo? O prazer de comprar um disco do Velvet Underground no Brasil em 1981. E saber que nenhum amigo conhecia essa banda. E então, amar essa banda em solidão. E chegar a crer que ela é sua. Mais ainda, que seu amor a mantém viva. Cuidar desse amor que é seu e portanto se TORNA VOCE. Esse é o aprendizado da individuação.

WOODY ALLEN/ GORE VERBINSKI/ ANTHONY MANN/ JAMES STEWART/ FELLINI/ BERGMAN

O DORMINHOCO de Woody Allen com Diane Keaton
Em termos de humor puro, nenhum filme de Allen é melhor ( entendam, este é o mais pastelão,e eu adoro pastelão ). Na saga do nerd que é adormecido em 1973 e acorda em meio a revolução séculos mais tarde, encontramos defeitos de diretor iniciante ( irregularidade ) e qualidades dessa mesma juventude ( irresponsabilidade ). Uma delicia!!! E que humorista genial Diane sempre foi ! São dela as melhores cenas. Nota 7.
RANGO de Gore Verbinski
Cheio de altos e baixos, esta homenagem ao western melhora muito ao final. Seu defeito é ter um personagem central fraco. A homenagem a Clint Eastwood é excelente! Aliás, a trilha sonora paga tributo a Morricone. Nota 5.
WINCHESTER 73 de Anthony Mann com James Stewart
Primeiro dos clássicos de Mann/Stewart. Um rifle é o que move bando de homens no oeste. Na verdade há mais que isso, há o ódio entre irmãos. O western de Mann em nada se parece com aquele de Ford, onde Ford canta a vastidão e a camaradagem, Mann destaca a solidão e a desconfiança. Stewart exibe uma então nova faceta de seu talento: o dom de mostrar a fúria contida. Um filme maravilhoso. Nota DEZ.
DESTRY RIDES AGAIN de George Marshall com James Stewart e Marlene Dietrich
Stewart é um muito calmo filho de antigo justiceiro que vai a cidade dominada por chefão. Ele, com seu jeito calmo e cheio de "causos" acaba por vencer, claro. Esta comédia-western é uma graaande diversão. Há humor genuíno neste excelente personagem. Nota 8.
...E O SANGUE SEMEOU A TERRA de Anthony Mann com James Stewart, Arthur Kennedy e Rock Hudson
Aqui Stewart cria amizade com tipo suspeito e ficamos sem saber por quase todo o filme o que os une. A fotografia é espetacular. Mas a ação carece da eletricidade de Winchester 73. De qualquer modo é um bom exemplar do filme de bangue-bangue. Nota 7.
A DOCE VIDA de Federico Fellini com Marcello Mastroianni, Anouk Aimée, Anita Ekberg, Yvonne Furneaux, Alain Cuny e Magali Noel
Crítica abaixo ( no texto sobre a avendia Sumaré ). Numa estranha coincidência, revi este filme antes de saber que ele seria vendido em banca de jornal. A figura do paparazzo é criada e batizada neste filme. Que marca a segunda fase da carreira de Fellini. Ele deixa de ser realista e passa a se aprofundar dentro de si-mesmo. Acompanhamos Marcello ( um soberbo Mastroianni ) em sua jornada por Roma. Ele caminha para o esvaziamento, o que vemos são mortes, de mitos, de sonhos e de intenções. Roma nunca esteve tão bela, escura, misteriosa, sexy. Não é uma obra-prima, tem muitas cenas falhas, mas suas grandes cenas ( o final é histórico ) são de antologia. Nosso mundo nasce neste filme. Nota 9.
UM ESPÍRITO BAIXOU EM MIM de Carl Reiner com Steve Martin e Lily Tomlin
A excelente história da ricaça que morre e encarna no corpo de Steve é ótima. Mas Reiner perde o ritmo várias vezes. Steve Martin, o melhor humorista americano dos últimos trinta anos, brilha. Seu papel é não só engraçado, é uma peça de arte. Nota 6.
MORANGOS SILVESTRES de Ingmar Bergman com Victor Sjostrom, Ingrid Thulin e Bibi Andersson
Em coincidencia, além de ver A Doce Vida, ainda tive minha quarta apreciação de Morangos Silvestres. Que também sai em banca de jornais. Vou passar o resto de minha vida vendo este filme uma vez por ano. Já o comentei longamente neste blog. Suas imagens são de sonho. Mostram a busca de resgate/remissão de um velho médico em viagem. Nesse caminho ele descobre ter errado sempre. É genial a forma como Bergman mistura o velho homem alquebrado com suas lembranças sempre jovens. A famosa cena do sonho ainda é rica em material e em sentidos. E tem um final inigualável, o velho homem olha seus jovens pais a pescar em lago, o velho sorri para eles e todo o sentido do filme se revela. Ele está conciliado com seu inferno. Em que pese duas cenas ruins, o filme é tão superior ao meio "cinema" que só pode ser comparado a Mozart ou Tolstoi.
SORRISOS DE UMA NOITE DE AMOR de Ingmar Bergman com Harriet Andersson, Ulla Jacobson, Eva Dahlbeck, Margit Carlvist
Uma constatação: onde Bergman acha tantas atrizes bonitas? Esta é uma comédia de Bergman, ou seja, é um filme estranho. Fez imenso sucesso de público ( o que testemunha a favor do público de 1955 ). Conta, com ironia, a história de casais que se traem, mentem, falam bobagens e seduzem uns aos outros. E se vingam também. É dos mais imitados filmes da história. Woody Allen já o refilmou e Paul Mazurski também. Mais Altman, o próprio Allen e uma infinidade de nomes têm se inspirado nele. Há ainda uma aula de sensualidade sem culpa da vulcânica Harriet Andersson. Leve, bonito, mas com um amargor que permanece. Nota 7.
A VIDA DURANTE A GUERRA de Todd Solondz
Adorei o que Cássio Starling Carlos escreveu na Folha. Ele denuncia esses filmes "chantagistas". Filmes como Rio Congelado, Preciosa e Inverno da Alma, todos milimetricamente formatados para ganhar festivais indie e serem endeusados por pessoas "com bom coração". Quem não gosta desses filmes é rotulado de insensível. Necas!!!! São filmes ruins feitos para enganar. Fáceis de fazer, fáceis de inscrever em festivais, fáceis de esquecer. Este é um deles. ZERO!!!!!!!!!!!!!

ELIA KAZAN/ WARREN BEATY/ TOTÓ/ PAUL GIAMATTI/ GAINSBOURG/ MICKEY ROURKE/ RENE CLAIR/ BERGMAN

TOTÓ PROCURA CASA de Mario Monicelli e Steno com O Grande Totó
Que humorista foi esse tal de Totó!!!! Que rosto! Não espere elaboração dele. Não espere "humor sofisticado". Totó é um palhaço, como Mazzaropi, como Renato Aragão, como Buster Keaton e o Jim Carrey dos bons tempos. Seu humor é infantil, direto, simples, e portanto corajoso. Aqui o objetivo é o riso, só o riso, se seu público não ri o humorista falhou, daí sua coragem. Neste filme ( dos primeiros desse fenômeno chamado Monicelli ) ele é um pai de familia sem casa. O filme mostra ele tentando achar lugar para morar ( tenta uma escola, cemitério e até no Coliseu ele se aloja ). Uma chanchadona que é de um doce saudosismo. Totó foi um graaaande comediante! Nota 7.
CLAMOR DO SEXO de Elia Kazan com Warren Beaty e Natalie Wood
Crítica abaixo... É mais um belo retrato da América feita por esse tão importante diretor. Warren está muito bem como o jovem aluno inocente e rico ( é seu primeiro filme ). Natalie não está a sua altura na primeira parte do filme, depois ela cresce e acaba por nos comover. Drama de primeira. Nota 8.
FAY GRIM de Hal Hartley com Parker Posey e Jeff Goldblum
Talvez um Alphaville? Uma brincadeira de Hartley que lamentávelmente não dá certo. Parker está muito sexy ! Mas que roteiro é esse???? Nota 2.
NINHO DE COBRAS de Joseph L. Mankiewicz com Kirk Douglas, Henry Fonda e Warren Oates
Pois bem... este é um filme muuuuito errado! Explico o porque. Temos David Newman e Robert Benton, os dois mais brilhantes roteiristas da época. Eles escrevem uma história sobre um cowboy ladrão e uma prisão de desajustados. O roteiro, típico da época contracultural, atira em xerifes, racistas, mulheres, westerns etc. Mas, chamam para dirigir o filme Joseph L. Mankiewicz, o diretor, excelente, de A Malvada. Um grande nome, mas um estranho no ninho!!! O que acontece então? Nada. O roteiro, cheio de boas ideias, é asfixiado numa direção acadêmica. O resultado é morno. Kirk é perfeito para esse tipo de perverso/espertinho e Fonda brinca com seu tipo de americano/Lincoln. Mas é Hume Cronyn, fazendo uma espécie de debilóide que mais impressiona. Não é uma grande comédia, mas é ok. Nota 6.
PASSION PLAY de Mitch Glazer com Mickey Rourke, Megan Fox e Bill Murray
A capa do dvd promete: Rourke como um trompetista de jazz decadente. O ambiente é Utah. Fox é uma angelical esperança de redenção e Murray um empresário sacana. Atraente né? Pois é um drama risível de tão ruim. Deve ter sido escrito por algum fã de cinema com 8 anos de idade ( o roteiro macaqueia Asas do Desejo e um monte de filmes noir dos anos 40 ), o diretor, é flagrante, pensava estar fazendo um bom filme, deve ser um nerd de 11 anos e quem o produziu crê que o público de cinema é imbecil. Megan Fox é um anjo ( ela tem asas )..... e na última cena Mickey Rourke voa com ela rumo ao céu.... se aqui descrito parece ruim, creia-me, é bem pior na tela. Chega a ser cretino. Sem nota. Faz de conta que jamais o vi.
SLOGAN de Pierre Grimblat com Serge Gainsbourg e Jane Birkin
Um publicitário conhece em Veneza Jane Birkin. Ele é casado. Se amam, mas Jane o abandona. Pois é.... eu gosto muito de Serge e este é o filme em que ele conheceu Jane. Mas que lixo é este? Serge é péssimo ator e Jane chega a rir em cena !!! O filme é constrangedor de tão amador!!! Não é um filme, é muito mais um documentário sobre um flerte. Nota 1.
PORTE DE LILÁS de René Clair com Pierre Brasseur e Henri Vidal
Em favela francesa ( sim, são barracos em ruinas ) um assassino se esconde. Fica no porão de um cantor fracassado e é ajudado por um tolo ingênuo. O filme tem belas imagens, mas se perde em sua excessiva glamurização da pobreza. Clair funciona melhor em fantasias puras, onde ele pode "levantar vôo". Nota 5.
ATRAVÉS DE UM ESPELHO de Ingmar Bergman com Harriet Andersson, Max Von Sydow, Lars Passgard e Gunnar Bjorsson
Uma obra-prima, devastadora. Retrato de uma personalidade em crise ou retrato de nossa condição desde sempre? Bergman nada enfeita, nada exagera, nada dramatiza. Faz o que ele pensa dever ser feito, sem jamais mudar de rumo. É um filme de tristeza polar, mas também de uma beleza profunda, seca, perturbadora. Nota DEZ.
A MINHA VISÃO DO AMOR de Richard J. Lewis com Paul Giamatti, Dustin Hoffman e Rosamund Pike
Uma coleção de clichés. Acompanhamos a vida de um mala por 3 décadas. Cliché: a década de 70 e suas drogas, a esposa doidona, a vida como irresponsável flerte. Segundo cliché: a segunda esposa é uma chata judia à woodyallen... Já a terceira esposa é dos tempos atuais, mais cliché: gente que só pensa em saúde e equilíbrio. No final, supremo cliché: violinos e pianinho enquanto ele sofre de doença incurável.... Os críticos gostaram? Pobre crítica! Paul Giamatti imita Jack Nicholson. Faz exatamente o tipo que ele faz desde 1983. Mas é bom ator. É imitação de bom nível. Dustin nada tem a fazer. Fica lá, como um tipo de velho tarado. A direção é franciscana: pobre. O filme já nasce velho e com cheiro de reprise do SBT. Nota 3.

ATRAVÉS DE UM ESPELHO-INGMAR BERGMAN, O OLHAR IMPASSÍVEL DE DEUS.

Não há maior prazer em arte que ver um mestre dispor de seus elementos e exibi-los a nosso olhar. O que temos aqui é a radiografia de uma crise, e também a questão que funda nossa civilização.
Sven Nykvyst fotografa o filme. Temos a ilha, o universo limitado, o isolamento. Horizonte sem fim. Temos uma familia. Moradores únicos daquele mundo. Últimos ou primeiros seres. O filme, como tudo em Bergman, começa expondo seus personagens, sem apelação, sem atropelos, com musical crescendo.
Karin é a filha. Ela acabou de voltar de hospital. Seu caso psiquiátrico é incurável. Karin está em um de seus bons momentos. Aparentemente. Com ela vem seu namorado, que realmente a ama e sofre com ela. Há um irmão mais jovem, assustado com aquela situação e o pai, escritor famoso e distante da familia. Bergman em 80 minutos nos mostra esse drama cósmico, de quebra ganha seu segundo Oscar e modifica o alcance do cinema para sempre.
O filme é dedicado a esposa de Bergman ( uma das várias ) e é fácil perceber que o pai distante é Bergman. Mas na verdade ele é também Karin e sua loucura, o namorado amoroso e o irmão que odeia as mulheres ( e é fascinado por elas ). O filme em primeira visão é retrato de uma alma ilhada em conflito consigo mesma. Fosse apenas isso seria um ótimo filme, mas sendo muito mais alcança uma estatura de obra-prima ( isso se voce possuir a mente capaz de ver o que lhe é mostrado. Não indico o filme a meninos e inteligentinhos. Fiquem com a tola obviedade pornô de Cisne Negro/Anticristo e que tais ).
Karin começa a voltar a seu mundo dividido. E em quarto da casa "tenta entrar na parede". Alguma coisa a chama. A sutileza impera. Bergman não grava vozes a chamando, não usa trilha sonora de suspense, não exagera coisa alguma. Karin parece "normal", não somos invadidos por sua loucura, somos convidados a compreender e observar. Começamos então a sentir um incômodo imenso, vazio, começamos a sentir, suavemente, a loucura de Karin.
Há uma cena brilhante dentro de um barco encalhado. Chove, e os dois irmãos se escondem lá dentro. A água escorre pela madeira, eles se abraçam e se encolhem. Eis uma das mais belas cenas da história do cinema. O que vemos ali é toda a condição humana, desamparo,crise, e então voce começa a perceber o alcance do filme. A partir daí ( em seus vinte minutos finais ) o que temos é superlativo. Como gênio que é, Bergman traz a tona, sem estardalhaço, a questão fundamental de nossa civilização.
Karin volta ao quarto. A voz que a chama é Deus. E ela quer ir a seu encontro. Uma porta se abre e Ele vem a seu encontro. Karin grita, foge, se apavora. Ela é levada por sua familia e medicada. E diz: Eu vi Deus e Ele é como uma aranha, um terrível animal que me olhou com seu impressionante olhar frio, ausente, vazio. Karin optará por voltar ao hospital. No conflito de seus dois mundos, ela escolhe a loucura.
Mas o filme continua. E é nesse final que o toque do mestre se faz. Mas antes um comentário.
Deus seria uma aranha, a vida a teia em que Ele nos captura. Somos insetos em sua teia, presos. Mas não é apenas isso. O pai, numa cena crucial, diz que observa Karin, sem se envolver em seus problemas. Eis outra imagem de Deus, alguém que nos observa, indiferente, rompido com os homens. O filme tange a ideia de que somos um tipo de experimento que não deu certo, Deus nos virou as costas.
O irmão reclama logo no inicio que o pai não fala com ele, o ignora. Após Karin ir embora, rumo ao hospital, o irmão pergunta ao pai se Deus existe. O pai diz que não sabe, mas que o amor existe, com certeza o amor existe. O irmão pergunta se Deus não seria esse amor. O pai responde que isso não importa, o que interessa é que Karin está cercada pelo amor de sua familia. Esse diálogo, breve, é feito à luz de uma janela. O pai sai de lá e o filho, sózinho, diz com um quase sorriso: "Meu pai falou comigo!" Imediatamente o filme se encerra. Sem música, sem The End, sem nada, simplesmente vem o final. Seco.
Quem já tentou produzir arte, seja romance, pintura ou música, sabe o quanto é dificil chegar a simplicidade plena. Como é árduo conseguir dizer muito falando pouco. Impressionar sem chocar e despertar emoções sem violência. Quando o rapaz diz sua fala final, todo o drama de pais e filhos, de mestres e discípulos, de fiéis e Deus, cai sobre mim. Cubro meus olhos com a mão e choro. E peço a meu pai que fale comigo. Fale comigo como jamais falou. Fale comigo. Eis o drama central de toda a nossa civilização, esse pungente pedido de que alguém fale conosco, nos olhe, preste atenção, afirme que existo.
Karin foi sacrificada ( auto-sacrificada ) para chegarmos a esse encontro de pai e filho. E o mar, liso, vasto, magnífico, a tudo assiste sem se importar. A ilha permanecerá a mesma, mas aqueles quatro seres terão chegado perto de um sentido.
O que mais algum filme pode dizer?

NICOLAS CAGE/ DORIS DAY/ COCTEAU/ BERGMAN/ MANOEL DE OLIVEIRA/ JOE WRIGHT/ GABIN

FÚRIA SOBRE RODAS de Patrick Lussier com Nicolas Cage e Amber Head
Barulho e corpos decepados. Mulheres nuas em cenas não-sensuais. Machismo a enésima potência. E Cage no meio daquilo tudo. Adoro filmes de ação sem cérebro. Sou fã de Jason Statham e fui de Bruce Willis/ Mel Gibson. Mas filmes de ação precisam de leveza, de algum humor. O que vemos aqui é grosseria pura e nada de emoção. Video-game em que voce não joga, assiste e engole. Estamos no ponto mais baixo do cinema. Nota ZERO.
A TEIA DE RENDA NEGRA de David Miller com Doris Day, Rex Harrison e Myrna Loy
Um elenco superior para um filme comum. Doris é esposa aterrorizada por telefonemas anônimos. Rex é seu marido e Loy uma amiga. Tem classe, mas o roteiro não se distingue por nada de especial. Serve para fãs de Hitch que gostam de conhecer suas imitações ( meu caso ). Doris, uma atriz sempre subestimada, segura o papel. Nota 5.
INVERNO DA ALMA de Debra Granik com Jennifer Lawrence
Por entre toneladas de entulho, bando de zumbis esfomeados e drogados vaga sem destino e sem nada para se ocupar. Uma menina deprimida vai à procura do pai em meio a esse mundo lixo ( que não é o meu ). É só isso. Um filme perfeito para quem confunde arte com depressão, ou que mostrar a verdade é mostrar gente zumbi. Se voce viajar grandão no filme, voce até pode imaginar que há ali a constatação do fim da figura paterna/deus e dos restos de coisas tentando ocupar esse vazio. Vazio que é inescapável. Mas o filme é realmente tão rico? Ou ver isso é empurrar sentidos que ele não merece ter? A atriz não atua, apenas fica zanzando pelo set. Foi dificil ficar acordado. Nota ZERO.
A BELA E A FERA de Jean Cocteau com Jean Marais e Josette Day
Para se avaliar um clássico é preciso vê-lo mais de duas vezes. Na primeira vez em que vi este filme ( 1991 ) chamei-o de obra-prima. Na segunda vez ( 1999 ) apenas de um excelente filme. Agora o considero um filme interessante, bonito ( a foto é de Henri Alekan ) mas nada de tão grandioso assim. Nosso gosto se apura com o exercicio do olhar e do escutar. Em 91 o que eu conhecia de cinema? Bom..... A história é aquela do desenho Disney. Claro que numa chave mais adulta. Cocteau, para os meninos que não sabem, foi poeta, coreógrafo, pintor, diretor de cinema e escritor. Bom em todos esses ramos, genial em nenhum. Amigo de Picasso, Matisse e toda a turma boêmia da Paris 1920/1940, seus filmes sempre possuem um visual rico, sonhador, poético. Mas também apresentam sempre algo de flácido, suave demais. É o caso. Nota 6
SINGULARIDADES DE UMA RAPARIGA LOURA de Manoel de Oliveira com Ricardo Trêpa
Se Clint Eastwood viver mais vinte anos terá a idade que Manoel tem hoje. Um milagre! E tomara que Clint ( e Woody ) consigam. Manoel de Oliveira é pouco apreciado em Portugal. Seu sucesso vem da França e da Espanha. Fácil saber o porque: ele expõe aquilo que os portugueses não gostam em si-mesmos. Aqui ele pega um conto de Eça e faz um filme de uma hora, apenas. E que filme é esse? Uma radiografia sobre a facilidade com que um amor nasce dentro de uma pessoa, e a mortal capacidade que esse amor tem de se escapar. Se amar é fácil, perder um amor é mais fácil ainda. O filme nada tem de trágico. Aliás, nada tem de emocionante. A paixão é exposta como coisa fria. E o fim é ainda mais frio. As cenas nunca são bonitas, são precisas, simples, naturais. É um tipo de cinema diferente, distante, de cenas longas, nada espetaculares. Em meio a tanta bobagem é um alivio. Mas por outro lado, há uma ostentação cultural, um pedantismo que chega a irritar. De qualquer modo, quando um ator recita um poema de Fernando Pessoa ( Alberto Caieiro ) faz-se a luz. É uma cena maravilhosa. Manoel de Oliveira não é de nosso tempo. Seu filme parece ter sido feito por um contemporâneo de Machado de Assis, Proust ou Thomas Mann... E ele o é. Nota 6.
O SÉTIMO SELO de Ingmar Bergman com Max Von Sydow, Bibi Andersson e Gunnar Bjorson
Quando temos diante de nós um filme como este, tudo o que podemos fazer é ajoelhar e bater palmas. O prazer em assisti-lo é inenarrável. Se voce não compartilha desse prazer, sorry, voce não sabe o que perde. Morte, história, coragem, jogo, estes os temas do filme. Bergman constrói cenas sobre cenas que nos ficam gravadas na cabeça como sonhos acordados. É, como diz Pauline Kael, o único filme medieval que parece ter sido feito na época. Bergman compreende o que foi aquele tempo. De certa forma, ele viveu seus conflitos em termos de culpas medievais. Foi um homem que enfrentou o dragão. Inescapável marco do cinema. Nota DEZ.
ARDIDA COMO PIMENTA de David Butler com Doris Day e Howard Keel
Doris está adorável como Calamity Jane, a heroína do oeste, com jeito e roupas de homem. Keel é um cowboy seu amigo. O filme, musical, mostra sua transformação em mulher atraente. É um musical de sucesso, mas não é um dos grandes. Em que pese o talento de Doris e de Keel, o filme tem uma encenação comum, pouca ousadia em seus números. È apenas uma diversão ligeira, da época em que se produziam filmes às toneladas. Nota 6.
GAINSBOURG de Joann Sfar com Eric Elmosnino, Laetitia Casta e Lucy Gordon
Um bom filme sobre um ícone. Sfar surpreende: caso raro de bio que não sente pudor em amar seu objeto. Serge é tratado como personagem de lenda, de conto de fadas. A encenação é rica, e suas canções estão lá ( La Javannaise é a melhor ). Bacana terem lembrado de France Gal, mas bem que podiam ter dado um jeito de colocar Anna Karina. A terceira parte, quando ele encontra Birkin, é a melhor. O encontro com BB é o pior resolvido. De qualquer modo, é obrigatório para fãs, para francófilos e para quem gosta de boa música. Para o resto será uma surpresa. Eric tem atuação de gala, mas Serge não era tão feio! Lucy é uma Jane convincente ( sim, se usavam saias tão curtas ) e Laetitia está longe da beleza de BB. Pena Claudia Schiffer não ser mais jovem.... A atriz que faz Grecco nada tem da esquisitice da musa existencialista. No mais, é um filme sobre um homem muito sexólatra feito de forma estranhamente pudica.... Sinal dos tempos.... Nota 7.
HANNAH de Joe Wright com Saoirse Ronan, Cate Blanchet e Eric Bana
Ainda não passou aqui este novo filme do excelente diretor de Desejo e Reparação e de Orgulho e Preconceito. Do que trata? Saoirse ( excelente ) é uma menina criada pelo pai ( Bana ) para saber se defender. Na verdade ela é parte de uma experiencia que não deu certo. Blanchet é a agente governamental que fez parte do projeto e que agora quer eliminá-la. Sentiram o drama? É HQ das mais banais. E o filme é esquizo até o osso. Wright, um talento enorme, trabalha com esse roteiro banal e faz misérias com as cenas. Não há um excesso de cortes, não há violência demais. Mas há a criação de um clima angustiante e principalmente, Wright consegue fazer um filme de hoje que se parece com futuro distante. Vemos aquele mundo sórdido, à Blade Runner, e percebemos que é nosso mundo, é agora. Um filme cheio de erros ( o pior é a trilha sonora vulgar ) mas que deixa se perceber o talento, grande, de seu diretor. Nota 6.
A TRAVESSIA DE PARIS de Claude Autant-Lara com Jean Gabin e Bourvil
Demorou mas virei fã de Gabin. Acho que precisamos de uma certa idade para gostar de seu jeito lento, duro, seco e mal-humorado. O chapéu de lado, o cigarro em toco, as mãos gordas. O maior mito francês em cinema. Aqui ele é um pintor bem sucedido que se envolve com o contrabando na segunda guerra só para ver como é. Ele ama a vida e quer conhecer esse lado de viver entre contrabandistas desesperados. Seu camarada é um apavorado e afobado pobretão, sempre nervoso e quase estragando tudo. O que eles contrabandeiam é carne de porco ( há a morte de um porco no começo que pode ofender alguns ). O filme, filmado nas ruas escuras de Paris, é uma diversão deliciosa. Assistimos com interesse a caminhada desses dois perdidos pela cidade tomada pelo medo e por soldados nazistas. E é lindo ver a Paris escura, fria, suja, pobre, da guerra. Nota 7.

O sétimo selo - diálogo de Antonius Block com a Morte



leia e escreva já!

O SÉTIMO SELO, UM BERGMAN FEROZ ( RELIGIÃO X ARTE ).

Ingmar Bergman tem raiva. A repressão sofrida na infância ( como mostra Fanny e Alexander ) lhe deixou a marca da dúvida, da angústia e da dor. Nenhum cineasta tratou melhor desses temas, e nenhum cineasta foi mais independente. Bergman fez sempre o que desejou fazer. Na arte e na vida. O Sétimo Selo fez dele uma estrela intelectual, no ano em que além desse filme-marco, ele lançou Morangos Silvestres e preparou O Rosto ( meu favorito ).
De qualquer modo, para o bem ou para o mal, aquilo que conhecemos como "cinema de arte" nasce aqui. Antes de O Sétimo Selo, lógico, existia arte em Dreyer, Ozu ou Renoir, mas a relação do cinéfilo com tal tipo de filme se dá aqui. Desde este filme, "filme de arte" se tornou um gênero à parte.
Ninguém entendeu melhor a idade média ( opinião que compartilho com N críticos ). E neste filme estamos em momento chave da psique humana: a volta das cruzadas e a peste negra. Vários autores relatam que é no retorno da cruzada que se faz a crítica primeira ao cristianismo. Os horrores cometidos e a visão de reinos mais evoluidos que os europeus, fez com que a dúvida se entravasse na mente dos cavaleiros. Porém, mais importante que isso é a peste.
Uma de cada quatro pessoas morreu na peste. Seria como se hoje 2 bilhões de pessoas no mundo morressem em dois anos. Corpos jogados nas ruas apodrecendo, cidades sendo evacuadas, gente gritando pelas ruas, a certeza de que o mundo iria terminar. Psicólogos e filósofos que admiro dizem que foi momento de tamanho horror, que a angústia moderna perante a morte tem sua origem nesse momento. O idílio do paganismo/cristianismo primitivo morre com o horror da peste, com o medo sem fim. O europeu se torna grave, sisudo, angustiado, covarde.
Dois homens acabam de voltar da cruzada e encontram a Europa em terror. A morte acompanha um deles e os dois jogam xadrez. Essa morte nada tem de religiosa. Ela acontece, ceifa vidas, mas nada sabe do que faz. O cavaleiro que joga com ela ( um enigmático Max Von Sydow, que voce viu no filme recente de Scorsese ), é um questionador. Ele quer saber porque Deus não fala com ninguém. O outro que o acompanha já é um homem da renascença, ele tem suas respostas e todas são negações: Deus não existe, o Diabo não existe e os homens não são livres.
Os dois andam e encontram um casal de atores. Eles criam um filho e são muito simples em sua arte mambembe. O ator tem visões e numa bela cena ( que remete a Morangos Silvestres ) ele vê a Virgem Maria com um bebê. O cavaleiro se faz amigo dos dois enquanto um terceiro ator se envolve com mulher casada. Há uma bela cena em que o casal se apresenta cantando e são interrompidos por uma procissão religiosa. Bergman mostra a oposição entre a leveza criativa vital da arte e o peso mortal e tétrico da igreja. Mas ele não é um criador simplório e voce deve sempre duvidar do que Bergaman parece dizer. Pois a pergunta que essa cena traz ( e todo o filme ) é: Onde está a verdade? Se o masoquismo da procissão é ato de histerismo e cegueira, na arte há também algo de ilusório e falso. Ou não?
Uma das mais belas cenas é de uma jovem bruxa sendo queimada ( que remete a Carl Dreyer ). O cavaleiro quer saber se ela, naquele momento final, consegue ver o demônio. Aturdido, ele percebe que os olhos dela nada vêem, apenas o medo e o horror ( ou não? ).
Como todo gênio, Bergman não responde, pergunta. Tudo o que ele sabe é que viver dói. E que existem momentos de alivio que compensam a dor. O casal de atores sobrevive. Mas o outro ator, que fugiu com a mulher casada, em cena de humor cruel ( o filme tem humor quase todo o tempo, humor medieval ) tem sua árvore derrubada pela morte. Morte que trabalha sem cessar.
A cena final é uma das mais conhecidas, os mortos dançando atrás do ceifador. Mas não é esta a cena derradeira, há ainda uma breve tomada do casal partindo. Mais vida e arte irá nascer. Para então morrer.
Porque Bergman, mesmo falando de morte, me faz feliz? Fácil responder: minha alma vibra ao presenciar talento verdadeiro. Por mais triste que seja o tema, eu me alegro ao ver como um homem de gênio lida com essa dor. Nada de falso, nada de artifício, nenhuma apelação. Filmes simples e que jamais se esgotam. O Sétimo Selo seria tema para infindáveis conversas. Penso no jovem Woody Allen vendo esse filme em NY-1956 e pirando para sempre. Vejo-o hoje, em 2011, Brasil, e mais uma vez sinto uma coceira mental, uma vontade de pensar e de perguntar.
Ingmar Bergman é um gênio, seu talento está além do cinema.

LOSEY/ VISCONTI/ BURT LANCASTER/ OLIVIER/ HITCHCOCK/ HELEN MIRREN/ JACK NICHOLSON

EVA de Joseph Losey com Jeanne Moreau, Laurence Harvey e Virna Lisi Se eu gostasse tanto de Moreau como Losey parece gostar, o filme seria melhor. A trilha sonora de Michel Legrand é fascinante e a fotografia de Gianni di Venanzo faz deste um dos mais elegantes filmes já feitos. Fala de uma relação completamente vazia entre um homem poderoso, confiante e uma mulher sem alma. Ele sucumbirá. Filme bom de se olhar, mas tão árido quanto seu tema. Losey fugiu do MacCarthismo e se deu bem na Europa. Tem vários filmes maravilhosos, este não é um deles. Nota 5.//////// RUMO A FELICIDADE de Ingmar Bergman com Maj-Britt Nilsson, Stig Olin e Victor Sjostrom Bergman é uma alegria em minha vida. Toda a dor que ele mostra em seus filmes ( e que deprime alguns ) me dá força, paz e confiança. Porque? Pela magnifica beleza que existe em seu mundo. Cada close, cada tomada, todo ator em cena, a escolha das músicas, tudo é digno, claro, hipnótico, belo sem ser tolo ou piegas. Este é seu último filme antes da entrada em sua fase genial, fase de inigualável sequencia de obras-primas ( entre 1951/1982 ). Este fala de jovem casal que não consegue ser feliz. O egoismo dele tudo aniquila. Um filme simples, um ensaio para coisas maiores. Nota 6. ////////HAMLET de Laurence Olivier com Olivier e Jean Simmons Não preciso falar da excelencia dos atores. Este foi o primeiro filme ingles a ganhar o Oscar de melhor filme ( em ano muito forte, basta dizer que venceu Sierra Madre ). Já foi meu filme favorito, o que confirma a tese de Paul Valery de que crescemos todo o tempo com a prática da apreciação artistica. O filme é ainda maravilhoso, mas com esse texto e esses atores que filme não seria? Shakespeare tem alguns bons filmes no cinema, mas o melhor não é este ( é RAN de Kurosawa, baseado em Rei Lear ). O cenário é feito de escadas em espiral, fumaça e escuridão, e Simmons é a Ofelia mais bela possível, mas a direção de Olivier se perde as vezes num excesso de freudianismo ( sim, este é Hamlet sob a ótica de Édipo ). De qualquer modo é um espetáculo nobre e que deve ser sempre visto e revisto ( é minha sexta apreciada ). Hoje um filme tão elevado ganharia o prêmio? Nota 9.//////////// O AGENTE SECRETO de Alfred Hitchcock com John Gielgud e Madeleine Carrol Hitch na Inglaterra fez filmes melhores que nos EUA? Ele próprio pensava que não, mas fica bem para um certo tipo de esnobe dizer que sim. Tolice! Embora na Inglaterra ele tenha feito algumas obras-primas, é nos EUA que ele atinge o cume dos cumes. Este é um suspense médio que serve para mostrar Gielgud, o melhor ator ingles de teatro ( é dele o maior dos Hamlets ), e que jamais deu certo nas telas. Nota 6. ////////////SABOTAGEM de Hitchcock com Silvya Sidney e Oskar Homolka Um belo Hitch da fase inglesa. Cheio de ação e com um clima opressivo, sórdido, cruel até. Lemos em entrevistas que ele não gostava do filme, mas é incompreensível: é uma obra invulgar. Destaque para a cena no ônibus e a da sala de cinema, Hitchcock já sendo um mestre absoluto. Nota 7. ////////////////A ÚLTIMA ESTAÇÃO de Michael Hoffman com Helen Mirren, Christopher Plummer e Paul Giamatti Só agora é lançado este filme que assisti um ano atrás!!!! Escrevi sobre ele na época e o registro novamente. Se voce quer saber algo sobre o gênio Tolstoi nada vai saber vendo o filme. Mas se voce quer ver dois atores dando aulas de magia e carisma, aqui está. Helen Mirren é a melhor atriz viva, Plummer não desaparece ao seu lado. O filme é bastante melancólico ( existe algum filme "artisitico" feito hoje que não o seja? ), e está longe de ser do tamanho que o tema merecia. Mas é bem superior a 99% daquilo que voce pode ver agora. Nota 6. /////////////////VIOLÊNCIA E PAIXÃO de Luchino Visconti com Burt Lancaster e Helmut Berger Citando Valery outra vez, se voce tem já alguma intimidade com grandes filmes corra ao Cinesesc e se dê o privilégio de ver esta obra-prima. Se voce ainda está naquela ração de lançamentos da semana, fuja. Visconti é o contrário de tudo o que se faz em cinema agora ( quase tudo ), ele é titânico. Seu tema nunca é modesto, tudo é sempre grande, vasto, operistico. Este adorável filme me toca profundamente por falar de meu tema favorito: decadencia. Vemos a vulgarização do mundo de um esteta, o assassinato da aristocracia de gostos e de gestos. O filme exibe a vitória da vulgaridade, do espalhafato, da grosseria. Quando os novos inquilinos chegam, vemos a barbárie rica e pretensamente chic tomar o poder. Impotente, só resta ao aristocrata assistir estoicamente o fim de seu mundo. Lancaster brilha intensamente. Cada olhar que ele nos dá é um testamento de nobre pensamento. O filme é inesquecível. Nota DEZ!!!!!!!!!! O MÁGICO de Sylvain Chomet Que decepção!!!! Este desenho homenagem a Jacques Tati ( parece que ele deixou um esboço de roteiro que foi aqui usado ) é tudo o que Tati nunca foi: chato. Os traços são maravilhosos, as ruas de Londres e de Edimburgo estão belas como em sonho, mas o desenho é de uma melancolia que parece forçada, poética demais. Há que se comentar um fato: por que os desenhos feitos a mão parecem mais humanos? Sem saudosismo, os digitais são mais perfeitos, mas um desenho como este sempre tem mais "autoria", mais calor. Mas o roteiro, sobre um mágico modesto, é enfadonho! Nota 4.////////////////// HEAD de Bob Rafelson com Monkees, Jack Nicholson, Frank Zappa e Victor Mature Jack Nicholson e Rafelson, amigos até hoje, se encheram de ácido e escreveram o roteiro desta viagem psicodélica. Entregaram tudo aos Monkees, que após o fim de seu seriado de sucesso na NBC, se despediam da fama com este fracasso. O filme é um caleidoscópico dia na vida da banda. Mas é dificil resumir a história ( que história? ). A trilha é fascinante e o filme, que hoje é hiper-cult, acaba sendo uma diversão bastante instigante. Para se ter uma idéia do filme, há uma cena com Zappa puxando uma vaca e outra com os Monkees presos num secador de cabelos. Foram meus primeiros ídolos, eu os amava apaixonadamente aos 7, 8 anos de idade. Ainda sinto algo quando os vejo. Nota 6.

BERGMAN/ JOHN FORD/ BOORMAN/ GODARD/ CHABROL/ CAROL REED/ ANTHONY MANN

PERSONA de Ingmar Bergman com Bibi Andersson e Liv Ullman
Dificil classificar este filme. Todas as notas que dou têm relação com o prazer. Não dou um dez porque o filme é importante ou complexo. O dez é dado ao filme que me dá um supremo prazer, seja estético, seja emotivo, seja moral. Mas como falar de Persona? O filme tem a profundidade simbólica dos melhores sonhos, mas ao mesmo tempo é árido. Nenhum prazer existe em sua visão. Assistir este filme é sentir desconforto, medo e até mesmo angústia. Não há como em outros filmes do mestre, o alívio prazeroso da bela imagem e dos atores geniais. Aqui tudo é dor. Impossível a mim dar uma nota.
OS DEZ MANDAMENTOS de Cecil B.de Mille com Charlton Heston, Yul Brynner e Anne Baxter
Aqui tudo é circo. Cecil se despede do cinema com imensa produção. São milhares de figurantes, bichos e cenários gigantes. Heston é Moisés e Brynner é o faraó. Anne está uma delícia como Nefertiti. Tem tudo nesse enredo de crioulo doido: tempestades, milagres, a voz de Deus, escravos, estupro e lutas. Profundo como um episódio de cartoon. Estranhamente é ainda divertido em sua cafonice esperta. Nota 6.
A VIDA ÍNTIMA DE SHERLOCK HOLMES de Billy Wilder com Robert Stephens e Colin Blakely
Na primeira parte vemos Holmes como um tipo de dandy gay viciado em cocaína. Watson é seu simplório amigo que como bom vitoriano finge nada perceber. É um tipo de comédia suave. Mas quando acontece o crime e Holmes passa a tentar o resolver o filme se perde. O caso é óbvio e simples demais para um detetive tão genial. È um dos últimos filmes de Billy e foi imenso fracasso. Nota 4.
DEPOIS DO VENDAVAL de John Ford com John Wayne, Maureen O'Hara e Victor McLaglen
Deixa eu contar: este é o filme favorito de meu pai. Assisti com ele quando eu tinha 10 anos de idade, na Globo, sábado às 21 horas. Lembro que achei o filme muito bobo, muito alegre e muito cheio de socos. Na adolescência passei a detestar esse tipo de filme ( como detestei tudo que lembrasse meu pai ). Mas após os 30 anos comecei a aceitar esses filmes, a ver sua poesia, seu imenso valor mitico. É o maior sucesso em bilheteria de Ford e ganhou Oscar. Conta a história de americano que vai a Irlanda ( Galway ) comprar casa que foi de seu pai. Lá, ele se enamora de vizinha ( Maureen maravilhosa ) e briga com grande valentão do lugar. O filme mostra a Irlanda do folclore, onde todos bebem e brigam, riem e fazem tudo beeeem devagar. Ford cria seu universo fordiano, mundo onde os mitos e os símbolos vivem. O filme é de uma comovente simplicidade e de uma esfusiante beleza. Wayne irrompe como rei da masculinidade e Maureen é a fêmea ideal. Lembrete de outro mundo possível ( extinto? ). Nota DEZ!!!!!!!!!!!!!!!
XEQUE-MATE de Paul McGuiguan com Josh Hartnett e Lucy Liu
O que significa este filme? O ponto mais baixo em que uma diversão pode chegar? Observem: um filme ruim, antes, era um filme mal feito. Um filme ruim agora, como é este, é um filme mau. Violência pornográfica, roteiro imbecil e atores deploráveis ( o tal Josh mal sabe falar ). Há participações de atores de verdade ( infelizmente muito curtas ): Ben Kingsley e Morgan Freeman e de dois bons tipos: Bruce Willis e Stanley Tucci. Mas este lixo é inominável. Nota ZERO.
EXCALIBUR de John Boorman com Helen Mirren, Cherie Lunghi, Liam Neeson, Nicol Williamson
Uma fascinante viagem por mundo interior. Percebemos por entre as brumas nosso mundo e nossos símbolos mais imorredouros. Jung mora em cada personagem. Quando esta saga termina, sentimos que alguma coisa nos foi fixada. Há uma riquesa imensa nestas imagens. As cenas de Lancelot são as melhores, exemplos simples do que é o amor cortês. Nota 8.
FEDORA de Billy Wilder com William Holden e Marthe Keller
Último filme de Billy. Sem dúvida é o pior filme já feito por um grande diretor. Chega a dar pena. Trata-se de uma gororoba mal temperada sobre atriz anciã que tenta voltar ao cinema. Diálogos risíveis e interpretações lamentáveis. Nota Zero.
BANDE À PART de Jean-Luc Godard com Anna Karina, Sammi Frey e Claude Brasseur
Liberdade em forma de filme. Jean-Luc pega tudo que esperamos e nos devolve transformado. Os atores brincam e nos encantam, Anna dá um show no papel de uma bobona. O filme é leve, jovem, solto e soberbamente anárquico- mas atenção! É para amantes de cinema, sua magia está no filme em sí, não em sua "história". Nota 9.
ALPHAVILLE de Jean-Luc Godard com Anna Karina e Eddie Constantine
Godard consegue nos levar à ficção científica sem criar cenários ou efeitos. Ele filma a Paris de 1965 de um modo "esquisito", e nos faz crer que aquilo é um "outro mundo". Em que pese essa habilidade, este é de todos os seus filmes da primeira fase ( a fase Anna Karina ), o menos interessante. Um James Bond de vanguarda, ou um Godard em sci-fi. Nota 4.
MULHERES FÁCEIS de Claude Chabrol com Bernadette Lafond e Stephane Audran
É a história de 4 moças em Paris. Seus amores ( ou não ), bebedeiras, orgias e seu trabalho alienante. O filme é bastante ousado para a época e tem um final hitchcockiano. Lafond é uma comediante maravilhosa, tudo nela é ironia. Chabrol jamais foi um gênio, mas era um cineasta seguro, afiado, instigante. Nota 7.
O ÍDOLO CAÍDO de Carol Reed com Ralph Richardson e Michele Morgan
Na embaixada da França em Londres, um menino apegado a mordomo, presencia sua infidelidade e no processo descobre o que significa a palavra "verdade". Este filme, feito por um dos 3 maiores diretores ingleses, é uma obra-prima de suspense. O final me deixou com o coração na mão!!!! Detestamos o menino cada vez mais e nos compadecemos do mordomo e de sua amante. Cenários belos e labirínticos e fotografia exemplar de Georges Périnal. O grande ator shakespeareano, Ralph Richardson, mostra todo o medo e toda a aceitação do destino do patético mordomo. O filme, original e asfixiante, é uma jóia do melhor momento do cinema inglês. Veja e se apaixone por esse muito grande diretor. Nota DEZ!!!!
O HOMEM DOS OLHOS FRIOS de Anthony Mann com Henry Fonda e Anthony Perkins
Mann nunca errava???? A primeira cena deste western já é antológica, um passeio em grua, num preto e branco brilhante, pela cidade. Mas o filme é todo assim, uma aula de cinema. Fonda está estupendo como o herói amargo e quieto, exemplo de virilidade bem resolvida. Seus olhos são os olhos de um anjo caído. Tudo neste filme caminha para seu final catártico. Quem desejar saber o que é um herói e para que serve uma aventura, que veja este monumento. Anthony Mann, mestre de westerns que se fazem mitos, dava estatura de arte filosófica a filmes aparentemente banais. Um diretor perfeito. Nota DEZ!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

EU E EU- PERSONA- BERGMAN- EU MAIS NADA

Cenas que parecem não fazer sentido. Farão. Quero não ver. Vejo.
Aridez. Um menino se ergue de cama. Um rosto imenso na parede. O toque. Tudo é branco. Tudo é vazio. Ingmar sabe como é nosso inconsciente. Desolado e sem tempo. Eterno agora.
Atriz ficou muda. Enfermeira cuida dela. Quando vão para a praia o filme começa.
( Ignácio Araújo disse que hoje indicar Morangos Silvestres para alguém é considerado ofensa pessoal. Tristes tempos em que pensar é desejar o mal ).
Na praia. É uma ilha?
Somente a enfermeira fala. Bibi Andersson. Liv Ullman está muda por todo o filme.
Mas não há uma cena em que ela fala?
( Pauline Kael diz que a cena em que Bibi descreve uma transa na praia é "a única cena em cinema que entende o erotismo" ).
O filme começa a penetrar fundo, muito fundo em minha mente.
Sinto medo.
( Bergman foi filho de pastor. O pai lhe batia e depois exigia beijo na mão. A mãe variava entre frieza extrema e calor amoroso. Foi assim que Bergman aprendeu a observar rostos esperando o que viria a seguir. Ninguém filma faces como ele. E segundo Isabela Boscov, só ele tem a altura de seus temas- o sentido da vida. )
Começo a viajar no filme.
Seria Liv Deus? A enfermeira somos nós falando com Deus? Ele estaria mudo? Com Sua face de calma e indiferença? O sofrimento atroz de Bibi seria nossa dor? Onde Ele está?
Talvez não.
O filme se rompe literalmente. Precisamos ver sem a película.
Chega um homem que conhece a enfermeira.
Mas então as duas são uma? Ela seria a máscara e a outra a alma? Mas sendo assim a solidão deste filme é insuportável. Nossa vida nada mais seria que um diálogo entre eu e minha persona. Pior: diálogo onde um dos dois é mudo.
Falar com Deus também é falar com um mudo.
Mas há o rosto.... Bergman é o menino e as duas são sua mãe.
O desespero do filme é o desespero de um menino ( desprezado ) que tenta se comunicar com a mãe e falha sempre.
Mas é um filme apenas, vemos Sven Nykvist filmando.
O não e o nunca encerram o filme.
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Quando penso em diretor de cinema genial eu penso em Hitchcock ou Kurosawa.
Quando penso em gênio no cinema, penso em Bergman.
Está longe do cinema. Seu mundo é o de artes mais individuais, mais profundas, não espetaculosas.
Em seu alcance existencial, bergman só tem pares na literatura.
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O filme termina ( não termina )
Continua a se passar inteiro dentro da minha cabeça.
Tenho medo de dormir. Sinto uma solidão de gelo.
Acordo com ele dentro de mim.
Persona.
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O novo diretor japonês que também se chama Kurosawa ( e que é muito bom ) diz que na época de Ozu, Akira Kurosawa e Mizoguchi o mundo era mais feliz. Porque se acreditava no cinema. Hoje, tempos de finais, em nada se crê. )
Eu creio em Ingmar Bergman.

JEAN BECKER/ASQUITH/BERGMAN/BOGART/SOLARIS

CONVERSAS COM MEU JARDINEIRO de Jean Becker com Daniel Auteill
Becker, filho do grande Jacques Becker, é um dos bons diretores franceses atuais ( apesar de já veterano ). Aqui ele mostra uma linda história sobre amizade. Um pintor bem sucedido, pensa em reformar sua horta. Chama um jardineiro, que é, para sua surpresa, um antigo colega de escola. Amor, família, vida. Tudo é falado e vivido pelos dois. O filme jamais se torna chato. Ele flui, leve, colorido, saudável, bonito. Muito bom. nota 7.
O AMOR EM CINCO TEMPOS de François Ozon com Valeria Bruni-Tedeschi
Cansei de Ozon. Seu cinema frio, analítico, me entedia. Um saco este chatíssimo drama. Que me interessa a vida de dois malas que nada têm a dizer ? nota zero.
NUNCA TE AMEI de Anthony Asquith com Michael Redgrave e Jean Kent
Foram 400 anos de teatro inglês para se atingir a excelência da atuação de Mr. Redgrave. Ele é um anti-"sociedade dos poetas mortos". Um professor chato, duro, amorfo. A cena em que sua fortaleza desmorona é de uma comovente verdade. Redgrave se reclina, lendo uma dedicatória, e chora de costas para a câmera. O choro não é teatral, é contido, doído, magistral. Um filme absolutamente perfeito, levado com nobresa pelo elegante Sir. Asquith. E com um ator que é um Mozart do palco e da tela. Inesquecível e obrigatório. nota Dez!!!!!
O TÚMULO VAZIO de Robert Wise com Boris Karloff e Bela Lugosi
Muito bom esse Wise. Em mais de trinta anos de carreira dirigiu musicais como West Side Story ou A Noviça Rebelde; e mais faroestes, policiais e um clássico como O Dia em que a Terra Parou. Este é seu segundo filme, um terror da RKO. Karloff está muito bem, compondo um fascinante vilão. nota 5.
HORAS DE TORMENTA de William Wyler com Humphrey Bogart e Frederic March
Na velha Hollywood, quatro diretores eram todo-poderosos : George Stevens, Frank Capra, John Ford e principalmente William Wyler. Um diretor considerado até hoje o mais " capaz" da história. O que significa esse "capaz" ? Que Wyler nunca errava. Jamais alguém poderia chamá-lo de gênio, ou de ousado; mas ele era a certeza de fluidez, competencia e muita inteligência. Ele sabia fazer, sabia dirigir atores, sabia narrar. Conquistou três prêmios de direção e mais seis indicações não premiadas. Dirigiu de tudo : musical, western, filme noir, romance de fadas, filme de arte, de tribunal, comédia maluca, filme de guerra. De Ben-Hur à Princesa e o Plebeu. Sempre acertando. Este é de seus últimos filmes. Bogart é um muito desagradável bandido. Invade uma casa e mantém a família como refém. O filme é um duelo entre Bogey e o chefe da casa-March. Um filme tenso, rico em desdobramentos e que flui com rapidez. Um tipo de filme de Scorsese antes do tempo. Muito, muito imitado. Nota 8.
JUVENTUDE de Ingmar Bergman com Maj-Britt Nilsson
É impressionantemente o décimo filme de Bergman. Aos 30 anos!!!!! Bom tempo em que um diretor de trinta anos já dirigira dez filmes... Ele considerava este seu primeiro trabalho "de verdade". É sua primeira obra-prima. E talvez, seu filme mais simples. Uma bailarina, aos 28 anos, sente-se pela primeira vez na vida, "velha". Ela viaja à uma ilha, onde recorda um amor que viveu aos 15 anos. O filme é sómente isso. Uma sessão de terapia onde vemos a bailarina tomar consciência de quem ela foi, é, e será para sempre. Mas é também, como Bergman sempre faz, muito mais. Trata-se de uma exposição. Mostra a vida dos adultos em contraste com os jovens. Uns, cínicos, cruéis, desesperançosos; e os jovens, leves, risonhos, apaixonados, crentes. As cenas de namoro entre o jovem casal são reais, graciosas, e maravilhosamente atuais ( o filme é de 1951, mas, que estranho, parece ser de 2009 ). Maj-Britt, mais uma das maravilhosas atrizes de Bergmann, linda-moderna-enfeitiçante, tem uma atuação natural, uma menina cheia de sexo, de encanto e de alegria. Mas seu rude amadurecimento nos corta a respiração, porque é exatamente como se dá com todos nós : um amadurecimento amargo, cruel e surpreendente. Tudo que Bergman faria depois já se encontra aqui : a beleza da fotografia ( há filme mais belo que este ? ), as falas solenes, os atores geniais, a preocupação com sexo/morte/alma. Um encantador trabalho, um leve e delicioso filme, onde roteiro, música e atores se esmeram em criar duas horas de absoluto prazer e de intenso drama. Gênial. nota Dez!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
SOLARIS de Andrei Tarkovski
É tido por obra-prima. Que nota darei ? A fotografia é linda ( há uma cena com um cavalo de estarrecer de tão bonita ), o roteiro é poesia filosófica, a câmera é precisa. Mas o que dizer ? O filme tem o único defeito que não poderia ter : é grotescamente chato. O divino Oscar Wilde já dizia : perdoamos tudo em alguém. Ele pode roubar, pode mentir, pode ser falso e enganar, mas ser chato é imperdoável. nota zero!!!!!!

morangos silvestres, a vida é um círculo

Aqui no ocidente, somos educados a acreditar que a vida é uma reta. Partimos de um ponto e caminhamos em direção a outro ponto. Esse ponto final pode ser o nada, Deus ou o cosmos, não importa, enxergamos sempre uma estrada reta à nossa frente.
Para o oriental, a vida é um círculo. Não existe ponto de saída, não existe ponto de chegada. Estamos eternamente repassando pelos mesmos locais e momentos. O antes é o amanhã e o ontem se repete no futuro.
Morangos Silvestres já foi meu Bergman favorito. Hoje eu prefiro O Rosto. Mas como dizer qual o melhor ? Um artista de tal nível transcende julgamento. Seus filmes são concretos, estão alí, reais e eternos. Não precisam de nossa opinião. Permanecem no circulo, estão fora do tempo. E Morangos Silvestres fala exatamente disso : o tempo.
Um velho escreve, sonha, viaja de carro e " retorna à sua casa de infância ". O que acontece ? Penso, agora assistindo o filme pela quarta vez, que na verdade esse professor já está morto quando o filme se inicia. O que assistimos não é sua memória, mas sim, sua entrada no paraíso. Será ? Hoje penso que sim.
Leio que o jogador Adriano está morando na favela. Um belo texto na Veja sobre isso. Não é questão de cultura, é questão de espírito : o lugar onde pela primeira vez fomos felizes é nosso paraíso. A primeira manhã, o primeiro amor, a primeira brincadeira, a magia da descoberta. Para Adriano, a favela será para sempre o seu ninho, sua perfeição, sua beleza.
A última cena de Morangos Silvestres é uma das mais belas já filmadas. O professor enxerga seus pais pescando, os pais o percebem e acenam. Ele acena e os olha : um olhar único : o velho senhor se torna uma criança diante de nosso olhar maravilhado. Ele acaba de adentrar o paraíso. Pois é isso que todo grande artista faz, nos exibe céu e inferno, mesmo que não o queira ou saiba. E cada vez mais me convenço disso : viver é andar no círculo : nos afastamos da infancia e a ela retornamos para nos afastar outra vez... se soubermos perceber.
Como julgar este filme ?

o filme mais sinfônico-FANNY E ALEXANDER

Bergman realizou FANNY em 1983. É seu testamento, seu último filme para cinema, seu legado ( como bom pessimista, ele imaginou estar perto do fim. Ainda viveu 24 anos...).
O filme é uma perfeita sinfonia e se a grande arte sempre aspira a ser música, Fanny é arte perfeita.
Ele começa em acordes leves e vagos, cresce em festa de sons harmônicos e coloridos, irrompe fortíssimo em graves dissonancias lúgubres e se encerra numa coda cheia de fúria, magia e mistério.
Mas do que fala o gênio, o mestre, o mais inteligente dos cineastas ?
Da luta entre alegria e dor, da disputa entre liberdade e repressão, saúde e neurose, arte e religião, fantasia e tédio, Deus e o homem. É um compêndio de todos seus filmes anteriores, de todas as suas dores e alegrias e recorda muito Shakespeare- A Tempestade ( um mago recontando sua obra e sua magia ).
Raras vezes um filme mostrou cenários tão ricos em beleza e complexidade, raras vezes tantos atores foram melhor dirigidos ( o final, quando se fala da gratidão aos atores é de se aplaudir de joelhos ), raras vezes um filme foi melhor.
Bergman captura nosso cérebro e o leva para uma viagem. Através do olhar de um menino ( Alexander ) assistimos seu crescimento, suas dores, sua revolta e seu maravilhoso humor ( o filme tem duas das falas mais hilárias já vistas ). Nos apaixonamos por sua família, odiamos certos agregados e tememos seu destino. Tudo em ritmo perfeito, uma variação entre cenas longas e curtas, movimentos elaborados de câmera ou fixidez formal, solos ( monólogos ) ou grupos de até vinte atores atuando em grupo ( coisa que hoje ninguém mais tenta ).
Tudo está neste filme. Comédia amarga e drama insuportável. Citações de PERSONA, GRITOS E SUSSURROS, MONIKA, MORANGOS SILVESTRES, O ROSTO... estão presentes os atores que aprendemos a amar, a fotografia do mestre Sven Nykvyst, a música de Schumann e Britten, as preocupações do cineasta que melhor representou a dor do mundo moderno.
É estranho o fato de que meus cineastas favoritos sejam Kurosawa, Hitchcock, Hawks, Ford, Murnau, Lang... mas é Bergman que fala, pensa e mostra aquilo que vivo, penso e gostaria de expressar. Não sei se ele foi o melhor dos diretores, não sei se ele sobreviverá neste mundo cada vez mais acéfalo; mas ele conseguiu fazer do cinema UMA ARTE NOBRE, nobre como Shakespeare, Mozart, Shelley e Rembrandt.
FANNY E ALEXANDER é obrigatório para qualquer amante da vida, do cinema, da cor. Ele é estranhamente feliz, alegre, vivo e subitamente trágico. Nietszche.
Um filme que é uma vida, um espírito livre, eterno como um homem, belo como um segundo, feito com profundo amor pela arte, imensa criatividade e potencia criativa sem igual.
Mágico, único; INCOMPARÁVEL.

O ROSTO

Ingmar Bergman confia em nossa inteligência. Ele realmente acredita em nosso poder de entendimento, de atenção e de raciocínio. Seus filmes são um tipo de homenagem a quem os assiste.
Se houvesse um tipo de paraíso do cinema, Bergman teria a companhia de Kurosawa e dos Irmãos Marx nesse céu. Isso porque seus filmes me fazem bem, me dão paz, prazer, bem estar ( é claro que os trabalhos de Groucho, Ingmar e Akira são diferentes entre sí, mas me dão o mesmo nível de prazer ).
Em seu filme, O ROSTO, um grupo de mágicos ambulantes se defronta com um cientista e o chefe de polícia. O grupo é acusado de charlatanismo e será posto à prova.
Pois bem, Bergman nos coloca em dúvida todo o tempo.
Afinal, Vogler,o mágico, é um mentiroso? A magia que ele faz, é real ?
Dificil continuar elogiando esta obra de arte sem contar seus segredos ( segredos que não posso contar. ) Basta dizer que Bergman assume uma posição corajosa no final, subvertendo toda nossa expectativa.
Conduzido de forma lógica, sem conceder jamais ao melodrama ou ao coração, o filme termina da melhor forma possível. Da única forma cabível.
No mais, a fotografia em P/b de Gunnar Fischer chega a tirar o fôlego, ela é aveludada, suave, quase tátil.
Max Von Sydow está genial, como de costume, e sua face no primeiro confronto é inesquecível ( e reparem como ele muda de cara na segunda parte ).
Um comentário inevitável : onde Bergman conseguia tantas atrizes tão maravilhosamente lindas e tão genialmente talentosas ?
O ROSTO fica assim, como um testemunho de uma mente brilhante que acredita no brilho de quem o assiste.
É necessário mais ?
UM BICHINHO, UM PERIGO, UMA MULHER
Descobri a atriz sueca Harriet Andersson há apenas dois mêses.
Acho incrível ainda ser possível, após tanto tempo assistindo e estudando filmes clássicos, ainda existirem tesouros para serem descobertos.
Harriet iniciou sua carreira em 1951, e vou comentar exatamente esse começo através de 2 filmes : Monika e o desejo, Noites de circo.
Em Monika ela é uma adolescente tosca, com modos e aparencia de camponesa. Ela foge para uma ilha com seu tolo namorado. Engravida, tem um filho, se casam, trai o garoto.
Brigitte Bardot ficou famosa por representar, pela primeira vez, um tipo de mulher sexy que não era uma vagabunda e nem uma musa etérea. BB era uma garota saudável. Com desejos. Ela não fazia um tipo, ela era uma mulher.
Como Goddard escreveu nos anos 60, Harriet em Monika fez isso antes. Neste filme ela não é culpada por nada, não é boazinha, não faz pose de diva, ela é simplesmente uma mulher que deseja sexo. E consegue.
Sua sensualidade chega a ser hipnotizante, e ela tem uma cena de nú ( em 1953 ! ), do mesmo tipo das que BB faria. Ela não posa nua, ela caminha nua.
Bonita, belíssima ela é ( embora para os padrões dos meninos de hoje, ela seja fêmea demais ), mas é uma beleza real, sem artifício, animal.
Num de seus livros Bergman chama Harriet de um dos poucos gênios que o cinema já conheceu. Note bem, Bergman chama Harriet, uma atriz, de gênio. Eu concordo. Porquê?
Hepburn e Bette Davis foram as melhores atrizes que o cinema já viu, mas não eram geniais. Elas faziam tudo com arte e carisma, mas não criavam, não arriscavam. O gênio arrisca, faz o novo, tenta, procura e pode até ser ridículo. Brando era gênio. Giulieta Masina era. E Harriet.
O jovem Goddard nos 50, ainda crítico dos Cahiers, disse que Monika tem o mais belo plano do cinema. É quando, em meio a um diálogo, Harriet se abstrai da conversa e encara de frente a lente da câmera. Ela sai do filme, e como nossa cúmplice, nos encara. Nos tornamos seus amigos, olhamos sua alma, compreendemos Monika e participamos da genialidade.
Goddard faria isso com Ana Karina em diversas vezes, mas aquela foi a primeira vez que um ator sai da cena e encara a platéia ( não como Groucho, que nos olhava sendo Groucho e comentava o filme. Não. Harriet nos olha como Harriet ).
O filme em sí não é um dos grandes Bergman. É apenas isso, um solo de Harriet.
Noites de Circo, feito dois anos depois, é um filme melhor. De uma amargura sem saída, com algumas cenas belíssimas ( o perfeccionismo visual de Bergman é inigualável ).
Um velho dono de circo namora uma amazona ( Harriet Andersson ). Cansado da miséria, ele tenta voltar a ex-esposa, mas é recusado. Ela se envolve com ator rico e esnobe, é humilhada. Os dois, o velho e ela, acabam juntos e derrotados. Apesar desse tema árido, o filme é fácil de assistir, jamais enfadonho e muito bonito sem parecer afetado.
Harriet marca muito, como Ana, a amazona, dando seu show de total sensualidade, parecendo um bichinho mimado, depois uma menina sexy e então, uma camponesa vulgar.
Em tempo, mais um toque:
Mesmo nesses secundários filmes de Bergman, notamos com facilidade algo de original, de único, em cada take, em cada cena. Autoridade. Não houve diretor que passasse mais autoridade. Aquela impressão de que ele sabe do que está falando, que ele sabe segredos, pode nos ensinar a viver, pode desvendar a vida.
No cinema de hoje, a ambição máxima é ser um novo Spielberg, um novo Scorsese. Sinto falta da verdadeira ambição. A de ser um novo Bergman.