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TROUBLE IN PARADISE ( LADRÃO DE ALCOVA ), O FILME MAIS ANTIGO DO MUNDO

Existem obras de arte que são atemporais. Por exemplo: Sherlock Holmes. Apesar de seu charme "Inglaterra 1900 ", o tipo de diversão que Conan Doyle nos oferece é atemporal: mistério, suspense, gótico. Henry James é atemporal em sua psicologia do dinheiro e Proust é o mesmo em sua radiografia dos sentimentos. Nosso modo de pensar o poder e a sociedade é o mesmo de James e nossos ciúmes, medos e desejos são os mesmos de Proust. Mas há obras geniais que são testemunhos de seu tempo e são válidos como visita àquilo que fomos e provavelmente jamais voltaremos a ser. O valor, imenso, dessas obras se dá por sua BELEZA, por sua ENGENHOSIDADE. Pelo tamanho do espírito de quem as fez. Nada têm a ver com nosso mundo, mas nos fazem um bem imenso ao nos mostrar que existiram outros modos de ser e de fazer. Nos revigoram. Ativam partes obstruídas de nossa mente. ----------------------- Penso que uma pessoa que viva apenas na sua contemporaniedade é uma pessoa escravizada. E em 2022, um dos tempos mais pobres da história humana, viver com os dois pés e a mente neste momento é viver com apenas 2% daquilo que uma pessoa pode ser. ------------------ Ler John Milton ou Marlowe é ler algo passado, tomar contato com sentimentos e atitudes que nos são estranhas. E por isso são vitais: são descobertas daquilo que mora em nossa sombra mais escura. Ruínas que testemunham aquilo que perdemos. Ecos distantes que existem como forças indomadas porém incomunicáveis. Jamais entenderemos racionalmente o que era aquele mundo, mas podemos tomar contato com as forças que nos construíram. Como disse, há algo de profundamente liberador ao nos relacionarmos com uma arte perdida. No mínimo entendemos que somos mudança sem fim e que o que hoje parece definitivo é apenas uma etapa. Em seu melhor aspecto, crescemos muito, pois tomamos posse de uma herança comum a todos. ------------- O cinema já possui filmes em seu passado com mais de um século de idade. E alguns deles continuam a ser contemporâneos ( e espero que voce tenha entendido que isso não é um mérito em si ). Há filmes dos anos 20 ou 30 que continuam atuais porque falam de sentimentos que permanecem os mesmos. Há filmes que têm uma forma, um estilo de produção que permanece válido. Cortes rápidos, história com conteúdo, atores realistas, modo natural, são características de 2022 e que vários filmes antigos já as tinham. Mas existe gente como Ernst Lubitsch e seu cinema é completamente VELHO. E de todos seus filmes nenhum é mais VELHO que LADRÃO DE ALCOVA. --------------------- Lubitsch foi um homem da cultura vienense, um homem da virada do século XIX para o XX. O que caracteriza essa cultura é sua malícia elegante, o amor ao estilo, o modo de fazer acima do conteúdo, a discrição, a descoberta do sexo como poder, o horror à grosseria. Todos os seus filmes exibem tudo isso em imensas porções, mas só perceberá esse universo aquele que não tiver os dois pés em 2022. Assistir seus filmes é olhar para um mundo perdido em definitivo. ------------- LADRÃO DE ALCOVA conta a história de um casal de ladrões. Ele se faz passar por um nobre francês ( sim, em 1932, ano do filme, ainda havia nobre francês dando sopa por aí ), ela se faz passar por uma americana rica. Mas logo sabemos que os dois mentem. Se conhecem logo no começo do filme e de modo brilhante Lubitsch encena seu encontro: ele a rouba e ela o rouba. Percebem o furto, riem, e se unem. O amor nasce da alegria do trabalho em comum, o modo elegante de roubar é encenado de maneira rápida, alegre, leve. ------------ Juntos eles armam um golpe em cima de uma milionária. Ele se aproxima como um nobre falido, e a milionária o contrata como secretário. Ela é indicada para ser uma governanta. Mas algo dá errado: ele se deixa seduzir por ela. Lubitsch evita sempre o romance meloso, como vienense, e o roteiro é de Billy Wilder, ele crê que o amor é interesse mundano. O dinheiro vence o sentimento. Mas é hora de dizer o porque do filme ser o mais velho.... --------- A sedução. Herbert Marshall faz o ladrão. E não há ator menos contemporâneo que ele. Inglês, ele tinha uma perna mecânica, fora atingido por bomba na guerra de 1914 em que servira. Desse modo, em todos os seus filmes, ele mal se move, sua atuação é sempre da cintura para cima. O olhar é suave como brisa de primavera, a voz veludo fino, as mãos mal se notam, as roupas parecem recém passadas. O modo como ele seduz a milionária é suave, calmo, discreto, profundamente delicado. Voce nunca viu olhar como o dele. E apesar de tanta delicadeza, eles logo vão para a cama, pois Lubitsch sempre sugere sexo, sexo de adultos. Herbert Marshall nunca é violento ou ousado, ele DESEJA mas nunca IMPÕE. É ela quem abre a porta do quarto. ----------------- Ela é Kay Francis uma atriz que tem a presença chique dos anos 30: cabelos curtos, corpo magro e longo, olhar sonhador, voz maliciosa. As roupas são sempre justas e brilhantes e ela seduz a Herbert Marshall pelo que não diz, pelas frases ditas pelo meio, pela porta aberta, pelo olhar que evita mirar. Miriam Hopkins é a cumplice-ladra, uma atriz do estilo apimentada anos 30: na época se dizia LEVADA DA BRECA, uma maluquinha da era do jazz. Ela transpira desejo sexual por Marshall, os olhos brilham e cada roubo é uma penetração. ------------ Pelas palavras que usei voce deve ter percebido que nada neste filme lembra nem remotamente o cinema de hoje. Nada aqui é explícito e o que não se diz é mais importante e veemente que aquilo que é dito. É um cinema de pontinhos ... e nunca de exclamações !!!!!. Os ambientes são propositalmente artificiais, os coadjuvantes são TIPOS adoráveis ( Charlie Ruggles e Edward Everett Horton estão admiráveis como sempre ), a trilha sonora comenta a ação, os cortes são abruptos e dizem aquilo que não foi dito, a ação mantém o ritmo de um relógio, não acelera e não atrasa, os risos jamais são gargalhadas. O filme pede que nos sintamos educados, que relaxemos e gozemos o tempo em que ele transcorre. Imagino o prazer em ver esse filme em 1932, uma peça de arte delicada em um mundo que tentava preservar sua civilidade entre duas guerra hediondas. ----------- A palavra chave aqui é essa; CIVILIDADE. Neste filme tudo é civilidade. É, como toda obra de Lubitsch, uma homenagem à um mundo que morria, uma tentativa vã de o salvar. Wilder fazia o mesmo mas já sabendo que o mundo que ele amava era morto. Lubitsch ainda tinha esperança. CIVILIDADE, não há nada mais fora de moda no cinema contemporâneo. Asssitir este filme é ver fantasmas. É um cinema que nada pede, antes nos convida. Que não exibe, sugere e que não tenta emocionar, seu obejtivo é entreter. Elegante, muito elegante.

O CÍRCULO VERMELHO - EDGARD WALLACE

Depois de Sherlock Holmes e antes de Agatha Christie, houve Wallace. Inglês, como são os outros dois, começou a publicar na virada do século e morreu ainda jovem, na década de 1930. Ao contrário de Conan Doyle, seus romances policiais não possuem aquele clima vitoriano, pausado, cinzento, racional, que tanto atrai nas histórias típicas de Holmes. Mas também não se parece com Christie, pois Wallace nunca criou um detetive central, cada um de seus livros, e são dezenas, tem personagens novos. É o livro policial britânico, milhas e milhas distante do estilo americano que seria criado quase que ao mesmo tempo em que Wallace iria para Hollywood, fazer o roteiro de King Kong. Ele vendeu muito. Chegou a ser durante décadas, um dos autores mais lidos do mundo. Para voces terem uma ideia, na minha velha edição da Enciclopédia Britânica, edição de 1971, não há verbete algum sobre Conan Doyle ou Agatha Christie. Não há nada sobre Chandler ou Hammett e nem Patricia Highsmith. Mas há um verbete sobre Edgard Wallace: autor de romances policiais ditos best seller. São autores de sorte. Publicaram exatamente durante o curto período em que ler era a atividade central de um lar de classe média. Jornal, revista e livro, lia-se tudo. Não havia nenhuma concorrência, o rádio chegaria apenas nos anos 30, ia-se ao cinema, mas dentro da casa, apenas livros. No mundo mais desenvolvido, o analfabetismo estava quase erradicado, então tudo se uniu para que, entre 1870-1930, ler fosse a diversão mais importante ( não escrevo única porque havia o jogo, a canção dentro de casa, as reuniões entre amigos, e o simples e civilizado ato de conversar ). Devo ainda dizer que vi, o Brasil é atrasado, o reinado do rádio, a TV aqui só se tornaria rainha no meio dos anos 70, e lembro bem de jornais e revistas com tiragens aos milhões. Edgard Wallace, em bancas e supermercados, sempre no prelo, entre Christie, Doyle, Huxley, Orwell, Nelson Rodrigues, Jacqueline Susann, Simone de Beauvoir, Harold Robbins, Cassandra Rios, Erico Veríssimo e Jorge Amado. Lido hoje ele se mostra bastante inferiro a Christie e Doyle. Mas li divertidamente. Valeu.

DWAYNE- BILL CONDON- PETER BOGDANOVICH-WIM WENDERS- GUY RITCHIE- LAWRENCE- GUERRA

   UM AMOR A CADA ESQUINA de Peter Bogdanovich com Imogen Poots, Owen Wilson, Jennifer Aniston, Rhys Ifans, Will Forte, Cybill Shepard.
A produção é de Wes Anderson e de Noah Baumbach. Tem participação, como ator, de Tarantino. Ou seja, a nata do cinema de 2015 dando uma força para Peter, o grande diretor revelação de 1971 com A Última Sessão de Cinema. E que depois fez algumas excelentes comédias doidas, como aquelas que se faziam nos anos 30. Mas aqui nada funciona. É triste ver os atores se esforçando ao máximo para dar vida a personagens tão fake. Na comédia doida tudo é fantasia, tudo é exagerado, mas havia nelas uma inteligência, nas falas, que tornava tudo "verdadeiro". Pelo exagero se chegava à verdade final das relações. Aqui as pessoas são apenas loucas. Elas correm, gritam, mentem, fogem, voltam, e fazem com que nos sintamos indiferentes. Não chegam a ser antipáticos, são apenas chatos. Penso que deveríamos achar Imogen fofa. Ela é apenas bobinha. Owen deveria ser charmoso. É apenas oco. E a pobre Jennifer deveria ser divertida. É apenas sem peso. Triste ver um filme que pensa ser chique, leve, amoral, cínico, ser apenas infantil, truncado, espertinho e ingênuo. Um fiasco! ( Atenção a Imogen. Ela será uma estrela ).
   A ESTRADA 47 de Vicente Ferraz com Daniel de Oliveira
Bom tema: o brasileiro na guerra de Hitler. Penso que Ferraz tentou construir um clima à Kurosawa. A estética a serviço do absurdo. A guerra vista como confusão, medo, dor e niilismo completo. Mas falta muito para se chegar perto do mestre japonês ( ou de Naruse ), o filme não nos envolve. Histeria e frio que nunca vira narração.
   LADY CHATTERLEY'S LOVER de Jed Mercúrio com Holliday Grainger e Richard Madden.
Filme da BBC que foi exibido em setembro de 2015. Os filmes de TV da BBC nada mudaram. A Globo os exibia nos anos 70. Eram bem interpretados, solenes, adaptações de livros escritos no período vitoriano ou eduardiano. A única mudança foi nas cores dos sets: antes eram marrons e dourados, agora abusam do azul pálido e do cinza. Continuam sendo filmes bem feitos e meio mortos. Sem fibra e sem paixão. A antítese dos filmes de Boorman, Loach, Anderson, Schlesinger ou Losey.
   EVERYTHING WILL BE FINE de Wim Wenders com James Franco, Charlotte Gainsbourg, Rachel McAdams
Os primeiros dez minutos são ótimos. Neve e mais neve no Canadá do norte. Um homem atropela uma criança. Ele é escritor e é casado. E daí vem a crise... De admirável o fato de termos um filme "de arte" que não apela para sexo explícito, cenas de violência chocante ou um discurso calcado na velha ladainha de raiva adolescente. É adulto, lento, pausado, com imagens fortes, bem pensadas e nunca gratuitas. Mas é também insuportavelmente lento, escuro, triste e sussurrado. Não se pode dizer que não deu certo, ele é exatamente aquilo que Wenders imaginou.
   TERREMOTO, A FALHA DE SAN ANDREAS de Brad Peyton com Dwayne Johnson, Carla Gugino,  Ioan Gruffud e Paul Giamatti.
É bom poder dizer que este Terremoto é muito melhor que aquele de 1974. Não é uma refilmagem, mas tem o mesmo tema. Aqui os efeitos são ótimos, a ação vem na hora certa, nunca como única meta, mas sim como consequência, e ficamos muito satisfeitos com a diversão que ele nos dá. Sim, somos uma geração que se diverte vendo o fim do mundo...Quem sabe não sejamos no fundo uma geração descrente do mundo sólido e das cidades como centro da vida....Relaxe, enjoy!
   MR. HOLMES de Bill Condon com Ian McKellen, Laura Linney.
Já falei deste filme abaixo. Holmes está senil e luta para recordar a resolução de um crime de 30 anos atrás. Enquanto isso faz amizade com um menino e cria abelhas. Um bom filme com atuações ótimas. O final é bastante memorável.
  O AGENTE DA UNCLE de Guy Ritchie com Henry Cavill, Armie Hammer e Alicia Vikander.
Esperto, chique, divertido e charmoso. Tudo que imaginamos ter sido viver entre 1958-1965. Essa foi a época dos mais luxuosos filme. E foi o tempo do bom gosto. O filme tenta copiar esse tempo. E consegue! Os atores são bacanas, a trilha sonora imita Schiffrin e Barry, e Guy até diminui sua velocidade. Tipo do filme que te deixa de boas e faz com que você se sinta mais civilizado.

MR. HOLMES, UM FILME DE BILL CONDON

   Tenha na mente que Conan Doyle era espírita. E assim você poderá entender o porque deste filme.
   Sherlock Holmes, rei da lógica, frio, vaidoso, cético, está aqui com 93 anos. É tempo da segunda-guerra. É no campo. Ele vive isolado com uma governanta e o filho desta. Ele está velho e seu corpo começa a vacilar. Perde a memória. O menino se apega a ele e juntos eles cuidam de um apiário. Ao mesmo tempo, Holmes tenta recordar um caso que ele deixou pelo meio, sem solução.
  O filme até então parece bonito, só que meio vazio. Tudo parece sem rumo, vago. Mas há uma reviravolta, que não devo contar, e em seguida mais uma, que muda tudo ao seu redor. A morte surge, e com ela a dúvida, a insegurança e finalmente a humanização de Holmes.
  Os atores, Ian McKellen, Laura Linney, são ótimos, e o menino rouba o filme. Nada há de bonitinho aqui, nada de doce, é apenas a vida "normal". A não ser em sua última cena.
  Holmes junta pedras e na beira do mar ergue os braços aos céus. A lógica é derrotada e ao afundar na dúvida Sherlock Holmes perde toda a segurança e se torna um outro. Conan Doyle é a alma por detrás de Holmes e quem é a alma de Doyle só ele poderia dizer.
  O filme se afirma então. Fazia muito que não se fazia tão clara mensagem sobre a descoberta. Pequeno e humilde filme. Deve-se ver.

ARTHUR CONAN DOYLE- A TERRA DA BRUMA, SHERLOCK ENCONTRA O ESPIRITISMO

   Hmmmm....sei não. Acho que não gostei deste livro, bonito, de capa dura, recém lançado pela Zahar. O autor de Sherlock Holmes, na parte final de sua vida, arregaçou as mangas e mergulhou no mundo dos espíritos. Esta narrativa, uma peregrinação pelos centros espíritas da Londres de 1920, nada mais é que a propaganda de uma fé. Claro que permanece a maestria de Doyle em criar clima, ambiente, mistério. Mas onde está o personagem interessante? Ninguém aqui nos cativa, como fazem Holmes e Watson.
  Já frequentei centros, e apesar de meu interesse religioso, algo neles sempre me desagradou. No espiritismo existe a mania do século XIX de tudo racionalizar. O mundo dos espíritos me parece ordenado demais, claro demais, corriqueiro, muito positivo. Creio em mistérios, mas o que me incomoda é que o espiritismo nada tem de misterioso. Dessa forma, Doyle passa o livro todo procurando nos convencer da verdade de suas experiências. Eu não sei.
  Arthur Conan Doyle foi médico, esteve em duas guerras e passou a viver de escrever com o imenso sucesso de Sherlock. Após os 50 anos, ele que sempre fora muito curioso, resolveu investigar a ""febre"""espírita que tomava Londres então. Se convenceu da veracidade. Interessante observar a perseguição policial que era feita contra os mediuns, todos acusados de charlatanismo, e a certeza que Doyle tem de que no futuro todos serão espíritas. 
  Para ele, o mundo das almas não é aceito porque a certeza em sua presença colocaria o mundo de ponta cabeça. Toda a vida produtiva, todo o esquema de poder, o modo como avaliamos a história, tudo seria posto abaixo. E os poderosos não podem aceitar a ideia de que somos todos iguais, todos alma eterna, todos com o mesmo dom e o mesmo futuro. Um mundo plenamente espírita seria um mundo de absoluta paz. A vida aqui seria como uma escola, um aprendizado, destituído de ambição material e de medo.
  Eu não sei.

A AGULHA OCA- MAURICE LEBLANC, O OCASO DE ARSÉNE LUPIN

   Li um livro sobre Os Franceses em que Theodore Ziegler diz que o que define um francês é sua pretensão outsider. Todos querem ser do contra, sempre. Pois bem, a resposta francesa ao sucesso de Conan Doyle e seu Sherlock Holmes tinha de ser alguém como Arséne Lupin, um gênio do crime, um bandido charmoso, o cérebro a serviço da mentira. Tudo é dúbio em Lupin, torcemos pelo bandido.
   Imenso sucesso por todo o século XX, Lupin hoje anda meio esquecido. Vale o reencontrar. Leblanc escreve com precisão, cria expectativa, nunca ofende a inteligência do leitor. Ego gigantesco ( o contraste com Holmes é completo ), Lupin aqui engana um pequeno gênio investigativo que pensa estar em sua pista. Mais não conto. As féria de verão logo irão chegar e ler este livro a varanda numa tarde quente será grande prazer para voces todos.
   Fácil de achar em sebos. Compre.

007/ KEN LOACH/ PAUL NEWMAN/ REDFORD/ CADILLAC RECORDS/ WISE

   500 MILHAS de James Goldstone com Paul Newman, Joanne Woodward e Richard Thomas
Adoro filmes de automobilismo e adoro Paul Newman, mas este filme, cheio de modernices na edição esperta e na trilha sonora pop, é uma chatura! Muito romance entre o casal central e pouca corrida. Jamais desperta o interesse. Nota 3.
   THE GREAT WALDO PEPPER de George Roy Hill com Robert Redford, Susan Sarandon e Margot Kidder
Logo após os Oscars e os dólares de Golpe de Mestre, Roy Hill e Redford voltam com este delicioso filme sobre um piloto da primeira guerra mundial que vive entre feiras do interior dos EUA se exibindo em troca de dinheiro. Redford, um Brad Pitt mais humano, exibe seu sorriso mais simpático e faz um sonhador que luta para viver como quer. O filme, comédia que acaba por se fazer amargura, é belíssimo. A fotografia é de Robert Surtees, um mestre em campos e céus sem fim. Há uma cena tristíssima com a jovem Sarandon e o fim do filme é corajoso, aberto, sem conclusão. Veja que é uma bela surpresa. Entre 1967/ 1977 Roy Hill e Redford não erraram. Nota 9.
   A BATALHA DO RIO DA PRATA de Michael Powell
Entre os 16 filmes de Powell que tive o prazer de ver, é este o único que não gostei. Fala do bloqueio feito pelos nazistas aos navios mercantes britânicos. O tom é patriótico demais! Nota 4.
   THUNDERBALL de Terence Young com Sean Connery, Claudine Longet e Luciana Paluzzi
Este, que é o quarto filme de Bond, é de todos os estrelados por Connery o menos bom. Por um motivo simples, o vilão é o mais fraco. As Bond Girls são das melhores, Luciana Paluzzi era hiper sexy e Longet fez algum sucesso na época, mas há um excesso de cenas sub-marinas e muito pouco humor. Mesmo assim, comparado aos filmes que viriam depois, é um bom filme. Nota 6.
   RATOS DO DESERTO de Robert Wise com Richard Burton, Robert Newton e James Mason
A história da resistência dos ingleses e australianos aos Afrikan Korps de Rommell. O filme é duro, forte, cruel e muito objetivo. E é muito, muito bom. Wise foi um diretor maravilhoso! Fez de tudo, desde A Noviça Rebelde até Star Trek. Sempre com fibra, sabendo como fazer e onde chegar. Feito em P/B, com o contraste entre areia cinza e céu carregado, explosões e rostos sujos, este é um dos mais bem realizados filmes de guerra que já vi. Nota 8.
   O HOMEM COM A PISTOLA DE OURO de Guy Hamilton com Roger Moore, Christopher Lee e Britt Ekland
Roger Moore tinha um sério problema, ele era frio demais, elegante demais, distante demais. Por isso, ele jamais convenceu 100% como Bond. Um cara como ele não mataria, mandaria matar. Sean Connery parecia um grosseirão assassino que aprendeu a ser fino e culto, por isso ele nos convencia sempre. Moore não, parecia culto e playboy, nunca um matador. Devo dizer que este filme, aquele do anão e da ilha na China, é ridículo. Bond cai na armadilha dos anos 70, se torna carnavalesco e auto-gozador. Britt Ekland, futura senhora Rod Stewart, foi uma suéca muito perigosa que destruiu todos seus ex-maridos ( Peter Sellers foi o primeiro ). Linda. No fim da coisa tem uma luta num quarto entre Bond e o anão ( Mr.Tattoo ), que é o ponto mais baixo de toda a saga James Bond. Nota 2.
   O CÃO DOS BASKERVILLE de Terence Fisher com Peter Cushing, Andre Morell e Christopher Lee
Sherlock Holmes é feito de ótimos diálogos e clima londrino. Isso faz de sua leiura um prazer, mas é uma armadilha para o cinema. Tudo fica falado demais, lento, meio xoxo. De qualquer modo ele melhora no fim. O elenco é ótimo, Cushing e Lee eram a alma da Hammer, da renascença do horror clássico. Nota 4.
   CADILLAC RECORDS de Darnell Martin com Adrien Brody, Jeffrey Wright, Beyoncé, Mos Def
Para aqueles que não gostam de rock ou de blues é uma perda de tempo. O filme fala da história real da gravadora Chess, desde 1941 até seu fim, com a morte de seu fundador Leonard Chess em 1966. O elenco está divino. Brody emociona e Jeffrey está impressionante, ele se torna Muddy Waters. Assim como Mos Def faz um Chuck Berry irresistível. Beyoncé produziu o filme e se deu o papel de Etta James. Ela é ótima, mas há um pouco de Etta James demais. Colorido, com as músicas icônicas que mudaram o mundo, é divertido, mas muito abaixo de seu tema. Nota 5.
   A PARTE DOS ANJOS de Ken Loach
Eu odeio aquilo que Irlanda e Escócia são hoje. Odeio aquilo que a Inglaterra é agora. Por isso me é repugnante ver esse bom filme. Esse sotaque grotesco me dá saudades da Louisiana e do Kentucky. Que jeito de falar é esse? Parece suéco ou islandês, inglês nunca! Que bem a influência latina e negra fez a lingua! Viva o inglês da BBC, com suas inflexões latinas e o inglês americano, com seu caldeirão étnico. Mas esse inglês celta, saxão, sem nada de normando, dos rincões da ilha, esse não! Dito isso...Bravo Loach! Ele é um tipo de intelectual europeu que está a desaparecer. Esquerda que crê no homem, que tem amor ao povão. Arte que mostra o mal e que aponta saídas. Ken Loach ama gente, ama o povo pobre e sem voz. Ao contrário dos artistas mais jovens, que mostram esse povo como coisa acabada e sem chance de mudança, Loach acredita em evolução, em mudança, em vitória. O filme é bem bacana ( apesar de minha aversão ). E real, bem real. Nota 6.

O MUNDO PERDIDO- ARTHUR CONAN DOYLE

   1912, ano de lançamento deste livro. Tempo em que ainda se podia acreditar em "lugares da Terra onde o mistério impera". Os Pólos, a Mongólia, ilhas do sul, interior da Austrália, Terra do Fogo, quase toda a África, todas essas eram terras mal conhecidas, pontos em branco nos mapas, mistérios, lugares de gente corajosa. E o Brasil, claro. Esta aventura se passa na Amazônia, e como diz seu narrador, Amazonas e Mato Grosso, duas imensas regiões que ainda não foram mapeadas.
   Então é para lá que vão nossos aventureiros, atrás de pistas de um local onde ainda vivem dinossauros. Não só dinos, como homens-macaco, os primeiros mamíferos e peixes excêntricos. Lá eles verão a repetição do momento decisivo da evolução humana, o momento em que o homem inteligente aniquila o homem besta.
   Conan Doyle tinha um grande ressentimento de Sherlock Holmes. Passou a vida tentando se livrar do estigma desse personagem. Aqui ele lança um de seus livros "não Holmes". Uma aventura corrida, direta, e porque não, imaginativa. É uma das fontes do cinema fantástico.
   PS: Quando eu era criança,e juro que não faz tanto tempo, ainda era um mistério ir lá pros lados de Mato Grosso. Uma viagem sob risco de vida. Não por causa de bandidos, mas por causa de doenças, indios e cobras. Um vasto mundo sem estradas e sem mapas. E lembro que o litoral sul de São Paulo era um imenso deserto, pontilhado por vastas áreas sem estradas e cheias de aldeias de indios. Ir para Cananéia era voltar a 1500.
   Sinto falta de saber que lugares assim ainda existem.
  

SHERLOCK HOLMES- ARTHUR CONAN DOYLE ( O MUNDO VITORIANO )

   Watson está calmamente tomando chá com sua esposa. Um mensageiro chega e lhe avisa que seu amigo, Sherlock Holmes o convida para ir ao Sussex, desvendar um caso de morte. A esposa permite que ele se ausente e então Watson parte. É ele que irá nos relatar a aventura. As histórias de Conan Doyle, em sua maioria, começam assim. E a cada vez que lemos esse inicio invariável ( já devo ter lido quarenta histórias de Holmes ), sentimos renovado prazer. Porque? Eu não sei e nenhum fã de Holmes saberia dizer.
   Li gente comentar que seria o encanto da Londres vitoriana em seu apogeu. As carruagens, o fog, as pedras no calçamento, as damas em perigo. Outros dizem que é a forma como Holmes desvenda o crime. Ele quase nada faz de físico, raciocina, segue aquilo que é dado, não imagina nada, apenas deduz sobre as bases do real. É um pensamento matemático, hiper-racional. Tudo o que ele olha são números que formam uma equação.
   Eu prefiro crer que o motivo principal do sucesso de Doyle é a criação da personalidade de Sherlock Holmes. Ele é um solteirão que toca violino, fuma cachimbo, aplica cocaína na veia e lê romances vitorianos. Segundo Watson, Holmes é fraco em filosofia, razoável em fisica e excelente em quimica. Com esse perfil, que une rigor e excentricidade, o que nos resta a não ser admirá-lo?
   Descobri seus livros tarde na vida. Só após os 40 anos comecei a ler. O primeiro foi o Estudo em Vermelho. Logo na terceira página o virus já me contaminara: era um Holmesmaníaco. O que me prende não é o desejo de desvendar o crime, não é a escrita clara e simples, elegante, de Conan Doyle, o que me prende é o prazer em estar no mundo de Sherlock Holmes. Eu gostaria de conhecer o grande homem, de ser amigo de Watson e de correr num fiacre com eles. A vida vitoriana, uma ilusão criada após a segunda-guerra, uma ilusão formada de chá quente, poltronas de couro e lareiras acesas, uma fantasia que continua a vender mobilia e filmes de amor, um mundo ideal que foi inventado em contraposição aos horrores reais demais dos últimos 70 anos, esse mundo é que seduz. O mundo vitoriano que nos deu de Peter Pan a Virginia Woolf, de Alice em seu país das maravilhas a My Fair Lady, mundo que pensamos sempre como reino de excentricidade temperada com humor e conforto, seguro. Mundo que nunca existiu ( o mundo vitoriano era na verdade um universo militarizado e silencioso ).
   Sherlock Holmes faz parte desse universo. Lê-lo é comungar dessa fé. E eu digo, se a Londres de 1900 não foi exatamente o que lá está, que me importa? Que se creia na lenda!