FIN DU SIÉCLE- OTTO MARIA CARPEAUX

   Decadentes. O mundo como lugar de decadência, anuncios do fim do homem como ser de cultura.
   Esteticismo. A beleza e a arte como um tipo de nova religião. A palavra como um simbolo, magia capaz de dar vitalidade àquilo que decai. Eis o Simbolismo.
   Estranho: O mundo vivia a última era de otimismo ( até agora foi a última ). Progresso e fim das guerras. Entre 1870 e 1914 a Europa viveu inéditos 44 anos de paz. Aviões, cinema, carros, prédios, filosofia positivista, pragmatismo, tudo apontava para a felicidade final. Burgueses podiam atingir o poder, livros eram editados às toneladas, dandys nas ruas. Mas os artistas se isolavam, levavam os ideais dos romanticos de 1790 ao limite. Porque?
    Sentiam-se excluídos dessa festa. Artistas eram considerados inuteis pelos burgueses, vagabundos, loucos. Ao contrário dos aristocratas que os compreendiam, o novo poder não os tolerava. A vulgaridade tomava as rédeas do mundo. Como reagir? Tornando a arte incompreensível para essa ralé espiritual. Ou denunciando a falta de gosto, de beleza nesse novo mundo. Ou usar essa burguesia tosca.
    Carpeaux nos situa nesse mundo. Momento, segundo ele, em que a literatura atinge seu apogeu. Nunca tantos autores interessantes escreveram ao mesmo tempo. Lia-se muita coisa boa, havia espaço para as coisas mais esquisitas. A nova classe dirigente logo foi seduzida pelos novos artistas. A busca da beleza se torna uma febre mundial ( menos nos EUA ). E estranhamente, nas entrelinhas, tudo anunciava o desastre que logo aconteceria. A destruição da "Europa Feliz" nas guerras de 14 e de 39. Impossível  compreendermos o que era essa outra Europa. Nascemos já com a terrível marca do medo, da desconfiança, da falta de fé no futuro e no poder. Não era assim. E estranhamente, os simbolistas fizeram isso todo o tempo: avisar sobre o iminente desastre.
    Claro que existiam excessões! Se Baudelaire é o primeiro simbolista, temos de dizer que ele amava a cidade grande e o progresso. Mas Rimbaud, Mallarmé e Verlaine não. Esses três, e Laforgue com eles, são os verdadeiros pais do simbolismo. Negam o mundo otimista de então, criam uma linguagem própria, procuram revivificar a vida, revitalizar o mundo. Está nascido o mundo do símbolo, poetas se jogam às mais perturbadoras experiências. Ansiam pelo estranho, pelo exótico, pelo inusitado, é um novo romantismo. Dessa vez, um romantismo não-satanico, eles trocam o culto ao anjo caído pelo culto a beleza decadente. São todos tristes, mas é uma tristeza orgulhosa, corajosa, dandy.
   Carpeaux fala de mais de 500 autores. Holandeses, noruegueses, romenos...Literaturas que mal conhecemos e que descobrimos com ele. E também as estrelas da época. Desses, Carpeaux critica Oscar Wilde. Diz que suas peças serão esquecidas. E também não morre de amores por Shaw. Os maiores elogios do livro vão para William Butler Yeats, Paul Valéry, Joseph Conrad e Marcel Proust. Mas há tanto mais! D'Annuzzio, Tchekov, Benavente, Forster, Rilke, Mann, Kipling, Wells, Henri Bergson, Nietzsche, Anatole France, Verne, Blok... e centenas de outros.
   Ele dá uma geral na história, na filosofia da época e deduz do porque das transformações. Disseca as diferenças entre as nações, a Espanha humilhada e se reerguendo, a Inglaterra que começa a perder seu dominio mas não sua pose, a Alemanha e suas ambições coloniais, a Itália pobre e atrasada... e a França, que volta a se sentir centro do mundo. Nos EUA a coisa é diferente. Eles não tiveram simbolismo, foram sempre realistas. A literatura que produzem nesse período é aquela "da fronteira", da aventura de se construir um país.
   Vou citar uma das histórias do livro, história que demonstra o espirito simbolista alemão, espirito que anuncia o nazismo e que ao mesmo tempo foi morto após a tomada de poder por Hitler. Stefan George, poeta central, tinha um namorado adolescente que morreu. Arrasado, George muda seu estilo e começa a escrever sobre seu namorado morto. Para o poeta ele se torna uma encarnação de um deus, um objeto de culto sagrado e exotérico. Pois bem, forma-se ao redor de George um círculo de seguidores. Todos passam a cultuar esse "deus", criam-se dogmas, regras rigidas e uma hierarquia. Quem não as seguir é banido do circulo. Para Carpeaux, esse é um fenômeno tipicamente alemão. Na Inglaterra, desconfiada, cinica, essa idolatria é impensável. Mas a Alemanha, seja por Wagner, por Goethe, por Marx, tem essa tradição de cultos, de sociedades fechadas em dogma, de mestre e seguidores fiéis. Após o desastre hitlerista esse aspecto do caráter alemão foi suspenso, mas desde sempre houve essa fé em lideres e em messias. Conto essa história para mostrar a linha mais interessante do livro, Carpeaux exibe a sociologia da literatura, a relaciona com o momento histórico e com o espirito da época. Não é mera exibição de autores e obras, é História.
   Quem me lê sabe que esse é meu tempo. Dandys nas ruas, decoração de Beardsley, a dubiedade da sexualidade, sentimentos estranhos, inusitados, a busca por algo mais, por revelações, por êxtases, pela verdade da vida. Eles experimentavam: religiões, linguas, drogas, sexo, isolamentos. As aventuras eram todas "para dentro", o espirito era dissecado, revirado, desafiado. Divino momento onde os mais terríveis e os mais sublimes escreveram.
   Fácil de ler, didático, profundo e direto. Deve ser lido e relido por todo leitor sério.

NIETZSCHE E O QUE IMPORTA NELE

   A Alemanha começou a crescer muito por volta de 1880. De repente burgueses exibiam nas ruas suas posses. Vaidosos, posavam otimistas, eram arautos do futuro. Militares mandavam em tudo. Era um regime militarista, prussiano. E os artistas, até então centro da vida alemã, se viram jogados ao canto, longe do poder, longe do centro. Goethe e Wagner não eram mais os heróis da nação, esses heróis eram a familia Krupp e Bismarck. Reis da indústria e o militar que arquitetou a Alemanha.
   Nietzsche surge nesse meio. Cheio de ressentimento. Filósofo sem sistema, jamais pode ser comparado a Kant ou a Hegel, ele está muito mais próximo de Pascal ou de Platão. Poeta-filósofo.
   Ele era um saudosista. Queria fazer da Alemanha uma nova Grécia. Via em Wagner o deus que traria á Alemanha a vitalidade do Mediterrâneo. Nietzsche ansiava por vitalidade. Via a seu redor uma nação em queda. Não percebeu que quem caía era ele. A Alemanha se erguia industrialmente, os artistas se perdiam, aturdidos pela nova pátria ambiciosa,  imperialista e materialista.
   Nietzsche foi um gênio do aforismo. Mas há aí um perigo, seus aforismos servem para tudo. Um orientalista verá neles a confirmação de sua crença, e assim será com um ateu, um simbolista, um fascista, um anarquista, um liberal. Eles parecem servir a tudo e a todos. O que devemos ter em mente é o que na verdade eles eram.
   Ele começa como pessimista, na escola de Schoppenhauer e ao final se torna um otimista, um cantor da alegria da carne e do fogo da vida. O que se manteve foi seu amor a beleza, ele sempre foi um esteta. Nietzsche idolatrava a beleza fisica do Mediterrâneo, a saúde dos corpos latinos, o sol. Ele via no cristianismo a negação de tudo isso, o culto a tristeza e a morte. Como diz Carpeaux, Nietzsche foi incapaz de compreender a humildade, via nela  ressentimento. Mas tudo no alemão aponta por um desejo absoluto por fé, por religião. Ele a encontra numa espécie de retorno ao paganismo, ao primitivismo. Ressentido com a nova nação, Nietzsche sente nostalgia do barbarismo.
   O ponto mais fraco de Nietzsche é aquele que ele considerava o mais forte, o Super-Homem. Esse ser seria para ele a salvação da Europa, a volta do europeu vital, da força do engenho e da vida. Engano que Burkhart logo percebeu e não aceitou ( Nietzsche era fã de Burkhart, o intelectual mais forte na Alemanha da época ), Burkhart viu que o Super-Homem seria o fim da Europa, um tipo de hiper-individualista que destruiria qualquer chance de união entre os homens.
   Fato estranho passa a ocorrer com Nietzsche após sua morte. Ele passa a ser, principalmente na França, um tipo de advogado para o hedonismo. Mal entendido, uma casta de burgueses privilegiados passa a viver à beira mar uma existência "nietzschiana", ou seja, sem regras, sem culpas e sem deveres. O poeta alemão ficaria chocado ao ver a leviandade com que sua filosofia de negação se torna para essa gente um tipo de álibi para o "bom-viver". Tudo pode e Tudo sem Culpa, esses se tornam os slogans de Nietzsche, slogans que ele jamais assinaria em baixo.
   Um grande poeta. Herdeiro de Holderlin, que ele adorava, último representante do humanismo puro na Alemanha, Nietzsche exerceu uma influência imensa sobre 90% da literatura feita entre 1900/1920. Genial criador de imagens, de frases, de efeitos, vivesse mais dez anos, se livre da loucura, ele teria encontrado o que? Em que alturas ele planaria?
   Nietzsche, como Jesus, Tolstoi ou Darwin, não tem culpa do que fizeram com sua herança. O tempo lhe deu sentidos postiços e distorceu o que ele desejava.
   Para ser entendido, deve ser lido sempre como um poeta. Poeta-filósofo, como o foi Platão. Poeta a procura da verdade. Em construção. Criança que descobre e pergunta, que nega e afirma, que se perde. Visto assim, ele foi imenso.

LINCOLN

   Leio hoje que o século XX não mereceu o século XIX. Eu jamais havia pensado isso. Que o século XIX preparou o mundo para ser um lugar muito melhor. Que o ano de 1900 prometia paz, progresso e cada vez mais justiça. O século XIX desenvolveu a ciência, trouxe a ideia de democracia de volta às mentes, popularizou as artes, e acabou com a escravidão. Mas meu século, o XX, destruiu quase todas essas ideias. Tudo o que os sonhadores do século anterior sonharam, o XX desfez.
  Lincoln não é um grande filme. Spielberg depois de velho resolveu ser John Ford. Mas ele não pode ser Ford porque o mundo onde Ford foi formado foi o idealista mundo do século XIX. Mas Spielberg tenta e devo dizer que pelo menos nesta época de cinismo e de negativismo blasé, Spielberg insiste em nos oferecer humanismo. O filme é digno, solene, seco e não faz concessões. Fala do tempo em que os homens faziam politica.
   Politica...Voce pode não acreditar mas a politica já foi a coisa mais importante da vida. Hoje ela não existe. Não se faz politica, se administra um banco. A economia tomou seu lugar. Porque politica não é pensar em termos de lucro e divida. Politica é ter projetos, pensar o futuro, acreditar em ideologias e saber fazer aliados e calar inimigos. Não há um só lider nacional que pense em termos politicos hoje. Pensam em conseguir lucros e assim garantir mandatos. São gerentes de bancos.
   Lincoln nos mostra a politica. E recordo de outra coincidência. Não faz mais de dois dias que li que o sexo tomou o lugar da politica na vida dos jovens. Nenhum jovem pensa em politica e isso é bom para quem odeia a politica mas ama o poder. Pois Lincoln amava a politica.
   Cheguei a acompanhar o último politico grande vivo: Maggie Thatcher foi pura politica. Uma raposa, uma gênial mistura de crueldade e de visão a longo prazo. Depois dela...vácuo.
   Terá a geração teen a consciência da importância histórica do que lá é recordado? De que enquanto nós aqui pagávamos o mico de ter uma familia real de sangue europeu, os EUA, na vanguarda, continuavam a construir seu projeto de nação? ( Que foi traído no século XX ). Podemos odiar os yankees, mas é a verdade, os EUA do século XIX são um projeto racional, duro, teimoso de nação. O filme mostra isso. Se Lincoln errasse o país negaria seu destino, ele não errou. O erro viria em 1898 com o começo do imperialismo nas Filipinas e Porto Rico. Como dizia Gore Vidal, a partir daí os militares passariam a ser o poder do país. No tempo de Lincoln não. Há o projeto civil, republicano e representativo. Um projeto que ousa, em 1864, dar a liberdade aos negros africanos.
   Spielberg apenas filma, nada inventa. O filme não tem uma grande cena. Daniel Day-Lewis está pegando todos os grandes papéis. Além de ser grande ator, tem concorrentes fracos. Quem mais poderia ser Lincoln? Sean Penn? Não temos mais Gregory Peck, Gary Cooper ou Henry Fonda. Esse tipo de ator, digno, viril, elegante, de voz poderosa, ponderado, desapareceu. Então quando precisamos desse tipo de ator temos Daniel. E Daniel. Ele está muito bem. Assim como Sally Field, melhor que ele, menos composta, mais quente que o inglês. E o grande Tommy Lee, cada vez melhor ator, que na verdade é o que mais me agradou, fazendo uma interpretação natural, matreira, cheia de nuances.
   Não é um grande filme. Longe disso. Espertamente Spielberg fez o filme certo na hora certa. O tema é muito bom. ( O roteiro é de Tony Kutchner. É aquele Tony, de Angels in America? ).
   Na verdade Cavalo de Guerra, como filme, me agradou bem mais. Mas todos devem ver este filme. Nem que seja para saber que um dia se fez politica no mundo. Que ela não é apenas isso que agora vemos, a administração de dinheiro e de negócios. Foi uma ideia, um plano e uma visão.
   Tá dito.

David Bowie - Fashion



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A VOLTA DA DECADÊNCIA

Alvíssaras! Vivas! Manés Manés! Parem de olhar o umbigo do vizinho, encerrem as divagações realísticas! O último representante da decadência voltou ! O derradeiro símbolo da inefabilidade temporal volta a nos guiar ! David Bowie manda sinais de vida e nós, súditos de fidelidade absoluta, respondemos.
Agora nossas camisas de seda estão menos solitárias e as noites roxy são mais plenas. Bowie é vivo !
Ecos de Walter Pater podem ser respondidos e olhares bovinos de Wilde têem novamente um objeto. A aposentadoria de seus suspiros terminou: Bowie está vivo !
2013 já se justifica e este mês não mais padece de ardor. As dores derretem-se e a noite se molda, o cara está vivo !
Tudo volta a ter sentido. A decadência ainda existe em frases de falsidade sincera. Relaxe baby, nem tudo se perdeu. Os óbvios da mortal certeza podem miar, Bowie nunca deu a mínima pra eles. Os babaquinhas continuam se indo sem saudades no rastro.
David Bowie continua a nos decair. Pretty Things forever.
Ele não cabe no mundo, porém, simbolista que é, estar fora lhe é um prazer rude. Sabe Bowie que sua pose é sombra que reaviva o mundo.
Alvíssaras! Vivas! Manés!

2010-1910- fin du siécle

   Estou lendo FIN DU SIÉCLE, o volume 8 da História da Literatura de Otto Maria Carpeaux. Dificil escolher, fico em dúvida na livraria se compro aquele sobre o barroco, o outro sobre o romantismo...escolho este ( já li a Idade Média ). Afinal, 1880/1914 é meu período favorito.
   Acabo de ler uma afirmação de Otto que preciso dividir com voces ( o que escrevo é um ato de amor, ou voces nunca perceberam isso? ), ele diz que os anos 1900-1914 são os mais ricos de toda a história da literatura. Prova disso ( Otto escreveu em 1965 ), são as constantes reedições dos livros daquele tempo. Mais que isso, o leitor médio, aquele que não é um intelectual, mas que sabe alguma coisa sobre literatura, procura em sebos e em bibliotecas livros desse tempo. Os autores que vêem imediatamente antes são clássicos, intimidam leitores médios ( Balzac, Stendhal, Dostoievski, Tolstoi, Dickens ), mas os autores de 1900 parecem contemporâneos, não-escolares, e ao mesmo tempo são "artísticos", ousados, profundos, originais. Weeellll...posso dizer que em 2012 nada mudou. Ou mudou sim, certos autores do período estão mais vivos que em 1965.
   Otto fala que a época é tão rica por motivos históricos. Um salto na economia, otimismo, e principalmente a democracia. Em 1900, pela primeira vez, todos podem ser "um autor". É a hora da explosão da literatura como um todo, sem modas. Proletários, snobs, mulheres, países periféricos, poetas loucos, nobres, homens de negócios, comunistas, fascistas, crianças...Há uma quantidade imensa de gêneros e de escritores. Não há rádio, tv, cinema, nada. O mundo é do livro, do jornal e do teatro. E, diz Otto, quase tudo que se escreve nesse período tem valor, tem interesse, merece sobreviver.
   Falar de autores? Otto cita-os. Seu livro é imenso. Vou citar apenas uma meia dúzia: Nietzsche, Machado de Assis, Joseph Conrad, Henri Bergson, Henry James, Freud, Yeats e Wilde. Só alguns pegos ao acaso, a lista é infindável.
   1910. Futebol. Cinema começando. Rádio e avião. Carros. Picasso, Matisse, Chagall, Klee, Kandinsky. Stravinsky, Ravel, Strauss, Bartok. O jazz e o blues. Otimismo. Viagens aos polos.
   2010. Guerra ao terror. Esgotamento do cinema. Da música popular, do teatro. Internet, código genético, câmeras onipresentes. Pessimismo. Desencanto com a democracia, com as ideologias. Monetização da vida. E as artes? E os livros? Proust em tablets. Ótimo. Mas Proust é 1910. Autores: Larsson, De Lillo, Roth, Martell, Couto, Coelho, Rowling, Lobo, Llosa...Este momento não lembra em nada 1910, lembra 1870, época do naturalismo, de medo, de insegurança. Precisamos de uma nova geração romãntica, de novos simbolistas, de outros profetas irreais.
   Mas na verdade é tudo em vão. Sinto em mim que escrever não tem mais porque, pra que ou como. Então sei o que sou, um simbolista. Assim como essa geração de 1880, há em mim a sensação de que no mundo de poderosos e de miseráveis, para mim não há lugar. Não sou um dos chefes e não me identifico com um dos "simples". Onde fico? O que posso escrever a ninguém irá interessar, o que se escreve pouco me interessa. Quem me escuta? Ao mesmo tempo tenho a vaidade de não fazer parte da sujeira. Não sujo as mãos com o poder vulgar e nem com as parcas ambições dos simples. Será isso? Um simbolista, eu?
   Mas onde o pessimismo? Simbolistas cultuam a morte e o desregramento. Sou comedido e vejo vida em tudo. Simbolistas são muito mais, sem que o saibam, certos amigos que tenho. Então vejo no livro de Otto, talvez eu seja um dos pós-simbolistas, aqueles que perceberam a alegria após a dor. Os que conseguiram criar um mundo parte do mundo. Os que se desembaraçaram do eu e olharam ao redor. Bá....
   Vejo então que sou um tipico homem de 2012, e que escolho um rótulo como quem escolhe em paletó. Procuro na vitrine de estilos aquele que me convém. Esqueça. Sou mais um blogueiro. Apenas isso. Exibo vaidade. Só isso.
   O interessante, é que eu, como todos os outros leitores médios, procura, ainda, em 1910 seus modelos, seus produtos, seus paletós.
   Otto acertou.

Just One More Inception



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Kojak Season 2 Open



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SÉRIES DE TV: UM CARECA COM PIRULITO E UM ANJO EM MEIO AO LIXO

   Pessoas com mais de 30 anos cada vez mais trocam o cinema por séries de tv. Os motivos são muito simples, filmes de cinema são cada vez piores. A arte do diálogo foi jogada no lixo ( e veja isso, a maioria dos filmes de arte hoje são quase mudos.... ). Séries de tv têm diálogos. Diálogos que nem são muito bons, mas que pelo menos existem, estão lá. Roteiristas de cinema perderam a habilidade de exibir um caráter em cinco minutos. Gente como Ben Hecht ou Robert Riskin conseguia fazer isso. Em cinco minutos a gente já conhecia o cara, já estava capturado por ele. Agora não mais e é por isso que hoje tem tanta biografia no cinema, o caráter já é conhecido, não se precisa criar. Na tv o cara pode levar vários episódios para desenvolver uma personagem. E geralmente é o que ocorre. House levou meses para ser House. Seinfeld é o caso clássico. Depois de 3 anos é que ele virou O Seinfeld. No cinema são duas horas para criar, desenvolver e concluir. É uma habilidade quase morta.
   Há um outro fato. As pessoas adultas saem cada vez menos. Filmes são vistos em casa. E em casa, para quem só assiste filmes "novos", é indiferente assistir um filme de cinema ou uma série de tv. Porque filmes novos se parecem cada vez mais com séries de tv. Séries ruins. Falam dos mesmos temas, e são filmados em digital, com imagem como a da tv. Zoons, closes e cenários pobres. Dificil saber visualmente o que é cinema e o que é tv. Claro, não falo de Pi ou de Lincoln, falo do filme médio, da grande maioria dos filmes. A única diferença entre esses filmes e as séries é o fato de que as séries desenvolvem mais os diálogos. Ou seja, vencem a disputa exatamente por serem mais "tv".
   Porque o "defeito" da tv sempre foi esse. Ela falava demais. E num tempo em que o cinema ainda sabia falar, ela perdia por ser visualmente pobre. O cinema falava tão bem ou melhor que a tv, e tinha um cuidado em foto e cenografia que a tv jamais poderia ter. No século XXI não é assim. Nos acostumamos a um cinema tão indigente que a tv passou a parecer uma arte nobre. Quem assiste apenas a filmes novos logo verá só tv. E quer saber? Não tenho pena nenhuma do cinema. Ele cavou sua cova. Optou pelo caminho fácil. Que seja feliz.
   No conforto de minha casa assisto a uma caixa com 6 discos de Kojak e a 4 caixas de Columbo. 28 dvds. As duas são o equivalente aos filmes de Scorsese e De Palma em tv.
   Kojak demora mais pra gente gostar. Acontece com ele o fenômeno Seinfeld. Os primeiros episódios parecem sem rumo. A série começa como um tipo de Operação França dos pobres. Muita cena na rua e a exibição da NY pobre e suja de 1973. Mas então, súbito, Telly Savallas vai achando o tom e a série cresce. É um prazer ver um ator fazer história. Telly vinha do cinema, onde sempre fora um bandido. Aqui ele é um tira. Kojak, O Cara. Eu não a assisti na época, era criança, mas lembro do sucesso. Kojak virou marchinha de carnaval. Os homens imitavam Savallas. O cigarro preto e fininho virou mania ( marca More ), o pirulito na boca também ( ele tenta parar de fumar ). Copiava-se na rua o chapéu, os ternos, os óculos escuros e a mania de falar Baby. Telly Savallas acabaria por ganhar dois Globos de Ouro e um Emmy com a série. Ficaria cinco anos entre as cinco maiores audiências. Telly morreria em 1994. Acho que Tarantino adoraria filmar com ele. Kojak tem todo o clima dos filmes de Quentin. É uma delicia ver aqueles carrões e os bandidos extra-cool. Mas ninguém é mais cool que Theo Kojak.
   Columbo é o anti-cool. Se Kojak é uma delicia, Columbo é uma obra de arte. Peter Falk foi um grande ator. Fazia parte da turma de John Cassavettes. E em 1971 começa na tv com Columbo. Para muita gente, uma das cinco melhores coisas que a tv já fez. Columbo é feio. Tem olho de vidro, fuma charutos baratos. O carro é velho e a roupa desalinhada. Modesto e nada violento. O tipo do boa praça. O que Falk faz aqui é genial. Ele transforma esse mala sem alça num tipo adorável. Voce ama Columbo. Não por acaso, em 1986 Wim Wenders ao filmar Asas do Desejo escolheu Columbo como um anjo que vivia na Terra. Columbo visita a Alemanha e Wenders o exibe como um homem que pode ver anjos. Nada mais justo.
   Columbo tem ainda uma grande originalidade. Ele mostra o crime. Na primeira cena nos exibe o crime. Sabemos quem é o culpado e vemos que não há pista. Então do nada surge Columbo e o que nos pega é o prazer de ver como ele vai deduzindo e descobrindo aquilo que já sabemos. Um fino prazer. Falk ganhou 3 Emmys com o papel e mais 2 Globos de Ouro.
   Columbo teve entre os atores que nele trabalharam gente como Myrna Loy, Ray Milland, Leonard Nimoy, Martin Sheen, John Cassavettes, Martin Landau, William Shatner; e na direção Steven Spielberg, Richard Quine e Richard Donner.
   Kojak teve episódios dirigidos pelo pai de Sean Penn, Leo Penn e Harvey Keitel entre seus vilões.
   Bem baby, me pego comprando um pirulito e alisando minha camisa. Andando pelas ruas me sentindo um cavalheiro: durão e muito frio. Minha lustrosa careca protegida por um elegante chapéu preto. E com a pergunta kojakiana nos lábios: "Diga quem te ama baby?"
   Um raro prazer.

AS RELAÇÕES PERIGOSAS- CHODERLOS DE LACLOS, UMA RADIOGRAFIA DO JOGO AMOROSO

   Amor. Existe? Laclos foi soldado, foi poeta, viveu os conturbados anos da revolução. E lançou uma obra-prima que jamais é esquecida, As Ligações Perigosas ( que o tradutor Sergio Miiliet opta por chamar de Relações ).
   Estamos em meio a nobreza. O que eles fazem? Se exibem. Vivem uma realidade estática. Para eles, o que é hoje será sempre. Não há tempo, não há mudança. Seguros socialmente, com todos os dias ociosos, eles se fazem mestres em prazer. Dedicam-se à vaidade. O filme de Frears dá ênfase a isso: Eles passam horas se vestindo, se maquiando. O outro grande prazer é a comida. E o principal é o sexo. Sexo como jogo racional. O romantismo ainda não vingou, estamos no reino da razão absoluta.
   Valmont, nome do filme de Milos Forman também baseado neste livro, seduz mulheres. Nobres, viúvas, criadas, virgens. Todas são suas. Ele, frio, jogador consumado, sabe racionalmente toda a regra, toda a tática do amor. Foi amante da mulher que lhe é igual, a marquesa de Merteuil. A amizade sobreviveu.
   Um dia surge uma devota. Cécile se torna prêmio de uma aposta. Se Valmont a seduzir, Merteuil dormirá de novo com ele. Por Cécile ser ingênua, Valmont usa a tática da culpa. Finge sofrer por ela, finge crer em Deus, finge ser casto. Conto o resto para voces?
   Falarei apenas que o filme de Forman carrega na futilidade. É muito mais leve que o livro. E que o filme de Frears exagera no sentimento, o livro é bem mais frio, seco, distanciado. Falarei do estilo do livro: É epistolar, estilo muito em moda no século XVIII. Lemos as cartas trocadas pelos personagens. Assim, por lermos apenas o que eles escrevem, temos de intuir nas entrelinhas suas emoções reais. A leitura se torna rica, complexa, sutil. Onde Valmont diz a verdade?
   Obra-prima, tive o prazer de ler Laclos pela primeira vez em 1993, num janeiro cheio de paixão. Depois fiz dele um manual, guia sobre a paixão e sobre o jogo do amor. Muitos o chamam de tratado definitivo sobre a sedução. Laclos teve a intuição, ou seria sabedoria?, de nos dar uma radiografia exata das motivações do amor. Valmont tem confiança, tem tato, e acima de tudo, sabe mentir. Quando o jogo passa a ter regras que ele não conhece, sua máscara cai. Começa o amor.
   Valmont e Merteuil são dois dos maiores personagens já criados. O século XXI está povoado por clones dos dois. Clones que são muito mais tolos, bem mais deselegantes, mas com a mesma motivação. Vaidade e poder.
   PS: Ligações Perigosas, assim como Amadeus, foi um grande sucesso de bilheteria dos anos 80. Filmes históricos sem monstros e vampiros ainda tinham público. O que aconteceu?

DAVID FRANKEL/ GRACE KELLY/ WOODY/ FREARS/ BETTE DAVIS

   TODOS DIZEM EU TE AMO de Woody Allen com Alan Alda, Julia Roberts, Goldie Hawn, Edward Norton, Tim Roth, Natalie Portman
É sempre um prazer ver esse povo dos filmes de Woody Allen. São intelectuais bem de vida, com suas casas bem decoradas, suas roupas confortáveis e seus dramas sob controle. É gostoso ver esse povo espelhar aquilo que a gente pensa ser. Este é dos que mais gosto. Lembro que em 1999, na tv, ele me ajudou a superar uma grande dor de cotovelo. O filme tem belas cenas em Paris e Veneza. O elenco é deslumbrante. E eles cantam!!! As canções são ótimas. E no fim, em reveillon, eles cantam Hooray For Captain Spaulding, bela homenagem aos irmãos Marx. Nota 8.
   UM DIVÃ PARA DOIS ( HOPE SPRINGS ) de David Frankel com Meryl Streep, Tommy Lee Jones e Steve Carell.
O povo da Folha adorou este filme. Eu achei chato de doer! Frankel faz carreira sólida com filmes tipo nada. Fez o Prada, o Marley e agora este. Seu estilo é nojento, taca música pop em toda cena. O cara tá andando no mercado e lá vem vozinha com piano; o cara tá dirigindo e tome voz e violão...um saco! Usar música pop em filme adianta quando o diretor entende que a música é secundária, ela comenta, não carrega a cena nas costas. Ah, o filme fala de um casal de meia idade que não transa mais. Todo o filme são sessões de terapia. Meryl faz caricatura, está nada bem. Tommy está excelente, a hora em que ele se abre é a única cena boa do filme. Típico filme que tenta ser sério e adulto. Erra. Todo adolescente pensa que ser adulto é ser chato e triste. Frankel é um adolescente. Nota 1.
   OS GALHOFEIROS de Victor Heerman com Groucho, Chico, Harpo, Zeppo e mais Lilian Roth
Groucho é anunciado como o grande Capitão Spaulding. Sua entrada é digna do melhor de Bugs Bunny. Adoro este filme caótico! É o segundo da turma, e tem de bônus a adorável Lilian Roth. História? Tem alguma coisa a ver com roubo de pintura. Talvez seja meu filme favorito dos irmãos. Nota DEZ.
   O DOBRO OU NADA de Stephen Frears com Bruce Willis, Rebecca Hall, Catherine Zeta-Jones
Não dá pra dizer que Frears está em decadência, afinal, recentemente ele fez o ótimo A Rainha. Em seu crédito temos ainda Alta Fidelidade, Ligações Perigosas, Os Imorais, Minha Adorável Lavanderia; e meu favorito, The Hit. Mas neste seu mais recente filme, não sei se passou aqui este ano, ele erra feio. O filme não é ruim, é desinteressante. Fala de uma stripper que passa a trabalhar com um agenciador de jogatina. O filme não chega a irritar, Frears sabe dar ritmo, mas nenhum dos personagens importa. São mal escritos. O roteiro é muito, muito ruim. Bruce faz o seu tipo número dois, o "brega meio doido", Zeta-Jones está com um rosto irreconhecível e Hall, filha do grande Peter Hall, um dos maiores do teatro inglês, mostra ser muito boa atriz, mas pouco tem a fazer. O filme é vazio. Nota 2.
   UM BARCO PARA A ÍNDIA de Ingmar Bergman
É o terceiro filme do mestre, de 1947, tempo em que ele ainda aprendia. Bons tempos, um diretor novato podia aprender-fazendo. Bergman só encontrou seu estilo no sétimo filme. Mas aqui já está em semente todo o futuro do estilo Bergman de cinema: mar,  isolamento, conflito com pai, sexo. Neste filme, que em seu tempo jamais poderia ser feito em Hollywood, temos um filho que apanha e bate no pai, esse pai traz a amante para morar com a familia, o filho a rouba do pai. O filme é forte e lembra os amados filmes do realismo poético francês, filmes de Carné, de Vigo, que Ingmar via muito então. Sinto que ninguém sabe filmar praias como ele. Visualmente o filme é primoroso. Nota 7.
   O QUE TERÁ ACONTECIDO A BABY JANE? de Robert Aldrich com Bette Davis, Joan Crawford e Victor Buono
Foi um imenso sucesso nos anos 60, e nos 70 passava muito na tv. Causou um choque em seu lançamento por seu mal-gosto. Hoje parece até elegante. Bette é irmã de Joan. Joan está presa a uma cadeira de rodas. Bette tortura Joan. Motivo? Joan fazia sucesso no cinema dos anos 30, Bette não. O filme é brilhante. Ficamos duas horas presos num misto de horror e admiração, prazer e medo. Aldrich, que logo depois faria a obra-prima The Dirty Dozen, faz miséria. O filme tem ritmo, tem ousadia e um humor hiper negro delicioso. Mas devemos dar vivas a grande, grande, grande Bette Davis. Mal maquiada, velha, suja, ela assusta com sua voz rouca, seu modo bêbado de andar, seus olhos esbugalhados. E melhor, percebemos o quanto ela se diverte em fazer aquilo. É um desempenho fascinante. Se Kate Hepburn foi a única a lhe fazer frente, devo dizer que Kate não conseguia fazer esses tipos tão vulgares. Tudo em Kate parece sempre "alta-classe", mesmo ao fazer gente pobre. Bette não, talvez por não ter a origem "nobre" de Kate, ela fazia mendigas, bebadas e prostitutas como ninguém. Este filme fica com voce. Repercute. Nota 9.
   O CISNE de Charles Vidor com Grace Kelly, Alec Guiness e Louis Jourdan
Na curta carreira de Kelly, este é de seus piores filmes. Em 1910, a mãe de Grace, tenta casa-la com o herdeiro da coroa. Filmado em belo palácio, claro que o filme é bom de se ver. Mas a história é chata, aborrecida, sem nenhuma atração. Guiness está ótimo. E Grace Kelly foi dentre as belas a mais bela das atrizes. Mas...o que fazer com roteiro tão perdido? Nota 2.

UM SÉCULO DE BOA VIDA- JORGE GUINLE

   Jorge Guinle foi o último playboy brasileiro. Hoje não existem playboys. Porque? Porque o "fazer algo de útil" tomou conta de todo mundo. O verdadeiro playboy gasta dinheiro. E não trabalha nunca. Nem faz aplicações, negócios, especulações etc. Ele gasta e jamais sabe quanto tem ou de onde virá o dinheiro. Recebe grana do banco, dos pais, cai em sua conta. E ele gasta, tudo. Em diversão. Sem se preocupar. Isso é ser playboy. Segundo Jorginho, hoje talvez só os principes árabes tenham cacife pra ser assim. Mas eles se divertem pouco.
   Jorge Guinle jamais trabalhou. Nem um dia de sua vida. Os Guinle tinham vários negócios, principalmente imóveis no Rio, mas a fonte maior era o porto de Santos. Eles eram donos do porto. De cada 5 cafés que se tomava no mundo, 3 pagavam tributo aos Guinle. Mas Jorge nunca teve muito. O dinheiro era da familia, ele recebia mesada. Em valor de hoje, "apenas" 100 mil por mês. Menos que qualquer jogador de futebol conhecido. Mas com um detalhe: esses 100 mil eram apenas para diversão. Todas as contas "sérias" eram pagas, assim como ele ia a restaurantes e clubes de graça. Tinha um dos Rolls Royce da familia, passagens de avião, roupas. Basicamente os 100 mil eram para taxi.
   O livro tem fotos. A mais bonita é da casa onde ele nasceu. Uma mansão gigantesca em Botafogo. Depois ela se tornou embaixada da Argentina. Quem mora em SP, passe na Avenida Nove de Julho e olhe a Casa da Marinha. É muito parecida. Coisa de 22 empregados. A chácara Gromari, onde a seleção treina em Teresópolis, também era da familia. Dois milhões de metros quadrados.
   Jorge estudou no College de France. Sua primeira lingua foi o francês. O College é a melhor escola francesa. É aquela faculdade, da qual já falei, sonho de todo professor da USP. Paga o melhor salário do mundo, e seus mestres dão apenas uma aula por ano. Sobre o tema que escolher. Lá, Guinle estudou filosofia. E se formou na cadeira de Bergson. Sua filosofia não é bergsoniana, é William James com Russell, o tipico materialismo do começo do século XX. Jorginho fala do que pensa: Não existe um Eu. Nem um Ego. Crer no Inconsciente é crer em mitologia. O eu é a soma de experiências. Qaunto mais vivência, mais eu voce tem. Fora disso não há nada. Tudo no cérebro é mecãnico, não há nada de oculto, simbólico ou inconsciente. Pensamos o que provamos. Fora de nós o que há é matéria. Sem a matéria nada há. Infinito é algo impossível. Tudo tem um fim. A matéria é finita, experimentável e temporal. Fora da matéria, o nada. Não existe uma função da vida, um porque. O que há é a matéria sendo provada por nós. Nosso Eu, uma ficção, é um conjunto de lembranças e de aprendizados.
   Jorge Guinle fala ainda de pintura, tema que ele conhece. Mas sua paixão é outra, mulheres. Ele fala de suas namoradas, a maioria atrizes americanas. Ele conheceu Hollywood em seu auge, conviveu com produtores, atores e as belas mulheres. Nada do que ele conta é muito apimentado, gentleman, ele mantém uma certa discrição. Boas as histórias com Erroll Flynn. Voce pode estar pensando: "Como esse brasileiro conseguia ser recebido por tanta gente top?" A resposta é: Copacabana Palace. O Rio da época, ainda com cassinos, era um tipo de Bahamas de hoje, uma pacifica ilha tropical, um oásis que todos queriam conhecer. Guinle hospedava essas estrelas, o Copacabana era dos Guinle.  O Rio, cidade calma, sem crimes, os enfeitiçava. Sofia Loren, Kim Novak, Rita Hayworth, Cary Grant, Jayne Mansfield, Gina Lollobrigida, Ava Gardner, David Niven, Ginger Rogers...
   O que mais me deliciou são as comparações do que era ser rico em 1930, e do que é ser rico hoje ( 1997 ).  Os ricos simplesmente não se misturavam em 1930. As familias ricas de Filadélfia e Boston não aceitavam os ricos de New York, pois New York era cidade de novos ricos. Os Rockefeller, por exemplo, por mais que gastassem, não eram aceitos pelos Vanderbilt, ricos bostonianos de 200 anos.  Mas era na Europa que estava o verdadeiro luxo. Jantares onde era obrigatório ter um mordomo para cada dois convidados. Trocava-se de roupa três vezes por dia: roupa da manhã, da tarde e do jantar ( sempre o dinner-jacket, que sabe-se lá porque, chamamos de smoking ). Pratos de ouro puro, pesados, jóias que se podia usar na rua ( no Rio as mulheres iam passear em Copacabana com diamantes... Mal comparando, lembrei que em 1972  minha mãe ia visitar sua prima na Nove de Julho com colares de ouro grossos... ). Um tempo de imensa segurança, tempo que não volta. Nunca.
  Mas não pense em alienação. Guinle se diz de esquerda. Ele ama o luxo, mas quer esse luxo para todos. Sabe o que é a injustiça, mas sabe também que o modelo socialista nunca dará certo. Porque o homem quer mais, quer poder ter.
   Livro excelente para se ler a beira da piscina, um anti-Caras, anti-celebridades, Jorge Guinle nos conquista por sua inocência.
   PS: O livro expõe algo que eu já suspeitava: O homem que se dá melhor com as mulheres é aquele que as ama integralmente, sem medo.
   Já me ia esquecendo!!! O jazz é outro grande amor de Jorge. Ele dividiu mesa de bar com Billie Holiday, Dizzy Gillespie, Charlie Parker. Esteve no Cotton Club em seu auge, viu o bop nascer. Tá tudo no livro. Quem quiser saber mais sobre jazz tem prato cheio.